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INTEGRAÇÃO DO CNO NA ESCOLA

OPORTUNIDADES NUMA ESCOLA SECUNDÁRIA COM 3º CICLO DO

2. UM CNO NUMA ESCOLA SECUNDÁRIA COM 3º CICLO DO DISTRITO DE LISBOA: UM ESTUDO DE CASO

2.2 INTEGRAÇÃO DO CNO NA ESCOLA

A Iniciativa Novas Oportunidades foi perspetivada de forma parcelar pelos principais membros da comunidade educativa, nomeadamente pela Diretora da escola. Existia uma perceção do Centro Novas Oportunidades como algo que utiliza o espaço escolar, mas que não faz parte verdadeiramente da sua essência.

De facto, a diretora reconheceu que “o Centro também não mexe verdadeiramente com a vida da escola”, pois “o Centro enquanto Centro não se intercepta grandemente com a vida da escola”. Uma das possíveis razões para que tal tivesse acontecido é que “o Centro funciona mais ao final do dia e à noite”. De facto, foi referido o contacto com os colegas que estão afetos ao Centro Novas Oportunidades, “porque estes vão à sala de professores, vão ali e vão aqui, portanto circulam e frequentam os mesmos espaços”. A ligação entre Escola e Centro Novas Oportunidades materializa-se pontualmente, em situações muito específicas, como por exemplo na “abertura solene do ano letivo em que se pretende entregar os certificados aos adultos”. Esta falta de inter-relação entre o Centro Novas Oportunidades e a Escola foi visível nas palavras da diretora, que é, simultaneamente diretora da escola e do Centro Novas Oportunidades, quando esta afirmou que “não identifica vantagens ou constrangimentos pela existência do Centro”. Este fraco impacto do Centro Novas

Oportunidades explica-se, segundo a diretora, pelo facto de não existir ensino noturno na escola, nem se equacionar que este venha a existir, tendo em conta que “até à data, a resposta a estas necessidades formativas da população adulta é dada claramente e com um belíssimo trabalho de uma escola” que se localiza na mesma cidade. Ainda quanto à pouca vivência do Centro Novas Oportunidades na escola, uma das razões poderá estar na forma como se perceciona o futuro da iniciativa. A Diretora considerou que “o centro vai existir enquanto existir a iniciativa”, sendo esta algo a médio ou curto prazo. “Julgo que nem sequer foi criado com a perspetiva de durar para sempre”.

Também os profissionais de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências consideraram que a restante comunidade escolar olhava com desconfiança, ou seja, desvalorizava a existência do Centro, para além de desconhecer em que este consiste.

Vão criticar. Eles têm exatamente a mesma ideia pré- concebida que eu tinha antes de entrar aqui. Portanto a ideia deles é, pé atrás. Agora vão lá em dois ou três meses e ficam com o nono ano, a ideia do facilitismo. Este trabalho não é muito valorizado por parte dos colegas que não estão aqui.

Acho que não tem sido bem aceite pelos outros professores a existência do Centro.

Olham como se o Centro proporcionasse benefícios para quem cá trabalha.

Quando questionados sobre a existência do CNO na escola, os formadores, também eles, referiram sobretudo uma desarticulação entre as duas entidades.

É uma coisa secundária, é uma coisa à parte. Não há grande articulação entre o ensino regular e o que se passa aqui. Do outro lado ninguém vem cá. Nós passamos aqui horas sem ir ao outro lado e vice- versa.

Consideraram também que, na comunidade escolar, existia um grande desconhecimento do processo, que levou à desvalorização e até mesmo desconfiança face ao mesmo.

valor. Há alguma desconfiança. A maior parte das colegas também não conhecem, não sabem como é.

Em suma, os diferentes stakeholders foram unânimes em afirmar que não houve uma plena integração do Centro Novas Oportunidades na escola em questão. O facto de o Centro Novas Oportunidades funcionar de forma autónoma, com uma organização própria e, sobretudo, destinado a um público específico e novo na escola poderá ter sido um dos fatores que levaram a essa separação. Os diferentes stakeholders continuaram a perspetivar a Iniciativa Novas Oportunidades como uma medida política que não terá continuidade nem mudará a visão do campo educativo contemporâneo. Talvez, também por isso, o Centro Novas Oportunidades não tivesse sido entendido como algo que devesse fazer parte integrante da escola, pois não foi considerado um elemento identificador da mesma.

