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As entrevistas são uma das formas mais reconhecidas de desenvolver investigação qualitativa (Mason, 1996). São instrumentos adequados quando se considera que o conhecimento que as pessoas têm, a sua visão, o seu entendimento, as suas interpretações, experiências, interacções pertencem à mesma realidade social que as questões de investigação pretendem explorar. Neste caso, pode-se afirmar que um modo legítimo de procurar respostas às questões de investigação aqui propostas, passa por interagir com os actores envolvidos na interacção Universidade-Empresa, falar com eles, ouvi-los, para poder aceder às suas percepções e aos seus mecanismos de articulação. Como, normalmente, numa investigação qualitativa não se pretende provar hipóteses, o cerne da investigação não passa pelo facto de o investigador conseguir generalizar os resultados do seu estudo a uma população mais vasta, mas sim conhecer, analisar e interpretar, com suficiente profundidade, o modo como os entrevistados percepcionam as experiências, para através dessa percepção, conseguirem gerar um conhecimento interpretativo e conceptual do objecto de estudo (Seidman, 1998).

Enquanto técnica de investigação qualitativa, a entrevista engloba um vasto número de práticas, que podem ir desde ferramentas muito estruturadas como inquéritos/ questionários de perguntas fechadas previamente definidas até, no outro extremo, entrevistas com questões abertas ou mesmo sem estrutura aparente, de tipo antropológico, que se assemelham quase a uma “conversa entre amigos” (Seidman, 1998). A entrevista, aqui utilizada, é uma entrevista semi-estruturada, ou também designada de entrevista “qualitativa”. Este tipo de entrevistas é

caracterizado por um estilo informal, que se assemelha mais a uma conversação ou a uma discussão do que a um estilo formal de pergunta-resposta, onde são abordados temas, tópicos ou assuntos que o investigador pretende cobrir (Mason, 1996).

São diversos os argumentos que podem justificar a sua escolha. Do ponto de visto epistemológico, a entrevista permite a exploração em profundidade do discurso e das posições dos actores perante um determinado fenómeno. Em relação a outros métodos, este facilita a compreensão e o conhecimento partindo dos dilemas e dos desejos dos sujeitos (numa abordagem política e ética). Sendo a entrevista um instrumento privilegiado de acesso às experiências mais subjectivas dos actores, permite-nos uma interpretação mais profunda da percepção dos diferentes sujeitos, permitindo estabelecer relações com conceitos que podem não estar objectivamente relacionados com a relação Universidade-Empresa, ou com os processos de transferência de tecnologia, mas todavia os influenciam, na medida em que afectam o modo como os indivíduos percepcionam estes fenómenos. A entrevista permite uma maior proximidade com o “mundo do entrevistado” e o facto do entrevistado poder usar a sua linguagem permite uma maior espontaneidade e maior fidelidade à sua opinião. Mesmo no âmbito mais específico da fenomenografia, a entrevista, nomeadamente a entrevista semi- estruturada, é o instrumento mais comum.

Considerando os objectivos delineados para este estudo, o uso da entrevista semi- estruturada permitiu coligir a informação necessária para dar resposta às várias questões de investigação. O uso desta ferramenta permitiu ainda granjear um objectivo complementar. Aproveitando a temática da Prospectiva e das questões de investigação levantadas, foi intenção deste estudo aproveitar a oportunidade para proceder a um processo de co-nomeação, que poderá ser útil em futuras investigações.

Existem obviamente problemas inerentes ao uso de entrevistas. Um deste problemas é a multiplicidade de interpretações que pode resultar da entrevista, quer pelo desajuste que pode existir entre aquilo que o entrevistado afirma e aquilo que está realmente na sua mente, quer pela interpretação que o entrevistador lhe atribui, quer pelo facto de que a entrevista pode criar uma terceira interpretação, reflectindo não a realidade do entrevistado, nem do entrevistador, mas a realidade do entrevistador/entrevistado85 (Mason, 1996). Existem outras dificuldades que podem surgir nas entrevistas, como o facto do entrevistador provocar algum tipo de inibição no entrevistado. Este e outros tipos de preconceitos difíceis de identificar são, por essa razão, perigosos e exigem que as entrevistas tenham uma preparação cuidada e que sejam respeitadas determinadas cautelas, estratégias e regras éticas que permitem diminuir substancialmente os riscos referidos anteriormente. Estes cuidados foram tomados em consideração, quer na elaboração do guião quer no decurso das entrevistas.

A entrevista foi, desde do início, convenientemente enquadrada, dando a conhecer ao entrevistado o objectivo do estudo e da entrevista em si (Dingwall, 1997). Considerando os objectivos deste estudo e as questões de investigação correspondentes, foi elaborado um guião

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de entrevista semi-estruturada (Anexo 7.1) que tinha como propósito, estabelecer os tópicos a abordar e eventuais sugestões sob a forma de os introduzir. As perguntas foram colocadas da forma mais aberta possível, de modo a não influenciar a resposta do entrevistado e permitir um mais claro entendimento da sua perspectiva sobre estas interacções. Perguntas como “O que entende por transferência de tecnologia?”, “Quais são para si os principais factores críticos da relação Universidade-Empresa?” foram mantidas em forma simples e aberta, para possibilitar a maior liberdade de interpretação e de resposta. Apenas numa segunda etapa da entrevista, o entrevistado foi convidado a elaborar sobre os factores críticos considerados como extrínsecos (estruturas, políticas e comunicação), que (se) ainda não tivesse mencionado, para permitir um maior grau de comparabilidade. Considerou-se que não seria necessário fazer essa segunda abordagem dos factores críticos intrínsecos (como por exemplo cultura, organização, confiança, etc…), por se considerar que estes factores estariam reflectidos na percepção que o sujeito faz da relação Universidade-Empresa e dos seus agentes e influências. Considerando que o factor crítico Políticas, enquanto instrumento normativo, mas também dinamizador e motivador, poderia ser, também em Portugal, um dos principais factores considerados como críticos e considerando que a utilização de ferramentas de apoio à definição de estratégias e políticas poderia actuar como um instrumento de apoio e facilitação da relação Universidade-Empresa, houve necessidade de traduzir essa questão sob a forma de algumas perguntas abertas da entrevista semi-estruturada. Essas questões visam, primeiro, perceber o conhecimento que os entrevistados possuíam sobre a ferramenta; segundo, questionar os entrevistados sobre a pertinência que uma ferramenta prospectiva poderia ter nesta temática; e sobre a (des)motivação com que participariam (ou não) num hipotético exercício deste género.

As questões foram sempre colocadas do modo mais aberto possível, acompanhando preferencialmente a direcção da conversa e aproveitando os momentos mortos para colocar as questões, de forma que surgissem, sempre que possível, no seguimento do que está a ser abordado. O guião (que consta do Anexo 7.1) serviu portanto mais como lista de tópicos a serem abordados na entrevista, como “check-list”, do que um instrumento normativo. A primeira questão foi colocada conforme consta no guião mas as restantes questões foram colocadas seguindo o rumo da conversa e não necessariamente a ordem ou os termos que se encontram no guião. Respeitou-se, sempre que possível os silêncios curtos do entrevistado mas quando o silêncio era um pouco mais prolongado, as perguntas do guião serviam como ignição, reavivando o discurso do interlocutor.

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