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Implicações para a(s) prática(s): a promoção de competências transversais em

Capítulo IV. Discussão e Conclusões

3. Potencialidades e contributos

3.1. Implicações para a(s) prática(s): a promoção de competências transversais em

No cômputo geral, e conforme defendido ao longo deste trabalho, considera-se que as competências transversais deverão ser sempre desenvolvidas em contexto, independentemente da sua natureza ser mais académica, extracurricular, profissional ou de trabalho (indiferenciado). Os momentos de exposição aos contextos deverão ser precedidos de um momento de preparação, no qual se identificam os objetivos e as estratégias a agenciar para o seu cumprimento no contexto escolhido, explorando-se, igualmente, os motivos que estiveram na base daquela escolha (e quando não existe contexto à partida, realizar um balanço de competências e identificar, de seguida, que contextos poderão propiciar o desenvolvimento das dimensões pretendidas).

No caso particular das competências transversais, pode tomar-se como exemplo o modelo de intervenção utilizado para este fim pelo SLH e que se baseia teoricamente em perspetivas de desenvolvimento de carreira de natureza mais construtivista e ecológica. Independentemente de o indivíduo já ter realizado anteriormente um balanço de competências, o processo de intervenção/apoio deverá iniciar-se pela identificação dos pontos fortes e a melhorar – tendo em conta a sua perceção e os objetivos de carreira que tem – no sentido de perceber quais as dimensões que vão contribuir para uma melhor integração e resposta no contexto e quais poderão vir a ser desenvolvidas com essa experiência. É igualmente nesse momento que o indivíduo deverá saber gerir realisticamente as expetativas quer em relação aos ganhos que se esperam da experiência, quer ao impacto que produzem no desenvolvimento de competências (que acontece por via da exposição continuada e de momentos alternados de reflexão/integração).

Após um período de imersão na experiência – que poderá variar entre duas horas, no caso de uma atividade letiva, e duas semanas, no caso de uma experiência de estágio ou um mês, no caso de uma experiência continuada de voluntariado pontual – deverá acontecer um período de monitorização do plano de ação estabelecido (eventual reajuste por necessidade de um melhor fit às especificidades do contexto) e reflexão integrada e apoiada, mas não diretiva. À medida que a experiência se vai desenrolando, os momentos de exposição deverão ser sempre intercalados com momentos de reflexão, no sentido de permitir uma melhor integração da experiência e do enriquecimento que a mesma proporciona ao nível pessoal e profissional. Em alguns

casos o momento de finalização da experiência poderá consistir num encerramento formal – por via de uma apresentação/ momento final com a administração da empresa (se remetermos para um contexto de estágio, por exemplo) – ou acontecer de maneira não-formal – no âmbito de um momento de integração autónomo ou assistido (pelo profissional que conduziu os momentos de reflexão anteriores). O momento de finalização é particularmente importante pois permite comparar o ponto de partida com o de chegada, identificando as dimensões que foram desenvolvidas com recurso a evidências concretas, as que foram mobilizadas (já existentes, mas que tiveram um papel preponderante para o sucesso no contexto) e as que ainda necessitam de melhoria (aproveitando para identificar que outros contextos poderão promover essas mesmas competências transversais).

Acredita-se que o modelo apresentado corresponde ao que constitui uma abordagem intencional e articulada de desenvolvimento de competências transversais, conforme pretendido e defendido pelos participantes que colaboraram com as suas perceções para este estudo. No entanto, e tendo em conta as reflexões produzidas no âmbito desta investigação, algumas críticas poderão ser apresentadas quanto às dimensões que seguidamente se apresentam.

O balanço de competências, que se toma como ponto de partida da intervenção, baseia-se num referencial não especificamente orientado para as áreas de economia e gestão, sendo o referencial atualmente utilizado uma adaptação do modelo de Evers, Rush e Berdrow (1998). Este referencial sistematiza as competências transversais mais relevantes para a aprendizagem ao longo da vida e para a empregabilidade, não as situando num contexto particular em termos de áreas de saber para as quais serão mais ou menos relevantes, como o presente estudo sinaliza, para as áreas de Economia e Gestão. Para além de esta ferramenta ser utilizada no ponto de partida, deverá existir igualmente uma maior sensibilidade ao longo de todo o processo para as dimensões sinalizadas como relevantes, tendo em conta a área específica de formação do indivíduo – entrando aqui a distinção entre a Economia e a Gestão, enfatizada no estudo – trabalhando-se de modo intencional as que são identificadas como mais importantes a desenvolver para cada uma das áreas (no caso de o indivíduo não as evidenciar ainda). A avaliação do impacto efetivo que as experiências extra-académicas produzem no desenvolvimento de determinadas competências deve ser realizada criteriosamente e, como os resultados do estudo demonstram, dependerão quer da natureza das mesmas quer da possibilidade de reflexão que permitem ao estudante na lógica de significar estas experiências em torno das competências que permitiram desenvolver

e/ou mobilizar, bem como de outras aprendizagens que simultaneamente se registaram ao longo da experiência.

