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Na! contemporaneidade,! não! há,! de! forma! alguma,! esgotamento! do! individualisH mo,!mas!disseminação!em!espiral!da!sua!dinâmica.!O!neoHindividualismo!não!se!reduz! ao!hedonismo,!mas!implica,!cada!vez!mais,!um!trabalho!de!construção!de!si,!de!tomada! de!posse!do!seu!corpo!e!da!sua!vida.!É!o!self!contemporâneo.!Num!cenário!pautado!pela! cibercultura! e! por! toda! a! visualidade! e! virtualidade! envolvida,! é! necessário! identificar!

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Fenomenologia é a ciência dos fenômenos que será utilizada como aporte metodológico nesta pes- quisa, bem como autores desta linha de pensamento (a autora).

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diferenças! significativas! que! constroem! e! são! construídas! por! fronteiras! e! identidades! simbólicas! no! cotidiano.! As! possibilidades! e! as! formas! de! se! vivenciar! a! cultura! agora! são!variadas,!mais!do!que!nunca.!Estas!possibilidades!proporcionadas!pela!nova!lógica! midiática!referemHse!a!uma!apropriação!reflexivista,!por!meio!da!qual,!ao!indivíduo,!se! abre! espaço! para! profundas! reconsiderações! sobre! sua! identidade,! seus! papéis! e! seu! projeto!de!vida!e!mundo!(LIPOVETSKY,!2004).!

É!uma!nova!configuração!da!cultura,!que!se!refere!a!uma!forma!contemporânea! de!significar!recursos!simbólicoHpráticos!tradicionalmente!offHline,!com!finalidades!indiH vidualistas!e!ao!mesmo!tempo,!coletivizadas,!num!movimento!paradoxal!e!flexibilizado! da! contemporaneidade.! A! cibercultura,! neste! sentido,! é! um! espaço! de! manifestação! de! reflexividade!do!self!por!excelência!(LEMOS,!2004).!O!ponto!central!é!verificar!como!esH ses! estilos! de! cultura! se! transformam! ou! são! absorvidos! por! esta! dinâmica! (SANTOS,! 2007).! Atualmente,!a!diversidade!de!experiências!culturais,!proporcionadas!inclusive!peH la!virtualidade!na!rede,!implica!a!busca!por!existências!individuais!novas.!E!este!segmenH to!engendra!experiências!inovadoras!e!oxigenadoras!na!cultura.!Assim,!o!entendimento! de!processos!culturais!emergentes!e!de!sua!difusão!em!termos!práticos,!globais!e!locais,! individuais!e!coletivos,!deve!considerar!a!posição!estratégica!ocupada!pelos!interagenH tes11 !dinâmicos!e!heterogêneos!(LEMOS,!2009).! Esta!ambiência!promove!rupturas!e!contribui!para!a!constituição!de!identidades! abertas! e! referenciais! flexíveis! e! provisórias,! contingentes! e! mutáveis.! Propiciadas! e! propiciantes! do!self! individual,! dos! elementos! de! cultura! que! compõem! o! interagente,! suas! identidades! e! seu! capital! social! na! rede.! A! pluralidade! crescente! de! perspectivas! afeta!os!sistemas!de!referência!dos!interagentes,!interferindo!na!constituição!de!identifiH cações,!práticas!e!nos!ambientes!da!rede.!Proporcionando!uma!liberdade!posta!e!imposH ta.!Há!uma!mudança!de!percepção;!da!cultura!objetiva!e!subjetiva!(BAUMAN,!2005).!

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Interagente está presente nesta pesquisa como significação de indivíduo na contemporaneidade (PRIMO, Alex Fernando Teixeira. Enfoques e desfoques no estudo da interação mediada por com- putador. Disponível em: http://www6.ufrgs.br/limc/PDFs/enfoques_desfoques.pdf. Acessado em: 10 set 2011).

Um!dos!efeitos!deste!self,!no!plano!da!subjetividade,!é!a!percepção!cada!vez!maior! da! construção! das! referências,! levando! o! interagente! a! ter! de! decidir! autonomamente! sobre!suas!posturas!e!orientações!em!uma!sociedade!que!apresenta!sistemas!simbólicos! altamente!diferenciados,!onde!existe!a!necessidade!constante!de!tomada!de!decisões!e! estabelecimento!de!vínculos.!

