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4. O COTIDIANO DOS TRABALHADORES

4.1. INTEIRANDO-SE COM O CUIDADO: A ENFERMAGEM

A enfermagem naquele serviço era desempenhada por enfermeiras e auxiliares de enfermagem.

A rotina básica das enfermeiras, o cotidiano do trabalho, constituía-se em receber o paciente encaminhado pela recepção. Geralmente, este encaminhamento era procedido pessoalmente, ou seja, a recepcionista encaminhava o paciente até a consulta de enfermagem. Nesta consulta, são realizadas algumas rotinas de trabalho: pesagem, verificação da pressão arterial, etc. bem como a abertura do prontuário, que se constituirá no banco de dados do paciente, sendo este procedimento realizado manualmente. A partir desse momento o paciente é cadastrado para as devidas consultas no serviço ambulatorial, bem como nos programas desenvolvidos: assistência individualizada, doação de medicamentos, atenção domiciliar terapêutica (ADT) e cesta básica de alimentação.

Esta consulta com o profissional da enfermagem (enfermeiro) denomina-se de pré-consulta. A partir daí este paciente é encaminhado para o médico para a consulta clínica propriamente dita ou, ainda, pode ser encaminhado para o assistente social ou para o psicólogo - há também um encaminhamento, informal, para o advogado. O termo “informal” foi utilizado por designar que este ultimo profissional em questão não faz parte do quadro de funcionários do ambulatório, nem tampouco tem alguma vinculação empregatícia com a instituição mantenedora, no caso a secretaria municipal de saúde. Este serviço de cunho jurídico é prestado voluntariamente para alguma necessidade do paciente.

Esses encaminhamentos efetuados pelos trabalhadores da enfermagem a outros profissionais são feitos pessoalmente, ou seja, este profissional (enfermagem) leva o paciente até o outro profissional. Em outros casos, através do auxiliar de enfermagem.

Depois de outros atendimentos, este paciente retorna ao profissional de enfermagem (enfermeiro), que ocupa um papel central nas interações.

Bem o enfermeiro é aquele que articula as coisas, vai para um profissional e volta, vai para outro profissional e volta; eles devolvem para mim, depois do atendimento; com o médico ele também retoma para mim, onde então eu dou algumas orientações com relação a exames, aonde ele vai fazer, o que são estes exames, o que são as medicações, e então encaminho para o farmacêutico, por exemplo ou para outra necessidade.

As interações entre estes trabalhadores e os auxiliares de enfermagem se processam da seguinte.forma:

Com alguns profissionais este contato é bem legal. Assim, eu velo cada papel profissional dentro da unidade. Por exemplo, o meu contato com o auxiliar de enfermagem é íntimo. No sentido da gente tá sempre trocando, conversando, trocando informações sobre o paciente ou algum outro serviço.

É possível ainda dizer, segundo um dos atores, que “a enfermagem assume

um papel responsável pelo ambulatório”. Isso se deve à justificativa de que as

interações neste ambulatório iniciam-se a partir do médico, do enfermeiro e do auxiliar de enfermagem, sendo ainda hoje as interações mais freqüentes entre os profissionais da equipe: As pessoas com quem tenho mais contato são o médico e o

auxiliar. Porque o que eles exercem eu vou olhar. É mais importante para mim. Os outros profissionais não é tanto, só para ver se foram consultados.

Segundo estes próprios atores, é possível descrever as interações entre estes profissionais “como boas, mas não como ótimas”. Existem dificuldades no repasse de algumas atribuições com os outros trabalhadores, dentro do processo de trabalho. Outro aspecto pode ser descrito como as diferenças no grau de proximidade ou “intimidade” entre estes três profissionais com os demais:

Com o auxiliar de enfermagem é mais íntimo mas, as vezes, torna-se difícil nos entendermos pelas próprias exigências do trabalho. Mas, a gente tem muito contato. Com o médico, se a gente tem alguma dúvida, a gente vai lá, senta junto, conversa, parece ser mais próximo também. Com o assistente social é uma coisa assim de encaminhar, de rotina. Quando alguém tem necessidade eu sempre encaminho, porque me interessa o paciente num todo. As vezes, eu quero saber alguma coisa do paciente, que me diz que não tá bem, então, eu comento com o assistente social, dizendo que ele não tá bem, de poder ver o que tá detrás. Porque ele não consegue tomar o medicamento. As vezes, ele não tem o que comerem casa. Com o psicólogo é mais o encaminhar; eu vejo assim: o psicólogo no seu lado, mais dentro da sua sala. Porque a gente tá sempre circulado, trocando idéias. Com esse profissional não é tão íntimo assim.

