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A concepção do ensino de Ciências que extrapola a assimilação e

reprodução mecânica de conceitos científicos defende o desenvolvimento de um processo de ensinagem centrado nos significados, sentidos e aplicabilidade dos conhecimentos científicos relacionados ao cotidiano dos educandos. Dessa forma, o saber científico e o fazer devem estar intimamente relacionados à vida cotidiana das crianças, promovendo o letramento através do desenvolvimento de habilidades e ações de investigação.

Tais procedimentos de investigação necessitam de docentes que encorajem cada vez mais os estudantes ao exercício do pensamento, tentativa de resolução de problemas por meio do teste de suas próprias hipóteses. A motivação para investigação deve ser constante, deve mobilizar saberes prévios, mas, sobretudo, deve instigar, inquietar, produzir questionamento que será propulsor para iniciar o ciclo de busca, a construção do conhecimento e seu compartilhamento.

Na perspectiva de Moares, Galiazzi e Ramos (2002) educar pela pesquisa se constitui em três momentos, que dialogam entre si em todo momento do percurso investigativo, em um movimento cíclico e permanente, representado no esquema a seguir6:

Questionar é problematizar, é a fecundação do ato investigativo. É essencial que o sujeito da aprendizagem se envolva diretamente neste questionamento, perceba a necessidade de problematizar sua própria realidade. Dessa forma, as perguntas que surgem tomam sentido, até porque cultura, experiência e saberes

6 Assumo nesta pesquisa os termos Educar pela pesquisa e Ensino com pesquisa como sinônimos e

apoiado em Moraes, Galiazzi e Ramos, como sendo o ensino no qual um movimento dialético, em espiral, que se inicia com o questionar dos estados do ser, fazer e conhecer dos participantes, construindo-se a partir disso, novos argumentos que possibilitam atingir novos patamares desse ser, fazer e conhecer, estágios esses então comunicados a todos os participantes do processo.

QUESTIONAMENTO

CONSTRUÇÃO DE ARGUMENTOS

prévios foram mobilizados pelos questionamentos feitos. A esse respeito, Moraes, Galiazzi e Ramos (2002, p. 12) comentam:

Para que algo possa ser aperfeiçoado, é preciso criticá-lo, questioná-lo, perceber seus defeitos e limitações. É isto que possibilita pôr em movimento a pesquisa em sala de aula. O questionar se aplica a tudo que se constitui o ser, que sejam conhecimentos, atitudes, valores, comportamentos e modos de agir.

Desse modo, compreendo que o professor, ao assumir práticas investigativas, deve estimular o processo de construção do conhecimento por meio de perguntas que ativem o conhecimento prévio dos alunos e os convidem a fazer previsões, antes, durante e após o processo investigativo. Pari passu, ao propor o problema para os alunos, o professor precisa considerar as ideias espontâneas das crianças como especificidade primordial no processo de construção do conhecimento científico.

É importante lembrar que o processo cognitivo evolui sempre numa reorganização do conhecimento, que os alunos não chegam diretamente

ao conhecimento correto. Este é adquirido por aproximações sucessivas,

que permitem a reconstrução dos conhecimentos que o aluno já tem. Assim,

é importante fazer com que a crianças discutam os fenômenos que as cercam, levando-as a estruturar esses conhecimentos e a construir, com

seu lógico, significados dessa parte da realidade (CARVALHO et al., 2010, p. 10) (grifos dos autores).

No entanto, não basta o simples questionamento. Aliás, dele deve partir a construção de argumentos que fundamentarão as novas ideias e emergentes do processo investigativo. Ao argumentar, o aluno consulta diferentes fontes de pesquisa, organiza os dados, trata a informação, experimenta, testa hipóteses, conhecimentos, reformula-as e fundamenta assim, o novo conhecimento.

Na década passada, os PCNs já consideravam que: “Os experimentos simples, que podem ser realizados em casa, no pátio da escola ou na sala de aula com materiais do dia-a-dia, podem levar a descobertas importantes”. As atividades executadas pelos professores contribuem para a elaboração de explicações teóricas feitas pelas próprias crianças, que discutem os resultados obtidos, elaboram hipóteses e, consequentemente, o desenvolvimento científico dos mesmos (BRASIL, 2002).

