• Nenhum resultado encontrado

Importância do Estado desenvolvimentista

2. FINANCEIRIZAÇÃO, GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO: MUDANÇAS

2.2 Importância do Estado desenvolvimentista

O Brasil, assim como grande parte dos países capitalistas, passou por um período de forte crescimento econômico, entre as décadas de 1950 e 1970, no pós 2ª guerra mundial. Condiciona-se grande parte do crescimento apresentado pelo país à atuação intervencionista por parte do Estado, em sua inserção que ficou conhecida como Estado desenvolvimentista25.

25 No caso dos países latino-americanos, o papel do Estado pode ser compreendido a partir da concepção da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) sobre o caminho a ser construído pelos países atrasados da região para alcançar o desenvolvimento, postando-se na necessidade de uma estratégia de industrialização induzida e acelerada (PREBISCH, 1949). A Cepal focou-se no conceito da relação Centro- Periferia, na qual haveria um desnível entre os distintos países, com os termos de troca entre bens manufaturados (produzidos especialmente pelos países do Centro) e os bens primários (produção dos países periféricos) deteriorando-se, fazendo com que os países periféricos tivessem as disparidades com relação aos países centrais aprofundadas. A própria capacidade de acumulação e desenvolvimento da periferia estaria limitada por essas

Esta maior participação estatal na economia inicia-se já na década de 1930, porém, é a partir dos anos 1950 que se constitui tendo como objetivo impulsionar a industrialização no modelo de industrialização por substituição de importações. Tal forma de intervenção fez parte de uma mudança paradigmática, sendo que, entre as décadas de 1930 e 1970, ocorreu um profundo aumento do poder estatal com ampliação de seu papel como agente econômico, não somente na função de regulador, como também no aumento de seu aparato burocrático e em sua função de propulsor da indústria de base, fornecendo subsídios e insumos para as empresas.

Inicialmente, a participação do Estado balizou-se na função de articulador do chamado tripé – capital privado nacional, capital estrangeiro e estatal (que teria sido, inicialmente, implementado no governo Juscelino Kubitschek26). A partir disso, realizou-se uma série de iniciativas por parte do Estado. Este aumentou a proteção ao mercado interno, através de elevadas tarifas aduaneiras, e realizou uma política cambial com controle do mercado de câmbio e taxas de câmbio diferenciadas, como forma de incentivar setores específicos da economia – tais medidas foram utilizadas a fim de proteger a indústria nacional, no processo de internalização do parque produtivo. Além disso, o governo fomentou as indústrias, através do BNDE(S), que se constituiu como principal agência pública para financiamento da indústria nacional. Tem-se, ainda, a participação direta do Estado, por meio das empresas estatais, sendo estas as grandes responsáveis pelo desenvolvimento da infra-estrutura no país e em grande parte das indústrias que demandaram maior investimento de capital – as indústrias de base (SUZIGAN, 1988). Esta forma de intervenção direta foi a grande propulsora do Milagre Econômico, na gestão do ministro Delfim Neto – especialmente na “2ª fase” no começo da década de 1970, quando se realizaram grandes investimentos estatais27.

A intervenção estatal ocorreu, assim, com a constituição de uma industrialização periférica e tardia, através da industrialização por substituição de importações, com forte participação do investimento estrangeiro, com este se concentrando no setor de bens de

diferenças, com a necessidade de uma “intervenção indutora”, que permitisse não só uma maior capacidade de acumulação interna, mas especialmente o deslocamento do centro de decisões para a órbita interna dos países subdesenvolvidos. Com isso, o Estado é invocado a fim de desempenhar tal papel.

26 Apesar das primeiras grandes indústrias já terem sido instaladas ao longo do governo Getúlio Vargas (1930- 1945), o governo JK é considerado o primeiro a efetivamente implementar um plano sistemático para a industrialização do país, através do Plano de Metas. Para mais, ver LESSA (1981).