O!fenômeno!atual!da!cultura!apresenta!possibilidades!simultaneamente!antagôH nicas! marcada! por! tensões! e! contradições.! Cria! um! cenário! de! necessidades! da! ordem! coletiva!e!liberdade!individual.!É!um!estilo!de!vida!centrado!na!autonomia!do!sujeito.!A! recusa!prometéica!do!destino!e!a!invenção!de!si!mesmo!sem!via!social!traçada!por!anteH cipação! caracterizam! esse! neoHindividualismo.! A! condição! social! contemporânea! é! coH mandada!por!esse!ideal!de!controle!soberano!de!si!e!por!essa!luta!sem!fim!contra!o!preH existente!e!o!herdado!habitus.!É!nesta!lógica!fenomenológica!que!se!encontra!o!sujeito! atualmente.!O!indivíduo!é!excessivamente!caricaturado!como!uma!mônada!fechada!soH bre!si!mesma.!ViveHse!a!época!da!mobilidade!subjetiva!(LIPOVETSKY,!1983).! De!qualquer!maneira,!essa!mobilidade!e!essa!autonomia!têm!seu!custo,!com!freH quência,!elevado,!pois!são!acompanhadas!por!um!crescimento!inquietante!da!ansiedade,! da! depressão,! de! perturbações! psicopatológicas! comportamentais! diversas! (LEMOS,! 2009).!Narciso!não!é!o!indivíduo!triunfante,!mas!o!indivíduo!fragilizado!e!desestabilizaH do! por! ter! de! carregarHse! e! de! construirHse! sozinho,! sem! os! apoios! que,! outrora,! eram! constituídos!pelas!normas!sociais!e!referências!coletivas!introjetadas.!A!figura!dominanH te!do!individualismo!democrático!foi,!durante!algum!tempo,!a!euforia!de!liberação;!agoH ra,!cada!vez!mais,!é!a!dificuldade!de!viver,!a!insegurança,!o!medo!ligado!não!somente!ao! terrorismo,!mas!a!qualquer!coisa:!alimentação,!relações,!idade,!trabalho,!aposentadoria! (LIPOVETSKY,!2004).! Faz!mais!de!meio!século!que!os!intelectuais!não!param!de!ter!um!discurso!hiperH crítico!a!respeito!dos!meios!de!comunicação!de!massa.!Muito!cedo,!estes!foram!acusados! de!serem!instrumentos!de!manipulação!e!de!alienação!de!essência!totalitária.!A!Escola! de! Frankfurt! estigmatizou! as! indústrias! culturais,! que! transformam! obras! de! arte! em! produtos! de! consumo.! ObservouHse! na! mídia! uma! fábrica! de! estereótipos! a! serviço! da! consolidação!do!conformismo,!da!justificação!da!ordem!estabelecida,!do!desenvolvimenH to!da!falsa!consciência!e!da!asfixia!do!espaço!público!da!discussão.!Os!situacionistas!deH nunciaram!a!comunicação!unilateral!que!destrói!a!comunidade,!isolando!os!indivíduos.!

O!perfil!dominante!da!mídia!veicula!a!ideia!de!um!poder!total:!controle!e!manipulação!da! opinião,!uniformização!dos!pensamentos!e!dos!gostos,!desagregação!do!espaço!público,! atomização!do!social!(BOURDIEU,!2003).! Em!‘A!miséria!do!Mundo’!(2003)!organizado!por!Pierre!Bourdieu,!autores!expliciH tam!que,!atualmente,!temos!um!novo!demônio!responsável!por!todos!os!nossos!males:!a! mídia.!A!mídia!busca!alcançar!indivíduos!diferentes,!mas!isso!não!ocorre!sem!um!proH cesso!de!padronização,!de!massificação!dos!modos!de!vida,!dos!gostos!e!das!práticas.!Por! outro!lado,!a!mídia!tem!uma!influência!na!sociedade!que!seria!ilógico!minimizar,!mas!ela! não!pode!tudo,!não!tem!todos!os!poderes.!Os!meios!de!comunicação!de!massa!favorecem! globalmente! um! uso! mais! intenso! da! razão! individual.! Na! escala! da! longa! duração,! os! indivíduos!têm!mais!possibilidades!de!questionar!e!de!mudar!suas!próprias!posições,!de! avaliar!e!de!julgar!livremente,!de!tomar!distância!em!relação!às!posições!das!autoridaH des!institucionais.!Porém,!analisando!a!mídia!como!um!fenômeno,!há!um!entorpecimenH to!por!parte!do!interagente!e!uma!nãoHreflexão!dos!conteúdos!da!mídia.!

O! consumo! de! televisão! apresentaHse! mais! como! um! hábito! do! que! como! a! exH pressão! de! uma! escolha! individual! deliberada.! Assim,! o! telespectador! contemporâneo! não! se! identifica! nem! com! o! homem! padronizado! das! multidões! nem! com! o! indivíduo! soberano.!Ele!é!o!indivíduo!zapeador,!de!audiência!flutuante!(WOLTON,!2008).!Em!conH sequência,!as!ameaças!que!espreitam!não!decorrem!mais!da!manipulação,!da!massificaH ção,!da!doutrinação,!mas!se!encarnam,!antes,!no!triunfo!das!práticas!aditivas,!nas!ciberH compulsões! e! em! outras! utilizações! imoderadas! ou! incontroláveis! (WOLTON,! 2006).! A! mídia!favoreceu!o!desenvolvimento!da!autonomia!dos!indivíduos;!eis!eles,!agora,!prisioH neiros!de!novas!dependências!(WOLTON,!2003).!