Atualmente, no documento da Base Nacional Comum Curricular – BNCC, podemos observar a preocupação com a formação de um estudante crítico e capaz de vivenciar momentos de investigação, nos quais a experiência deve estar apoiada

em situações didáticas que explorem a reflexão sobre os conhecimentos e sua compreensão sobre o mundo em que vive. O documento propõe que não basta apenas apresentar aos alunos conhecimentos científicos, é preciso oferecer oportunidades para o envolvimento em processos de aprendizagem nos quais possam vivenciar momentos de investigação que lhes possibilitem exercitar e ampliar sua curiosidade, aperfeiçoar sua capacidade de observação, de raciocínio lógico e de criação (BRASIL, 2017, p.283).

O docente, ao promover aos alunos práticas inovadoras no ensino de Ciências nos anos iniciais, ao organizar a sala de aula como ambiente de pesquisa e diálogo, proporciona momentos investigativos que tornam os alunos mais envolvidos e participativos. Esses momentos de observação e reflexão pelos alunos possibilitam um ambiente intelectualmente ativo, o que inspira as crianças a pensarem sobre questões relevantes de seu contexto, fomentando consequentemente uma tomada de decisão frente à problemática lançada. Porquanto, “quando levamos nossos alunos a refletir sobre os problemas experimentais que são capazes de resolver, ensinamos-lhes, mais do que conceitos pontuais, a pensar cientificamente o mundo e a construir uma visão de mundo”. (CARVALHO et al., 2009, p. 13).

Na perspectiva de educar pela pesquisa proposto por Moraes, Galiazzi e Ramos (2002, p. 16), o processo de construção argumentativa é concebido da seguinte maneira:

A pesquisa em sala de aula precisa do envolvimento ativo e reflexivo permanente de seus participantes. A partir do questionamento é fundamental pôr em movimento todo um conjunto de ações, de construção de argumentos que possibilitem superar o estado atual e atingir novos patamares do ser, do fazer e do conhecer.

Por outro lado, a incorporação dos novos saberes construídos por meio da argumentação, precisa ser incorporado aos novos discursos. Deve primeiramente, expressar com clareza a nova concepção construída a partir do questionamento e argumentação, e em um segundo momento, divulgar os resultados da investigação. O registro é fundamental para que os pares conheçam e acessem as novas percepções construídas.

É importante que a pesquisa em sala de aula atinja um estágio de comunicar resultados, de compartilhar novas compreensões, de manifestar novo estado de ser, do fazer e do conhecer, o que contribui para a

validação na comunidade em que esse processo está se dando (MORAES; GALIAZZI; RAMOS, 2002, p. 19).

Os estudantes ao refinarem suas práticas de produção textual e sistematização de suas ideias, relacionam estes momentos do educar pela pesquisa. Diante das tentativas de escrita, validação e crítica dos argumentos, a comunicação final se reorganiza e se reelabora.

Em relação às ideias expressas pelos alunos no processo de argumentação, Carvalho e colaboradores (2010) afirmam que não podemos esperar que as crianças relatem todos os acontecimentos durante a atividade, nem exigir que os relatos estejam coesos e claros da mesma forma como o professor entende, uma vez que cada aluno destacará, de acordo com seus interesses, determinado aspecto da atividade desenvolvida.

Quando o professor tem clareza das intenções educativas da pesquisa e conduz os alunos neste ciclo de construção e reconstrução individual e coletiva, o movimento de pesquisa toma corpo e fortalece a qualidade da transformação dos envolvidos. Atingimos, portanto, a mudança conceitual que afeta o estudante, já que partiu de uma realidade vivida com propriedade, acionando contextos e conhecimentos pessoais.

Para que o professor alcance a clareza educativa do seu trabalho e impulsione os alunos num movimento cíclico de autonomia e interatividade na ensinagem, é necessário que o mesmo invista em sua formação e problematize frequentemente sua prática docente, tema que discuto na seção a seguir.

V - FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES: DIÁLOGO E REFLEXÃO EM