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CAPÍTULO II FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Interdisciplinaridade e Recursos naturais

A partir das décadas de 1960 e 1970, a interdisciplinaridade ganhou ares propulsores arrojados no tocante às discussões sobre as questões ambientais ao redor do mundo. Problemática intensificada através dos debates acerca da Revolução Industrial.

Em decorrência da degradação ambiental, intensificada desde a segunda metade do século XX, a comunidade científica e as instituições de apoio ao ensino e à pesquisa tiveram de rever as suas práticas. Assim, geraram uma reformulação do campo científico, com a inclusão da interdisciplinaridade, na perspectiva de que os estudos e pesquisas que envolvam aspectos ambientais e formas de utilização dos recursos naturais devam ser realizados segundo bases conceituais e metodológicas interdisciplinares (CÂNDIDO, 2011).

Enquanto nos países centrais, instituições de pesquisa de cunho ambiental vêm se desenvolvendo há décadas, no Brasil apenas recentemente – basicamente nos últimos 11 anos

– a questão tem mobilizado conjuntamente profissionais das mais diversas ciências: Biólogos, Economistas, Geógrafos, Engenheiros, Antropólogos, dentre outros (ROCHA, 2003).

O propósito de integrar diferentes ramos do conhecimento científico e técnico em torno a um objetivo comum é anterior à demanda de produção de um saber interdisciplinar que propõe a problemática ambiental do desenvolvimento. Na verdade, a partir do momento em que a acumulação do capital exige a articulação funcional das ciências aos processos produtivos para elevar sua eficiência, os conhecimentos científicos não apenas surgem numa relação de verdade ou de conhecimento do real, mas também como força produtiva do processo econômico. (LEFF, 2010, p. 71).

A interdisciplinaridade caracteriza-se pela colaboração entre as disciplinas diversas de uma determinada ciência enriquecida nas trocas provenientes da reciprocidade. É o ponto de encontro ante os movimentos de renovação dos problemas de ensino e pesquisa e o avanço do conhecimento científico. A interdisciplinaridade permite reflexão aprofundada, crítica e salutar sobre o funcionamento do saber unificado, apoiando o movimento de ciência e pesquisa (CARVALHO et al., 2011). Constitui-se em uma necessidade epistemológica, uma consequência de uma realidade cada vez mais complexa e mutável (CÂNDIDO, 2011).

De acordo com Claude Raynaut (2011, p. 69):

Longe de ser doutrina ou ideologia, a interdisciplinaridade se caracteriza por gerar constante dúvida e estar em permanente construção. “As mudanças pelas quais as evoluções do conhecimento científico passa variam de amplitude e de ritmo segundo os períodos da história” [...] O movimento atual, dessa vez em âmbito mundial, apela por novos paradigmas, novas categorias de pensamento, novas metodologias de pesquisa e novas formas de ensino.

Ressalta-se assim, a importância do pensar e o agir interdisciplinar apoiados no princípio de que não existe uma única fonte de conhecimento, e sim interação com outras áreas, para se compreender a realidade e a forma como se apresenta.

A prática interdisciplinar nos envolve no processo de aprender a aprender, tornando-se cada vez mais importante termos uma formação com perspectivas crítico-reflexivo subsidiada por uma prática didático- pedagógica interdisciplinar que permita o desenvolvimento do cidadão criativo, pensante, analítico, crítico, flexível, ético e adaptável (CARVALHO et al., 2011, p. 8).

A justificativa para a busca da institucionalização das pesquisas e do pensamento interdisciplinar sobre a questão ambiental e seu rebatimento em uma possível legitimidade socialmente reconhecida, vem sendo construída em fundamentos de ordem moral (a responsabilidade social com o futuro), prática (a necessidade de se resolver problemas urgentes), estética (a prerrogativa da contemplação da natureza) ou política (atendimento à crescente demanda social por bens “naturais”), bem como na combinação desses vários fundamentos ao mesmo tempo e em um mesmo movimento (FERREIRA, 2000).

Certamente, a ambição da cooperação interdisciplinar situa-se no plano da ciência: ela visa a produção de saberes inacessíveis às disciplinas isoladas. Mas, para esse fim, necessita do suporte de uma organização diferente daquela que prevalece no âmbito das disciplinas (GODARD, 2002, p. 322).