Se!a!mídia!funciona!como!instrumento!de!estimulação!e!de!legitimação!hedonisH tas,! contribui,! paralelamente,! para! destilar! uma! situação! de! insegurança,! amplificando! os! temores! cotidianos:! medo! alimentar,! medo! de! vírus,! da! pedofilia,! da! obesidade,! da! violência!urbana,!da!poluição,!quase!tudo,!hoje,!tende!a!cair!no!regime!de!fobia.!O!indivíH duo! liberado! da! sujeição! ao! coletivo! achaHse! cada! vez! mais! submetido! aos! poderes! do! medo!e!da!inquietude!(DEBORD,!1997).!

Por!um!lado,!a!mídia!mergulha!no!lúdico!e!nas!distrações!superficiais;!por!outro! lado,!não!para!de!intensificar!as!imagens!de!um!mundo!repleto!de!catástrofes!e!de!periH

gos.!Se!não!há!dúvida!de!que!a!mídia!acelerou!a!dissolução!de!algumas!formas!de!sociaH bilidade!tradicional,!não!é!verdade!que!tenha!eliminado!todos!os!laços!sociais,!destruído! o!gosto!pela!sociabilidade!e!pelas!relações!humanas!nem!consumismo!sem!intersubjetiH vidade!(BOURDIEU,!1997).!

Paralelamente! à! multidão! solitária,! surgem! as! novas! multidões! emocionais,! que! cabem!mal!na!grade!da!sociedade!do!espetáculo,!ou!seja,!da!fabricação!da!passividade!e! da!separação!generalizadas!(DEBORD,!1997).!

Atualmente,! a! mídia! funciona,! ao! menos! episodicamente,! como! catalisadora! de! reuniões!efervescentes,!de!afetos!comuns,!de!participações!emocionais!em!amplas!maniH festações.!As!novas!exteriorizações!coletivas!dos!sentimentos!estão!ligadas,!de!perto!ou! de! longe,! ao! impacto! da! mídia:! inexiste! emoção! coletiva! sem! hipermidiatização! dos! acontecimentos.!Não!são!mais!os!ritos,!os!costumes,!as!normas!herdadas!do!passado!que! organizam!os!estados!de!efervescência!coletiva;!estes,!agora,!vinculamHse!aos!aconteciH mentos!do!presente!e!à!sua!cobertura!midiática!(DEBORD,!1997).!

Assim!como!a!cultura!midiática!é!uma!cultura!de!mosaico,!descontínua,!sem!meH mória,! os! grupos! sociais! atuais! são! caracterizados! pela! fluidez! e! pela! instantaneidade,! pela! instabilidade! e! pelo! efêmero! (LIPOVETSKY,! 2004).! As! mesmo! tempo,! para! tentar! obter! referências,! os! indivíduos! resgatam! o! passado,! criam! memórias! e! as! perpetuam,! num!movimento!dual!e!paradoxal.!A!mídia!não!consegue!controlar!e!fabricar,!peça!por! peça,! os! gostos! e! as! reações! do! público.! EstimulaHos,! mas! não! os! comanda! (DEBORD,! 1997).!A!televisão!não!é!um!poder!sem!limites!capaz!de!destruir!todo!sentido!crítico!ou! de!disseminar!o!gosto!pelo!crime!(BOURDIEU,!1997).!É!um!balizador.!Nenhuma!mídia!é! total,!mas!há!perpetuação!de!estereótipos!e!conceitos!através!da!ideia!de!construção!da! realidade!realizada!através!dos!veículos!de!comunicação.!

A! Internet,! atualmente,! é! simultaneamente! real! e! virtual,! gerando! informação! e! contexto!de!interação,!espaço!e!tempo,!mas!que!altera!as!próprias!coordenadas!espaçoH temporais!a!que!os!indivíduos!estão!habituados,!compactandoHas.!Ou!seja,!o!espaço!e!o! tempo!na!rede!existem!na!medida!em!que!são!construção!social!partilhada.!Esta!consH trução!é!estruturada!pelos!laços!e!valores!sociopolíticos,!estéticos!e!éticos!que!tipificam! este!novo!espaço!antropológico.!Este!novo!espaço!com!áreas!de!privacidade!–!um!novo! mundo!virtual!ou!mundo!mediatizado!−!é!um!suporte!aos!processos!cognitivos,!sociais!e!

afetivos,!os!quais!efetuam!a!transmutação!da!rede!de!tecnologia!eletrônica!e!telecomuH nicações!em!espaço!social!povoado!por!indivíduos!que!(re)constroem!as!suas!identidaH des!e!os!seus!laços!sociais!nesse!novo!contexto!comunicacional.!Geram!uma!teia!de!noH vas!sociabilidades!que!suscitam!novos!valores.!Estes!novos!valores,!por!sua!vez,!reforH çam! as! novas! sociabilidades.! Esta! dialética! é! geradora! de! novas! práticas! culturais! (TURKLE,!1998).!As!redes,!e!seus!serviços!geram!novos!espaços!de!encontro,!novos!esH paços!antropológicos.!Há!que!questionar!em!que!medida!esses!novos!espaços!represenH tacionais!(re)criam!as!práticas!culturais!estereotipadas.!

2.3.! A!NOVA!LÓGICA!ESPACIO<TEMPORAL!E!MÍDIA:!!

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