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JORNALISMO IMPRESSO: RESuLTADO DE uMA TRADIÇÃO

Antes de tratar do jornalismo na atualidade, em diferentes suportes, dentre eles a Web, é necessário falar do jornalismo impresso, situado na tradição dos produtos culturais impressos, que resultam de uma longa história. Essa questão torna-se relevante à luz de indagações acerca dos modos por meio dos quais o discurso toma forma, ou seja, questionamen- tos sobre a materialidade discursiva9.

Recebem atenção especial na moderna análise do discurso os ques- tionamentos quanto ao espaço no qual está disponibilizado o material significante. O sentido é produzido a partir dessa organização, que pode ser de várias ordens, sonora, escrita, imagética ou, no caso do jornal im- presso, uma mescla de vários recursos discursivos.

A materialização do discurso midiático, em sua trajetória, estabeleceu hierarquias para definir quais fatos passariam à notícia, visto que há uma limitação de espaço para a acomodação do material. É esse um constran- gimento relevante, que atua na seleção dos acontecimentos noticiáveis e sua organização. Como lembra Charaudeau (1994, p. 9), o quadro de constrangimentos atua na definição do contrato de comunicação, espe- cialmente por operacionalizar a aproximação entre os participantes do processo (enunciador e destinatário).

Para o autor, uma importante questão surge com a caracterização da circunstância material na qual se realiza o ato comunicacional. A questão central concentra-se no meio onde esse ato se desenvolve, bem como o ambiente, canal etc. Seguindo essa lógica, considerar a materialidade discursiva pressupõe colocar em relevo não apenas um discurso en- quanto unidade analítica, mas também os constrangimentos referentes às potencialidades e limitações do suporte, o que finda por “autorizar” uma narrativa, ou inibi-la, por sua inviabilidade técnica. Com o objetivo de refletir sobre a Web como novo espaço de organização do discurso jornalístico, propõe-se situar brevemente a evolução das estratégias de apresentação textuais.

Até meados do século xix, o jornal era uma estrutura dependente da organização gráfica do livro, pois não havia máquinas específicas para a produção dos jornais. “Contudo, muito antes de os jornais, com suas rotativas, depois seus linotipos, entrarem na era industrial, eles iniciaram

uma evolução sensível de sua apresentação ao mesmo tempo em que seu conteúdo também se modificava”. (mouillaud; tétu, 1989, p. 55).

Com isso, percebe-se que a discursividade do jornal vai além daquilo que é dito, visto que para o estabelecimento do plano discursivo diário, há que se buscar compreender a definição, por exemplo, da estrutura gráfica, que permanece imutável, devendo ser diariamente preenchida com novidades.

A seleção e forma de apresentar as notícias progressivamente deram a cada jornal sua identidade própria ao ponto que nenhum órgão de imprensa atualmente ousa aplicar uma modificação sensível sem antes se explicar junto aos seus leitores: toda modificação da forma de um jornal aparece como a alteração violenta de sua identidade. (mouillaud; tétu, 1989, p. 55).

É esse também um caminho longo na estruturação do jornal, tal como conhecemos hoje. A textualidade do jornal não se restringe apenas à or- ganização escrita clássica, pois ela lança mão também de um conjunto de variáveis visuais, cuja história é relativamente nova. Por exemplo, Le

Journal de Paris, de 1777, apresentava apenas duas colunas, ou seja, havia

movimentação apenas no eixo vertical do jornal. (mouillaud; tétu, 1989, p. 55). A divisão do plano visual (Fig. 3) não propunha muitas alternativas ao leitor.

Essa disposição espacial privilegiava de maneira acentuada a ordem temporal do discurso. A proposta narrativa não sofria interrupção; ne- nhuma ilustração incorria para suspendê-la; nenhum lead ou intertítulo introduzia uma enunciação secundária. Havia um único plano narrativo proposto, com base na ordem cronológica dos acontecimentos. “[...] esta forma de apresentação corresponde exatamente à lógica temporal do dis- curso: ela é a apresentação do logos em movimento, e não a apresentação de um acontecimento”. (mouillaud; tétu, 1989, p. 57).

