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Início da profissão e desenvolvimento da prática docente

Diante da pergunta: quando você começou a lecionar, o que foi mais importante para o desenvolvimento de sua prática docente?, os professores responderam como alternativa mais significativa para o próprio exercício profissional “a leitura dos livros didáticos”. Do universo

total de pesquisados, 20% (quase sempre) e 50% (sempre) responderam que este foi/é o recurso mais importante para sua prática pedagógica, como mostra o gráfico R3a.

Gráfico R3a - Leitura dos livros didáticos

R3a 5% 5% 20% 20% 50% Nunca Raramente Às vezes sim/não Quase sempre Sempre

Os livros didáticos são produzidos com o intuito de orientar os professores nas suas atividades docentes. Muitas vezes, são utilizados como os únicos textos base, mas também como um recurso pedagógico, como respondeu um professor. Os professores que os utilizam como único texto base correm o risco de se tornarem dependentes deles. Aqueles que os utilizam apenas enquanto recursos pedagógicos podem usufruir uma maior autonomia em relação aos conteúdos trabalhados em sala de aula.

Sabe-se que, no Brasil, o livro didático teve uma grande difusão a partir da década de 1980. A novidade aos poucos foi-se revelando uma preocupação. Autores advindos de outras áreas do conhecimento tornaram-se especialistas em escrever sobre Filosofia. Mas, aos poucos, profissionais da própria Filosofia compreenderam a importância do recurso e passaram eles próprios a produzir os textos a serem utilizados na área. Além destes, diversos textos passaram a ser traduzidos e publicados no país.94

94 Para ilustrar, cito apenas dois compêndios muito utilizados nas aulas de Filosofia durante as décadas de 1970 e

Acreditamos que os livros didáticos devem ser utilizados apenas como recursos pedagógicos. O uso de linguagens acessíveis à compreensão dos alunos pode ser capaz de ajudá-los no exercício da reflexão. Estes, porém, devem ser conjugados com textos clássicos dos filósofos. Entretanto, transformar os conteúdos científicos, filosóficos, em uma prática docente no âmbito do universo dos alunos de ensino médio, especificamente, não é uma das tarefas mais fáceis, pela natureza específica da Filosofia e em decorrência da maturidade dos alunos. Por isso mesmo, muitos professores fazem do livro didático o agente intermediário do conhecimento, às vezes em decorrência do reduzido tempo disponível para preparar as suas aulas. Tem-se a impressão de que na luta contra o tempo, que geralmente está ligada com a sobrecarga de trabalho, emerge como fenômeno mais forte a necessidade de que os professores recorram ao livro didático para poder dar conta do fazer pedagógico.

Além disso, muitas vezes, soa negativamente o impacto que um professor pode encontrar diante de um texto filosófico se não estiver devidamente preparado teórica e metodologicamente. A improvisação,95 embora soe interessante para algumas situações, remete a um risco. Contudo, no processo de elaboração teórica, é necessário um árduo e profícuo trabalho de mediação do conhecimento que, igualmente, é fruto do texto e do contexto. E isto evidencia o importante papel que corresponde ao planejamento do ensino.

Quando perguntados sobre a contribuição das conversas “com os professores que lecionam na escola” para o início da prática docente, as respostas dos pesquisados indicam que apenas 5% (quase sempre) e 30% (sempre) deles avaliam como importantes para o início da profissão, como se observa no gráfico R3b, embora se saiba que no início de carreira os professores dialogam mais entre si e, com o passar dos anos, há uma tendência ao isolamento

Vol I e II. Tradução de Lélia de Almeida Gonzalez. Rio de Janeiro/São Paulo: Livraria Freitas Bastos, 1968. 2) HUISMAN, Denis & VERGEZ, André. História dos Filósofos ilustrada pelos textos. Tradução de Lélia de

Almeida Gonzalez. Rio de Janeiro/São Paulo: Livraria Freitas Bastos, 1976.

95 A respeito da improvisação no ensino, ver, CANEVACCI, Massimo. Antropologia, ensino e cultura.

profissional.96 Ora, se os professores não conversam entre si, significa que, em geral, praticamente inexistem as atividades de planejamento e reuniões pedagógicas nas escolas para avaliar situações e traçar objetivos para as atividades de ensino. Pode ocorrer que, em geral, o professor vá até a escola, ministre sua aula e saia de cena, como se a escola e os alunos tivessem vida própria.