A leitura do cotidiano dos auxiliares de enfermagem, mostrou um processo diário de busca de definição de uma identidade na equipe de saúde.

Uma das atribuições deste trabalhador está na prestação de um atendimento de atividades complementares e de execução das prescrições pelos profissionais de medicina e enfermagem: dados iniciais do prontuário, pesagem, medição da pressão arterial do paciente, ou seja, um atendimento preliminar da pré-consulta.

Segundo a descrição desses trabalhadores, bem como a observação do pesquisador, há indicativos de uma dificuldade, por parte deles, na definição de suas funções, no seu papel dentro da equipe:

Eu sou contratada como auxiliar de enfermagem. Enquanto auxiliar, existem umas funções que são prementes ao papel. Isso já passou. Eu mesma me vejo diferenciada dessa contratação. Hoje, aqui no ambulatório, eu não sei a função determinada. Há dúvidas. Por que? Quer dizer, você é auxiliar de enfermagem, no papel eu sei que sou. Só que ali, para aplicar isso, tem momentos que eu aplico: administração de medicamentos no paciente, receber este paciente, verificar o peso, pressão, ou seja, auxiliar na própria enfermagem. Conduzir o paciente para alguma consulta, para o médico ou outro profissional. Mas eu não me sinto definida.

Nesses últimos anos a equipe aumentou. Antes era o médico, a enfermeira e o auxiliar. Eram bem definidos os papéis. A gente sabia com quem interagia. Eu era auxiliar, fazia o papel de recepção, atendimento imediato. Passava para a enfermagem que passava para o médico. O médico me solicitava para acompanhá- lo, fazer o preenchimento de uma ficha. Eu fazia essa função. A í de repente veio mais outro enfermeiro, veio outros profissionais, psicólogos, assistentes sociais. Uma equipe maior. Cada um com funções que a gente sabe pelo senso comum. E aí, como eu me coloco nesse novo quadro? Bom, me dizem que minha função é muito importante, mas qual? Em reuniões eu me sinto perdida.

Mais ainda:

O entrosamento com o pessoal é um pouco difícil. Porque a gente não tem uma

atividade definida. Acaba fazendo tudo. Atendimento no balcão, medicamentos, o telefone. Nem dá para dizer. E os outros profissionais nem sempre ajudam. A minha atividade é fazer medicamentos, atender o paciente, não no balcão, mas no ambulatório. O balcão é para o agente administrativo.

As interações que este trabalhador mais estabelece são com o médico e o enfermeiro. Dependendo da situação, na execução de alguns procedimentos, de anotação de queixas ou sintomas expressos pelo paciente e repassados para o médico. Outra atividade exercida pelo auxiliar é a preparação de pacientes para exames ginecológicos. Segundo este ator observado (auxiliar): “o médico não gosta

que a gente saia da sala no atendimento com pessoas, então eu acompanho tudo, toda a consulta.”

No que se refere a qualidade dessas interações, este trabalhador afirma ser muito boa com o médico. Contudo, com os outros profissionais de enfermagem já teve dificuldades:

Bem eu já tive muita dificuldade até por esta questão de ser enfermeira e eu auxiliar: a questão do poder. Dela me passar a idéia de coordenar e na realidade não era assim. E esse não era o papel dela, era só de enfermeira. Então, nosso relacionamento tem sido muito difícil. No fundo, nós temos que trabalhar em conjunto. Agora a gente já sentou, conversou. Ela agora faz medicamentos também, porque era só eu e sozinha eu não dou conta. Eu não tava mais agüentando, em muito serviço. Porque o serviço de medicação tu tens que ficar a tarde inteira com o paciente. Com a assistente social me dou muito bem e com a psicóloga também. Entrou também uma atendente e a gente tá se dando bem.

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