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O jornal era, nessa concepção, não apenas o narrador do contem- porâneo, mas de uma temporalidade, passando do mais antigo ao atual, sempre nessa ordem. O jornal coloca-se na posição de observador e narra, de maneira única e seqüenciada, o desenvolvimento dos fatos. A ruptura desse modelo se dá com o desenvolvimento dos recursos gráfi- cos. A paginação passa por transformações, como o aumento do número de colunas, diferenciação de caracteres, ilustrações e cores. Com isso, o plano do jornal torna-se segmentado em unidades informacionais. “A paginação aparece então como uma retórica do espaço que desestru- tura a ordem do discurso (sua lógica temporal) para reconstituir um dis- curso original que é, precisamente, o discurso do jornal”. (mouillaud; tétu, 1989, p. 57-58).

Exemplo é o jornal pernambucano O Carapuceiro, com circulação entre 1832 e 1847, na verdade tradução do jornal inglês The Spectator,10 que cir-

culou por um curto período, entre 1711 e 1714, e foi o segundo impresso a surgir na Inglaterra (Fig. 4). O Carapuceiro era redigido unicamente por Frei Miguel do Sacramento Lopes Gama (Fig. 5). A linha editorial caracterizava- se pela abordagem de assuntos sociais como a questão da mulher e rela- cionados à moral. O nome do periódico, “carapuceiro”, era proveniente de uma forma irônica de tratar questões de repercussão social sem se dirigir diretamente a pessoas, daí a dinâmica da carapuça, proposta por meio do jornal de Lopes Gama, a quem servisse a carapuça, dizia ele, que ficasse com ela e saísse de mansinho. (nascimento, 1969, p. 92-106).

Na parte superior, acima do título, figurava a ilustração de um vende- dor de carapuças — O Carapuceiro, e sua loja repleta de carapuças, dentre elas coroas, tricórnios, tiaras papais/episcopais, cartolas, enfim, todo tipo de adorno associado ao poder. O objetivo do periódico era, ironicamente, por meio de suas matérias, oferecer as carapuças, servindo-se do conhe- cido adágio: “se a carapuça lhe serviu...” (Fig. 6). Sobre isso, diz o padre jornalista:

Façam de conta que assim como há lojas de chapéus; o meu periódico é fábrica de carapuças. As cabeças em que elas assentarem bem, fiquem-se com elas, se quiserem; ou rejeitem-as, e andarão com a calva às moscas, ou mudem de darme de cabeças, que é o partido mais prudente. (Apud pallares-burke, 1999, p. 134).

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Por meio do uso do sarcasmo, O Carapuceiro apresentava um discurso ácido, posicionava-se como irreverente, estabelecendo uma relação dis- cursiva baseada numa enunciação direta e bem-humorada. Não obstante a falta de recurso da época, que se impunha como constrangimento de ordem técnica, usava ilustrações para se aproximar de seu público, se- gundo preconizado pela perspectiva do contrato de comunicação.

O discurso deve ser entendido a partir de sua organização e de sua materialização. As possibilidades técnicas atuam como importante cons- trangimento, definindo, por exemplo, a extensão de um discurso, como no período em que havia escassez de material para escrita. O exemplo histórico é oferecido por Arns (2007)11 em A técnica do livro segundo São Jerônimo. São Jerônimo, um dos pensadores da Patrologia Cristã,12 vê-se

afligir pela dificuldade em conseguir o suporte para seus textos.

Jerônimo adverte seus amigos de Aquiléia, dizendo-lhes que a falta de papiro não pode servir como pretexto para cartas breves: “Por que ter-me enviado uma epístola tão breve [...]? Não pode ser por falta de papiro, creio, pois é objeto de comércio no Egito”. [...] “o pequeno formato de meu papel mostrará que estamos no deserto”. (arns, 2007, p. 21). Desde os impulsos tecnológicos, o jornal passa a representar a socie- dade por meio de uma pluralidade de narrativas. Essa vai ser a abertura para as especializações dentro do espaço (plano) do jornal. Rubricas, se- ções, enfim, segmentação do discurso, o que marca um posicionamento de aproximação no tocante à realidade vivida pelas pessoas, uma vez que a sociedade é marcada pela multiplicidade de falas.

