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Mapa 5 Imagem aérea do roteiro da viagem formativa

6 FORMAÇÃO DE PROFESSORES: UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA

6.2 INTERVENÇÃO, COLABORAÇÃO E SABERES DOCENTE

Nesta etapa, a pesquisa ganha caráter de aproximação à modalidade de pesquisa intervenção (ROCHA; AGUIAR, 2003) com ações colaborativas (DAMIANI, 2013; FREITAS, 2010). Este caráter está apoiado no processo de diálogo estabelecido entre os pesquisadores e os professores cursistas no período das intervenções pedagógicas, isto é, configuramos a pesquisa como intervenção, pois parte dela ocorreu no curso de extensão. As ações colaborativas ocorreram a partir do diálogo estabelecido e também pelo material educativo elaborado que passou pela avaliação e validação dos cursistas, com o intuito de gerar adequações e alterações às necessidades percebidas pelos educadores em formação.

Destacamos ainda que “O processo de formulação da pesquisa-intervenção aprofunda a ruptura com os enfoques tradicionais de pesquisa e amplia as bases teórico-metodológicas das pesquisas participativas, enquanto proposta de atuação transformadora da realidade sócio-política” (ROCHA; AGUIAR, 2003, p. 67).

Nossa escolha se justifica, primeiramente, por estarmos situados em um mestrado profissional em Ensino de Humanidades e, por isso, espera-se a contribuição das pesquisas deste tipo de mestrado para a transformação da práxis docente. Em segundo lugar, justifica-se pela

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incompatibilidade das pesquisas sociais com as propostas de cunho meramente quantitativo, como ressalta Duque-Arrazola, ao dizer que a “[...] pesquisa participativa se inscreve, por assim dizer, em um amplo movimento, nas ciências latino-americanas, de reação e recusa ao predomínio esterilizante do positivismo empirista da prática das ciências sociais” (DUQUE- ARRAZOLA, 2014, p. 132). Cabe salientar que não são todas pesquisas quantitativas que tem caráter positivista, pois o levantamento de dados é de grande relevância para subsidiar análises e, ainda, que a lógica dialética não é dicotômica, visto que um de seus preceitos é a identidade dos contrários, isto é, os opostos formam uma unidade que é indissociável (MARTINS, 2015). Nesse sentido, nossa pesquisa está sustentada pelo método materialista histórico e dialético que oferece instrumentos valiosos para a compreensão e aproximação do real concreto. Assim, nos debruçamos na dialética e, consequentemente, nas suas categorias (contradição, totalidade e historicidade) e no “[...] reconhecimento das múltiplas determinações materiais que condicionam o objeto de pesquisa” (RODRÌGUEZ, 2014, p. 150).

Dessa forma, nossa proposta de formação é subsidiada pela teoria preconizada por Demerval Saviani, pois ela se assenta e se inspira nos princípios filosóficos do materialismo histórico e dialético. De tal modo, entendemos que, na busca por “[...] compreender as determinações que se ocultam sob as aparências dos fenômenos que se manifestam empiricamente à nossa percepção” (SAVIANI, 2015, p. 36), faz-se necessário o uso do método marxiano, para que “[...] partindo dessa aparência, alcançar a essência do objeto de estudo, capturar sua estrutura e dinâmica, bem como suas múltiplas determinações” (LAVOURA; MARSIGLIA, 2015, p. 352). Nesse processo de desvelar a aparência da prática social, a educação tem a função essencial de mediação, visto que o ser humano é um ser social, dependente do outro para se desenvolver. Nesse sentido, notamos a importância de se pensar no processo formativo de professores na perspectiva Histórico-Crítica.

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Saviani afirma que

Se a educação é mediação no seio da prática social global, e se a humanidade se desenvolve historicamente, isso significa que uma determinada geração herda da anterior um modo de produção com os respectivos meios de produção e relações de produção. E a nova geração, por sua vez, impõe-se a tarefa de desenvolver e transformar as relações herdadas das gerações anteriores. Nesse sentido, ela é determinada pelas gerações anteriores e depende delas. Mas é uma determinação que não anula a sua iniciativa histórica, que se expressa justamente pelo desenvolvimento e pelas transformações que ela opera sobre a base das produções anteriores. A educação, na medida em que é uma mediação no seio da prática social global, cabe possibilitar que as novas gerações incorporem os elementos herdados de modo que se tornem agentes ativos no processo de desenvolvimento e transformação das relações sociais (SAVIANI, 2008, p. 143).

O referido autor destaca a função primordial do ensino escolar de humanizar os indivíduos. Essa humanização se faz ao promover a apropriação dos elementos culturais produzidos historicamente pela humanidade. Tais conteúdos sistematizados, chamados pelo autor de clássicos ou eruditos, foram negados às classes ou grupos subalternos ao longo da história, a partir da divisão social do trabalho e da apropriação das fontes de produção privadas. Ocorreu então, a separação entre as atividades intelectivas (controlada pelos dominantes) e as atividades braçais (incumbência dos dominados) segregando o direito à educação, e, por sua vez, os elementos culturais clássicos aos dominantes em detrimentos dos menos favorecidos.

