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Uma faculdade comum, porém muito interessante que está presente no ser humano é a habilidade de reconhecer, reproduzir e analisar melodias ou pedaços de músicas. Longuet-Higgins [1979] e Temperley [2001] mencionam que essa habilidade abrange tanto a capacidade de identificar ritmos, relação entre as tonalidades, alturas, harmonia, quanto julgar se uma nota ou frase foi tocada fora do tempo ou está fora de tonalidade.

Goga e Goga [2004] dizem que a música é sentida pela porção do cérebro responsável pelos sentimentos, e não simplesmente visualizada pela porção cerebral responsável pela razão e inteligência. Para esses autores, os compositores podem influenciar o ser humano, no sentido de trazer alegrias, paz, tristeza, melancolia, entre outros. Os autores ainda afirmam que a circulação sangüínea e respiração podem sofrer influências dependentes do tipo de música escolhida pelo ouvinte. Por isso também é importante que as composições musicais sejam bem planejadas e estudadas.

O ouvido é dividido basicamente em três partes (Figura 1.29): ouvido externo, ouvido médio ou tímpano e ouvido interno, ou labirinto [LENT,2002] [BENSON,2007]. O ouvido externo representa a parte visível, composto pelo pavilhão auricular, pela concha e pelo meato auditivo externo, onde as ondas sonoras são concentradas, amplificadas e transmitidas para os receptores. O meato auditivo externo possui aproximadamente 2,7 cm e termina no tímpano ou membrana timpânica que vibra ao ser incidida por um estímulo sonoro. O tímpano separa o ouvido externo do ouvido médio. O ouvido médio representa uma cavidade cheia de ar na qual estão localizados ossículos articulados entre si (martelo, bigorna e estribo), responsáveis por transmitir as vibrações do tímpano para outra membrana que veda um orifício denominado janela oval. Essa membrana da janela oval separa o ouvido médio do ouvido interno, representado pela cóclea. A cóclea é uma cavidade óssea em forma de caracol onde estão os receptores auditivos. Um de seus propósitos é separar o som em várias componentes de freqüências antes de transformá-lo em impulso nervoso.

Figura 1.29: O ouvido [LENT,2002,pp.190]

Portanto, a detecção de freqüência é desempenhada por vibrações da membrana basilar na cóclea do ouvido. A membrana basilar é mais estreita e rígida na base do que no ápice da cóclea. Na Figura 1.30 (a) está ilustrada a cóclea, que é o órgão receptor do sistema auditivo. Na Figura 1.30 (b) está ilustrado o corte de uma volta da cóclea, em que se pode observar a membrana basilar. As freqüências mais baixas, os sons mais graves, fazem vibrar regiões da membrana basilar próximas ao ápice da cóclea e não conseguem mover com facilidade as regiões próximas à base, conforme observado na Figura 1.31 (a). Ao contrário, as freqüências mais altas, os sons mais agudos, fazem vibrar regiões da membrana basilar perto da base e menos a região perto do ápice, conforme observado na Figura 1.31 (b) [LENT, 2002].

Figura 1.30: Parte do sistema auditivo humano. (A) A cóclea e (B) Mostra de um corte transversal da cóclea. [LENT, 2002]

Figura 1.31: A tonotopia representa uma especialização da membrana basilar: os sons mais graves fazem vibrar o ápice (A), e os mais agudos movimentam a base (B). [LENT,

2002]

