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Interpretações possíveis para os resultados do Ideb – Anos Iniciais

O Índice de Desenvolvimento de Educação Básica – Ideb, embora receba muitas críticas, tem se apresentado como um importante indicador da qualidade da educação pública no Brasil. A partir dele, uma série de diagnósticos pode ser produzida, e essas informações têm sido utilizadas para dar lastro a um conjunto amplo de ações em termos de políticas públicas educacionais. Ao conjugar o desempenho (em Língua Portuguesa e Matemática) e o fluxo, o Ideb se apresenta como uma importante medida para monitorarmos a qualidade do ensino que oferecemos. Mesmo reconhecendo a importância que o Ideb pode ter para nossa educação, fica parecendo que o índice não leva em consideração o Ciclo de Alfabetização. Por não apresentar valores e metas, a impressão é que essa etapa de escolaridade não é abarcada pelo Ideb. Contudo, vale lembrar, a medida de fluxo que o Ideb utiliza diz respeito ao fluxo de todo o ciclo, e não apenas de uma série. Quando falamos de fluxo para calcular o Ideb do 5º ano, está sendo computado o fluxo de todos os anos do Ensino Fundamental, do 1º ao 5º. E o mesmo se dá com o 9º ano e com o 3º ano do Ensino Médio. Além disso, o desempenho é uma medida produzida a partir do desenvolvimento de habilidades e competências previstas em uma Matriz de Referência de base curricular, que pode ser interpretada tendo em vista uma Escala de Proficiência. Pela pró- pria natureza da organização do conhecimento sistematizado, que pauta o trabalho da escola, não é possível conceber que o desempenho se refira, única e exclusivamente, a habilidades específicas de uma etapa de escolaridade, como o 5º ano, por exemplo. Assim, quando se ava- lia o desempenho do 5º ano, em última instância, todos os anos precedentes estão, de alguma maneira, sendo avaliados. As habilidades apresentam diferentes graus de desenvolvimento e maturação, e, por isso, não simplesmente “aparecem” em uma etapa de escolaridade. O apren- dizado de etapas anteriores é fundamental para seu desenvolvimento.

É com base nessa concepção que podemos propor o uso dos dados do Ideb como instrumento de auxílio para a interpretação dos problemas que afetam a Alfabetização. Embora, não possua, em sua configuração atual, metas para o Ciclo de Alfabetização, os valores do Ideb podem se apresentar como um norte para a avaliação de problemas ligados à Alfabetização no Brasil. Como faz referência aos anos anteriores, o Ideb também é um indicador para a qualidade dos três primeiros anos do Ensino Fundamental. A tabela a seguir mostra os valores e as metas do Ideb, entre 2005 e 2013.

TABELA 1: IDEB OBSERVADO E METAS – BRASIL – ANOS INICIAIS   Ideb Observado Metas

Edição 2005 2007 2009 2011 2013 2007 2009 2011 2013 2021 Total 3.8 4.2 4.6 5.0 5.2 3.9 4.2 4.6 4.9 6.0 Dependência Administrativa Estadual 3.9 4.3 4.9 5.1 5.4 4.0 4.3 4.7 5.0 6.1 Municipal 3.4 4.0 4.4 4.7 4.9 3.5 3.8 4.2 4.5 5.7 Privada 5.9 6.0 6.4 6.5 6.7 6.0 6.3 6.6 6.8 7.5 Pública 3.6 4.0 4.4 4.7 4.9 3.6 4.0 4.4 4.7 5.8 Fonte: Inep; tabulação própria.

A partir da análise dos dados do Ideb para os anos iniciais, podemos observar que o Brasil (no quadro, exposto na linha Total) vem atingindo as metas estabelecidas para essa etapa de esco- laridade. Entre 2005 e 2011, o país, a cada biênio, conseguiu ter um crescimento de 0.4 ponto na escala do Ideb, que, vale lembrar, varia de 0 a 10. De 2007 a 2013, portanto, as metas para o primeiro ciclo do Ensino Fundamental foram atingidas, e o resultado de 2013, 5.2, supera em 0.3 ponto a meta para o referido ano. Ao todo, entre 2005 e 2013, o resultado do Ideb experimentou um aumento de 1.4 ponto, saindo de 3.8 em 2005.

A análise dos resultados das avaliações em larga escala sempre permite uma miríade de pos- sibilidades. O foco pode recair sobre um diverso conjunto de elementos. Quando observamos o Brasil, tomado como um todo, por exemplo, notamos que houve melhora desde a criação do Ideb, e que, caso o crescimento se mantenha dessa forma, o país não terá problemas em atingir a meta 6, estabelecida para o ano de 2021. Contudo, é preciso ressaltar que, quanto melhores são os resultados, mais difícil é produzir melhorias significativas. Isso significa que o crescimento que o Ideb dos anos iniciais experimentou até 2013, dificilmente, ocorrerá, na mesma medida, nos próximos anos. Observando somente os números em si, essa percepção talvez não salte aos olhos. Entretanto, é preciso levar em consideração que os esforços, em termos de ações e políticas, para melhorar um Ideb de 3.8, levando a 4.2 (2007), são diferentes daqueles necessá- rios para elevar um Ideb de 5.2.

