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4.1 INTERPRETAÇÃO SOBRE A VONTADE LEGISLATIVA: ALTERAÇÕES NA SEARA TRIBUTÁRIA QUANTO A SUJEIÇÃO PASSIVA/RESPONSABILIDADE

TRIBUTÁRIA

Conforme apresentado no Capítulo III, o Código Tributário Nacional é a norma responsável por disciplinar aspectos gerais sobre tributos no sistema juríd ico brasileiro. A norma, mesmo sendo originalmente uma lei ordinária, fora recepcionada pela Constituição, em razão da matéria, como lei complementar. Por isso, uníssona é a posição de que o CTN é uma lei complementar ratione materiae. Uma vez caracterizada desta forma, conforme palavras de Sacha Calmon52, ―suas regras somente podem ser alteradas por outras leis complementares da Constituição‖.

A base constitucional para essa possibilidade jurídica encontra-se consagrada no inciso III do art. 146 da Constituição da República. Este determina, nas alíneas ―a” e “b”53, que a lei complementar será responsável em disciplinar sobre normais gerais em matéria tributária,

52 CA LMON, Sacha, ob. cit., pp. 357 53 Art. 146. Cabe à lei co mplementar:

(...)III - estabelecer normas gerais em matéria de leg islação tributária, especialmente sobre:

a) defin ição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

especialmente sobre a definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos, obrigações tributárias, fatos geradores, bases de cálculo, contribuintes etc.

Assim é o que acontece com o IPTU no CTN. Seus fatos geradores, sua base de cálculo e, principalmente, os seus sujeitos passivos estão expressamente elencados.

Dessa forma, a Lei 9.514/97, que é ordinária, não possui competência para tratar sobre responsabilidade de débitos tributários, pois viola expressamente a determinação constitucional sobre a necessidade de lei complementar disciplinando a matéria, nos moldes do art. 146 da Constituição da República, o que acarretaria a INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL do §8º do art. 27 da Lei 9.514/97.

Em caso análogo, o STF, por unanimidade, posicionou-se pela inconstitucionalidade formal do artigo 13 da Lei ordinária nº 8.620/93, que atribuía responsabilidade tributária imediata aos sócios por dívidas da sociedade com a Seguridade Social, por violação ao disposto no artigo 146, inciso II, alínea “b” da Constituição Federal. Destacamos abaixo parte da ementa do acórdão, podendo seu inteiro teor ser encontrada no Anexo deste trabalho monográfico (Anexo 2):

DIREITO TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO. ART 146, III, DA CF. ART. 135, III, DO CTN. SÓCIOS DE SOCIEDADE LIMITADA. ART. 13 DA LEI 8.620/93. INCONSTITUCIONALIDADES FORMAL E MATERIAL. REPERCUSSÃO GERAL. APLICAÇÃO DA DECISÃO PELOS DEMAIS TRIBUNAIS. 1. Todas as espécies tributárias, entre as quais as contribuições de seguridade social, estão sujeitas às normas gerais de direito tributário. 2. O Código

Tributário Nacional estabelece algumas regras matrizes de responsabilidade tributária, como a do art. 135, III, be m como diretrizes para que o legislador de cada ente político estabeleça outras regras específicas de responsabilidade tributária relativamente aos tributos da sua competência, conforme seu art. 128. 3. O preceito do art. 124, II, no sentido de que são solidariamente obrigadas “as pessoas expressamente designadas por lei”, não autoriza o legislador a criar novos casos de responsabilidade tributária sem a observância dos requisitos exigidos pelo art. 128 do CTN, tampouco a desconsiderar as regras matrizes de responsabilidade de terceiros estabelecidas em caráter geral pelos arts. 134 e 135 do mesmo diploma. (...) 4. A responsabilidade tributária pressupõe duas normas

autônomas: a regra matriz de incidência tributária e a regra matriz de responsabilidade tributária, cada uma com seu pressuposto de fato e seus sujeitos próprios. A referência ao responsável enquanto terceiro (dritter Persone, terzo ou tercero) evidencia que não participa da relação contributiva, mas de uma relação específica de responsabilidade tributária, inconfundível com aquela. O ―terceiro‖ só pode ser chamado responsabilizado na hipótese de descumprimento de deveres próprios de colaboração para com a Administração Tributária,