Ainda segundo Longuet-Higgins [1979], algumas teorias para o entendimento da percepção musical podem ser consideradas. Sobre a percepção da tonalidade, considera-se a Figura 1.32 como ilustração. Nessa figura são mostradas as notas musicais nas linhas numeradas de y=-2 a y=3 e nas colunas numeradas de x =- 3 a x=4, onde um intervalo numa linha corresponde a uma quinta (7 semitons) e um intervalo numa coluna corresponde a uma terça maior (4 semitons). A principal associação que o ouvinte interpreta ao ouvir cada nota está associada com a tonalidade estendida das primeiras duas notas, porém se as notas se moverem drasticamente no espaço harmônico, o ouvinte será forçado a buscar uma nova tonalidade de acordo com os intervalos menos remotos. Por exemplo, a tonalidade estendida de C12, abrange as notas referentes à escala de C maior e notas referentes à escala de C menor mais duas notas extras, como ilustrado do retângulo da Figura 1.32. Portanto, o ouvinte começa a ouvir uma seqüência de notas e assume que a primeira nota seja a tônica13 da tonalidade e atribui à essa tônica a tonalidade estendida. Se a segunda nota for coerente com a hipótese levantada, por exemplo, se representar a nota mais a direita da tônica ou a imediatamente acima dela, então a hipótese é mantida. Caso contrário, a

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Notas da escala de C maior: C-D-E-F-G-A-B. Notas da escala de C menor: C-D-Eb-F-G-Ab-Bb. As duas notas extras (Db e F#) do exemplo da Figura 1.32 não pertencem a nenhuma dessas duas escalas .

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A escala musical é uma seqüência de 7 notas sucessivas. A tônica é o primeiro grau da escala musical

primeira nota estará mais propícia para ser a dominante, então a tonalidade estendida será movida uma nota para a esquerda no espaço harmônico.

Figura 1.32: Espaço harmônico sugerido por Longuet- Higgins [1979]

Assim, tanto a percepção de tonalidade quanto a percepção de ritmo14 envolve a interação entre o que o ouvinte está ouvindo e ponto de referência e conhecimento criado por ele. Para a percepção de ritmo, esse ponto de referência é o tempo e o metrônomo e na percepção de tonalidade o ponto de referência é a escala formada pela tonalidade estendida LONGUET-HIGGINS [1979].

Griffith e Todd [2001] estudaram a percepção da altura ou tonalidade relacionando-as com o reconhecimento do instrumento musical. Os autores também mencionam sobre a capacidade dos seres humanos em reconhecer um centro tonal e a função de cada altura dentro desse centro, de memorizar melodias e reproduzi-las corretamente e dos diferentes parâmetros que os humanos utilizam para indicar se uma melodia oferece boa ou má qualidade. Sobre todos esses aspectos e todas as habilidades de compositores musicais humanos, Griffith e Todd [2001] discutem as dificuldades e pesquisas realizadas para sistemas de composição artificial.

Sano e Jenkins [1989] propuseram um modelo de rede neural para examinar os estímulos sensitivos na percepção da altura com ênfase na sua representação neural. A tarefa da rede neural proposta é determinar qual a altura e oitava dessa altura através de simulações dos estímulos da membrana basilar.

Scarborough, Miller e Jones [1989] propuseram uma rede neural para análise de tonalidade em uma melodia. A melodia geralmente é escrita em uma tonalidade, e essa tonalidade define uma relação entre as notas e acordes presentes nela. Os humanos conseguem identificar a tonalidade de uma melodia porque

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A percepção de ritmo estudada por Longuet-Higgins [1979] é semelhante a percepção da tonalidade. Para identificar um ritmo de uma seqüência musical, o ouvinte precisa conhecer a batida dessa peça. Se o ouvinte pode identificar duas notas que ocorrem em sucessivas batidas, será possível descobrir quando a próxima batida será realizada. Caso contrário, se outra nota é soada naquela batida, será necessário identificar o tempo dessa nota no começo da próxima batida e atualizar, se necessário, sua estimativa de tempo.

conseguem capturar essa relação. Portanto, a rede neural busca identificar a tonalidade ao obter a relação entre notas e acordes de uma tonalidade, através da ocorrência, disposição e duração dessas notas na melodia.

Bharucha e Todd [1989] sugerem que pessoas que não possuem conhecimento sobre a estrutura de uma melodia são capazes de criar expectativas e ter intuições sobre melodias de sua cultura quando são expostas a vários exemplos dessas melodias. Os autores propuseram um modelo de rede neural que buscasse imitar essas expectativas através das tonalidades de uma cultura e que realizasse predições de acordes dessa tonalidade durante uma melodia, como acontece com humanos.