O Projeto Educativo constitui um documento orientador fundamental para compreender todo e qualquer processo que decorre na escola, no sentido em que esclarece as finalidades e funções da escola, analisa problemas e recursos e propõe dinâmicas. O Projeto Educativo de Escola disponível à data de 10 de janeiro de 2010 é ainda o que tinha como vigência o triénio 2005-2008, sendo que o novo Projeto Educativo de Escola se encontrava ainda em fase de elaboração. O dito documento foi aprovado em 18 de Janeiro de 2006, ou seja, é ainda anterior à implementação do Centro Novas Oportunidades na escola, em setembro de 2006.

Do anteprojeto, disponível em 2010, destacava-se uma definição da escola em estudo sobretudo como uma escola secundária vocacionada para os Cursos Científico-Humanísticos. Mais uma vez, ao Centro Novas Oportunidades foi reservada uma referência breve, sem qualquer caracterização do mesmo.

Relativamente ao Centro Novas Oportunidades, o Projeto Educativo referia a necessidade de otimizar os canais de comunicação e a necessidade de formação complementar para os adultos. Todavia, não se previa nem na oferta formativa, nem nas estratégias, referências a uma forma de responder a estas necessidades.

O último Regulamento Interno da escola em análise tem a data de 27 de Maio de 2009, ou seja, cerca de três anos após a abertura do Centro Novas Oportunidades. Como tal, é um documento relevante para entendermos até que ponto a Iniciativa Novas Oportunidades foi assimilada pela escola. O item Centro Novas Oportunidades surgia com

um mesmo nível de titulação do que o Centro de Formação das Escolas, por exemplo, referindo-se o facto de, apesar de este ter um regimento interno próprio, o Plano Estratégico de Intervenção do CNO dever ser enquadrado no Projeto Educativo de Escola. No mesmo documento, em secção relativa ao Conselho Pedagógico, e quanto à composição do mesmo, referia-se a inclusão do Coordenador Pedagógico do CNO. Tendo em conta que o “Conselho Pedagógico é o órgão de coordenação e orientação educativa da Escola, nomeadamente nos domínios pedagógico-didáticos, de orientação e acompanhamento dos alunos e da formação inicial e contínua do pessoal docente e não-docente”, o facto do coordenador do CNO fazer parte da sua constituição revelava uma integração, a nível institucional pelo menos, da Iniciativa Novas Oportunidades na escola. Não eram feitas mais menções específicas ao Centro Novas Oportunidades ao longo do extenso documento que constitui o Regulamento Interno da Escola.

Em suma, o espírito inerente ao Projeto Educativo e ao Regulamento Interno enquadram-se naquilo que podemos reconhecer como princípios da Iniciativa Novas Oportunidades: a diversificação de públicos, a resposta à heterogeneidade dos alunos da escola e a abertura da escola ao meio envolvente. Todavia, não encontramos um claro e explícito assumir de educação de adultos, um dos eixos estruturantes da Iniciativa Novas Oportunidades, nos documentos orientadores da escola.

3. CONCLUSÕES

Os dados recolhidos através deste estudo de caso levam-nos a interrogarmo-nos acerca das questões organizacionais da escola.

Tendo em conta a evolução do pensamento sociológico sobre as organizações, verifica-se a passagem de uma visão ancorada nas perspetivas positivistas para uma multiplicidade de teorias que, no seu conjunto, remetem para definições de organização marcadas por conceitos como interação, símbolos, significados, contextos, dinâmicas, conflitos (Cano, 2003).

