• Nenhum resultado encontrado

3. METODOLOGIA

3.3. Intervenções

O modelo proposto de oficina é similar ao utilizado em um projeto anterior e que foi amplamente discutido por Vera Paiva108, mas com algumas modificações na última sessão, onde foi trabalhada a realização do teste HIV. Como foi explicitado anteriormente, o principal objetivo desse projeto era avaliar esse modelo de intervenção construído pela equipe do NEPAIDS. Desta forma, a seguir será feita uma breve descrição de cada sessão, pois Vera Paiva já fez uma descrição detalhada dos objetivos, técnicas utilizadas e resultados obtidos.

A intervenção consistiu-se em quatro encontros de três horas cada um. Após a realização do questionário, os estudantes foram sorteados e divididos em grupos de no máximo 20 participantes. Moças e rapazes foram separados em diferentes grupos, o que garantiu a confidencialidade e encorajou a discussão aberta sobre as normas de gênero e os papéis sociais pré-estabelecidos que dificultam a prevenção da AIDS.

108 Paiva (1996).

a) Primeira sessão:

Na primeira sessão era realizada uma espécie de contrato verbal - como é feito também no trabalho psicoterápico - que abrangia o número de sessões, o tempo de duração de cada uma delas, a regra de sigilo e o respeito a opiniões diferentes dos colegas. Foi importantíssimo estabelecer um espaço onde opiniões diferentes, dúvidas ou mesmo gostos pudessem ser expressos. Cada participante teria que respeitar o seu colega e manter sigilo sobre assuntos pessoais que fossem discutidos no grupo.

Iniciávamos o “aquecimento” do grupo utilizando algumas técnicas do psicodrama, de forma a tirar os estudantes de suas cadeiras, às quais estavam tão habituados, e dar o “tom” do trabalho: dinâmico e participativo. Era pedido que eles falassem a primeira palavra que pensassem ao ouvir: “Quando você pensa em AIDS, o que lhe vem à cabeça?”, “O que a AIDS tem a ver comigo?” Discutíamos a partir dos conteúdos obtidos de forma a conscientizar a simbologia expressa por eles sobre a AIDS, o impacto em suas vidas e a percepção ou não do risco de contrair o HIV.

O grupo era então dividido em dois: um deles representava o HIV e, o outro, as pessoas que deveriam conversar com o vírus. Essa dinâmica tem por objetivo a concretização da AIDS e da noção de vulnerabilidade frente ao HIV. Dividíamos os participantes em pequenos grupos e pedíamos que montassem uma história baseada em alguns personagens e locais de uma prancha109 (o labirinto, como chamávamos esse exercício) na qual uma das pessoas estaria contaminada pelo vírus HIV. O objetivo principal dessa dinâmica foi trabalhar a noção de grupos de risco e a auto- percepção do risco frente à contaminação pelo HIV.

As informações sobre o HIV, as formas de transmissão e o modo de atuação do vírus no organismo eram discutidos pelo grupo de forma participativa, levantando questões e estimulando a retirada de dúvidas. Após essa etapa, apresentávamos um vídeo da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) chamado “Amor, Viva a Vida.”, direcionado para a população jovem, que continha informações, feito com a participação de atores de televisão e jovens portadores do HIV.

109 Produzida pelo grupo Casa da Mulher do Grajaú e pelo Inst. Saúde da Secretaria da Saúde de São Paulo, para ser usado em trabalhos com mulheres da periferia de São Paulo. Em anexo.

b) Segunda sessão:

O grupo era iniciado retomando questões, dúvidas e sentimentos suscitados pela sessão anterior. Após este período inicial para continência de possíveis ansiedades e dúvidas do grupo, propúnhamos a realização de uma massa, feita com farinha/água/sal, para que fosse modelada uma parte do corpo erótico ou reprodutivo, do homem ou da mulher. “Não é uma aula sobre “sexualidade”, mas um exercício de conscientização da sexualidade construída nas subculturas sexuais brasileiras, as diferentes formas em que essa parte da vida é percebida, o uso da informação transmitida pela mídia, família, professores e no “boca a boca”.”110

O objetivo também era discutir as normas de gênero, que definiam os papéis sexuais de homens e mulheres. A partir dessa atividade, discutimos a presença do HIV nos líquidos corporais e as formas de contaminação, especialmente nas diferentes práticas sexuais.

Novas questões eram levantadas e então discutíamos como fazer para não contrair o vírus. Demonstrávamos o uso da camisinha e de lubrificantes nas diferentes práticas sexuais. Os jovens manipulavam o preservativo, brincavam e treinavam a sua colocação em uma banana ou pepino. O objetivo era banalizar a camisinha e torná-la familiar, ensinando o seu uso corretamente.

c) Terceira sessão:

O objetivo dessa sessão era aprofundar a discussão sobre o sexo seguro e as dificuldades em adotar tais medidas de segurança. Iniciávamos a sessão retomando questões, dúvidas e comentários sobre a sessão anterior e propúnhamos que os participantes se dividissem em três grupos. Cada grupo deveria pensar cinco formas de ter prazer sem risco. Para isso recebiam um papel onde estava descrito o tipo de casal que deveria estabelecer tais práticas seguras: duas mulheres, dois homens ou um homem e uma mulher. O objetivo era discutir as diferentes práticas sexuais e as formas de prevenção, retirando a limitação do sexo como “penetrativo” e expandindo as possibilidades de práticas prazerosas e seguras.

Em alguns grupos surgiam o preconceito com relação a práticas sexuais diferentes, opções sexuais diferentes, como o preconceito relacionado aos

110 Paiva (1996).

homossexuais, por exemplo, ou mesmo questões relacionadas a prostituição ou drogadição. Quando estas questões se tornavam emergentes no grupo, utilizávamos a técnica psicodramática de role-playing, de forma a concretizar tais personagens e humanizá-los, fazendo com que o grupo “se colocasse no lugar do outro”, objeto de seu preconceito.

Utilizando cenas da vida deles, discutíamos as dificuldades de se prevenir da AIDS. Através da sociometria, o grupo era levado a escolher uma situação emergente que era encenada com a ajuda das técnincas psicodramáticas de direção de cena e role-playing111. O objetivo era discutir as barreiras individuais, interpessoais e grupais na prevenção do HIV.

d) Quarta sessão:

Retomávamos aspectos da sessão anterior e propúnhamos uma nova atividade, onde os participantes simulavam a realização do teste HIV, a retirada do resultado e as mudanças em suas vidas frente a tal resultado. Esse tema não foi trabalhado no projeto anterior112, coordenado por Vera Paiva. Utilizamos técnicas de aquecimento e o psicodrama interno para realizar tal atividade. O objetivo era discutir a realização do teste HIV e suas conseqüências, de forma a possibilitar que os participantes pudessem optar pela realização ou não do teste HIV no Instituto “Adolpho Lutz”.

A testagem foi realizada de forma anônima e voluntária, em dias específicos. Os participantes receberam uma guia de encaminhamento, ao final da oficina, para a realização do teste. No final deste encontro fizemos uma avaliação da oficina e do impacto em suas vidas.