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CAPÍTULO 1 APORTE E QUALIDADE DE RESÍDUOS DE ESPÉCIES

1. INTRODUÇÃO

Em ambientes tropicais os solos normalmente apresentam baixa disponibilidade de nutrientes. Nas florestas dessas regiões, a deposição contínua de material senescente das árvores representa a forma mais eficiente de ciclagem de

nutrientes (YOUNG, 1997; SCHROTH; SINCLAIR, 2003). Nos ecossistemas agrícolas convencionais, em geral, há quebra desta ciclagem natural, mas os sistemas agroflorestais (SAFs), em particular, imitam as florestas aportando continuamente material senescente ao solo e apresentando um ciclo mais fechado de nutrientes, comparado à maioria dos sistemas agrícolas (MAFONGOYA et al., 1998; SANCHEZ, 1995). Com isso, os SAFs desencadeiam processos de grande importância melhorando características químicas, biológicas e físicas do solo (YOUNG, 1997; KIBBLEWHITE et al., 2008; JOSE, 2009).

Nos trópicos, devido à grande diversidade de espécies, as árvores nativas constituem boas opções para serem utilizadas em SAFs (REIS et al., 2010; DUARTE et al., 2012). Elas podem desenvolver mecanismos eficientes (fixação biológica de N2,

associação com micorrizas, liberação de exudatos) para conviver com os altos teores de alumínio trocável e também para utilizar eficientemente os limitados nutrientes disponíveis no solo (KANMENGE et al., 1999; RADERSMA, 2002). Assim, tais espécies são capazes de produzir maiores quantidades de biomassa, acima e abaixo do solo e, dependendo da sua qualidade, contribuir para uma maior ciclagem de nutrientes e aumento dos níveis de matéria orgânica do solo (MOS).

Na maioria dos SAFs prioriza-se o uso de espécies leguminosas e utiliza-se uma alta densidade de árvores, que são podadas constantemente para fornecer ao solo material orgânico com altos teores de nutrientes (CONSTANTINIDES; FOWNES, 1994; MAFONGOYA et al., 1998). Entretanto, há SAFs em que, raramente, os agricultores podam as árvores. Nestes, o aporte de resíduos acontece devido à queda natural de folhas, ramos e estruturas reprodutivas, exigindo assim menos gasto de mão de obra para sua condução (SOUZA et al., 2010). Neste caso, os resíduos aportados (resíduos senescentes) possuem menores teores de nutrientes. Isto acontece devido à translocação desses nutrientes pelas espécies, os quais são redistribuídos de tecidos velhos para tecidos em formação (CONSTANTINIDES; FOWNES, 1994).

O aporte de resíduos senescentes pelas árvores de florestas decíduas e semidecíduas, como no Bioma Mata Atlântica (Brasil) apresenta uma dinâmica sazonal, a qual é influenciada principalmente pelo estresse hídrico (MARTINS; RODRIGUES, 1999), e pelas baixas temperaturas, o que acontece no período do inverno. Neste período de seca, o material orgânico aportado em maior quantidade, contribui para a manutenção da umidade do solo e para a redução das oscilações de temperatura, ambos de grande importância na manutenção da atividade microbiana. Além disso, o material

orgânico protege o solo contra a ação das chuvas que se iniciam em setembro, minimizando o problema da erosão (CARVALHO; FERREIRA NETO, 2000).

No solo, os resíduos senescentes são transformados pela ação dos organismos presentes. Esta transformação pode ocorrer de forma rápida ou lenta, dependendo da composição química e bioquímica dos resíduos. Normalmente, resíduos com altas concentrações de N, P e hemicelulose, e menores concentrações de lignina, celulose, e polifenóis, resultam em altas taxas de decomposição, considerando as mesmas condições edafoclimáticas (HÄTTENSCHWILER; VITOUSEK, 2000; MENDONÇA; STOTT, 2003; PRAVEEN-KUMAR et al., 2003). Por outro lado, para que haja uma maior proteção do solo, é desejável uma decomposição mais lenta dos resíduos e a sua acumulação sobre o solo, reduzindo as perdas por processos erosivos (MATOS et al., 2008).

