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A IMPORTÂNCIA DO ESPAÇO NA FORMA DE PROPRIEDADE 33 PARA COMUNIDADES RIBEIRINHAS NO INQUÉRITO CIVIL N 1.23.003.000078/2015-

Organograma 1: Composição Acionária Norte Energia (com alteração em 2014)

3. DA REALIDADE AO DIREITO: o Inquérito Civil n 1.200000078/2015-

3.2 A IMPORTÂNCIA DO ESPAÇO NA FORMA DE PROPRIEDADE 33 PARA COMUNIDADES RIBEIRINHAS NO INQUÉRITO CIVIL N 1.23.003.000078/2015-

Considerando que a questão da identidade se demonstrou de significativa relevância ao se estudar a questão ribeirinha, entendo que a propriedade possui um importante papel para a conservação do modo de vida ribeirinho, bem como, para a definição de comunidade tradicional, já que, adotando o posicionamento de Henyo Barretto Filho, compreende-se que mais do que o tempo, o espaço é aquilo que define uma comunidade como tradicional34.

Por isso, saber quais são as disposições relativas a essa propriedade tanto no âmbito internacional, como nacional, é um passo fundamental para se compreender como a construção e operação da UHE Belo Monte vem afetando as comunidades ribeirinhas locais.

O TRATAMENTO DO DIREITO DE PROPRIEDADE NO CAMPO DO DIREITO INTERNACIONAL

No campo do direito internacional, como se viu ao longo do capítulo de identificação, inexiste menção expressa sobre ribeirinhos. Compreensível, já que se trata de uma, entre as mais diversas categorias de povos tradicionais que são encontrados no Brasil. Além disso, adianta-se que a categoria de “ribeirinho” também se confunde com outras denominações sociais, como pescadores e beiradeiros.

De todo modo, implica ressaltar que a análise a ser realizada aqui vai considerar que comunidades ribeirinhas, constituem ao seu modo, em uma concepção exógena, minorias que desenvolvem práticas tradicionais. Portanto, qualquer consideração sobre minorias aqui feita,

33 Com o início desse tópico apresento uma importante consideração. Apesar de existir uma clara diferença no campo do direito civil na aplicação dos conceitos de posse e propriedade, essa distinção aqui, foi deixada de lado para a livre utilização dos termos “posse, propriedade e domínio”. Acrescento que falar de propriedade e explicar esse conceito aos ribeirinhos já se demonstrava uma tarefa com complicações, incluir ainda sua distinção, com relação ao conceito tradicional de posse geraria, algumas complicações para essa pesquisa. Sendo assim, considerando ainda que a relação tradicional dos ribeirinhos com sua propriedade e meios de subsistência é distinta da relação tradicional de propriedade que a sociedade do “nós” está acostumada a empregar, o uso desse termo aqui, já vinha sendo utilizado de uma maneira sui generis.

34 Mesmo que o conceito apresentado por Henyo Barretto Filho em “Populações tradicionais: introdução à crítica da ecologia política” seja voltado para a definição de comunidades tradicionais inseridas em áreas de proteção ambiental, o mesmo importa para a compreensão das noções de propriedade porque há uma preocupação em incluir “indivíduos, famílias, comunidades e grupos [...] que ocupam, residem ou usam, regular ou recorrentemente, um território específico”, como, pessoas ou grupos sociais que são mutáveis e sofrem influências do tempo, moldando, assim, a sua constituição.

será com a intenção de estender as considerações às comunidades tradicionais dos ribeirinhos, e não, para se reforçar essa condição de minoria, como já se demonstrou previamente.

Convenção 169 da OIT

Analisando a Convenção n. 169 da OIT, constata-se que há uma proteção de direitos coletivos. Prevê no Artigo 7° que:

1. Os povos interessados deverão ter o direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete as suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual, bem como as terras que ocupam ou utilizam de alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o seu próprio desenvolvimento econômico, social e cultural. Além disso, esses povos deverão participar da formulação, aplicação e avaliação dos planos e programas de desenvolvimento nacional e regional suscetíveis de afetá-los diretamente.

Compreende-se que para povos tradicionais propriedade representa conservação e desenvolvimento. Pode parecer até um pouco contraditório, em uma abordagem marcada pelas concepções do desenvolvimento econômico, mas a preservação da propriedade implica em uma série de impactos positivos para comunidades tradicionais, e por isso, o resguardo desse direito colabora com a conservação do modo de vida tradicional, e permite que haja desenvolvimento, seja ele econômico ou cultural.

A Convenção prevê ainda, em sua Parte II, uma seção específica para regular a maneira com a propriedade desses povos é protegida. Destaque para o artigo 13, I, que regula que:

[...] os governos deverão respeitar a importância especial que para as culturas e valores espirituais dos povos interessados possui a sua relação com as terras ou territórios, ou com ambos, segundo os casos, que eles ocupam ou utilizam de alguma maneira e, particularmente, os aspectos coletivos dessa relação.

As determinações da Convenção com relação ao aspecto de propriedade abarcam diversos aspectos como:

a. Reconhecimento do direito de posse e propriedade sobre as terras que ocupam, bem como, o direito de utilizar terras que não são exclusivamente ocupadas por eles, mas que estão diretamente relacionadas a sua subsistência e atividades tradicionais (artigo 14);

c. Proteção aos recursos naturais, direito de consulta e indenização por danos causados em função da exploração de seus recursos naturais (Artigo 15.2);

d. Direito de não ser deslocado das terras que ocupam, sendo que, o translado ou reassentamento somente serão aceitos em casos excepcionais, com o consentimento desses povos, cabendo o retorno a suas terras de origem quando cessar o motivo do deslocamento ou o recebimento de terras adequadas, que estejam na mesma proporção e qualidade se comparadas com as terras que anteriormente ocupavam (Artigo 16).

A Convenção n. 169 da OIT passa a delimitar a questão da proteção para as comunidades tradicionais (tribais e indígenas), estabelecendo padrões de interpretação e direitos humanos fundamentais para estes povos. Nesse contexto, se mantém a necessidade de participação das comunidades tradicionais na elaboração de projetos de desenvolvimento que irão afetar sua sobrevivência cultural. É uma forma de compatibilizar os interesses do desenvolvimento econômico com os interesses tradicionais, cabendo ao governo que proceda com a realização de estudos sobre os impactos que poderão acontecer no meio ambiente ocupado.

Esse direito, contudo, precisava de um resguardo quanto as possibilidades de sua violação. Por isso, a Convenção n. 169 não deixou de prever formas de proteção que se somam com as noções de reparação no caso de danos. Cabe entender que:

Artigo 16

1. Com reserva do disposto nos parágrafos a seguir do presente artigo, os povos interessados não deverão ser trasladados das terras que ocupam. 2. Quando, excepcionalmente, o traslado e o reassentamento desses povos

sejam considerados necessários, só poderão ser efetuados com o consentimento dos mesmos, concedido livremente e com pleno conhecimento de causa. Quando não for possível obter o seu consentimento,

o translado e o reassentamento só poderão ser realizados após a conclusão de procedimentos adequados estabelecidos pela legislação nacional, inclusive enquetes públicas, quando for apropriado, nas quais os povos interessados tenham a possibilidade de estar efetivamente representados.