27 A expressão “Milagre Econômico” demarca o período de maior crescimento do país à época. Entre 1968 e 1970, o crescimento no país baseou-se na ocupação de capacidade instalada; a partir de 1970, novos investimentos se fizeram necessários para permitir a continuidade das elevadas taxas de crescimento. Para mais sobre o período do “Milagre Econômico”, ver LESSA (1981); ABREU (1990); BELLUZZO; COUTINHO (1998); TAVARES (1983).

consumo duráveis. Isso acarretou na internalização do setor de bens de capital, de transformação e indústria de base – em períodos distintos – como dependente do Estado, o qual sustentava o tripé. Tal conjunção possibilitou um significativo desenvolvimento da indústria nacional28.

Tem-se, porém, que aos primeiros sinais de desgaste nesse modelo, ou seja, quando a economia passou a enfrentar problemas significativos, como a aceleração do processo inflacionário, o crescimento da dívida externa e o arrefecimento do crescimento econômico, todo o modelo até então em vigor, e que permitiu todo crescimento econômico, passa a ser questionado e dado como findo, principalmente a participação do Estado, posta como pretensamente incompetente e ineficiente.

Na verdade, o que se pode verificar, é que, no momento em que não se pôde mais alinhar interesses e - mais do que isso - conciliá-los por meio do crescimento econômico, as bases que sustentavam a atuação desse Estado desmontaram-se. Ou seja, as bases de apoio desse modelo eram frágeis, uma vez que só conseguiam se manter enquanto o país estivesse em constante – e de preferência, elevado – crescimento econômico. Mais do que isso, o que ocorreu é que os próprios fatores que levaram ao esgotamento de tal modelo já se encontravam presentes no tipo de crescimento escolhido. Quando as contradições existentes como parte – e dentro – do aparato estatal tornaram-se agudas e não puderam mais ser sustentadas com o uso da “fuga para frente”, o próprio modelo de funcionamento do Estado não mais se sustentou (FIORI, 1989; FIORI, 1995; TAVARES, 1978). “Desde o final da década de 70 acumulam-se os sintomas de uma crise que, econômica e política, solapou as bases de sustentação do regime e erodiu a capacidade gestora do Estado” (FIORI, 1989, p. 104).

Tal crise deu margem à instauração de uma outra inserção por parte do Estado, mais concernente com as modificações internacionais da própria lógica de acumulação capitalista. Isto porque, se a existência de um Estado desenvolvimentista, que realizou forte intervenção e direcionamento na distribuição do capital, foi possível no Brasil, deve-se, em grande medida, à própria fase pela qual a economia capitalista passava. Afinal, como já posto no capítulo 1, este período – aproximadamente, entre as décadas de 1950 e 1970 – foi marcado por uma

28 No entanto, como o Estado não era capaz de internalizar toda cadeia produtiva, grande parte do ciclo de acumulação continuou sendo realizada em escala mundial, permanecendo parte dessa indústria exteriorizada no Centro capitalista, ou seja, nas grandes nações desenvolvidas. Constrói-se nesse âmbito uma relação de interdependência entre os países, porém com perceptíveis assimetrias, com o aprofundamento da dependência dos países periféricos.

maior intervenção do Estado na economia mundial, a fim de garantir o funcionamento das relações de mercado. Quando tal inserção do Estado na economia entrou em “falência” foi porque o mesmo era considerado esgotado para as necessidades do capitalismo. Ou seja, o modelo implementado e o foco na economia produtiva não eram mais concernentes com a necessidade de reprodução do capital. O transbordamento do capital produtivo para a esfera financeira foi essencial para que o capital continuasse a se reproduzir e criar mais valia – conforme a lógica marxista de alcance da fase “superior” do capitalismo. Nesse ínterim, a forma de atuação do Estado foi se modificando de acordo com as necessidades postas pelo capital e pelas classes dominantes que o coordenam.