Na Zona da Mata de Minas Gerais, Bioma Mata Atlântica, onde esse trabalho foi desenvolvido, os solos são altamente intemperizados, ácidos, e com baixas concentrações de nutrientes (CARDOSO et al., 2001). O relevo é muito movimentado, sendo observadas lavouras de café (Coffea arábica) ocupando encostas de montanhas com altas declividades e problemas de erosão laminar. Além disso, esses solos são dependentes do aporte de material orgânico para melhorar suas características químicas como, o aumento da soma de bases, a disponibilização de P e a redução da saturação de alumínio e da acidez do solo (CARDOSO et al., 2001). Neste caso, os SAFs propiciam cobertura eficiente do solo, tanto pela copa das árvores, quanto pela camada de serrapilheira, contribuindo para a redução da erosão e para a manutenção dos níveis de matéria orgânica, tornando-se uma alternativa de uso sustentável do solo (CARVALHO; FERREIRA NETO, 2000; PEREZ et al., 2004).

O café, principal cultura de renda da região (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA – IBGE, 2007), é originário de matas semidecíduas da Etiópia (MATSUMOTO, 2004) o que indica sua aptidão natural para o cultivo sombreado (MOGUEL; TOLEDO, 1999). Com isto, SAFs com café conciliam produção, renda, conservação do solo e ainda, prestação de adicionais serviços de ecossistemas, atribuídos muitas vezes, à sua diversidade (SOTO-PINTO et al., 2000; BEER et al., 2003; JOSE, 2009). Os SAFs, ao contrário de café a pleno sol, contribuem para conectar fragmentos de florestas presentes na região, diminuindo o isolamento e facilitando o fluxo gênico entre estes contribuindo para a conservação da biodiversidade no Bioma

Mata Atlântica (VANDERMEER; PERFECTO, 2007), uma das principais reservas de biodiversidade do mundo, porém se encontra mais ameaçada (MYERS et al., 2000).

Os benefícios advindos das árvores nos SAFs podem ser potencializados com a adequada escolha da espécie, ou pela combinação destas e do manejo a ser adotado no sistema. Na Zona da Mata, os agricultores apontaram como critérios para a seleção das espécies arbóreas a compor os SAFs: a sua compatibilidade com o café, indicada pela profundidade das raízes das árvores e aspectos sanitários do café; a quantidade de biomassa produzida; a necessidade de mão de obra para manejá-las; a diversificação da produção entre outros (SOUZA et al., 2010).

Com base nestes critérios, as espécies arbóreas, Luehea grandiflora (açoita cavalo), Inga subnuda (ingá), Zeyheria tuberculosa (ipê preto), Senna macranthera (fedegoso), Erythrina verna (mulungu), Aegiphila sellowiana (papagaio) e Solanum mauritianum (capoeira branca), nativas da Mata Atlântica, foram indicadas pelos agricultores como algumas das mais compatíveis com o café. As espécies frutíferas Persea americana (abacateiro) e Musa sp (bananeira), principalmente a variedade prata, embora exóticas, também estão entre as espécies mais indicadas, as quais diversificam a produção e a renda nestes sistemas. No caso da bananeira, diferente das árvores, o aporte de resíduos ocorre através do desbaste de perfilhos que brotam constantemente na touceira, e também pelo corte de plantas após a colheita.

Apesar de a clareza dos critérios de escolha das espécies a serem utilizadas nos SAFs, os agricultores apontaram como um dos problemas na condução das experiências, a escassez ou inexistência de informações sobre o potencial de ciclagem das espécies arbóreas utilizadas. Espera-se que a quantidade, qualidade e distribuição temporal do resíduo aportado aos sistemas pelas espécies sejam diferentes entre si, e por isto influenciam diferentemente a ciclagem de nutrientes e a proteção do solo. O melhor conhecimento destas diferenças pode contribuir para o entendimento dos potenciais serviços de ecossistemas desempenhado por tais espécies e para o estabelecimento de estratégias de uso e manejo das espécies arbóreas nos SAFs (DUARTE et al., 2008), aumentando com isto, o numero de agricultores e de áreas manejadas com SAFs.

Dessa forma, este trabalho teve como objetivos avaliar: i) a quantidade de resíduo aportado pelas espécies ao longo do ano ii) os teores e aporte de nutrientes nos resídos, iii) a translocação interna de nutrientes e, iv) as características químicas e bioquímicas que interferem na decomposição destes resíduos.

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