• Nenhum resultado encontrado

vol 2 Inventário dos anexos: descrição dos documentos roubados (cartas pessoais e folhetos).

F ) I NSTITUTO DE C IÊNCIAS B IOLÓGICAS

VI. vol 2 Inventário dos anexos: descrição dos documentos roubados (cartas pessoais e folhetos).

Tal projeto possui apenas 25 cópias, algumas passadas para o inglês e enviadas para o exterior, qualquer pessoa pode ter acesso. Em 1985 foi lançado o Projeto B, em livro, para que tivesse maior divulgação. Chamado: Um relato para a história – Brasil: Nunca Mais. O prefacio é de Dom Evaristo Arns599. Quando do término do projeto e lançamento do livro, acreditou-se que havia “toda a verdade” sobre o que aconteceu nos anos que se seguiram a 1964. Até a aprovação do habbeas data em 1988, esta havia sido praticamente a única referência oficial que os processados ou punidos pelo regime militar tinham para buscar informações e pedir reparações.

"É o individuo que o detém e o faz de maneira privada. A sociedade não participa dessa transação nem se apropria das informações obtidas. (...) A instituição que determina a quantidade e o conteúdo que deve liberar" .600 Em 1992 os arquivos começaram a ser transferidos das instituições militares para os arquivos públicos, criando assim, mais uma forma de se conseguir informações tanto sobre o indivíduo, quanto sobre o conjunto de ações do governo. Os arquivos da repressão contêm documentos pessoais, declarações individuais, inquéritos, fotos, correspondências, enfim, tem-se o monitoramento diário dos considerados inimigos internos. Apesar disto, em relação aos desaparecidos políticos, as lacunas ainda persistem, o que ficou claro, sobretudo a partir da descoberta da vala clandestina de Perus em 1990601.

599 Projeto A Brasil: Nunca Mais, em Minas há uma cópia disponível para consulta no Instituto Helena Greco.

Projeto B, foi lançado pela editora Vozes, em 1985.

600GRECO, Heloisa. A dimensão trágica da luta pela anistia. IN: Cadernos da Escola do legislativo. Belo

Horizonte, vol. 8. n.13. 2005. pp. 85-111.

601

Esta vala encontra-se no Cemitério Dom Bosco, em São Paulo, construído em 1971, sob governo de Paulo Maluf. Mais de 1049 ossadas foram encontradas entre indigentes, desaparecidos políticos e vítimas do Esquadrão da Morte. A UNICAMP ficou com a responsabilidade identificar os corpos. Neste ano, o governo resolveu voltar à identificação do restante das ossadas (147 ativistas). Em Minas e São Paulo já ocorreram, atos de coleta para o banco de DNA de familiares de desaparecidos. Segundo dados da Comissão Especial e a Secretaria de Direitos Humanos (ambas ligadas ao Ministério da Justiça), existem 147 ativistas políticos mortos pelo regime ainda não identificados. Cf: TELLES, Janaína. Mortos e desaparecidos políticos:

reparação o impunidade? São Paulo: Humanitas, 2002. FIGUEIREDO, Lucas . À procura dos corpos. Estado de Minas. Caderno Política. 22 de abril de 2007. pp.22. Para mais informações: http://www.desaparecidospoliticos.org.br/perus/perus.html e documentário premiado : “Vala comum”. Direção:João Godoy.32 min. 1994.

Outro fator relevante foi o aparecimento do ORVIL que, como vimos, reanimou o debate acerca da abertura dos arquivos da ditadura e da reabertura de alguns processos para a indenização de famílias. Hoje já se sabe que, muitas das vezes, as informações (verbais ou escritas) foram retiradas sob tortura, embora isto não esteja descrito no livro. Tais informações se liberadas à revelia, poderiam causar transtornos e ativar memórias desnecessárias. Trata-se da delicadeza do limite entre público/privado em tais arquivos.

