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Quando se trata de propagação no ambiente marinho deve-se lidar com o fato de que uma de suas principais características é a interação com o fundo marinho.

Dependendo da frequência da onda sonora emitida pode haver a interação com a região de subsuperfície. Ao contrário da interface ar-água, devido ao contraste de impedância, a interface água-substrato permite além do espalhamento, também a transmissão da energia para a subsuperfície (mais detalhes são dados por Brekhovskikh e Lysanov [32]), como ilustra a Figura 2.3.

Para que os efeitos de interação com o fundo (reflexão, refração, atenuação, espalhamento) sejam corretamente identifi- cados, deve-se ter um conhecimento sobre o fundo marinho [7]. O fundo marinho é um contorno da mesma forma que a superfície da água, contudo, seus efeitos são mais complicados

devido à sua composição diversificada. Segundo Katsnelson et al. [7], a formação de uma plataforma continental pode definir se esta será estreita (poucos km) ou larga (de 100 a 200 km). Plataformas com baixa atividade tectônica (margens passivas) podem acumular grandes quantidades de sedimento e são largas. Já as plataformas com alta atividade tectônica (margens ativas) tendem a acumular menos sedimento e possuem uma menor extensão.

Fonte Coluna dʹágua

Subsuperfície

Figura 2.3.: Diagrama de espalhamento sonoro das interfaces ar-água e água-substrato.

Além disso, deve-se considerar a tipologia do substrato superficial de fundo encontrado. É normal que em regiões mais próximas à costa haja a deposição de sedimentos mais

grossos, devido ao fato de que a energia de onda de superfície2

é maior nessas regiões e este tipo de sedimento possui uma taxa de deposição superior às de sedimentos mais finos. Existem exceções quanto a presença de aporte sedimentar terrígeno por grandes bacias hídricas [7]. A Tabela 2.1, expõe algumas propriedades com valores típicos a respeito de substratos presentes no fundo marinho.

2É expressa pela capacidade de trabalho da onda superficial. É

teoricamente proporcional ao quadrado da altura da onda, que é um parâmetro de obtenção fácil. A maior parte da energia de onda do mar de uma região costeira é consumida no atrito com o fundo e na movimentação do substrato.

Tabela 2.1.: Valores típicos de propriedades para alguns substratos da plataforna continental. Adaptada de Hamilton

[33]. Substrato Diâmetro [mm] Dens. do grão [g/cm3] Poros. do grão [%] Veloc. do som [m/s] Areia grossa 0,5285 2,034 38,6 1836 Areia fina 0,1593 1,941 45,6 1749

Areia muito fina 0,0960 1,856 50,0 1702

Areia lamosa 0,0490 1,772 55,3 1646

Lama arenosa 0,0308 1,771 54,1 1652

Lama 0,0237 1,740 56,3 1615

Lama argilosa 0,0077 1,488 71,6 1549

Argila lamosa 0,0027 1,421 75,9 1520

É possível perceber que a densidade e a velocidade do som aumentam com o diâmetro dos grãos. Deve-se ressaltar que dados para sedimentos carbonáticos, cascalhos e alguns outros tipos distintos de substratos estão omitidos nesta tabela.

O fato de que ondas acústicas de alta frequência possuem grande interação com o fundo é uma característica tão impor- tante quanto a interação com o volume d’água do guia de onda. Os efeitos acarretados pela interação com o fundo são relacionados à difração, como a reflexão, a refração, a atenuação e o espalhamento do som [24], ilustrados na Fig. 2.4.

A forma com que interage com o fundo, as características da interface e o contraste de impedância entre água e substrato ditarão se a onda será transmitida ao fundo ou refletida à coluna d’água. Caso haja a transmissão para o substrato, as formações geológicas, camadas da subsuperfície, poderão refletir as ondas transmitidas. O sinal que retornará ao receptor será diferente do emitido pela fonte, fato este que permite a identificação das feições que interferiram na propagação sonora.