Para assumir uma postura interdisciplinar é necessária a compreensão na medida em o fenômeno da interdisciplinaridade vai sendo conhecido e criticado ao nível teórico e prático, em articulação permanente. Esse contexto coloca de forma mais atenta a realidade de sua construção demandada pela articulação de especialistas de várias áreas do conhecimento confrontados pelos paradigmas dominantes da racionalidade.

Não se questiona mais a importância da interdisciplinaridade como maneira de minimizar as relações de causa-efeito dos saberes disciplinares, visto que, quando se fala de ciência, fala-se a partir de uma perspectiva identificadora do campo simbólico, cujos mecanismos são constitutivos de uma cultura científica moderna e tecnológica, com um ethos científico já construído (FLORIANI, 2000).

A cientifização da produção transformou os processos tecnológicos em objetos de uma integração multidisciplinar do saber científico e técnico, antes que a problemática ambiental exigisse participação de diversas disciplinas para compreender e agir sobre um objeto prático complexo: o ambiente (LEFF, 2010, p. 71, grifo nosso).

A busca pela interdisciplinaridade implica na inter-relação de processos, conhecimentos e práticas a partir da colaboração de profissionais com diferentes formações disciplinares, pautada na necessidade de voltar a uma reflexão crítica sobre os marcos conceituais e as bases epistemológicas que podem impulsionar uma prática da

interdisciplinaridade mais aprofundada e mais bem fundamentada em seus princípios teóricos e metodológicos, orientada ao manejo, gestão e a apropriação dos recursos naturais (LEFF, 2000).

Para Raynaut (2011), a aplicação da interdisciplinaridade no campo ambiental está situada na interface dos sistemas sociais e naturais, o que compreende as diversas formas de interação entre as atividades humanas e o meio natural, o que exige a utilização de recortes temáticos das ciências sociais e humanas e das ciências da vida e da natureza.

Dentro desse campo de pensamentos, Floriani (2000) destaca a dificuldade de determinar com exatidão o que faz mudar as bases epistemológicas do saber científico, demonstrando que o desafio do cientista de hoje é ousar transpor a repetição, alterando os procedimentos convencionais na (re) produção do conhecimento, buscando a fonte de sua imaginação em diversos referenciais cognitivos; não apenas naquele de sua disciplina específica, como também nos de natureza estética, ética, nos conhecimentos espontâneos, especialmente naqueles profundamente arraigados na cultura dos povos, recriando e restabelecendo o que foi esquecido pelos procedimentos da racionalidade instrumental da modernidade, com vistas a restituir às culturas o reconhecimento de sua sabedoria, fazendo autocrítica dos erros cometidos, conhecendo e reconhecendo os problemas do mundo a partir de uma reforma de pensamento, já que a relação do homem com a natureza não pode ser nem simples nem fragmentada, no intuito de conhecer e reconhecer os problemas do mundo a partir de uma reforma do pensamento.

A crise ambiental remete-nos a uma pergunta sobre o mundo, sobre o ser e o saber que nos leva a repensar e a reaprender o mundo (LEFF, 2010). Pois como indica Heidegger, “estamos a serviço do pensar apenas quando nos voltamos com o pensar para o já pensado” (HEIDEGGER, 1957/1988: 97 apud LEFF, 2010, p. 196), e “aprender é sempre aprender a conhecer” (HEIDEGGER, 1962/1975: 67 apud LEFF, 2010, p. 196).

De um modo geral, toda a problemática interdisciplinar deve emergir da confrontação das visões disciplinares, que modificam obrigatoriamente a visão particular de uns e de outros sobre os conceitos utilizados, os métodos escolhidos, os instrumentos empregados, as estratégias de amostragem.

Fio condutor da pesquisa, a problemática comum deve ser entendida como um conjunto articulado de questões formuladas pelas diferentes disciplinas envolvendo um tema e um objeto comum (ZANONI, p. 116).

Desse modo, o pensar interdisciplinar parte do princípio de que nenhuma forma de conhecimento é em si mesma racional. Tenta, pois, o diálogo com outras formas de conhecimento, deixando-se interpenetrar por elas. Um pensar nesta direção exige um projeto em que a causa e intenção coincidam. Um projeto interdisciplinar de pesquisa deve então, captar a profundidade das relações conscientes entre pesquisadores.

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