Gráfico R3b - Conversar com os professores que lecionam na escola

R3b 20% 10% 35% 5% 30% Nunca Raramente Às vezes sim/não Quase sempre Sempre

Quando perguntados sobre a contribuição dos “conteúdos e métodos aprendidos na universidade”, apenas 20% (quase sempre) e 20% (sempre) dos professores apontam como importantes esses requisitos para o desenvolvimento da prática docente, como mostra o gráfico R3c. Porém, a situação preocupante desse caso são os índices de 10% (nunca) e 15% (raramente) e 35% (às vezes sim/não) daqueles que não tiveram nenhum tipo de contribuição dos conteúdos aprendidos na universidade para as práticas pedagógicas na escola.

96 Não é nosso objetivo aprofundar aqui o conceito de isolamento profissional. Todavia, Pérez Gómez (2001)

aponta que o isolamento do docente, vinculado ao sentido patrimonialista de sua sala de aula e seu trabalho, pode ser considerado uma das características mais difundidas e perniciosas da cultura escolar. Além disso, o autor distingue três classes de isolamento: a) o isolamento como estado psicológico; b) o isolamento ecológico etc.) o isolamento adaptativo.

Gráfico R3c - Conteúdos e métodos aprendidos na universidade R3c 10% 15% 35% 20% 20% Nunca Raramente Às vezes sim/não Quase sempre Sempre

Os fatores que menos contribuíram no início da prática docente, de acordo com os dados da pesquisa, são “as orientações dadas pelo diretor ou equipe pedagógica da escola”, com um total registrado de 40% (nunca) e 15% (raramente), como mostra o gráfico R3d.

Gráfico R3d - Orientações dadas pelo diretor ou equipe pedagógica da escola

R3d 40% 15% 25% 5% 15% NuncaRaramente Às vezes sim/não Quase sempre Sempre

“As apostilas ou livros indicados na universidade” exerceram pouca importância no início da prática docente, como mostram os percentuais de 25% para (nunca) e 25% (raramente) expostos no gráfico R3e.

Gráfico R3e - Apostilas ou livros indicados na universidade R3e 25% 15% 35% 10% 15% Nunca Raramente Às vezes sim/não Quase sempre Sempre

Assim, 30% (nunca) e 25% (raramente) dos professores afirmaram que “as orientações curriculares da Secretaria de Educação”, contribuíram para esse processo, como se vê no gráfico R3f.

Gráfico R3f - As orientações curriculares da Secretaria de Educação

R3f 30% 25% 15% 10% 20% Nunca Raramente Às vezes sim/não Quase sempre Sempre

Por último, 35% (nunca) e 30% (raramente) dos professores indicam que “o plano de aula recebido no início da atividade docente” foi significativo como ilustra o gráfico R3g. Isto demonstra que os professores em geral desempenham suas ações de forma autônoma, sem muita articulação com as metas e planejamentos da escola, quando esta os possui.

Gráfico R3g - Planejamento entregue no início da atividade docente R3g 35% 30% 10% 5% 20% Nunca Raramente Às vezes sim/não Quase sempre Sempre

Estes dados são reveladores de situações problemáticas: 1) a direção e equipes de especialistas das escolas não têm orientado devidamente os professores quando estes começam a trabalhar. A ausência de um planejamento discutido e elaborado no início da atividade docente também contribui para o distanciamento das atividades entre as equipes pedagógicas e a prática docente. Resta saber se, ao longo do trabalho, acontece algum tipo de integração com os professores, ou se as barreiras de comunicação permanecem intransponíveis ao longo da carreira profissional; 2) Além disso, o gráfico R3f indica que, ao iniciar as atividades no magistério, o professor não recebe apoio didático da Secretaria Estadual de Educação, assim como orientações sobre a proposta curricular em vigor nas escolas; 3) Além disso, os materiais didáticos utilizados e indicados nas universidades pouco contribuem para o trabalho em sala de aula, conforme as respostas dos professores. Por isso, a procura por livros didáticos parece ser um fator determinante, quase natural e inevitável.