Os questionamentos que levaram à produção do livro mostraram aos seus pesquisadores a necessidade de abranger um maior recorte temporal para compreenderem aquilo que estava se configurando como a “quarta tentativa de tomada de poder”. De acordo com o documento:

Esta tentativa de fato já teve seu inicio há alguns anos. Vencida a forma de luta que escolheu- a luta armada- , a esquerda revolucionária tem buscado transformar a derrota militar que lhe foi imposta em todos os quadrantes do território nacional em vitória política602

Pela lógica militar, a esquerda haveria mudado a estratégia de luta para garantir seu assalto ao poder. Desta maneira, uniram-se à esquerda ortodoxa, com quem romperam anos antes, e ao clero progressista. Para os militares, isto mostraria como a “nossa memória é fraca”. Superestimando o poder do inimigo, o ORVIL chama a atenção para fatos que ilustram o quão ardilosa foi a esquerda no Brasil daquele período. Consideravam que os leitores do documento seriam jovens na faixa dos 30 anos603, que eles ainda não haviam nascido na primeira tentativa de tomada de poder (1935), tampouco se recordariam da segunda (1964), e assim formariam, a partir das publicações biográficas divulgadas naquele período, uma visão “deturpada” do que teria sido a realidade dos movimentos de esquerda. Ante a iminente perda da luta pela memória, precisavam “reconstruir” a verdade sobre os órgãos de esquerda. Para estes militares, a terceira tentativa (período de 1966-1973) teria sido a mais violenta e mais nítida, contudo não seria a mais perigosa. Esta seria a quarta tentativa, que abrange um trabalho de massas e tinha por trás um projeto de deturpação da história, maculando a imagem do período militar e se colocando no papel de vítima604.

602 Projeto ORVIL.pp.11. www.averdadesufocada.org.br 603

Considerando a época da escrita do “livro”, 1986.

No Brasil, foi somente em 1995 que o Estado assumiu a responsabilidade pelo assassinato e desaparecimento de opositores, por meio da Lei 9.149/95, que instituiu a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, cuja função principal seria a de localizar e buscar soluções para cerca de 400 corpos de militantes. Devido a sua natureza, o crime do desaparecimento de pessoas encobre a identidade de seus autores. Começa um jogo perverso em que não se há cadáveres, não há culpados, e os familiares das vítimas perdem seu direito ao luto. Diversas valas clandestinas e até um cemitério subaquático foram descobertos. O processo de identificação dos corpos é lento por dificuldades de financiamento. A Secretaria Especial de Direitos Humanos lançou em agosto de 2007, o livro-documento Direito à Memória e à Verdade605, baseado nos processos políticos dos mortos e desaparecidos, o qual se tornaria a “palavra oficial” do Estado, acerca destes militantes. Muito recentemente, outro passo do governo foi a institucionalização pelo Ministério Civil, sob coordenação de Dilma Vana Rousseff, do Centro de referencia das lutas políticas no Brasil. Este implantado pelo Arquivo Nacional, cuja finalidade é a reunião de informações sobre a história política recente. Por meio de um site, pode-se ter acesso a imagens e documentos on-line ou localizar documentos dentro do Arquivo Nacional. Sem dúvida, passos importantes estão sendo dados no sentido de publicização de informações606.

O debate acerca da memória do período inicialmente era mais difícil de ser realizado em função do receio dos militantes em exporem suas vidas e que a “memória oficial”, os documentos, ainda estava nas mãos do Exército. Com o revés desta situação, atualmente, é difícil encontrar nas novas gerações quem trate o golpe como “revolução”, ou guerrilheiros como terroristas, assim, a tendência é a não perpetuação desta “historia militar”. Ainda há muito o que ser escrito e pesquisado sobre o período, para tanto é necessária a abertura dos arquivos e a fala de muitos que viveram a época (sejam militares ou militantes) para que haja mais análises e novas interpretações sobre os fatos ocorridos no período.

A discussão que permea este capítulo é a discussão sobre a abertura de arquivos. Na primeira parte, através dos arquivos que recentemente foram tornado público ORVIL e

605Há uma versão on-line, no endereço:

http://www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/sedh/.arquivos/livrodireitomemoriaeverdadeid.pdf

AESI, pudemos ter uma visão mais esclarecida da atuação tanto dos agentes de informação a respeito das organizações, quanto da colaboração de funcionários civis com o combate à “subversão”. Pudemos, através de uma pequena amostra vislumbrar esta colaboração dentro da UFMG, principalmente, na Faculdade de Medicina. A segunda parte, tratou de como o aparecimento de novas fontes arquivísticas alimentam o debate sobre a memória do período. Debate este, ainda longe do término.