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CAPÍTULO 4 – MAPA DE SENTIDOS

4.2 Gesto de leitura

4.2.3 FD3 – INDÍGENAS SOFREM VIOLÊNCIA E SÃO VIOLENTOS

4.2.3.2 PS8 – Indígenas são violentos

Como tratamos no primeiro capítulo desta tese, o índio foi sendo discursivizado na literatura, filmes e livros como preguiçoso, indolente e violento. Uma comprovação desta memória sobre como os brasileiros não-índios percebem e concebem os povos indígenas foi demonstrada na pesquisa realizada pelo IBOPE, a pedido do Instituto Socioambiental (ISA) em 2000, por ocasião das comemorações dos 500 anos do “Descobrimento do Brasil” e publicada por Povos Indígenas no Brasil (ISA, 2000). Nela 89% afirmaram que os índios só são violentos com aqueles que invadem as suas terras para tomar-lhes.

Tal rede de paráfrases trabalha o índio como violento contra os “brancos” e autor de desordem, como na SD322. Retomamos aqui uma das diversas memórias discursivas sobre o indígena, o índio violento. Os jornais evidenciam um índio que é capaz de matar por motivos fúteis, conforme evidenciado na SD326, onde até a forma da violência e o entendimento da mesma apresenta o índio como primitivo (SD321).

Outro elemento que notamos nesta posição-sujeito no jornal A Tribuna, diz respeito a enfatizar a crueldade indígena, conforme demonstrado na (SD326) “Como revide, F.B.S pegou uma faca e feriu a rival no abdome”, assim como na (SD327)

“Matou com uma facada a jovem Luana Carvalho de Souza (26)”. Nesta última

sequência discursiva, a contraposição elaborada no discurso identificando a idade da indígena (46 anos) – portanto uma adulta – a qual tira a vida de uma jovem, uma pessoa que ainda não alcançou seu pleno desenvolvimento e poderia ter longa vida, potencializa o sentido de impiedade da indígena sem contextualizar as causas que levaram o conflito.

A discursivização do jornal A Gazeta também valida o interdiscurso “índio violento” na (SD323), “Os Xavantes chutaram o carro dele e deram pauladas na lataria”. Além de causar conflito, imputa o índio ao crime de impedir o direito de ir e

vir das pessoas, garantidos pela Constituição não identificando no texto a causa do conflito.

Na (SD238) o jornal A Gazeta destaca a manifestação de interdição de trechos da BR-070 e dá ênfase à suposta ilegalidade do ato quando utiliza o termo “até mesmo”. Também demonstra má intenção e a disposição dos indígenas ao conflito

quando destaca na (SD238) e, na (SD239), que eles possuíam armas “munidos de arco e flecha e outras armas artesanais”. No caso da (SD258) o advérbio de

adversidade “apesar de” chama a atenção para o fato dos indígenas estarem

armados. A tentativa de incriminar os indígenas e substanciar o caráter da violência

ocorre também na (SD239) “A PF orientou os motoristas a usarem o recibo para

registrarem um boletim de ocorrência por extorsão”, (AGC, 20.15-3B/I). A palavra

extorquir tem como significado “ato de obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, por meio de ameaça ou violência, com a intenção de obter vantagem, recompensa, lucro”, (FERREIRA, 2010, p.224. grifo nosso).

Nesta posição-sujeito, o bloqueio de estradas por indígenas emerge fortemente nos discursos do jornal A Gazeta de Cuiabá, tanto que na semana do Dia do Índio de 2015, 2016 e 2017 o assunto era o tema destaque na cobertura sobre os povos indígenas durante todo o período, evidentemente com foco no ato ilegal do bloqueio, da cobrança de valores, e também, pelo uso da violência. As demais SD abaixo ratificam os sentidos explicitados anteriormente.

(SD254) Durante toda segunda-feira os índios cobravam o pedágio, e o motorista que se negasse a pagar o valor exigido tinha que retornar. De acordo com a PRF, os que tentaram furar o bloqueio, chagaram a ser cercados pelos Nambikwaras de maneira intimidadora. (AGC, 21,22.15-4B/I)

(SD259) Cada trecho teria pelo menos 15 índios bloqueando a passagem. Apesar de estarem armados com arco e flecha, a PFR informou que não houve tensão. (AGC, 19.16-1B/I)

(SD319) Quanto ao motorista agredido, o caso será levado ao

Ministério Público Federal (MPF) e à Polícia Federal (PF) que têm prerrogativa para tratar de casos envolvendo indígenas. “Ele chegou muito assustado ao posto da PRF mas não se feriu”, comenta o

delegado. (AGC, 18.17-3B/I)

(SD322) O caso remete ao episódio em Juína em dezembro de 2015, quando dois amigos furaram o bloqueio de indígenas da etnia Enawenê-nawê eacabaram sendo mortos. (AGC, 18.17-3B/I)

(SD326) Na manhã de segunda-feira (17), moradores do bairro São Felipe viram quando o índio cavava um buraco no fundo do quintal de sua casa, onde existe um córrego, e enterrava alguma coisa. (ATA,

19.17-7/I)

(SD323) Os Xavantes chutaram o carro dele e deram pauladas na lataria, de acordo com o chefe da 5ª da Delegacia da PRF, Thiago

Machado. (AGC, 18.17-3B/I)

(SD324) Indígenas, da etnia Xavante, fizeram pedágio nesta segunda- feira (17), em mais de um momento do dia, na BR-070, próximo à Primavera do Leste (231 km ao sul de Cuiabá), para marcar a semana do índio. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) registrou pelo menos um conflito. (AGC, 18.17-3B/I)

(SD325) Um índio se apresentou como autor do delito, afirmando

que o feto de produto de um aborto espontâneo de sua esposa. Na minha aldeia esse tipo de procedimento é normal. Não sabia se era crime, justificou o indígena. (ATA, 19.17-7/I)

(SD327) Em Sena Madureira, o Corpo de Bombeiros atendeu a uma estranha ocorrência na tarde de segunda-feira, quando removeu de uma cova rasa na margem de um córrego no fundo do quintal de uma

residência do bairro São Felipe, o feto advindo de um aborto espontâneo. Um índio se apresentou como pai do bebê em formação,

e disse ser o responsável pelo sepultamento feito de forma ilegal.

(ATA, 19.17-7/I)

(SD328) Como revide, F.B.S pegou uma faca e feriu a rival no abdome. Levada para a emergência do hospital da cidade, ela morreu

quando recebia assistência. A assassina fugiu para a aldeia Camacauã, onde acabou presa horas depois. (ATA, 19.17-7/I)

(SD329) A polícia de Boca do Acre conseguiu prender na noite desta segunda-feira (17), na Aldeia Camacauã, no Rio Purus, a indígena F.S (46), que, no domingo, quando de uma festa dançante na sede do município, matou com uma facada a jovem Luana Carvalho de Souza (26). (ATA, 19.17-7/I)

(SD351) Quem não lembra do massacre ocorrido em abril de 2004 na reserva indígena Roosevelt, em Espião do Oeste, resultando na morte de 29 garimpeiros? Na época, a matança colocou à tona a verdadeira falta de políticas públicas voltadas aos interesses dos índios Cinta- Larga em Rondônia. (DDA, 20.17-A2/I)