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A INTERFACE PSICOLOGIA E SERVIÇO SOCIAL

No documento MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2010 (páginas 36-40)

Para compreender a interface estabelecida nesta pesquisa, entre a psicologia e o serviço social, é necessário um breve histórico da psicologia como ciência.

Desde Descartes, que postula a separação mente-corpo, a fisiologia e a anatomia passaram a contribuir para a psicologia como ciência. Com isso, a psicologia, que era estudada por filósofos, passou a ser investigada também pela fisiologia e pela neurofisiologia.

No Brasil, foram os médicos que estimularam e popularizaram a ciência psicológica numa época de nacionalismo exacerbado, em que se pretendia contribuir para a transformação do país em uma grande nação.

Dessa forma, desde o início, a vertente da psicometria foi privilegiada, já que os médicos reconheciam a psicologia como uma importante aliada no trabalho de classificar a população conforme suas aptidões e habilidades cognitivas.

A profissão se consolidou com o primeiro curso de psicologia no Brasil, em 1958, na Universidade de São Paulo. E foi regulamentada pela Lei 4.119 de 27/8/1962.

Os primeiros cursos tinham como base teórica e metodológica os modelos importados dos Estados Unidos. Havia pouca participação das produções europeias.

Paralelamente, a formação das primeiras turmas de psicólogos brasileiros ocorria em cenário nacional e internacional; o surgimento de conflitos sociais, impulsionados pela insatisfação frente à repressão que fazia parte das ações do Estado. Assim, em meados da década de 1960, a profissão acena para práticas mais voltadas à mobilização social.

A psicologia passou a ter envolvimento e participação política nos movimentos sociais. Eram os primeiros passos para o surgimento do que, hoje, denominamos psicologia comunitária.

Em meados dos anos 1980, com a criação da Associação Brasileira de Psicologia Social (Abrapso), instaura-se um marco importante da psicologia social no Brasil. No entanto, urgia a necessidade de repensar os aspectos metodológicos que regiam a ação profissional no contexto da comunidade. O homem passou a ser considerado em seu contexto sócio-histórico.

Muito se avançou no que diz respeito ao desenvolvimento da prática da psicologia. No entanto, os modelos teóricos e metodológicos para a preparação do futuro profissional de psicologia pouco mudou se comparado ao modelo desenvolvido nas primeiras décadas do estabelecimento da profissão no país.

Nos bancos acadêmicos, o universo discente dos cursos de psicologia ainda conhece muito pouco, ou quase nada, das reais condições e tampouco se percebem como sujeitos que podem colaborar para o desenvolvimento de uma consciência crítica nas pessoas com as quais irão atuar no cotidiano profissional.

Sob essa perspectiva, percebe-se que a formação do psicólogo, desde seu início, esteve voltada para o campo da clínica, que se sustenta, até os dias de hoje, em um modelo especifico de atuação cujo enfoque teórico e técnico privilegia o indivíduo e suas particularidades.

Considerando a grade curricular da maioria das universidades do país, nota- se que, ainda hoje, é na área clínica que se concentra a maior carga horária nos cursos de graduação, o que mostra uma desconexão entre a formação e a necessidade de atuação dos psicólogos no contexto social brasileiro. As instituições de formação profissional visam a atender a um imediatismo mercadológico.

Por sua formação, o psicólogo está habilitado a atuar em diversas áreas. Porém, conforme aponta Gomide (1984, apud Cambaúva et al., 1998, p. 213), há deficiências na formação acadêmica em psicologia: "Não estamos formando profissionais capazes de construir a psicologia, mas apenas de repeti-la, pois o estudante apenas aprende técnicas e busca o cliente para aplicá-las".

Alguns autores contemporâneos, como Neto (2002), mencionam a ruptura artificiosa que o universo psi tende a fazer com o contexto sócio-histórico. No

entanto, na prática cotidiana, evidencia-se que uma parcela de psicólogos apresenta preocupação em aplicar técnicas e métodos sem levar em conta a realidade e as condições em que o indivíduo se insere, restringindo-se apenas a interpretar os fenômenos psicológicos isoladamente. Os problemas apresentados passam a ser interpretados como crises individuais, ignorando-se que possam ser decorrentes de suas condições sociais, que acobertam a realidade de vida e retornam ao indivíduo a total responsabilidade pelo seu bem-estar.

Neste sentido, é preciso que haja uma mudança de paradigma, em que o psicólogo não use o “psicologismo” e passe a assumir plenamente um novo papel ético-político em sua atuação.

Para Gomide (1988), os psicólogos brasileiros são profissionais com formação tecnicista e com preocupações mais voltadas para a doença do que para a saúde, direcionando assim intervenções centradas no indivíduo que está sofrendo e não nas condições ou variáveis que determinam o seu sofrimento.

Com base nesse contexto histórico da formação em psicologia, fica evidente que existiam lacunas teórico-metodológicas para o tipo de intervenção proposta nesta pesquisa. Havia a necessidade de recorrer a outras áreas do conhecimento que dialogassem com a temática.

Porém, havia uma preocupação eminente: “Como realizar um trabalho clínico no contexto comunitário, sem reproduzir ações paternalistas e assistencialistas, que tendem à manutenção do individualismo e da fragmentação do sujeito e aplacam a possibilidade de desenvolvimento de uma consciência crítica?”. Ou, ainda, “como não interpretar e psicologizar o que é social?”.

Como abarcar o sofrimento social e contribuir para a construção de ações que possam potencializar os sujeitos e preservar suas raízes sociais e culturais? Era possível uma intervenção na área da psicologia, com viés clínico, que tivesse uma dimensão sociopolítica?

Concluiu-se que os conhecimentos da psicologia não dariam conta de compreender a demanda daquelas crianças. Com isso, foi preciso, então, recorrer a

outras áreas do conhecimento que tratavam do tema e tentar estabelecer um diálogo teórico-metodológico, que pudesse dar sustentabilidade às intervenções e focassem a escuta da criança no contexto institucional em que elase inseria.

Eclodiu, assim, o desejo e a necessidade de associar os conhecimentos da psicologia clínica aos conhecimentos do serviço social – campo fecundo de atuação profissional com dimensões sociopolítcas –, razão pela qual a pesquisa ora realizada se deu no campo do serviço social.

No documento MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2010 (páginas 36-40)

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