Então, o que vem a ser o “discurso do jornal”? No que ele difere do fato, digamos, in natura, tal e qual acontece? A questão aqui fundamental passa a ser a representação, ou melhor, os jogos de representação. O jornalismo desenvolve um discurso específico, tributário de uma série de técnicas e estratégias discursivas.

Pela soma de técnicas e estratégias aliadas ao discurso, bem como pelo estabelecimento de critérios de noticiabilidade como relevância e interesse, cria-se um tipo de expectativa quanto a esse discurso. Um novo critério de noticiabilidade é definido pela noção de concorrência. Sob uma ótica comercial, notícia não é só aquilo que desperta interesse no leitor, mas aquilo pode ser noticiado pelo concorrente.

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É ao suporte que de fato está atrelada a noção de status, conseguida pelo livro, ao longo de sua evolução, pela capacidade de prolongar a exis- tência de bens culturais. Falar da leitura hoje é falar do fácil manuseio de suportes como o livro ou o jornal. No entanto, essa forma de acesso aos textos nem sempre foi tão simples e, de acordo com a forma de acesso, tem-se uma forma de leitura, das formas públicas às privadas, e dos for- matos que necessitam de uma maior ou menor investida no manuseio desse suporte. Ao tratar do frenesi acerca da revolução proposta pelo texto eletrônico, Chartier (1999a) lembra que até meados de 1450, com a revolução de Gutenberg, um texto só era reproduzido à mão, individual- mente. O que se tem na contemporaneidade é, sobretudo, a possibilidade de uma maior circulação.

O livro pós-Gutenberg não representa uma revolução com plenas rupturas em relação aos manuscritos, visto que ambos baseiam-se numa mesma estrutura fundamental, a do códex.

Tanto um como outro são objetos compostos de folhas dobradas um certo número de vezes, o que determina o formato do livro e a sucessão dos cadernos. Estes cadernos são montados, costurados uns aos outros e protegidos por uma encadernação. A distribuição do texto na superfície da página, os instrumentos que lhe permitem as identificações (paginação, numerações), os índices e os sumários: tudo isto existe desde a época do manuscrito. (chartier, 1999a, p. 7-8).

Traçar uma historiografia do livro é também tratar das formas de aces- so ao suporte material. Os textos escritos, em suas origens, que eram dis- postos no formato de rolos, pressupunham um maior empenho do leitor, visto que este deveria proceder quase que simultaneamente aos atos de desenrolar e enrolar o texto. A leitura antiga é radicalmente diferente do que conhecemos e mesmo diferente daquilo que Gutenberg conhecia.

Este livro é um rolo, uma longa faixa de papiro ou de pergaminho que o leitor deve segurar com as duas mãos para poder desenrolá-la. Ele faz apa- recer trechos distribuídos em colunas. Assim, um autor não pode escrever ao mesmo tempo que lê. Ou bem ele lê, e suas duas mãos são mobilizadas para segurar o rolo, e nesse caso, ele só pode ditar a um escriba suas reflexões, notas, ou aquilo que lhe inspira. (chartier, 1999a, p. 24).

Tem-se, daí, a noção de um ato performático inscrito numa obra (zumthor, 2000). O ato de ler, como resultado de uma apropriação, encontra-se diretamente dependente da forma de apropriação. Se o texto, na concepção de Eco (1984, 1994), pressupõe um leitor modelo, numa concepção histórica, da mesma forma o texto prevê um leitor, com base nas possibilidades e limitações inseridas não apenas na obra, enquanto narrativa textual, mas sobretudo tendo-se por referência a condição de acesso ao tipo de suporte.

Uma das rupturas apresentadas pela inscrição eletrônica diz respeito ao manuseio, que antes era direto. O texto era desenrolado; a leitura pressu- punha um fluxo contínuo; havia fronteiras visíveis, com cadernos, seções, encerrado em capas. O texto eletrônico abre a possibilidade de embaralhar, entrecruzar e reunir textos. “Todos esses traços indicam que a revolução do livro eletrônico é uma revolução nas estruturas do suporte material do escrito como nas maneiras de ler”. (chartier, 1999a, p. 13).

