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3. EDUCAÇÃO SEXUAL EM UMA PERSPECTIVA EMANCIPATÓRIA

3.3 Individualidade e sexualidade

Reificação e fetichização têm sido fenômenos resultantes do processo de avanço do neoliberalismo, quando analisados sob um olhar crítico se constata que a fetichização faz com que um objeto, por exemplo, no caso da sexualidade que são os objetos sexuais, tornem-se pauta central e objetivo definido para o processo de construção dessa dimensão humana, levando os sujeitos a se tornarem os objetos sexuais, os quais buscam consumir outros objetos, sem a pretensão de se realizarem enquanto sujeitos, criando um círculo cultural vicioso.

É através do desejo, da libido sexual que o capitalismo impera sobre os seres humanos: o discurso sobre liberdade sexual trouxe à tona uma série de comportamentos, fazendo os sujeitos entenderem liberdade como sinônimo do consumo exagerado, consumo dos corpos, de pornografia e de instrumentos que levam ao orgasmo, já que esse é o objetivo central da sexualidade sob uma ótica neoliberalista.

Quando se debate sexualidade numa perspectiva emancipatória é necessário trazer ao discurso, como a negação da sexualidade, enquanto ponto central na construção da subjetividade do sujeito influi diretamente sobre como se entende corporeidade e, portanto, como se orientará as relações a nível subjetivo e individual, o que também envolve o coletivo (JÚNIOR, 2011).

Faz parte do processo materialista histórico-dialético, no qual se baseia a proposta educacional aqui colocada em discussão, analisar de forma comprometida levando em consideração como os discursos sobre sexualidade foram construídos, permitindo, assim, críticas e possibilidades de libertação dos sujeitos, abrindo caminhos para a autoconsciência e emancipação.

Júnior (2011) trabalha de forma concisa a relação entre sexualidade e Lukács, apontando que o reconhecimento social e histórico, enquanto sujeito nos afasta do mutismo imposto pelo sistema, decorrendo numa superação desse mutismo sobre a

sexualidade, essa “dimensão muda” como colocada pelo autor, está num nível orgânico, próximo da dimensão não muda: o ser social.

O olhar estritamente biológico do ser humano implica em separar a materialidade da espiritualidade, ou seja, o psicanalista Freud concebe que a vida espiritual determina a vida biológica dos sujeitos. Enquanto para Lukács, as ações do sujeito se baseiam no âmbito orgânico do ser, ou seja, na materialidade há possibilidades de compreender de forma ontológica a questão da corporeidade. No entanto não pode haver a ilusão, segundo Júnior (2011) que isso ocorre de forma exagerada, através de uma transposição simplista, como é feito no positivismo, através do darwinismo social.

Entender o ser humano em sua totalização, enquanto ser inconcluso faz parte da construção da ESE, aliada a contribuição de Lukács (2010) que propõe uma visão dialética da corporeidade, podemos enxergar a sexualidade como algo natural, no sentido de compor a dimensão humana, que se constrói de forma concreta com o avanço da humanidade.

O homem nunca é, de um lado, essência humana, social, e de outro, pertencente à natureza; sua humanização, sua sociabilização não significa uma clivagem de seu ser em espírito (alma) e corpo” (LUKÁCS, 2010, p. 42).

Tornar-se sujeito envolve todos os planos existenciais dos seres humanos, o que significa que para tanto, os indivíduos devem compreender a si mesmos e aos outros perante a dimensão sexual, para que relações objetivas e sociais sejam definidas, para tanto essa visão deve estar atrelada ao processo pedagógico da Educação Sexual que se pretende emancipatória (JÚNIOR, 2011).

Demartini e Silva (2016) também propõem possibilidades de encontro entre as propostas de Marcuse para com uma construção de Educação Sexual Emancipatória, isso porque, assim como Freire, há a preocupação para o autor no processo de humanização dos sujeitos, entendendo que a educação - por meio de pedagogias libertadoras que rompam com o status quo - é a melhor maneira e mais efetiva para a construção de uma sociedade onde isso possa ser uma realidade concreta.

[...] promovendo os sujeitos como protagonistas das transformações socioculturais - não podemos nos ancorar nos pressupostos alienadores da pedagogia dominante. Somente com uma pedagogia crítica para a Educação Sexual poderemos superar concepções restritas e produtoras da desumanização (DEMARTINI; SILVA, 2016, p. 63).

Pode-se constatar que a educação não dá conta de tratar sobre a temática de sexualidade de forma comprometida e ética devido ao fato de não haver preparação adequada dos educadores que têm que lidar com esse assunto. O processo de formação docente deve assim, ser uma preocupação dentro dessa discussão, para que esses profissionais ao terem contato com a necessidade de discutir sobre a sexualidade estejam preparados a fazê-lo com propriedade, numa dimensão histórica, filosófica, biológica e psicológica. As palestras, cartilhas e rodas de conversa que costumam ocorrer no ambiente escolar não são proposições que levam a superação do pensamento reducionista sobre a sexualidade, aspectos biologizantes sobre o tema favorecendo preconceitos são reproduzidos por esses materiais didáticos, bem como pelos livros (GAGLIOTTO; LEMBECK, 2011).

Promover projetos interdisciplinares de caráter crítico transformador, baseados em teorias que pensem sobre como a educação libertadora pode levar os educandos a construírem conhecimentos e proposições concretas, agindo sobre a sua própria realidade podem ser alternativas que para além de sensibilizar os educandos façam com que tomem consciência dessa realidade. O silêncio, vergonha e negação do diálogo dentro dos espaços escolares quando esse tema está em pauta é um indicador de que a prática educativa tradicional não cumpre o papel de uma educação verdadeiramente humanizadora (GAGLIOTTO; LEMBECK, 2011).

Nesse sentido a ESE não deve ter como objetivo orientar ou definir a vida sexual dos educandos, mas sim como aponta Júnior (2011), construir através de processos educativos conhecimentos que levem os educandos a fazerem escolhas pessoais, conscientes e desfetichizadas sobre seus corpos e os corpos dos outros sujeitos.

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