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1.1 - Justificação do tema e enquadramento

1 - INTRODUÇÃO

1.1 - Justificação do tema e enquadramento

A exploração de agregados naturais é hoje em dia encarada como um processo com significativas repercussões ambientais devidas, em grande parte, ao grande volume de material extraído, com consequente diminuição de recursos naturais não renováveis, às alterações significativas da morfologia dos terrenos e à necessidade por procurar e explorar de novos locais de extração. Como exemplo do exposto, refira-se que na Europa se extraem cerca de 15 toneladas - ton, de minerais e minérios por habitante - hab, e por ano, das quais cerca de dois terços são rochas industriais e ornamentais (Fortunato et al., 2009).

A par da situação apresentada surgem os problemas inerentes à gestão dos escombros e dos finos produzidos na indústria extrativa. O grande volume de resíduos gerados nesta atividade, bem como nas mais diversas atividades domésticas, agrícolas, comerciais e industriais, associado à falta de medidas para promover a valorização dos mesmos, também têm vindo a contribuir para o atual estado de degradação do meio ambiente e para o agravamento dos riscos para a saúde pública, panorama que a sociedade atual pretende inverter através da implementação de políticas de desenvolvimento sustentável.

Neste sentido, um número crescente de países tem vindo a contemplar nas suas disposições legais, relacionadas com a atividade extrativa, políticas ativas de proteção do meio ambiente e, ao mesmo tempo, a incentivar a reciclagem dos resíduos como agregados reciclados alternativos aos agregados naturais, desde que os primeiros também garantam um comportamento adequado às obras de engenharia civil ao longo do seu tempo de vida útil.

Em matéria de gestão integrada de resíduos, numa perspetiva da sua reciclagem futura, a Diretiva 75/442/CEE - Comissão Económica Europeia, de 15 de julho, foi um marco. Aproximou as diferentes legislações nacionais dos vários estados-membros que à data integravam a União Europeia - UE, e teve como objetivos proteger o meio ambiente e o homem, e favorecer a recuperação de resíduos e a utilização de agregados reciclados (Freire, 2011).

Em Portugal, o quadro jurídico da gestão de resíduos foi pela primeira vez estabelecido em 1985, com a publicação do Decreto-Lei - DL, número - nº 488/85, a 25 de novembro. Como resultado e de acordo com aquele DL, foram lançadas as bases para um sistema de registo obrigatório de resíduos e para a definição de competências e responsabilidades no domínio da gestão dos mesmos. Atualmente vigora o DL nº 73/2011, de 17 de junho, que estabeleceu o Regime Geral aplicável à Prevenção, Produção e Gestão de Resíduos - RGPPGR. De entre as alterações introduzidas por este diploma ao Regime Geral da Gestão de Resíduos - RGGR, previsto no diploma anterior, o DL nº 178/2006 de 5 de setembro, salienta-se a prioridade ao fomento da reutilização e da reciclagem dos resíduos com vista a prolongar o seu uso na economia. Para a concretização deste objetivo, estabeleceram-se requisitos para que substâncias ou materiais resultantes de um processo produtivo possam ser considerados subprodutos e não resíduos, e critérios para que determinados resíduos

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deixem de ter o estatuto de resíduo, e definiram-se metas de utilização, com 5% de materiais reciclados a deverem ser utilizados em empreitadas de obras públicas.

Os Resíduos de Construção e Demolição - RCD, um dos dois resíduos a reciclar estudados nesta dissertação, são uma das alternativas possíveis aos agregados naturais na indústria da construção. A sua produção anual é significativa comparativamente à dos restantes resíduos, quer se trate de Portugal, quer se tratem dos estados-membros da UE, onde os valores globais estimados são, respetivamente, 7,5x106 ton e 100x106 ton.

Para além do exposto, o fluxo dos RCD apresenta outras particularidades que dificultam a sua gestão, razão que, entre outras, evidencia a necessidade de criar um regime jurídico próprio, estabelecendo normas técnicas relativas às operações de gestão de RCD. O enquadramento legal com esse fim ficou consagrado, em Portugal, com a publicação do DL nº 46/2008, de 12 de março. No âmbito deste diploma foram publicadas quatro especificações pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil - LNEC, direcionadas para a reciclagem de RCD em betões de ligantes hidráulicos (LNEC E 471 (2009)), em misturas betuminosas a quente em central (LNEC E 472 (2009)), em camadas não ligadas de pavimentos (LNEC E 473 (2009)) e em aterro e camada de leito de infraestruturas de transporte (LNEC E 474 (2009)).

No caso das escórias de aciaria de Forno de Arco Elétrico - FAE, o segundo resíduo a reciclar estudado, a Siderurgia Nacional Empresa de Produtos Longos, S.A. - SN, prevê que a produção

anual deste resíduo em Portugal ronde, a médio prazo, as 400x103 ton. Contudo, contrariamente ao

que se verifica para os RCD, em Portugal, não existe qualquer tipo de legislação específica, pelo que, neste caso, as operações de gestão das escórias de aciaria de FAE são reguladas em concordância com o previsto pelo RGPPGR.

Conforme mencionado por Roque et al. (2010), a reciclagem dos resíduos em obras

geotécnicas deve ser acompanhada de um estudo das suas propriedades ambientais e de engenharia. Comprovando-se que não é relevante o seu potencial poluente para o meio ambiente e para a saúde pública, não há razão para que esses materiais alternativos não possam ser aplicados em obra, se estiver garantido um comportamento mecânico adequado destas ao longo do seu tempo de vida útil. Segundo os mesmos autores e nestas condições, ou seja, de adequação ambiental e mecânica dos materiais alternativos para utilização em obra, deve-se mesmo privilegiar, no quadro de uma política de construção sustentável e de gestão de recursos adequada, a sua utilização em detrimento da dos materiais naturais.