Nessa perspectiva, como é caracterizado então o ato de ler, mediante as novas formas de apresentação e distribuição textual, a partir das pos- sibilidades de registros digitais? “O texto eletrônico reintroduz na escrita alguma coisa das línguas formais que buscavam uma linguagem simbólica capaz de representar adequadamente os procedimentos do pensamento”. (chartier, 2002, p. 16).

Sendo assim, a novidade não está apenas na forma de inscrever e disponibilizar o texto; ela pressupõe, sobretudo, uma outra forma de apropriação e leitura do material. Se acreditamos que a organização do conteúdo, dependente de sua disponibilização num formato, suscita uma forma de ler, como no caso dos rolos ou das edições no formato de códex, como fica essa situação agora, uma vez que os textos passam a estar dis- persos, organizados de forma não-linear, e dispostos em distintos níveis, de acordo com a disponibilidade de bancos de dados?

Essa nova organização textual, ao pressupor uma outra forma de aces- so, viabiliza formas de leitura diferentes, o que, por sua vez, resulta numa nova performance de leitura. Esse novo momento performático pode ser ilustrado pelas possibilidades abertas ao leitor-navegador, em especial o público jovem, que ora protagoniza essa inovação. Por exemplo, a nova organização textual eletrônica esboça um novo idioma, imediatamente reconhecível por todos.

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É o caso da invenção dos símbolos, os emoticons, como se diz em in- glês, que utilizam de maneira pictográfica alguns caracteres do teclado (parênteses, vírgula, ponto e vírgula, dois pontos) para indicar o registro de significado das palavras: alegria13 :-) tristeza :-( ironia ;-) ira :-@ ...

ilustram a procura de uma linguagem não-verbal e que, por essa mesma razão, possa permitir a comunicação universal das emoções e o sentido do discurso. (chartier, 2002, p. 17, grifo do autor).

Mediante isso, passa-se à constatação de que há de fato uma mo- dificação nas formas de leitura, o que não quer dizer exatamente uma diminuição dessa prática. Há, sim, novas modalidades de leitura, por vezes operando a partir de elementos mais fragmentados. Quando se fala da redução do índice de leitura, na verdade não se atenta para as modalidades que divergem das tradicionais formas de leitura. “É preci- so utilizar aquilo que a norma escolar rejeita como um suporte para dar acesso à leitura na sua plenitude, isto é, ao encontro de textos densos e mais capazes de transformar a visão do mundo, as maneiras de sentir e de pensar”. (chartier, 1999a, p. 104).

Tratar das identidades de cada suporte é discutir sobretudo essa noção de evolução de um meio, em especial quanto a sua identidade a partir de sua materialidade. Nesse mesmo sentido, a evolução do jornal é tam- bém marcada pelas modificações inerentes às definições de seu suporte. Segundo Chartier (1999a, p. 82), nos séculos xvii e xviii, o jornal e o livro mantinham uma mesma estrutura. É só quando o jornal adquire um formato maior e uma ampla circulação que o seu suporte material terá um tratamento mais livre, passando a ser carregado, dobrado, consumido por muitos e até mesmo rasgado.

Estamos diante de um outro tipo de suporte, o jornal diário, com texto mais efêmero, que pode ser dobrado, riscado ou rasgado. Esse suporte pode ser manipulado de forma distinta. O jornal impresso, tal qual o conhecemos há tempos, hoje é totalmente produzido por meio digitais, estando aí armazenado até sua confecção final. Estamos, com isso, no limiar de mudanças quanto à finalização e distribuição desse material.

Se antes o jornal podia ser recortado e jogado fora, igualmente, de acordo com os recursos digitais, um material pode ser selecionado, re- cortado, copiado, arquivado, e o restante pode ser apagado. Da mesma

forma, uma vez que já dispomos das possibilidades de produção e de canais para a distribuição do material digital, “por que não pensar que um dia esta composição eletrônica do jornal seja diretamente recebida e lida em uma tela, ao menos por uma parte dos leitores?”. (chartier, 1999a, p. 138).