estabelecidos, ainda que a contrario sensu, na regra matriz de responsabilidade tributária, e desde que tenha contribuído para a situação de inadimplemento pelo contribuinte. 5. O art. 135, III, do CTN responsabiliza apenas aqueles que estejam na direção, gerência ou representação da pessoa jurídica e tão-somente quando pratiquem atos com excesso de poder ou infração à lei, contrato social ou estatutos. Desse modo, apenas o sócio com poderes de gestão ou representação da sociedade é que pode ser responsabilizado, o que resguarda a pessoalidade entre o ilícito (má gestão ou representação) e a consequência de ter de responder pelo tributo devido pela sociedade. 6. O art. 13 da Lei 8.620/93

não se limitou a repetir ou detalhar a regra de responsabilidade constante do art. 135 do CTN, tampouco cuidou de uma nova hipótese específica e distinta. Ao vincular à simples condição de sócio a obrigação de responder solidariamente pelos débitos da sociedade limitada perante a Seguridade Social, tratou a mesma situação genérica regulada pelo art. 135, III, do CTN, mas de modo diverso, incorrendo em inconstitucionalidade por violação ao art. 146, III, da CF.

(RE 562276, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 03/11/2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-027 DIVULG 09-02- 2011 PUBLIC 10-02-2011 EMENT VOL-02461-02 PP-00419 RDDT n. 187, 2011, p. 186-193 RT v. 100, n. 907, 2011, p. 428-442)

Outra questão vinculada ao art. 27 §8º da Lei 9514/97, é relacionada a sua INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL.

Em primeiro lugar, é necessário fazer a ressalva que este parágrafo em destaque inicia seu texto utilizando uma variação do verbo ―responder‖, no entanto, nos parece, após o estudo aqui apresentado, que a norma tenha pretensões de, na verdade, condicionar a escolha do Ente Fiscal na identificação do sujeito passivo do IPTU e não tratar, especificadamente, sobre a matéria de responsabilidade tributária.

Independente se o parágrafo tem a pretensão de alterar sujeição passiva do IPTU ou afastar a previsão de responsabilidade solidária prevista no art. 124 do CTN54, há uma violação material a Constituição no que tange ao art. 156, I.

Como já apresentado, aos Municípios foi atribuída a competência constitucional exclusiva para legislar sobre o IPTU. A lei municipal deve se espelhar nos ditames da no rma geral tributária, o CTN, que por sua vez deve respeito a Constituição.

Dessa forma, não poderia uma lei federal de competência da União usurpar a prerrogativa que é atribuída exclusivamente aos municípios e disciplinar sobre matéria que lhe é estranha. São

54 Art. 124. São solidariamente obrigadas:

os municípios os entes competentes para disciplinar sobre sujeição passiva e/ou responsabilidade tributária no caso do IPTU, sempre respeitando os limites previstos nas leis hierarquicamente superiores.

Além disso, de acordo com a jurisprudência pacifica do STJ e o posicionamento majoritário da doutrina, a lei civil não pode limitar a autonomia da autoridade fiscal em escolher sobre qual sujeito serão propostas suas ações. No momento que o parágrafo 8º do art. 27 da Lei 9.514/97, determina, por exemplo, que os débitos, anteriores a imissão da posse do credor, serão somente de ―responsabilidade‖ do devedor-fiduciário, acaba por violar os arts. 34 e 124 do CTN. Dessa maneira, a presente ilegalidade poderia ―qualificar‖ a flagrante inconstitucionalidade MATERIAL da norma.

Outro aspecto controverso reside no fato de que a natureza propter rem da obrigação tributária do IPTU, como apresentado, acompanha o bem imóvel e não o seu proprietário. Assim, caso o devedor não honre com o seu compromisso fiscal e forem, por conseguinte, constituídos créditos tributários, estes seriam de responsabilidade integral do credor, salvo na existência de documento hábil comprovando a sua quitação, nos moldes do art. 130 do CTN.

Neste sentido, a disposição de que o fiduciário somente responde por débitos posteriores a sua imissão é legítima apenas para os casos aonde conste a prova da quitação do imposto. Para os casos sem esta comprovação, o credor ao adquirir o bem, deverá responder sobre a integralidade dos débitos, sob pena de violação ao art. 130 do CTN, assumida com a satisfação da condição resolutória.

4.2 - INTERPRETAÇÃO SOBRE A VONTADE LEGISLATIVA: MERA