Como o Ideb leva em consideração o desempenho e o fluxo escolar, a melhoria conjunta dos dois indicadores é que permite uma melhoria sólida do índice. Contudo, é forçoso reconhecer que, em algum momento, a melhoria do fluxo escolar vai parar de acontecer, com os indicadores se estabilizando. Como o Brasil é um país com significativos percentuais de reprovação, ainda é possível pensar em ações para contornar esse problema, aumentando, consequentemente, o valor do Ideb. Entretanto, o fluxo não possibilitará mais melhorias. Quanto ao desempenho, de maneira análoga ao que foi dito em relação ao fluxo, ele ainda pode ser melhorado significati- vamente, visto que seus valores estão aquém do esperado. E quanto mais se eleva o desem- penho, maior o esforço necessário para elevá-lo, aumentando os desafios para os profissionais envolvidos com a educação. Basta que se pense em termos de conteúdo e não apenas nos números.

Os valores do Ideb, assim como os de outros indicadores educacionais, podem ser traduzidos pedagogicamente. Com isso se quer dizer que eles significam mais do que apenas números em escalas. Ao afirmar que o Ideb do Brasil, em 2005, era de 3.8, não se faz apenas uma afirmação matemática, mas, antes, pedagógica. Com esse valor, é possível perceber que o país apresen- tava problemas sérios em relação ao desempenho de seus estudantes e também em relação ao fluxo escolar. Para corrigir esses problemas, baixo desempenho e altas taxas de reprovação e/ou evasão, uma série de medidas pode ser pensada. E elas irão variar de acordo com o peso que esses problemas têm para a determinação do valor final do Ideb.

Peguemos um exemplo. Em 2013, o Ideb da rede pública brasileira foi de 4.9, nos anos iniciais. Para chegar a esse valor, o desempenho médio conjugado foi de 5.33, ao passo que o fluxo

foi de 0.92 (ou seja, uma taxa de 92% de aprovação). Por mais que se pense em mecanismos de reduzir, ainda mais, a taxa de reprovação para o primeiro ciclo do Ensino Fundamental, eles não impactariam tanto no valor final do Ideb dos anos iniciais. Se, por exemplo, um conjunto de ações destinado a melhorar o fluxo nessa etapa de escolaridade tivesse, de fato, seus efeitos nesse indicador, elevando-o a 0.97 (ou seja, com uma taxa de 97% de aprovação), o valor final do Ideb, mantido o desempenho médio em 5.33, seria de 5.17, uma diferença pequena em relação ao valor atual do índice.

Pensemos, agora, no Ciclo de Alfabetização. Muito se discutiu, no Brasil, sobre a ideia de um ciclo destinado à alfabetização, no lugar da organização seriada, permitindo que se acompanhe, ao longo de, pelo menos, três anos, o desenvolvimento dos estudantes, e fazendo as inter- venções pedagógicas necessárias, de modo a garantir a alfabetização plena até os 8 anos de idade. Essa proposta exige que se encare o ciclo como um todo, dando ênfase ao processo de correção das dificuldades dos estudantes com a alfabetização ao longo do processo, mas não trabalhando com a ideia de reprovação dentro do ciclo. Muitos professores discordam dessa proposta, afirmando que sua consequência mais imediata é a criação, no sistema educacional brasileiro, de uma espécie de promoção automática. A despeito da proposta de organização cíclica não ser essa e da prática nem sempre se coadunar com o que foi proposto, o fato é que o fluxo escolar do primeiro ciclo do Ensino Fundamental tem seu maior peso em virtude das re- provações nos 4º e 5º anos. A organização cíclica, entre outras coisas, foi pensada para corrigir o fluxo nos anos iniciais, que, no Brasil, sempre foi pautado por altas taxas de reprovação. Sendo assim, cabe o questionamento sobre como ainda é possível aumentar o fluxo, reduzindo a re- provação para a etapa. Fica nítido que, para melhorar os indicadores de qualidade da educação para essa etapa de escolaridade, o fluxo apresenta um peso menor do que o desempenho. Ain- da é possível promover melhorias no fluxo, como mostra o exemplo apresentado anteriormente em relação à rede pública brasileira, mas mesmo tal melhoria teria pouco impacto no avanço dos resultados do Ideb.

Com isso, ganha ênfase o desempenho. Como medida articulada à aprendizagem, é a melhoria da qualidade do ensino que pode fazer alavancar, sem se descuidar, evidentemente, das taxas de aprovação, os resultados do Ideb, caminhando em direção ao cumprimento das metas. E para que o desempenho possa refletir, de fato, uma melhoria no primeiro ciclo do Ensino Funda- mental, os processos de alfabetização desempenham um papel crucial.

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