• Nenhum resultado encontrado

Instrumentos de diagnóstico e severidade para depressão

5. REVISÃO DE LITERATURA

5.2 Depressão

5.2.4 Instrumentos de diagnóstico e severidade para depressão

Inicialmente, deve-se buscar determinar se os sujeitos investigados possuem ou não o diagnóstico de depressão. Num segundo momento, deve-se classificar os deprimidos num gradiente de severidade da doença. Nesse intuito, opta-se pela utilização de uma série de instrumentos desenvolvidos para auxiliar na determinação dessas

variáveis (169-172). Dentre as ferramentas mais conhecidas e utilizadas no meio clínico e de pesquisa, estão o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais IV (DSM-IV), Mini Entrevista Neuropsiquiátrica Internacional (MINI) e o Inventário de Depressão de Beck (BDI). Contudo, a variabilidade dessas ferramentas é tamanha, de modo que recentemente esses instrumentos têm sido alvo de estudos do tipo revisão sistemática.

Através desse modelo de estudo, a despeito dos constructos para diagnóstico de depressão, foi possível investigar a acurácia dos mesmos. E nesse âmbito, conclusões alarmantes foram obtidas – num total de 20 instrumentos investigados, apenas três cumpriram os critérios mínimos de especificidade e sensibilidade (173).

Indiscutivelmente, os instrumentos de diagnóstico e severidade de depressão são aplicados em extensa escala ao redor do mundo. Contudo, a utilização e interpretação dos dados obtidos requerem cautela. Nesse contexto, é preciso estar atento, pois essas ferramentas podem ser fonte de viés, uma vez que não consideram as expressões sintomatológicas específicas de cada gênero (168). Não menos importante, os aspectos culturais também parecem ser determinantes, insuflando o risco de viés dos achados nessas ferramentas. Embora traduzido e validado para o espanhol, inclusive apresentando validade interna, o BDI em sua versão no idioma espanhol não apresenta validade cultural. No início dos anos 2000, foi identificado que preconceitos culturais na versão traduzida poderiam incitar interpretações equivocadas e assim diagnósticos errados de depressão (174). Ainda sob essa perspectiva observou-se um viés cultural na interpretação de uma escala de diagnóstico de depressão em uma população de afro-americanos. Esses respondentes apresentavam tendência á respostas negativas, devido à associação com percepções de preconceito racial, ao invés de considerar os aspectos investigados no que concerne á depressão, propiciando a ocorrência de casos falso-positivos (175).

Diante desse panorama, investigar marcadores biológicos que forneçam suporte para confirmar categoricamente o diagnóstico e severidade da depressão, atualmente baseados em ferramentas subjetivas, tem sido uma potente vertente com futuro promissor.

Identificar e utilizar em grande escala biomarcadores com esse propósito, tem sido um desafio recente, enfrentado por muitos pesquisadores. A dificuldade dessa investigação consiste em lacunas ainda existentes na compreensão da neurobiologia e fisiopatologia da depressão. Assim, até o presente momento, a literatura sugere que mais estudos sejam realizados nesse sentido. Contudo, acredita-se que quando definidos e utilizados os marcadores biológicos para depressão á nível de determinação de diagnóstico da

depressão, essa permissa pode contribuir ao desuso das ferramentas supracitadas, dado viés e subjetividade das mesmas (81, 176).

5.2.4.1. Mini-Entrevista Neuropsiquiátrica Internacional (MINI)

O MINI é uma ferramenta neuropsiquiátrica, desenvolvida em 1998, que consiste em uma breve entrevista clínica estruturada, com objetivo de diagnosticar desordens mentais, como a depressão, de acordo com o DSM-IV (177). Atualmente, o MINI está disponível em aproximadamente 30 idiomas, possibilitando sua ampla utilização ao redor do mundo. Dado esse aspecto transcultural, hoje o MINI tem sido utilizado para captação de indivíduos para ensaios psicofarmacológicos multicêntricos, ensaios clínicos em psiquiatria e atenção primária em estudos desenvolvidos nos continentes europeu e americano (178).

A aplicação do MINI é breve, costuma durar entre 15 e 30 minutos. No que compete o treinamento de profissionais clínicos para estarem aptos á aplicação dessa ferramenta, observa-se que esse instrumento demanda somente de 1 a 3 horas, e rapidamente pode ser colocado em prática. Satisfatoriamente, a redução do tempo gasto em detrimento á entrevistas de diagnóstico complexas, não compromete as suas qualidades psicométricas (178).

O MINI é composto por questões do tipo dicotômicas. E se apresenta sob duas distintas versões para responder aos objetivos diagnósticos específicos de diferentes contextos de utilização: o MINI destina-se à utilização em cuidados primários e ensaios clínicos, possui 19 módulos e abrange 17 transtornos do primeiro eixo do DSM-IV. Além disso, vale destacar que essa versão apresenta um módulo específico para investigar o episódio depressivo maior; o MINI Plus destina-se à avaliação de transtornos mentais ao longo da vida dos sujeitos potencialmente afetados, a nível clínico e acadêmico. Não menos importante, o MINI Plus abrange critérios de inclusão, exclusão e cronologia de 23 categorias do DSM-IV. Nessa versão, o módulo A é o responsável por investigar o transtorno depressivo maior (178).

5.2.4.2. Inventário de Depressão de Beck (BDI)

O BDI é uma escala utilizada para aferir o grau de severidade da depressão, entre pessoas de 17 á 80 anos, desenvolvida por Aaron Beck, no início da década de 60. Essa ferramenta é constituída por 21 itens de múltipla escolha, cada um com quatro alternativas de diferentes níveis de gravidade, como por exemplo:

(0) Eu não me sinto triste;

(1) Eu me sinto triste;

(2) Eu me sinto triste todo o tempo e não consigo sair desta situação;

(3) Eu me sinto tão triste ou infeliz que não consigo suportar (179);

No que compete ao histórico desse inventário, sua primeira versão proposta por Beck ficou conhecida como BDI-IA, a qual embora apresentasse consistência interna suficiente (180), demonstrava falhas segundo os critérios estabelecidos pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais III (DSM III). Assim, no intuito de aprimorar essa ferramenta, em seguida da publicação da quarta versão do DSM IV, uma versão atualizada do BDI fora proposta, o BDI-II. As mudanças nessa nova versão foram substanciais, de modo que apenas três itens da primeira versão foram mantidos - sensação de estar sendo punido, pensamentos suicidas e interesse sexual. Conforme o BDI-IA, o BDI-II também apresenta consistência interna e mede a severidade da depressão através de 21 questões que pontuam para um sistema de escores. Contudo, as categorias de pontuação diferem do método original, e nessa versão os indivíduos que pontuaram de 0 a 13 são considerados com depressão mínima, de 14 a 19 depressão leve, 20 a 28 depressão moderada e de 29 a 63 depressão severa (181).

Atualmente, o BDI-II é amplamente utilizado, uma vez que já foi traduzido e validado para diferentes idiomas (182). No Brasil, essa ferramenta foi validada por Cunha e colaboradores, os quais apresentaram um manual de normas para a sua utilização (183).

Apesar disso, faz-se relevante mencionar que o BDI apresenta certas limitações, como por exemplo, o efeito nos resultados em detrimento ao modo de aplicação do instrumento, bem como o fácil exagero das respostas, para mais ou menos, devido ao fato de ser uma ferramenta de auto relato. Além disso, o ambiente de aplicação do instrumento, um ambiente clínico ou um familiar, também parece ser determinante na variabilidade das respostas (184).