De facto, a perspetiva da escola como organização exclusivamente burocrática revelou-se insuficiente perante as evidências dos estudos empíricos sobre a escola. “Em termos de

desta forma, para um compromisso entre a perspetiva burocrática (a consideração das determinações formais e dos respetivos constrangimentos impostos) e uma perspetiva que pudesse contemplar a organização e os atores, a ação organizacional, outro tipo de estruturas e de regras, em suma, uma esfera de autonomia relativa ao nível da organização” (Lima, 2003, p.45). Olhar para a escola significa, por isso, olhar para os atores e para a forma como estes a perspetivam. Tudo o que acontece na educação deve ser compreendido tendo em conta a sua significação e implicação num contexto social mais amplo, o qual reflete, por sua vez, diferentes relações entre os atores. Segundo Lima (1994), as inovações têm-se realizado sobretudo por via legislativa, ignorando a perspetiva de vários atores educativos e menosprezando a sua resistência para concretizar a realidade normativa no quotidiano das instituições escolares.

Se olharmos para as dificuldades de integração do CNO na escola no estudo de caso acima referenciado, percebemos que a escola não se identificou com o projeto do Centro Novas Oportunidades. Este foi um projeto que funcionou nas instalações da escola, mas que não foi assimilado pela cultura organizacional da mesma. De facto, a estrutura organizacional é também uma estrutura de significados que podemos designar como cultura organizativa ou cultura institucional. A cultura é um sistema socialmente construído de crenças, valores, modos de perceber e interpretar a realidade e as normas que identificam os membros do grupo (Yáñez, J. et al, 2003). Numa escola que se define fundamentalmente como vocacionada para o prosseguimento de estudos, marcada pela tradição de um antigo liceu, existem dificuldades em integrar um Programa Educativo que defende, como vimos anteriormente, as competências adquiridas por vias informais e não-formais. O conflito entre a escola tradicional, historicamente fechada e pouco flexível, e uma perspetiva de educação que desafia essa mesma instituição escolar provoca tensões que se traduziram aqui na desconfiança dos próprios docentes da escola face ao trabalho desenvolvido pelos seus colegas no CNO.

Podemos estar, de facto, a falar de duas escolas que partilham o mesmo espaço físico. Duas escolas, visto que se referem a missões, valores, crenças, públicos, intervenientes e processos diferentes. Mas, sobretudo, por concebem a aprendizagem de forma divergente. Embora com certificações semelhantes, e refiro-me aqui especificamente ao Nível Secundário de educação, esses mesmos diplomas são perspetivados de forma diferente, sendo os certificados

obtidos através dos Processos de RVCC menos valorizados socialmente do que os obtidos após a frequência do ciclo secundário pelos jovens alunos. A própria Comissão Europeia reconhece que ainda existem barreiras culturais e atitudinais à validação de competências. As aprendizagens realizadas por via formal são ainda sobrevalorizadas face às aprendizagens não-formais e informais. Estabelecer uma confiança na validação das aprendizagens, reconhecendo a sua qualidade e legitimidade, tanto em termos de qualificações obtidas como dos próprios processos de validação, é ainda um desafio (Hawley, et al., 2010).

A natureza inovadora do modelo e da metodologia em que assenta o Processo de RVCC tende a fazer olhar para a mesma com alguma desconfiança e a procurar estabelecer comparações com as aprendizagens que são realizadas no ensino dito regular, frequentado pelos jovens, na prossecução dos mesmos patamares de qualificação. (…) Além disso, este processo contempla aprendizagens de natureza distinta, designadamente informais ou vivenciais, resultantes da experiência conferida pela vida, o que não sucede no ensino tradicional. Medir o seu valor implica pois sermos capazes de encontrar denominadores comuns que sejam válidos e aferíveis nestas duas realidades (Lima, 2012, p. 22-23).

A verdade é que romper com a tradição de uma escola secundária vocacionada para o prosseguimento de estudos superiores e abri-la a novas modalidades, a novos públicos e a novas inter- relações não é algo que se possa fazer do dia para a noite. É preciso dar tempo a todos os stakeholders para se adaptarem às novas realidades, integrando-as não só na sua atuação, na sua organização quotidiana, mas sobretudo no entendimento do que será o seu papel e o exercício das funções dentro e fora da sala de aula.

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