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2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.5 Irradiação de tecidos biológicos com laser

Quando a radiação do laser atinge o tecido, os fótons penetram no tecido e a energia será distribuída de acordo com as propriedades ópticas tais como coeficiente de espalhamento, coeficiente de absorção e índice de refração. Uma fração da energia incidente será absorvida pelo tecido e será convertida em energia térmica. Essa energia térmica desencadeará um processo de transferência de calor que se manifestará através do aumento na temperatura do tecido. Os mecanismos combinados de condução, convecção e radiação distribuirão a energia térmica no tecido, acarretando numa distribuição de temperaturas que varia no tempo e ao longo do tecido. Se o aumento na temperatura for suficientemente grande podem ocorrer danos irreversíveis, tais como: inativação de enzimas, desnaturação de proteínas, queima e vaporização do tecido. Como consequência desses processos termoquímicos, as propriedades do tecido, especialmente as propriedades ópticas, sofrerão alterações que por sua vez influenciarão os processos de absorção e distribuição da energia no tecido.

O campo de temperaturas resultante no tecido depois de irradiado com laser é uma função da taxa com que a energia é depositada, da duração da irradiação, do volume do tecido irradiado, das perdas de calor por condução e convecção e da capacidade térmica do tecido.

As propriedades do laser que fizeram dele o instrumento escolhido para criar lesões precisas e remover tecidos são:

 potência estável e que se pode variar facilmente;

 habilidade de criar altas densidades de potência focalizando o feixe do laser;

 pequeno ângulo de divergência, permitindo controle preciso da área irradiada;

 disponibilidade de uma extensa gama de comprimentos de onda.

2.5.1 Segurança do laser

Os padrões de segurança para o uso de lasers estão baseados nas condições de irradiação que podem causar o mínimo dano ao tecido humano. O olho é o órgão mais sensível à irradiação laser devido à sua capacidade de focalizar a luz recebida numa pequena área e devido à sua incapacidade de regenerar o tecido neural destruído.

O laser é capaz de danificar o olho por três processos: fotoquímico, térmico ou mecânico. O interesse do presente estudo é examinar o processo de dano térmico causado ao olho e outros tecidos.

2.5.2 Aplicações médicas do laser

A primeira aplicação médica do laser ocorreu no início dos anos 60 no campo da oftalmologia para fotocoagulação ocular através da radiação de um laser de rubi, acarretando uma mudança no tratamento de procedimento hospitalar para procedimento ambulatorial. Em 1972 Kaplan (1978) iniciou o uso em grande escala do laser de CO2 de onda contínua.

A seguir é mostrado um resumo dos tipos de cirurgias onde o laser oferece vantagens sobre os métodos convencionais:

i. Cirurgias ortopédicas e plásticas com potencial para grandes perdas de sangue; ii. Extirpação de tumores altamente vascularizados;

iii. Cirurgias em hemofílicos e trombocitopênicos, nas quais a utilização de um laser diminui drasticamente as perdas de sangue e a morbidade pós-operatória;

iv. Extirpação de tecido canceroso, quase sem tocar o tecido;

v. Remoção de queimaduras, gangrena sinérgica, úlceras de decúbito; vi. Cirurgia cavitacional;

vii. Incisões através do tecido retinal; viii. Incisões nas meninges vertebrais;

ix. Microcirurgia em otologia;

x. Tratamento de displasia cervical por vaporização de tecido cervical; xi. Vaporização de verrugas que crescem na vulva, vagina e colo do útero; xii. Cauterização do colo uterino visando estancar sangramento menstrual; xiii. Reconstrução tubal.

2.5.3 Um modelo térmico para irradiação de tecidos biológicos com fontes de laser

O processo de modelagem da irradiação do tecido com fontes de laser é composto por duas partes:

a) cálculo do campo de temperaturas no tecido devido à absorção da radiação do laser; b) predição do dano por aquecimento com um modelo de taxa de reação química.

O esquema é mostrado na Figura 2.6.

Figura 2.6 – Modelo para cálculo de dano térmico para tecido irradiado por fonte de laser.

2.5.4 Equações e padrões de intensidade do laser incidente

Os modelos para respostas de temperatura em regime estacionário ou transitório, em tecidos irradiados com laser são normalmente baseados na equação da condução do calor sem incluir perdas de calor por convecção, isto é, não considerando perdas de calor devidas ao escoamento sanguíneo. Se a condutividade térmica é constante e isotrópica na região de interesse, a equação é:

onde:

= Temperatura;

= Taxa volumétrica de geração de calor; = Condutividade térmica;

= Difusividade térmica; = Tempo.

Um dos termos mais importantes na Eq. é o termo de fonte que inclui a energia recebida do meio exterior através de ondas eletromagnéticas. A capacidade de um meio absorver radiação eletromagnética depende de vários fatores, principalmente da constituição eletrônica dos seus átomos e moléculas, do comprimento da radiação, da espessura da camada absorvedora e de parâmetros internos tais como a concentração dos agentes absorvedores. Em primeira aproximação, pode-se assumir que a luz do laser penetra no tecido sem espalhamento e que a taxa local de absorção da energia radiante é proporcional à intensidade, segundo a lei de Beer (Shitzer, 1985). Isto leva a um decrescimento exponencial da intensidade e da taxa de absorção ao longo da direção de propagação de um feixe cilíndrico passando através de um meio homogêneo. Por exemplo, um feixe de intensidade dirigido ao longo do eixo terá uma intensidade:

ou

onde:

= Posição radial dentro do feixe cilíndrico de raio total ; = Distância da superfície até a camada absorvedora;

= Intensidade inicial do feixe na superfície da camada absorvedora; = Coeficiente de absorção;

= Fator que depende de outros parâmetros que não a concentração; = Concentração dos agentes absorvedores.