O envolvimento necessário de outras figuras, para além do psicólogo, em todas as etapas do processo de desenvolvimento, desde o momento inicial de avaliação – que, no modelo apresentado é realizado apenas pelo próprio estudante – até ao momento de finalização, também é uma característica a rever. Assim, e quando estas experiências surgem integradas num determinado âmbito, quer o docente (no caso de uma unidade curricular) ou outra figura do contexto responsável pela atividade (p.e., coordenador no núcleo de voluntariado, treinador da modalidade desportiva frequentada) ou mesmo pares intervenientes na mesma que com o aluno interajam (outros estudantes, voluntários, estagiários ou colegas atletas, no caso de atividades desportivas), ou o interlocutor do mercado de trabalho (na posição de orientador de estágio, de mentor, ou de parceiro no âmbito de um projeto que se está a desenvolver, por exemplo), constituirão figuras de referência para trazer uma perspetiva de feedback 360º à reflexão sobre as competências. O facto de auxiliarem na identificação e fundamentação de competências fortes e a melhorar providenciará contributos relevantes, ao longo do processo, para o desenvolvimento, capacitação e evolução do estudante relativamente às suas competências, não apenas em momentos de avaliação inicial, intermédia e final formais, mas ao longo de todo o processo de reflexão. No caso particular dos estágios – experiências com impacto identificadas neste estudo – os orientadores de estágio deverão funcionar como elementos fundamentais num momento inicial de reconhecimento do perfil, em momentos de feedback intercalares ao longo da experiência e no momento final de avaliação, que se deverá constituir enquanto contexto de reflexão da experiência e de projeção no futuro.

Por fim, destaca-se o constrangimento de não existir uma avaliação sistemática dos processos de intervenção do SLH no sentido de apurar o verdadeiro impacto que o processo provoca no desenvolvimento intencional de competências transversais. Esta é uma limitação que o próprio serviço SLH já identificou e que se acredita que o presente estudo ajude a colmatar, na medida em que validou um conjunto de competências que contribuirá para a uniformização destes instrumentos de avaliação a implementar. De facto, o balanço realizado no final do processo até agora resulta de uma perceção subjetiva do estudante, realizada de modo informal, sem evidências apresentadas por parte de outros atores que com ele interagiram no âmbito das experiências (à exceção dos orientadores de estágio, que preenchem uma breve ficha de avaliação, situando o nível de proficiência de um conjunto de competências transversais num único momento – o final do estágio). Assim, sugere-se que, ao pensar modelos de intervenção que

atuem a este nível, se considerem estes elementos para que se possa afirmar, com maior certeza, que os mesmos estão efetivamente a promover a reflexão e o desenvolvimento de competências transversais do estudante.

Por estes motivos, considera-se pertinente a revisão e aperfeiçoamento dos componentes identificados em relação a este modelo que o SLH utiliza, bem como de outras abordagens que, embora não tendo sido objeto de análise neste estudo, utilizem práticas semelhantes. Apenas uma avaliação mais situada e rigorosa em termos do verdadeiro impacto dos processos de intervenção no desenvolvimento efetivo de competências transversais poderá trazer, à luz dos contributos encontrados na presente investigação, uma noção efetiva de que estas dimensões estão a ser trabalhadas em contexto de Ensino Superior, no sentido de melhor preparar os estudantes para os desafios profissionais.

De uma forma geral, as metodologias de coaching e intervenção psicológica correspondem positivamente a esta configuração de processo, sendo por isso fortemente incentivado que as organizações (sejam elas Instituições de Ensino Superior ou empresas) proporcionem este tipo de acompanhamento aos seus estudantes/colaboradores, seja num contexto individual ou em grupo. No entanto, este modelo poderá ser também utilizado e enquadrado em unidades curriculares configuradas especificamente para este tipo de exigências (das quais as disciplinas de projeto da CPBS são exemplo).

De forma específica, e para as competências identificadas como as mais relevantes para as áreas de Economia e Gestão, propõe-se de seguida algumas vias específicas de ação.

Em contexto de ES seria de considerar a utilização mais frequente de metodologias de project based-learning – método de ensino através do qual os estudantes adquirem conhecimento e desenvolvem competências trabalhando por um período longo de tempo num projeto de investigação, tentando responder a uma questão, problema ou desafio complexo no âmbito curricular (para uma revisão, ver Thomas, 2000). Pressupõe-se um planeamento e organização no sentido de identificar as ações a desenvolver, orientando-as para objetivos concretos e consequentemente resultados, estimulando a capacidade de análise e resolução de situações por via da aprendizagem contínua e situada num contexto aproximado do real. Tal implicará uma flexibilização relativamente aos imprevistos, alguma adaptação à mudança (pela necessidade de permanente reformulação da abordagem em momentos de impasse),

promovendo a capacidade de gestão de informação (recolha, análise, sistematização) e posicionamento crítico face à mesma.

