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Influência dos media

No documento (In)segurança urbana, infância e risco (páginas 73-76)

Capítulo IV – Orientações Metodológicas da Investigação

5.3. Influência dos media

Segundo Leal (2010, p. 404), “o sentimento de insegurança não resulta só das experiências de vitimação ou da probabilidade de se poder vir a ser vitimado por um ato delinquente, mas também da dinâmica informativa e mediática transmitida ao vivo e em direto pelos media”. Partindo deste pressuposto, procurou-se indagar a influência que os meios de comunicação podem exercer ao nível das dinâmicas parentais mediante a colocação da questão “Na vossa opinião, de que forma as notícias veiculadas pelos órgãos

de comunicação social, designadamente as de desaparecimentos de crianças ou de abuso sexual de menores, podem causar impacto no âmbito das dinâmicas parentais?”. Apesar de se terem registado diversas opiniões relativamente ao tema, a natureza influenciadora dos media ao nível das práticas parentais esteve presente no discurso de todos os participantes envolvidos na investigação, sendo possível reconhecer, no entanto, duas variantes, designadamente, a influência positiva e a influência negativa, as quais foram constituídas categorias de análise (Quadro 7).

Quadro 7 – Influência dos media

P O SI T IV A

Alertam FG1/P4- Eu acho que os media nos alertam mais…

FG2/P6- Eu acho que nos levam a ficar mais alerta. (…) “Isto pode-me

acontecer a mim” é algo que nos passa pla cabeça… Estimulam a

adoção de comportamentos protetores

FG1/P5- Sem dúvida que esse tipo de notícias causam medo e nos levam a ser mais protetores.

FG2/P4- A gente ouve as notícias e fica… Às vezes, e eu sei por mim… (…)

Às vezes já não levo tanto pela mão, ou eu vou aqui a ver as montras e ela vai mais à frente… Depois, às vezes assusto-me quando não a vejo porque ela já está dois ou três metros mais à frente… É aquele espaço de dois metros e pode acontecer… N E G A T IV A Disseminam o medo

FG1/P1- Nós agora ligamos a televisão e é só notícias de assassinatos, de não sei quem que matou não sei quem, de raptos… Não falam de outra coisa... Parece que fazem de propósito para terem notícia…

FG2/P4- De vez em quando empolam e a gente fica… Eu lembro-me…

Quando isso aconteceu [caso Maddie]… Eu havia noites que... [riso nervoso] que nem conseguia dormir… Então… Fiquei em pânico mesmo porque… Não conseguia… Então… [suspiro] Nem é bom pensar…

Relativamente à influência positiva que os meios de comunicação podem deter no âmbito das dinâmicas parentais, foi possível apurar, através de relatos tais como “Há notícias que dão para pensar duas vezes… Ou que até dão para pensar muitas…(FG1/P1), “Eu acho que os media nos alertam mais…” (FG1/P4), “Depois também se ouve tanta coisa nas notícias… (…) A gente fica sempre com o pé atrás.” (FG2/P3) ou “Eu acho que nos levam a ficar mais alerta. (…) «Isto pode-me acontecer a mim» é algo que nos passa pla cabeça…” (FG2/P6), que os media são um importante meio de alerta para os pais, levando-os a adotar uma postura preventiva através de comportamentos protetores em relação ao filhos.

Seguindo esta linha de pensamento, constatou-se também que os media, da mesma forma que alertam, causam um forte impacto no âmbito das posturas parentais pelo estímulo que exercem ao nível da adoção de comportamentos mais protetores: “Sem dúvida que esse tipo de notícias causam medo e nos levam a ser mais protetores.” (FG1/P5);

“Hoje, a ler uma notícia por causa da Maddie… (…) Eu, agora, para todos os sítios onde for… Não me digam que é seguro… hotel ou o que seja… Não vou desgrudar da minha filha. Não vou confiar em empregada nenhuma. (…) Nunca mais!” (FG2/P4); “A gente ouve as notícias e fica… Às vezes, e eu sei por mim… (…) Às vezes já não levo tanto pela mão, ou eu vou aqui a ver as montras e ela vai mais à frente… Depois, às vezes assusto-me quando não a vejo porque ela já está dois ou três metros mais à frente… É aquele espaço de dois metros e pode acontecer…” (FG2/P4).

Apesar de se considerar que existe um risco na vida sem riscos (designadamente, quando a superproteção parental interfere na autonomia da criança) e, portanto, um limite entre a preocupação parental aceitável e a excessiva (que pode fazer mais mal do que bem a uma criança), o impacto dos media que se materializa na estimulação da proteção parental é aqui classificado positivamente por se entender que a idade dos filhos dos inquiridos assim o justifica. No fundo, são ainda crianças pequenas, o que de certa forma legitima a ideia de que “a proteção nunca é demais”.

Subjacente aos relatos supracitados está o medo difundido pelos media, o qual pode ser perspetivado enquanto influência negativa. De um modo geral, foi possível constatar que as notícias veiculadas pelos órgãos de comunicação social muitas vezes também assustam, constituindo nesse sentido um possível elemento adverso no âmbito das dinâmicas parentais (“Nós agora ligamos a televisão e é só notícias de assassinatos, de não sei quem que matou não sei quem, de raptos… Não falam de outra coisa... Parece que fazem de propósito para terem notícia…”, FG1/P1; “Na semana passada eu li que só em Portugal estão a desaparecer muitas crianças… Isso não é normal. (…) É horrível…”, FG2/P4; “De vez em quando empolam e a gente fica… Eu lembro-me… Quando isso aconteceu [caso Maddie]… Eu havia noites que... [riso nervoso] que nem conseguia

dormir… Então… Fiquei em pânico mesmo porque… Não conseguia… Então… [suspiro]

Nem é bom pensar…”, FG2/P4).

Em suma, é inegável a influência que os media exercem sobre a forma como os indivíduos constroem as representações acerca da (in)segurança e, naturalmente, sobre o modo como direcionam o seu quotidiano enquanto pais. No entanto, recorrendo aos estudos de McCombs (2001, citado em Leal, 2010), importa salientar que embora as pessoas estejam sujeitas aos efeitos condicionantes dos media, estes apenas constituem mais um dos muitos elementos que influenciam as suas experiências e perspetivas (nomeadamente sobre a (in)segurança) e, portanto, apenas mais um dos fatores envolvidos no processo orientativo das suas condutas.

No documento (In)segurança urbana, infância e risco (páginas 73-76)