Ao longo do tempo, os suportes textuais apresentam transformações, o que evidencia também a sedimentação de características que definem suas identidades, como a paginação, localização no espaço impresso, tudo de forma linear. A noção de criação de identidades é fundamental para o produto, visto que cria e mantém ligação constante com seu público. Essa noção é apontada como fundamental para a constituição de uma relação contratual.

A consolidação dos elementos capazes de conferir identidade ao produto e, dessa forma, permitir o reconhecimento por parte de seu pú- blico, finda por consolidar a noção contratual, que assegura a leitura, ou consumo, de um produto. E agora, mediante as novas possibilidades dos produtos digitais, é possível falar dessa noção contratual? Há modalidades formais que permitam esse reconhecimento?

Os produtos digitais, por princípio, também dependem de um su- porte, pelo menos para o instante de consumo. Pode-se falar da tela do computador ou do e-book,14 que já conta com um suporte próprio, como o

leitor Librié, lançado pela Sony. Esse leitor apresenta o mesmo tamanho e peso de um livro normal, mas pode armazenar em média vinte livros.

Em geral, os livros digitais, que podem ser conseguidos via rede, ex- piram num prazo de sessenta dias. Essa questão põe em xeque a longa tradição do livro visto como objeto durável não apenas por seu con- teúdo, mas também quanto a sua formatação. Sobre o livro eletrônico e sua relação com as modalidades de suporte, Chartier (2002, p. 112) indaga acerca “da capacidade que teria esse novo livro para encontrar ou produzir seus leitores”.

A indagação do autor, na verdade, é sobre a noção contratual ou rela- cional que essas novas modalidades de suporte poderiam estabelecer com seus públicos, já tradicionalmente habituadas à relação com formatos consolidados. É claro que ainda estamos diante de um fato parcialmente conhecido. A realidade dos produtos digitais ainda não está estabilizada e, na maioria das vezes, ficamos como que tateando no escuro, em meio a suposições acerca do devir, por ora apenas parcialmente conhecido.

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O texto, na condição de matéria significante, é o mesmo, indepen- dentemente do suporte. O que muda, na verdade, é sua forma de apre- sentação e disponibilização. Para Chartier (1999a, p. 138), “mesmo que seja exatamente a mesma matéria editorial a fornecida eletronicamente, a organização e a estrutura da recepção são diferentes, na medida em que a paginação do objeto impresso é diversa da organização permitida pela consulta dos bancos de dados informáticos”.

Encontramo-nos diante de um impasse vivido pela comunicação de massa. No mundo contemporâneo, as tecnologias possibilitam a difusão de conteúdos de forma distinta, podendo moldar um mesmo material para públicos diferentes, pensando-se em diferentes modalidades de leitura, de acordo com cada perfil, base da comunicação segmentada. O texto, como matéria significante, permanece. A mudança desafiadora fica por conta da instância emissora, para a qual “a diferença pode decorrer de uma decisão do editor, que, em uma era de complementaridade, de compatibilidade ou de concorrência dos suportes, pode visar com isso diferentes públicos e diversas leituras”. (chartier, 1999a, p. 138).

Como ressalta Chartier (1999b, p. 100-101),

a revolução do texto eletrônico será ela também uma revolução da leitura. Ler sobre uma tela não é ler um códex. Se abre possibilidades novas e imensas, a representação eletrônica dos textos modifica totalmente a sua condição: ela substitui a materialidade do livro pela imaterialidade de textos sem lugar específicos; às relações de contigüidade estabe- lecidas no objeto impresso ela opõe a livre composição de fragmentos indefinidamente manipuláveis; à captura imediata da totalidade da obra, tornada visível pelo objeto que a contém, ela faz suceder a navegação de longo curso entre arquipélagos textuais sem margens nem limites. Essas mutações comandam, inevitavelmente, imperativamente, novas maneiras de ler, novas relações com a escrita, novas técnicas intelectuais.

OS DISPOSITIVOS MIDIÁTICOS – MODOS DE MOSTRAR,