O lidar com dimensões éticas e deontológicas (por apresentar desafios reais que levantam frequentemente questões de confidencialidade e valores, por exemplo) e o culminar frequente em momentos de exposição oral para uma plateia (uma das vertentes da comunicação oral) são ainda dimensões que este modelo procura estimular. Em contexto profissional (organizações/empresas) poderia mostrar-se vantajosa a aposta em experiências de imersão pontuais ou continuadas que incentivem:

(a) a utilização de metodologias Kaisen e ferramentas lean, utilizadas para a otimização de recursos e processos mas que, simultaneamente, estimulam a orientação para resultados, a aprendizagem contínua, a análise e resolução de situações e a adaptação à mudança; e

(b) a gestão por via de key performance indicators, que ajudam a orientar em direção a resultados e a sistematizar/gerir informação tanto sobre perfis como de processos.

Em contexto académico mas simultaneamente aproximado à realidade profissional, é possível identificar também algumas ações a desenvolver. Por um lado a introdução de desafios de assessment de competências transversais no percurso académico dos estudantes, para que possam ter um contacto (ainda que simulado) com o tipo de provas com as quais se podem deparar num processo de recrutamento. Por exemplo os Centros de avaliação de competências desenvolvidos por algumas consultoras de RH (Pro-Unicenter e Pessoas e Sistemas) – permitem avaliar um conjunto de competências transversais ajustadas de acordo com o público-alvo, numa lógica preditiva mas com impacto nos processos de seleção, promoção, planos de promoção e desenvolvimento. No caso particular de licenciados em Economia e Gestão, a análise e resolução de situações, a organização, a gestão da informação e a comunicação oral são avaliados por via de provas one-to-one, in-basket e dinâmicas de grupo. Também a organização de clubes que promovem a arte de comunicar e de liderar através de um ambiente de aprendizagem positivo e de suporte mútuo, como é o caso do Toastmaster, podem ajudar ao desenvolvimento de competências transversais, nomeadamente as mais relacionadas com a comunicação oral e da liderança. Processos de coaching e mentorship desenvolvidos em contexto organizacional por pares (para feedback contínuo) e apoiados por chefias (desenvolvimento e gestão de carreira), dos quais os programas das consultoras McKinsey e PwC são exemplo, poderão potenciar quer a identificação quer o desenvolvimento de competências

relevantes para um contexto profissional particular. Finalmente, os processos de coaching e mentoring desenvolvidos para estudantes de licenciatura e mestrado, respetivamente, da CPBS, contextos nos quais se poderá definir objetivos de desenvolvimento muito particulares e customizados ao perfil (real e objetivo) do indivíduo.

Tais propostas trazem, naturalmente, desafios aos profissionais de ambos os contextos – nomeadamente professores, psicólogos, gestores de RH, chefias, diretores e administração de empresas, e aos principais atores deste quadro de transição: os próprios estudantes. Assim, para os psicólogos a atuar em contexto de ES será importante um estudo exaustivo e uma apropriação prática de metodologias interativas e reflexivas promotoras de desenvolvimento, em contexto individual e de grupo, que pela experiência irão sendo validadas ou reformuladas de acordo com os intervenientes e as alterações dos contextos, bem como das exigências que se avizinharem no plano futuro de carreira dos estudantes. Para os profissionais de RH e gestores, figuras de ligação colaborador-contexto organizacional, estes inputs e práticas serão relevantes quando considerados no âmbito dos processos de seleção, retenção e desenvolvimento de colaboradores, sendo que também as chefias diretas (ainda que provavelmente não tendo formação na área de gestão de pessoas) deverão igualmente considerar estas dimensões para um maior ajuste na condução de momentos de avaliação de desempenho e feedback aos subordinados. Também na articulação entre estes dois contextos, Archer e Davison (2008) propõem que os empregadores deverão ter em consideração que passos necessitam de dar antes de abordarem as Instituições de Ensino Superior com os perfis requeridos, trabalhando em conjunto no sentido de potenciar a empregabilidade dos estudantes de forma a trazerem valor às empresas logo desde o início das suas carreiras. Neste sentido, parcerias com universidades deverão ser estabelecidas para que os programas e a maioria das experiências de aprendizagem dos estudantes contribuam para um maior ajuste às necessidades do negócio, valorizando a dimensão das competências transversais. Os empregadores deverão ainda enviar sinais claros aos estudantes, investindo tempo e esforço na identificação dos seus perfis e valorizando as dimensões interessantes do seu percurso nos momentos de recrutamento. Por fim, há que considerar as implicações destas tendências e mudanças nos contextos para os estudantes, não os demitindo da responsabilidade de serem os principais agentes do seu próprio desenvolvimento, ainda que apoiados pelas iniciativas dos contextos, que facilitarão em grande medida o acesso a oportunidades para se desafiarem, e pelos psicólogos que os apoiarão na gestão estratégica dos recursos internos e externos.

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