A taxa volumétrica de geração de calor devida à fonte laser, , na Eq. é, portanto, dada por (Welch, 1985)

A equação acima foi obtida através de derivação, com sinal negativo, da função intensidade do laser, , em relação a variável que representa a distância entre a superfície de incidência da radiação e a camada absorvedora considerada.

O coeficiente de absorção depende fortemente tanto do comprimento de onda do laser quanto da natureza do tecido considerado. Portanto, fontes de laser diferentes apresentarão poder de penetração diferente. Os dados de Welsch et al. (1997) ilustram este fenômeno com clareza. Por exemplo, no sangue, para o laser de argônio, a intensidade do feixe é reduzida para 50% de em 0,005cm de profundidade enquanto que para o laser de Nd-YAG, igual redução ocorrerá numa profundidade de 0,11cm.

Quanto à propagação da radiação incidente há dois padrões usuais: a) O padrão gaussiano dado por,

onde representa o raio do feixe cilíndrico de laser.

b) O padrão “spot” ou disco, onde a intensidade do feixe de laser não varia radialmente dentro do próprio feixe.

O modelo simples da lei de Beer fornece bons resultados nos casos onde a absorção é fortemente dominante sobre o espalhamento, e fornece resultados pobres nos casos contrários, porém, na maioria das situações, o espalhamento do feixe de laser no tecido é insignificante. O calor depositado no tecido pela absorção da energia luminosa induz a um aumento da energia interna no local, aumentando a vibração molecular. O calor, assim gerado, é transferido para regiões mais frias por condução. Dependendo do aumento de temperatura e

do tempo de irradiação, o tecido pode vir a coagular ou sofrer ablação (Welch et al., 1989). Esse fenômeno pode ser parcialmente avaliado através da função dano.

2.5.5 Validação do modelo para campo de temperaturas

Modelar a irradiação de um tecido biológico vivo é uma tarefa complexa. Igualmente complexa é a determinação experimental de temperaturas, em estado transitório, em finas camadas de tecido biológico irradiado por laser. A aceitação quer dos resultados de um modelo matemático ou dos dados experimentais, requer algum método de validação. A modelagem e a experimentação, ao invés competir, uma deve complementar a outra. Os resultados obtidos através dos modelos podem identificar parâmetros e condições importantes eliminando a necessidade de realizar experimentos. Por sua vez, as análises experimentais permitem que sejam realizados aperfeiçoamentos nos modelos.

Uma validação completa das temperaturas calculadas para um sistema biológico irradiado por laser é praticamente impossível. Quando temperaturas medidas e calculadas são comparadas, surgem diferenças significativas para algumas condições e geometrias de irradiação. Quando existem diferenças, é importante detectar a sua origem.

São fontes de erros:

 Diâmetro do feixe pequeno comparado ao tamanho do sensor;

 Tempo de irradiação menor que o tempo de resposta do sensor;

 Representação do modelo para o sistema biológico;

 Algoritmo computacional;

 Valores selecionados para os parâmetros térmicos;

 Cálculo ou medida do tamanho da imagem e/ou intensidade;

 Perturbação do sensor sobre o campo de temperatura.

As limitações de um modelo teórico ou experimental para um sistema biológico podem ser estabelecidas por resultados obtidos em um modelo físico do sistema biológico. Por exemplo, cálculos e medidas de temperatura para olho irradiado por laser foram avaliados pelo estudo

da irradiação de laser numa câmara de duas seções, como representada na Figura 2.7 (Welch et al., 1979; Lee, 1977).

Figura 2.7 – Câmara pigmentada de duas seções usada para modelar o olho. O gel pigmentado representa as camadas absorvedoras do olho.

A Figura 2.7 representa uma câmara onde uma das seções foi preenchida com água e a outra com um gel tingido em cor escura. Medições de temperatura e intensidade de luz foram feitas no gel com sondas termopar de película fina de 15-30 µm. As medidas foram efetuadas para feixes com diâmetros de 100 – 1500 µm na interface água-gel; para dois comprimentos de onda, 514,5 nm e 1060 nm; e para dois pulsos com durações de 30 ms e 10 s.

Este experimento foi realizado para comparar as medidas de temperatura com os resultados fornecidos pelo modelo teórico, em regime transitório.

As temperaturas medidas e calculadas para a câmara pigmentada irradiada por laser, em geral, estavam em boa concordância. Embora, para um só experimento, alguns valores mostrassem diferenças de até 30%, as razões médias entre temperaturas experimentais e temperaturas calculadas pelo modelo foram próximas da unidade, confirmando o modelo matemático básico, o algoritmo computacional e as medições de temperatura no sistema irradiado por laser.