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Capítulo 1 – Introdução geral e objetivos

1.1. Introdução à miniaturização de sistemas analíticos

1.1.1. Introdução da amostra e transporte do fluido

A introdução da amostra em microcanais é, normalmente, realizada com o auxílio de reservatórios para soluções (tampão, amostra ou reagentes), os quais são implementados nos microssistemas de modo a permitir análises seqüenciais[7]. Estes reservatórios são feitos a partir da perfuração de orifícios em uma das peças constituintes do microssistema (tipicamente a tampa) antes da etapa de selagem (ou vedação). Dependendo do tipo de material utilizado como substrato, esses orifícios podem ser confeccionados com um perfurador de papel, como no caso do poliéster, por exemplo. Por outro lado, substratos como o vidro requerem a utilização de ferramentas mais sofisticadas, como uma furadeira de alta rotação, e brocas com pontas diamantadas. Após a perfuração, tubos plásticos podem ser fixados sobre estes orifícios permitindo a adição de soluções e também a conexão com o sistema de bombeamento fluídico.

A utilização de reservatórios é muito comum, inclusive em microssistemas comerciais. O único problema refere-se ao volume de solução adicionado a estes reservatórios. É extremamente importante que os reservatórios sejam preenchidos com o mesmo volume. Caso contrário, a quantidade de material introduzido nos microcanais será influenciada diretamente pela mobilização hidrodinâmica provocada pela diferença de pressão, em função da não homogeneidade do volume adicionado em cada reservatório[7].

Além da introdução da amostra, o transporte do fluido é uma das etapas mais importantes de uma análise química em microssistemas. Como o volume de amostra é

extremamente reduzido, problemas relacionados à difusão e à dispersão são freqüentes e requerem muitos cuidados no manuseio[7]. Em geral, o fluido pode ser manuseado através de fenômenos eletrocinéticos[7-9] ou hidrodinâmicos[10,11].

No transporte eletrocinético, o fluido é transportado pela eletrosmose gerada no interior dos microcanais através da aplicação de potenciais elétricos[12,13]. O fenômeno eletrosmótico é altamente dependente da característica da composição do substrato utilizado. Em substratos de vidro, por exemplo, os grupos silanóis (Si-OH) podem ser deprotonados dando origem à presença de cargas negativas na parede interna do microcanal[13]. Essas cargas negativas são balanceadas através de interações eletrostáticas com cátions presentes em uma solução eletrolítica gerando uma dupla camada elétrica. Quando um campo elétrico é aplicado, há a movimentação dos cátions carregando a solução em direção do cátodo. O fluxo transportado pela eletrosmose é denominado de fluxo eletrosmótico (EOF)[12-14].

Devido sua simplicidade instrumental para o transporte do fluido, a eletroforese é o método de separação mais explorado em micro-escala[14], existindo inclusive equipamentos comerciais. A Agilent®, por exemplo, produz um equipamento de eletroforese para microchip denominado de Bioanalyzer[15]. No entanto, com o avanço no desenvolvimento de bombas e válvulas miniaturizadas, métodos cromatográficos (em fase líquida[16,17] e também em fase gasosa[18]) estão começando a ser implementados em microssistemas. A exemplo do que ocorre com a eletroforese, já há equipamentos comerciais (Agilent®) que utilizam microssistemas para cromatografia líquida acoplada com um espectrômetro de massas[19].

Em uma plataforma miniaturizada, os microssistemas podem ser confeccionados em geometrias variadas, podendo conter um único microcanal ou até múltiplos canais em paralelo[20,21]. Como apresentado na Figura 1.1., um microssistema eletroforético (MSE) é constituído basicamente de dois microcanais delimitados por reservatórios para soluções. Para MSE, a geometria mais simples e a mais utilizada é em formato de uma cruz, como

apresentado na Figura 1.1. Neste caso, um microcanal é utilizado para realizar a injeção da amostra enquanto o outro é utilizado para efetuar a separação eletroforética. O sistema de detecção é, normalmente, posicionado no final do canal de separação. Estes microssistemas podem ser fabricados em uma variedade de substratos a partir de tecnologias convencionais ou alternativas[4-7].

Para a introdução da amostra, o volume de injeção pode ser delimitado pela geometria do canal de injeção[6]. Considerando um canal com largura e profundidade de 50 µm, por exemplo, o volume de injeção (para um sistema em formato de cruz) é de aproximadamente 125 pL (50 µm × 50 µm × 50 µm). O manuseio de volumes extremamente reduzidos requer, muitas vezes, sistemas de alta detectabilidade. No entanto, algumas estratégias podem ser realizadas para aumentar o volume a ser introduzido. Isso pode ser efetuado pela alteração do formato geométrico[6-8]. Como a zona de amostra é definida pela intersecção dos canais, o canal de injeção pode ser ligeiramente alterado para uma configuração no formato de um duplo-T, como apresentado na Figura 1.1. Nesse caso, o volume é influenciado diretamente pelo comprimento total desse duplo-T.

A desvantagem do transporte fluídico a partir do EOF é a tendência em discriminar as espécies iônicas, ou ionizáveis, que são transportadas por esse fenômeno[22]. Por esse motivo, o manuseio do fluido em microcanais com fluxo induzido por pressão está em expansão plena. O transporte hidrodinâmico pode ser realizado com pressão positiva ou negativa (vácuo), aplicada através de bombas seringas ou bombas peristálticas[7,9,10,22]. Este fenômeno de transporte pode ser utilizado para manusear uma ampla variedade de soluções, incluindo fluidos não iônicos. Um dos principais requisitos concerne à resistência mecânica da plataforma microfluídica. Para o manuseio de fluxo induzido por pressão, é desejável que os microcanais sejam vedados irreversivelmente, de modo a evitar qualquer danificação (ruptura, vazamento ou quebra) da estrutura fluídica[9,22].

Além dos fenômenos de transporte mencionados, a ação de forças centrífugas também pode ser utilizada para mobilizar o fluido a partir do princípio difusional. Esse fenômeno foi demonstrado por Duffy e colaboradores[23] usando um sistema no formato de um disco compacto (CD). Ao girar, a amostra introduzida em um reservatório próximo ao centro é facilmente deslocada na direção de outro reservatório, posicionado próximo à borda do CD. Este tipo de transporte fluídico apresenta algumas vantagens, como a independência das propriedades físico-químicas do líquido (pH e força iônica)[23].

Nessa verdadeira revolução instrumental, o uso de válvulas microfabricadas está contribuindo significativamente para o crescimento desta área de pesquisa[24]. Essas válvulas permitem controlar a quantidade (volume) de amostra e direcionar o fluxo do fluido nos microcanais[25]. A válvula mais comum é fabricada a partir de membranas elastoméricas, as quais podem ser ativadas por potenciais elétricos, pressão ou partículas magnéticas[24-26]. Embora o processo de fabricação destas válvulas seja laborioso, a integração destes acessórios é uma das principais tendências para o auto-processamento analítico, principalmente no uso de múltiplos canais em paralelo[24-27].

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