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CAPÍTULO II – Os indígenas e a Educação Escolar Indígena

2.2. Breve histórico da Educação Escolar Indígena

2.2.1. Da invasão à criação do SPI

Meliá (1979) descreve a educação dos indígenas antes da chegada dos portugueses como um processo global, ensinada e aprendida como um processo globalizante em termos de socialização integrante. A educação de cada índio era quase sempre de interesse de toda a comunidade. O indígena era constantemente educado para o prazer de viver, ele trabalhava para viver e essa educação permitia, de fato, um alto grau de espontaneidade que facilitava a realização dos indígenas dentro de uma margem muito grande de liberdade e autonomia. Esse modelo acabou sendo influenciado e transformado com a chegada dos colonizadores no continente americano.

O primeiro momento e também o mais longo tem início com a chegada dos primeiros jesuítas ao Brasil em março de 1549 junto com o primeiro governador- geral, Tomé de Souza. Os jesuítas eram comandados pelo Padre Manoel de Nóbrega e quinze dias após a chegada edificaram a primeira escola elementar brasileira, em Salvador.

Desde a época colonial, diversas missões católicas dedicaram-se à catequese indígena em geral, visto que a religião católica aqui chegou com

45 os padres jesuítas trazidos pelos primeiros governadores do Brasil colônia. Ela foi considerada a religião do Estado e o principal vínculo de unidade nacional, até o governo de D. Pedro I. (CARVALHO, 1998, p. 55-6)

As investigações feitas a respeito do tema “educação para índios” (Meliá 1992), mostram que desde a colonização, a educação para índios foi praticada pelos jesuítas que chegaram ao Brasil no início século XVI. Eles tinham como objetivo catequizar os indígenas e atender os interesses governamentais que os financiavam, utilizavam o método da ratio studiorum1 nos colégios e nas missões adequaram a catequese a uma realidade de diferentes línguas indígenas, como relatam Bittencourt e Silva:

Havia colégios para a educação dos jovens brancos onde, eventualmente podiam conviver alguns indígenas e haviam aldeias missionárias, criadas para catequese. (BITTENCOURT & SILVA, 2002)

Os jesuítas, então, organizaram aldeamentos para converter os indígenas ao cristianismo e aos valores europeus criando as reduções ou missões. Nas Missões, os índios, além de passarem pelo processo de catequização – que tinha como um de seus objetivos “educar o índio para a civilização” - também eram orientados ao trabalho agrícola, que garantia aos jesuítas uma de suas fontes de renda.

As Missões e aldeamentos, na realidade, contribuíram decisivamente para facilitar a captura de várias populações pelos colonos, que conseguiam, às vezes, capturar aldeias inteiras nestas Missões.

A escola indígena, cuja responsabilidade foi da Igreja Católica no período colonial, foi uma imposição aos povos indígenas do Brasil. A escola indígena, durante o período colonial, teve como princípios a conversão religiosa e o uso de mão de obra para todo tipo de trabalho, além da função de “integração” entendida

1 Durante o período em que a “educação” no Brasil esteve nas mãos dos jesuítas, houve uma forma de gestão e

organização de suas escolas, possíveis de serem identificados em documentos como o Ratio Studiorum que trata de direcionar, homogeneizar e regulamentar todo o sistema de ensino jesuítico.

46 como uma das formas mais eficientes de destruição das culturas indígenas, expressão de um modelo de submissão e exploração imposto pelo contexto de colonização. Isso significou a desestruturação de suas formas de organização social, das regras de parentesco e do xamanismo, colocando em “cheque” a veracidade de suas instituições milenares.

Os jesuítas permaneceram como mentores da educação brasileira durante duzentos e dez anos, até 1759, quando foram expulsos de todas as colônias portuguesas por decisão de Sebastião José de Carvalho, o marquês de Pombal, Primeiro-ministro de Portugal de 1750 a 1777.

Em meados do século XVIII com a reforma pombalina, o foco da educação indígena que antes era voltado para a catequização passou a ser o de civilizar os indígenas, sem, contudo deixar de catequizá-los. Pombal expulsou os jesuítas de Portugal e das colônias, revertendo todos seus bens para o Estado, desestruturando o sistema educacional montado pelos jesuítas. Porém, as concepções a respeito da natureza do índio continuavam preconizando que eram seres primitivos, incapazes, incompatíveis com o progresso e civilização, chegando a ser promulgado em 1845 um decreto tendo o índio um caráter de orfandade, dando aos colonizadores o direito de tirar grande parte de suas terras e justificando uma política paternalista que os tratava como crianças.

Pouco a pouco, a Coroa passou a diversificar suas parcerias, responsabilizando o encargo da educação escolar indígena a alguns fazendeiros ou mesmo moradores comuns de regiões vizinhas aos índios, como atestam diversas Cartas Régias de 1808. Como já dito, a introdução desses agentes “leigos” não significou, contudo, a emergência de uma educação indígena dissociada da catequese. A civilização e a conversão dos índios continuaram sendo explicitamente os objetivos educacionais propostos pelo governo.

Segundo Ferreira (2001, p.74)

Existe, hoje, consenso em torno da inadequação do modelo colonial/educacional desse primeiro momento da história da educação escolar, mas os mesmos propósitos reaparecem, embora de forma mais sutil, na próxima fase.

47 Márcio Silva e Marta Azevedo também confirmam que não aconteceram mudanças significativas no que diz respeito à educação escolar indígena durante o período do Império.

Até o fim do período colonial, a educação indígena permaneceu a cargo de missionários católicos de diversas ordens, por delegação tácita ou explícita da Coroa portuguesa. Com o advento do Império, ficou tudo como antes: no Projeto Constitucional de 1823, em seu título XVII, art. 254, foi proposta a criação de “... estabelecimentos para a catequese e civilização dos

índios...”. Como a Constituição de 1824 foi omissa sobre esse ponto, o Ato

Adicional de 1834, art. 11, parágrafo 5, procurou corrigir a lacuna, e atribuiu competência às Assembleias Legislativas Provinciais para promover cumulativamente com as Assembleias e Governos Gerais “... a catequese e

a civilização do indígena e o estabelecimento de colônias”. (SILVA e

AZEVEDO, 2004, p.150)

Segundo texto do MEC, com o advento do império, em 1822,

Apesar de a educação indígena estar presente nas agendas políticas da época não representou para os índios uma política imperial voltada especificamente para seus interesses. Ao final do Império, os especialistas e autoridades, que chegaram a se entusiasmar com a possibilidade de haver instituições públicas destinadas ao ensino de crianças indígenas, desacreditavam que isso pudesse ocorrer sem a intervenção das missões religiosas. Dessa forma, até o início do século XX o indigenismo brasileiro viverá uma fase de total identificação com a missão católica e o Estado dividirá com as ordens religiosas católicas, mais uma vez, a responsabilidade pela educação formal para índios. (SECAD/MEC, 2007, p. 13)

Na república a Constituição de 1891 ignorou a existência de índios no país, tendo apenas um decreto que transferia ao Estado a responsabilidade de "instrução dos índios". A situação dos índios tornou-se mais delicada e a imprensa veiculava a

48 idéia de que o progresso era incompatível com a presença dos índios. Crescia também a disputa pelas terras indígenas.

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