Na ausência de legislação específica para a classificação da perigosidade ambiental dos resíduos em obras geotécnicas, a sua reciclagem vem sendo permitida desde que pertencentes à categoria dos resíduos admissíveis em aterros para resíduos inertes, em conformidade com os requisitos mínimos previstos no DL nº 183/2009, de 10 de agosto, por se admitir que verificadas estas condições não existe risco para o meio ambiente e para a saúde pública. As especificações LNEC para os RCD preveem um controlo ambiental destes materiais, segundo os requisitos do diploma anteriormente indicado, com a frequência mínima de duas vezes por ano. No que se refere às

escórias de aciaria de FAE, os estudos já realizados por Roque et al. (ibid.) mostraram tratar-se de

- 3 - perigosidade ambiental das escórias de aciaria, foi evidenciada a sua adequabilidade mecânica para a construção de camadas não ligadas de pavimentos e de aterros estruturais de infraestruturas

rodoviárias (Gomes Correia et al., 2012). Um estudo semelhante ao realizado com as escórias de

aciaria, mas ainda numa fase inicial, é referido em Freire et al. (2011) para os RCD, tendo em vista a

sua reciclagem em camadas não ligadas de pavimentos rodoviários.

Nos estudos referidos no parágrafo anterior, privilegiou-se a reciclagem dos dois resíduos em obras rodoviárias, em particular em duas aplicações específicas: camadas de pavimento e de aterro. No entanto, na avaliação das propriedades dos resíduos não foi abordado o estudo da durabilidade. É neste contexto que na presente dissertação se estuda a durabilidade dos RCD e das escórias de aciaria de FAE e se avalia a viabilidade técnica da sua reciclagem em estruturas de drenagem de infraestruturas de transporte e de obras geotécnicas.

No que respeita à durabilidade dos resíduos a reciclar, entende-se que a mesma é fundamental para garantir o adequado funcionamento das obras ao longo do seu tempo de vida útil, à semelhança do já reconhecido com a utilização dos agregados naturais em estudos desenvolvidos por Quinta Ferreira (1990) e por Jeremias (1991). Acresce que na bibliografia consultada, designadamente na internacional, não se identificaram estudos sobre a durabilidade dos agregados reciclados em geral, e dos resultantes do processamento dos RCD e das escórias de aciaria de FAE em particular, explicável pelo facto da utilização deste tipo de agregados em obra ainda ser uma aplicação relativamente recente, contrariamente ao verificado com os agregados naturais. Entende-se, por isso, que o presente trabalho não só contribuirá para avaliar a durabilidade dos dois agregados reciclados, para os quais se perspetiva uma crescente utilização em obras de engenharia civil, como terá relevância internacional.

Em relação à aplicação dos resíduos em estruturas de drenagem, privilegiou-se a sua utilização na construção da camada de drenagem e recolha dos lixiviados do sistema de proteção basal dos aterros de resíduos. O elevado volume de material que pode ser reciclado na construção desta camada e o número de aterros de resíduos que vão continuar a ser construídos ou ampliados em Portugal justificam o estudo da durabilidade dos RCD e das escórias de aciaria de FAE aos lixiviados. Atendendo, porém, a que se utilizou água como segundo meio aquoso, os resultados obtidos permitirão também avaliar sobre a aplicabilidade dos dois resíduos selecionados em estruturas de drenagem de outras obras geotécnicas que estejam preferencialmente em contacto com aquele meio.

Por último, refira-se que o estudo apresentado nesta dissertação será complementado por um outro, a desenvolver no âmbito de outra dissertação, cujo objetivo principal será a avaliação do comportamento hidráulico dos dois resíduos a longo prazo, através da realização de ensaios de permeabilidade.

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1.2 - Objetivos

O principal objetivo da presente dissertação reside na avaliação da suscetibilidade à

degradação de dois agregados reciclados, o Agregado de Betão britado - ABRCD, e o Agregado

Siderúrgico Inerte para a Construção - ASIC, resultantes do processamento de dois resíduos, respetivamente, de RCD e de escórias de aciaria de FAE, tendo em vista a sua utilização na construção de estruturas de drenagem de infraestruturas de transporte e de obras geotécnicas, em particular na camada de drenagem e recolha dos lixiviados do sistema de proteção basal dos aterros de resíduos. Esta é a razão pela qual os ensaios de avaliação da durabilidade dos dois agregados reciclados foram realizados com água, recolhida na rede de abastecimento público, e com um lixiviado, recolhido num aterro de Resíduos Sólidos Urbanos - RSU.

O mesmo programa experimental realizado com os agregados reciclados foi aplicado a dois agregados naturais, um de basalto, e um outro de calcário, com o objetivo de comparar os resultados obtidos. A relevância desta comparação resulta da falta de dados na bibliografia consultada sobre a durabilidade dos agregados reciclados selecionados e de estes existirem para os dois agregados naturais acima indicados.

Ao exposto, acresce que, de acordo com o DL nº 183/2009, o material a integrar na camada drenante dos aterros de resíduos deve ser isento de material calcário devido à possível dissolução do

carbonato de cálcio (CaCO3). Assim, complementarmente ao objetivo principal, também se pretende

avaliar a durabilidade do calcário em presença do lixiviado.