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IMPOSTO ÚNICO SOBRE TRANSAÇOES –

JOSE VALNEY DE BRITO

Vamos examinar agora mais um ponto polêmico do Imposto Único sobre Transações: a alocação.

Um imposto único, límpido, universal, estável e não-sonegável permitirá deslocar as atenções da arrecadação para o uso.. Tudo será muito mais visível para a sociedade e essa visibilidade e transparência se refletirá em maior eficácia na aplicação dos recursos.

O grande trabalho dos políticos legisladores deverá ser a divisão do bolo tributário único entre os diversos níveis de governo, municipal, estadual, federal e entre os poderes.

A única base razoável para uma correta divisão deverá ser os serviços que cada esfera de governo prestará aos cidadãos. A discussão girará, portanto, em tomo de quais são os encargos e atribuições das entidades públicas e do custo de cada um deles. As comparações entre preços do mesmo serviço em municípios e Estados diferentes deverão levar a uma maior produtividade no serviço público, em benefício do contribuinte.

O conflito entre os diversos setores e níveis de governo depurará e elevará o debate político e acabará redundando em menores impostos e melhores serviços públicos para a sociedade.

O presente momento é adequado para a implantação do IUT. O plano de estabilização do governo Collor provocou um grande superávit fiscal. Há interesse e já se fala em reforma tributária. Ainda há tempo para as alterações constitucionais necessárias, o exercício pode ser mudado, há eleições legislativas em outubro e uma implantação bem sucedida do IUT pode, talvez, mudar o destino dos 80% de congressistas que, estima-se, perderão seus mandatos.

Argumenta-se também que o IUT não teria efeito coercitivo, especialmente para forçar a utilização econômica de terrenos urbanos e rurais ociosos. Mesmo sem o IUT, é questionável o efeito de qualquer tributação progressiva com esse objetivo específico. Em muitos casos o imposto punitivo provoca reações diferentes. O proprietário, se controlar os meios para tal, paga o imposto e eleva preços para preservar sua renda corrente, como já vimos anteriormente, ou realiza projetos que o mercado não quer.

Esse problema merece soluções mais inovadoras. A partir do princípio da função social da propriedade, inserido na Constituição, e da eficácia econômica que o mercado deve. procurar para os recursos disponíveis, pode-se admitir uma espécie de "desapropriação privada". O proprietário de qualquer bem ocioso seria compelido, após avaliação judicial, a vendê-lo, por valor de mercado, a quem disponha de recursos e de um projeto adequado.

Outro ponto para o qual não se tem dado a devida importância é que o ritual de pagar impostos neste país contribui para diminuir a qualidade de vida e aumentar a infelicidade dos cidadãos. A muitos afeta a tensão dos prazos, a burocracia excessiva, a pressão e o medo do erro e da fiscalização. Outros se ressentem da falta de dinheiro ou dirão que poderiam gastar melhor, ou ainda, se sentem mal por dar dinheiro para manter mordomias e

maus serviços. Cada um tem o seu motivo próprio para se sentir infeliz com os impostos. O IUT, pelas suas características homeopáticas, pode contribuir para aliviar o stress social.

Quero chamar a atenção para alguns pontos importantes abordados pelo prof. Marcos Cintra.

O sistema tributário brasileiro é complexo, tem tributos em excesso (mais de 50, segundo levantamento do jurista Ives Gandra) e fazê-lo funcionar é muito oneroso para a sociedade.

Acrescento também que é criminoso, pois induz ao erro. Não creio que haja uma única pessoa jurídica ou física que não seja infratora de alguma lei tributária. Conhecer e cumprir todas as leis, normas, instruções, portarias, pareceres normativos, resoluções, decretos etc. é uma simples impossibilidade física. É também criminoso ao estimular o crime, ao tornar a sonegação fácil e tentadora pela dimensão dos ganhos e gerar a corrupção. E pode também ser um dos responsáveis pelas graves distorções na distribuição de renda, pela sua incidência irregular.

Outro ponto muito importante é o custo de administração do sistema tributário avaliado em torno de 4% do PIB. Esta estimativa deve ser otimista e provavelmente não leva em conta a multiplicidade de custos indiretos como o tempo despendido dos congressistas, deputados estaduais, vereadores e todos gastos de suporte e voltados para a discussão e manutenção das leis tributárias. A sociedade gasta também com a grande quantidade de assessorias jurídico-tributárias, com tudo que se escreve e se imprime sobre impostos. Com o Poder Judiciário que julga todas as milhares de causas geradas por leis complexas e freqüentemente inconstitucionais.

Há uma imensa quantidade de boa inteligência gasta discutindo, analisando, escrevendo, pesquisando impostos, suas doutrinas, teorias e conceitos, sem que se consiga determinar seu efetivo proveito para a sociedade.

Essa inteligência, liberada, seria capaz de criar muitas coisas novas, úteis e boas para a comunidade. Também teriam aplicação mais nobre os 4 % ou mais de bom esforço social que se gasta apenas para arrecadar impostos. As empresas poderiam ser mais eficientes e produtivas se não precisassem dedicar tanta atenção a assuntos tributários e os produtos poderiam ser mais baratos se o custo de pagar impostos não fosse tão elevado.

Ha estimativas do PIB brasileiro em até US$ 570 bilhões e 4% equivalem a US$ 22,8 bilhões, que poderiam ter melhor função social na solução de qualquer dos muitos problemas que afligem a nossa sociedade.

O sistema tributário atual não atinge nenhum dos objetivos que se propõe. É um sistema ruim e a proposta do IUT já começa com o grande mérito de poder substituir algo comprovadamente ineficaz.

Há poucas probabilidades de se criar algo pior. Daí não serem necessárias etapas experimentais ou de transição. Quanto mais rápida a implantação do IUT, mais cedo começaremos a usufruir os benefícios e nos livramos da carga que carregamos hoje.

Folha, 03/07/90