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CAPÍTULO II METODOLOGIA

2.3 INSTRUMENTOS DE GERAÇÃO DE DADOS

Dentre os instrumentos de geração de dados que a pesquisa qualitativa dispõe, utilizamos, além do convencional levantamento bibliográfico, a pesquisa documental. Assim, é sabido que o levantamento bibliográfico tem por finalidade ―colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto‖ (LAKATOS; MARCONI, 2003, p. 183). Por meio de tal levantamento o pesquisador consegue vislumbrar todo o panorama no qual seu estudo se insere, assim como as possibilidades e impossibilidades de avanços na área de pesquisa.

Desse modo, o levantamento bibliográfico

abrange toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material cartográfico etc., até meios de comunicação orais: rádio, gravações em fita magnética e audiovisuais: filmes e televisão (LAKATOS; MARCONI, 2003, p. 183).

De acordo com as mesmas autoras, este tipo de levantamento ―não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras‖ (p. 183). Logo as conclusões a que se chegam nem sempre serão inovadoras, mas podem contribuir de forma a reafirmar estudos que apontam para a mesma direção.

Desse modo, durante o levantamento bibliográfico, o pesquisador seleciona os autores, bem como os apontamentos e teorias, que o ajudarão a dar suporte teórico para a análise dos dados levantados, permitindo a contestação ou a validação das reflexões, e esse momento requer certo cuidado.

No que corresponde à pesquisa documental, segundo Lüdke e André (1986), ―a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema‖ (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 38).

Assim, acreditando que ―Os documentos constituem uma fonte poderosa de onde podem ser retiradas evidências que fundamentam afirmações e declarações do pesquisador‖ (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 39), em nosso trabalho, tomamos a pesquisa documental como foco central de análise, sem a intenção de levantar fatos novos, mas de problematizar os existentes. E, por meio das autoras, podemos salientar que os documentos ―Representam ainda uma fonte ‗natural‘ de informação. Não são apenas uma fonte de informação contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem informações sobre esse mesmo contexto‖ (p. 39).

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017) para os Ensinos Fundamental e Infantil é nossa fonte documental, sendo um documento oficial de caráter normativo. Como apontam Lakatos e Marconi (2003, p. 178), os documentos oficiais ―constituem geralmente a fonte mais fidedigna de dados. Podem dizer respeito a atos individuais, ou, ao contrário, atos da vida política, de alcance municipal, estadual ou nacional‖, desde que o pesquisador consiga ―selecionar o que lhe interessa, como também interpretar e comparar o material, para torna-lo utilizável‖ (p. 178). Desse modo, por meio da análise de documentos oficiais é possível perceber quais as vozes sociais atuantes em tais documentos, bem como os interesses subjacentes aos discursos presentes neles, sejam eles frutos de agenciamentos individuais ou coletivos, como vimos anteriormente quando explicitamos a definição de agência em camadas apontada por Duranti (2004).

Antes da homologação da versão final do documento analisado foram disponibilizadas outras três versões para consulta pública e discussão. A versão final da BNCC está disponível no portal ―Base Nacional Comum Curricular‖, criado pelo Ministério da Educação (MEC) – www.basenacionalcomum.mec.gov.br. Desse modo, o documento é de domínio público e de fácil acesso, como tem que ser, pois quando se trata de documentos normativos há a preocupação de que eles sejam disseminados em larga escala.

Nesse sentido, segundo Cellard (2008), o contexto de produção do documento, que deve ser levado em conta durante o processo de análise. Para ela, independentemente da época em que o texto foi escrito ―O exame do contexto social global, no qual foi produzido o documento e no qual mergulhava seu autor e aqueles a quem ele foi destinado, é primordial, em todas as etapas de uma análise documental‖ (p. 299).

Flick (2013) corrobora o que aponta Cellard (2008), afirmando que, ao analisar os documentos para propósitos de pesquisa, deve-se ―sempre considerar quem produziu um documento, para quem e com que propósito‖. Uma vez que, ―a maneira como os documentos são concebidos é uma parte do seu significado e a maneira como algo é apresentado influencia os efeitos que serão produzidos por um documento‖ (p. 126).

Flick (2013) ressalta ainda, sobre os documentos oficiais, que muitos deles ―destinam-se apenas a um círculo limitado de destinatários que são autorizados a acessá-los ou aos quais são destinados‖. Desse modo, como nos alerta o autor,

Os documentos oficiais permitem conclusões sobre o que seus autores ou as instituições que eles representam fazem ou pretendem fazer, ou como eles avaliam. Os documentos são produzidos com um determinado propósito – por exemplo, para fundamentar uma decisão ou para convencer uma pessoa ou uma autoridade (FLICK, 2013, p. 125).

Assim, é perceptível a importância de se considerar também os elementos extratextuais para a análise documental. Nesse sentido, Cellard (2008, p. 300) afirma que ―Não se pode pensar em interpretar um texto, sem ter previamente uma boa ideia da identidade da pessoa que se expressa, de seus interesses e dos motivos que a levaram a escrever‖.

A autora traz, ainda, um questionamento, que consideramos essencial para nosso trabalho, quando se refere ao autor do documento: ―Esse indivíduo fala em

nome próprio, ou em nome de um grupo social, de uma instituição?‖. Pensando nisso, acreditamos que

Elucidar a identidade do autor possibilita, portanto, avaliar melhor a credibilidade de um texto, a interpretação que é dada de alguns fatos, a tomada de posição que transparece de uma descrição, as deformações que puderam sobrevir na reconstituição de um acontecimento (CELLARD, 2008, p. 300).

De acordo com Cellard (2008) deve-se levar em conta também, antes de tirar conclusões, a natureza do texto e o suporte em que o documento está veiculado, uma vez que isso também delimita o público leitor do documento. ―Efetivamente, a abertura do autor, os subentendidos, a estrutura de um texto podem variar enormemente, conforme o contexto no qual ele é redigido‖ (p. 302).

Sobre o conteúdo dos documentos, que comumente são foco das análises, a autora supracitada salienta:

Delimitar adequadamente o sentido das palavras e dos conceitos é, aliás, uma precaução totalmente pertinente no caso de documentos mais recentes nos quais, por exemplo, utiliza-se um ―jargão‖ profissional específico, ou nos que contêm regionalismos, gíria própria a meios particulares, linguagem popular, etc. Deve-se também prestar atenção aos conceitos-chave presentes em um texto e avaliar sua importância e seu sentido, segundo o contexto preciso em que eles são empregados. Finalmente, é útil examinar a lógica interna, o esquema ou o plano do texto (CELLARD, 2008, p. 303). Considerando que nossa pesquisa se localiza na área educacional e volta-se principalmente para as questões de ensino de língua, políticas linguísticas e agência é importante que nos atentemos aos conceitos, palavras e termos relacionados a essas questões.

Pensando em todos esses elementos apontados pelos autores, importantes quando se seleciona os documentos e propõe-se fazer pesquisa documental, é necessário destacarmos ainda, por meio de Cellard (2008), que o que possibilita ao pesquisador ―formular explicações plausíveis, produzir uma interpretação coerente, e realizar uma reconstrução de um aspecto qualquer de uma dada sociedade, neste ou naquele momento‖ é o ―encadeamento de ligações entre a problemática do pesquisador e as diversas observações extraídas de sua documentação‖ (p. 304).

Uma vez explicada a natureza da pesquisa documental a que recorremos no referido trabalho, na sequência, trazemos alguns pressupostos que nos amparam na análise dos dados.