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3 AS PRINCIPAIS VULNERABILIDADES DA SEGURANÇA MARÍTIMA NO

3.2 O impotente Poder Naval dos principais países do Golfo da Guiné

Se “poucas regiões do mundo tiveram mais melhorias em suas instituições de segurança marítima nos últimos cinco anos do que o GG”, mas, ao mesmo tempo, as ameaças à segurança marítima na África Ocidental “continuaram evoluindo e são cada vez mais difíceis de abordar”, torna-se necessário identificar as razões e propor soluções de modo a maximizar a eficiência e a eficácia dessa arquitetura no enfrentamento dessas ameaças (RALBY, I.; SOUD; RALBY, R., 2019).

Verifica-se, claramente, que existe um elemento comum a todos os Estados

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54 Cf. 2.3 e 2.4.

costeiros, para o qual converge a execução das ações de qualquer uma das iniciativas: os meios navais, aeronavais e de fuzileiros navais de suas Marinhas ou Guardas Costeiras. Para que cada Estado proteja suas respectivas zonas marítimas, deve possuir um Poder Naval aderente à magnitude das tarefas e dos desafios da segurança marítima na região (RALBY, I.; SOUD; RALBY, R., 2019; TILL, 2018).

Segundo Till (2018, p. 45-55), as Marinhas dos Estados classificam-se em três tipos, de acordo com o desenvolvimento econômico do país e suas relações com os efeitos da globalização: pré-modernas, modernas e pós-modernas. Essa classificação encontra-se detalhada no Apêndice D.

No contexto do GG, para que a BOM seja assegurada, necessita-se de PN regionais críveis e compatíveis com a zona marítima da arquitetura de Yaoundé a ser patrulhada e com as ameaças a serem enfrentadas. Entretanto, ao pesquisar os meios navais e os recursos humanos das principais Marinhas do GG, detalhados no Apêndice D56, e confrontá-los com a dimensão das respectivas zonas marítimas a serem protegidas (Figura 29), identifica-se a dificuldade operacional desses meios navais para garantirem a BOM na região e que reside nesta fraqueza a razão central do crescimento e da heterogeneidade das ameaças no GG (TILL, 2018).

Essa fragilidade é evidenciada não apenas pela quantidade e qualidade do inventário de meios navais dos Estados costeiros, analisados no Apêndice D, mas também ratificada em declarações públicas. Em outubro de 2019, durante a Conferência Global de Segurança Marítima, realizada na Nigéria, foi constatado que os países costeiros estão insuficientemente preparados e capacitados para “prevenir e combater efetivamente os ataques realizados por piratas, dentro e além de suas águas costeiras”, proporcionando que todos os tipos de tráfico no GG continuem a semear em “terreno fértil para o crime organizado transnacional, que opera em toda a região e com efeitos devastadores sobre as pessoas” (UNODC, 2019).

O embaixador português em Missão Especial para a Segurança Marítima, em seu artigo “Desafios de Segurança no GG”, frisou que a garantia da segurança marítima planejada na arquitetura de Yaoundé “requer meios que os estados da região, pelo menos alguns deles, não podem suportar” (MARQUES, 2018, p. 99).

Charles Ukeje, da Obafemi Awolowo University, na Nigéria, comenta sobre a estrutura de segurança marítima de Yaoundé:

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Mesmo a maior Marinha da região, a Marinha da Nigéria, enfrenta o problema de déficits agudos de recursos, especialmente em termos de treinamento, equipamentos, instalações e custos operacionais [...]. Há necessidade de incluir a construção de plataformas marítimas, aquisição de equipamentos, fornecimento de sistemas de detecção e vigilância, manutenção da frota (UKEJE, 2015).

O almirante Osinowo expôs a necessidade de que “sejam levadas ao nível político” as dificuldades operacionais para se implementar a segurança marítima no GG. Essa operacionalização dependerá do estabelecimento de uma robusta capacidade de vigilância, resposta e execução. No que se refere à vigilância, houve melhora nos radares de vigilância costeira, com o imprescindível apoio de parceiros como os EUA e a UE. Quanto à resposta e à execução, as Marinhas dos Países do GG ainda têm limitada capacidade de patrulha marítima (Apêndice D). A despeito do incremento no inventário de seus meios navais, ainda não há embarcações suficientes e adequadas às tarefas de patrulhamento, para garantir a segurança marítima em toda costa57. Além disso, a diversidade de fornecedores e equipamentos apresenta desafios adicionais de logística, manutenção e interoperabilidade dos meios navais, a maioria com mais de 25 anos de uso (OSINOWO, 2015; TILL, 2018).

Corroborando com essa narrativa, o relatório da Stable Seas sobre o GG, de março de 2020, informa que a capacidade dos PN regionais carecem de melhor estrutura para cumprir seus mandatos e enfrentar a multiplicidade de ameaças à segurança marítima (OKAFOR-YARWOOD et al., 2020).

Essas declarações combinadas à constituição dos PN da região, detalhada no Apêndice D, evidenciam a fragilidade atual das Marinhas e Guardas Costeiras do GG e permitem classificá-las, segundo os fundamentos de Geoffrey Till, como Marinhas Pré-Modernas, que mais “lutam para sobreviver e simbolizam seu país” do que tenham, efetivamente, capacidade de prover a segurança marítima contra as ameaças (TILL, 2018, p. 42).

Assim, verifica-se que, mesmo com parcela da estrutura de segurança marítima de Yaoundé implantada, os atuais PN dos países da região, ainda que reunidos, dificilmente poderão garantir um controle eficaz sobre suas AJ, com evidentes reflexos negativos à BOM, ao fluxo do comércio marítimo internacional e aos valores humanitários presentes na agenda da ONU. É essencial sublinhar que a

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eficácia da segurança marítima no GG converge obrigatoriamente para o emprego de meios navais adequados, de que os Estados costeiros não dispõem (TILL, 2018).

Por fim, pautado nos requisitos básicos elencados por Geoffrey Till, ao analisar o contexto marítimo do GG e as instituições governamentais de segurança, particularmente suas Marinhas, ressalta-se que, para promover a BOM na região será indispensável posicionar um PN crível na região, mesmo que seja necessário o reforço de meios navais de Marinhas exógenas, mais desenvolvidas, pois as locais necessitarão de longo tempo e aporte financeiro para adquirir novos meios e capacitar recursos humanos. Soma-se, ainda, a necessidade do guarnecimento pleno de toda a estrutura de segurança marítima de Yaoundé, incluindo seus centros de comando e controle, de modo a garantir, segundo Geoffrey Till, uma governança marítima integrada e sinérgica com as demais agências que tratem de assuntos ligados ao mar (TAULOIS, 2013; TILL, 2018).