(a) Reflexão (b) Refração e atenua-

ção (c) Espalhamento

Figura 2.4.: Efeitos da interação do som com o fundo: (a) a onda refletida possui mesmo ângulo da incidente; (b) parte da onda é refletida, parte é transmitida e parte atenuada; (c) pela rugosidade do fundo, a onda incidente é refletida com diversos

ângulos e para várias direções.

Considerando dois meios diferentes com velocidades de propagação distintas, uma onda incidente na interface será parte refletida (com ângulo igual ao de incidência) e parte refratada/transmitida para o outro meio. O ângulo em que a onda será transmitida para o segundo meio pode ser obtido pela Lei de Snell:

sen(θ1)

c1

= sen(θ2)

c2 (2.8)

na qual θ1 e θ2 são os ângulos de incidência, do primeiro e do

segundo meio e c1e c2são as velocidades de propagação do som.

Já a amplitude da onda refletida ou transmitida, proporcionais aos coeficientes de reflexão e transmissão, é determinada pelo ângulo de incidência e das propriedades dos materiais envolvidos nos meios, descritas por meio da impedância acústica

característica (Z = ρ0c). Sob incidência normal, o coeficiente de

CR= Z2−Z1

Z2+Z1

, (2.9)

em que Z1e Z2são as impedâncias do meio 1 e 2. O coeficiente

de transmissão é dado por:

CT= 2Z1

Z2+Z1

=1−CR. (2.10)

A Figura 2.5 ilustra o coeficiente de reflexão obtido para

três tipos de substrato variando com o ângulo de ataque3. As

curvas foram obtidas com a implementação do modelo do Fluido Equivalente [24], que supõe que o substrato pode ser modelado como um fluido adjacente à coluna d’água. Considerou-se uma onda de frequência 100 Hz. O primeiro substrato é composto por rocha do tipo basalto com velocidade de propagação de

3750 m/s e densidade de 2557,5 kg/m3, o segundo é um

substrato composto por areia com velocidade de propagação de

1650 m/s e densidade de 2046 kg/m3, o terceiro tipo de substrato

modelado é composto por sedimento lamoso com velocidade de

propagação de 1470 m/s e densidade de 1534,5 kg/m3. Curvas

mais exatas são obtidas por outros modelos de propagação. Detalhes são encontrados em [34].

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 0,0 0,5 1,0 Ângulo de ataque [º] CR Rochoso Arenoso Lamoso

Figura 2.5.: Coeficiente de reflexão para três tipos de substrato. É possível notar na Figura 2.5 que quanto mais consolidado e

mais denso o substrato, mais da energia incidente da onda será refletida de volta à coluna d’água, principalmente em ângulos de ataque pequenos.

Quando há transmissão para a subsuperfície, propagam-se ondas cisalhantes, além das longitudinais. Isso porque fluidos não possuem rigidez ao cisalhamento, característica essencial para a propagação de ondas cisalhantes.

As feições não homogêneas (ondulações no leito, objetos, grãos sedimentares, fauna e flora) interferem na propagação da onda, causando reflexões, refrações e difrações com ângulos diversos, o chamado espalhamento do som. O espalhamento pode ocorrer devido ao encontro com a superfície d’água e de fundo, com objetos ou animais flutuantes na coluna d’água [30], ou no volume de subsuperfície. Como para o caso da sísmica a onda sonora possui, geralmente, um comprimento de onda maior que as heterogeneidades da água e volume de substrato esse efeito será percebido com mais força na interação da onda com a interface água-substrato.

Em casos em que há alto contraste de impedância acústica entre coluna d’água e substrato, muito do sinal acústico é refletido de volta para a coluna d’água e não penetra na região de subsuperfície. Para pesquisas em que deseja-se obter informações a respeito da subsuperfície, deve-se escolher uma faixa de frequência de trabalho que garanta a penetração das ondas no fundo [31].

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