Desse modo, a pedagogia Histórico-Crítica apregoa práticas pedagógicas transformadoras, revolucionárias, haja vista que se propõe a lutar pela apropriação dos conteúdos historicamente construídos pela humanidade.

Nessa perspectiva, Saviani contribui muito ao discutir o conceito de competência técnica e compromisso político. Este autor afirma que

[...] pela mediação da competência técnica que se chega ao compromisso político efetivo, concreto, prático, real. Na verdade, se a técnica, em termos simples, significa a maneira considerada correta de se executar uma tarefa, a competência técnica significa o conhecimento, o domínio das formas adequadas de agir: é, pois, o saber- fazer. Nesse sentido, ao nos defrontarmos com as camadas trabalhadoras nas escolas, não parece razoável supor que seria possível assumirmos o compromisso político que temos para com elas sem sermos competentes na nossa prática educativa. O compromisso político assumido apenas no nível do discurso pode dispensar a competência técnica. Se se trata, porém, de assumi-lo na prática, então não é possível prescindir dela. Sua ausência não apenas neutraliza o compromisso político mas também o converte no seu contrário, já que dessa forma caímos na armadilha da estratégia acionada pela classe dominante que, quando não consegue resistir às pressões das camadas populares pelo acesso à escola, ao mesmo tempo que admite tal acesso esvazia o seu conteúdo, sonegando os conhecimento também (embora não somente) pela mediação da incompetência dos professores (SAVIANI, 2008, p. 36).

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Nota-se, em Saviani, que a formação de professores é fundamental na busca pela transformação social, pois a busca pela competência técnica deve estar em total articulação com o compromisso ético-político. Depreende-se, assim, que a educação é eminentemente política, contrariando a lógica pedagógica utilitarista que se compromete apenas com a manutenção do status quo. Além disso, entendemos que o docente precisa se apropriar/dominar os instrumentos técnicos/teóricos que embasarão o processo dialético de desvelamento da realidade concreta em conjunto com os estudantes.

Para que o processo de formação de professores se constitua em um dinâmica de totalidade, a pedagogia Histórico-crítica traz à luz a concepção dos múltiplos saberes que configuram o processo educativo (cf. SAVIANI, 1996) e que estão alinhados com a perspectiva de competência técnica e compromisso ético-político, quais sejam: saber atitudinal; saber crítico- contextual; saberes específicos; saber pedagógico, e o saber didático contextual.

Para Saviani (1996), o saber atitudinal é aquele referente às atitudes do professor, ou seja, a postura dele diante dos colegas e discentes no que diz respeito à disciplina, ao diálogo, ao respeito, à coerência daquilo que se fala com o que se faz e na equidade ao mediar as relações. Já o saber crítico-contextual está relacionado com o entendimento das condições sociais e históricas que determinam a tarefa educativa, ou seja, o docente necessita “[...] compreender o contexto com base no qual e para qual se desenvolve o trabalho educativo” (SAVIANI, 1996, p. 149). Os saberes específicos, que correspondem a um recorte do conhecimento socialmente produzido pela humanidade estabelecido por uma disciplina (geografia, história, artes, etc.), é também um saber valioso, na medida em que o professor deve ter o domínio do conteúdo abordado para subsidiar a socialização enriquecida do recorte estabelecido. Ressalta-se, ainda, o saber pedagógico que possibilita a construção da identidade do professor como profissional da educação, fundado em princípios teóricos científicos da educação. E por fim, o saber didático curricular que se baseia no fazer docente, isto é, na dinâmica do trabalho do professor, como a “[...] organização e realização da atividade educativa no âmbito da relação educador-educando” (SAVIANI, 1996, p.149).

Destacamos que, apesar do modismo pós-moderno do uso da expressão “saberes”, Saviani (1996) usa este termo de forma a considerar o fenômeno educativo e, dentro deste contexto, a formação de professores, de maneira totalizada, ou seja, levando em consideração os conhecimentos teóricos sistematizados (episteme) e os conhecimentos decorrentes das experiências de vida (sofia) articulados dialeticamente.

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Evidenciamos que, em nossa proposta de formação, damos destaque aos saberes em que predominam os conhecimentos sistematizados (episteme) específicos, tanto no que diz respeito às ciências humanas, em especial a História e a Geografia; quanto nos conhecimentos pedagógicos, especialmente relacionados à Educação Ambiental Crítica. Todavia, isso não significa que os saberes correlatos às experiências (sofia) não estarão presentes, haja vista que a proposta da formação ocorrerá considerando a colaboração e participação dos cursistas. Portanto, com base nesses pressupostos supracitados, nosso curso de extensão se fundamenta, buscando articular os múltiplos saberes, com o objetivo de produzir o conteúdo da formação para possibilitar respostas às questões colocadas pela prática social da sociedade, no nosso caso, no contexto da RMGV, em especial o entorno da Vale S.A.