PARTE I – CORPO TEÓRICO
4. METODOLOGIA
4.1. Justificativas e limitações metodológicas
Neste subcapítulo, buscamos expor os motivos que nos levaram a optar e acreditar que a metodologia escolhida tem potencial para atender as expectativas desta pesquisa. Apesar de termos uma ideia preconcebida do corpus metodológico deste trabalho, buscamos em outras pesquisas consagradas, exemplos utilizados com sucesso no âmbito da hipótese do Agenda-setting. Desta forma, procuramos manter algumas linhas metodológicas semelhantes àquelas encontradas em pesquisas similares à que nos propomos realizar aqui. De maneira geral, todas as pesquisas levantadas oferecem, em diferentes parcelas, contributos para o nosso trabalho.
Com a finalidade de facilitar a consulta e a comparação, discriminamos os principais aspectos de alguns trabalhos analisados, na forma de tabelas, conforme seguem abaixo:
McCombs e Shaw 1972
The Agenda-Setting Function of the Mass Media. Artigo
Análise cruzada (20 dias) Método
Sondagem: questionário para 100 eleitores indecisos (amostragem representativa) da cidade de Chapel Hill – Carolina do Norte.
Análise de conteúdo: cinco jornais, duas revistas semanais e os noticiários noturnos de dois canais de televisão.
Fonte de dados
Campanha eleitoral para eleições presidenciais Tema
Correlação entre a agenda dos meios de comunicação de massa, a agenda
do público e a agenda dos candidatos. Produto
Considera as diferenças entre os veículos de comunicação (jornais, revistas e televisão) como fatores condicionantes do tempo necessário para a formação da agenda temática.
Cronologia dos efeitos
Tabela 5: McCombs e Shaw, 1972
Tipton, Haney e Baseheart 1975
Media Agenda-setting in City and State Election Campaigns. Artigo
Análise cruzada (três meses) Método
Sondagem: três entrevistas durante a campanha eleitoral
Análise de conteúdo: agenda dos meios de comunicação foi extraída de estações de rádio, jornais locais e emissoras de televisão.
Fonte de dados
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Campanha para eleições presidenciais Tema
Identificação de correlações existentes por comparação entre as agendas
dos media e do público. Produto
Tabela 6: Tipton, Haney e Baseheart, 1975
Cook, Tyler, Goetz, Protess, Leff e Molotch 1983
Media and Agenda-setting: Effects on the Public, Interest Group Leaders,
Policy Makers, and Policy. Artigo
Análise cruzada Método
Sondagem: grupos de pessoas expostas a programas televisivos e formuladores de políticas públicas.
Análise de Conteúdo: conteúdo relacionado a fraudes e abusos no sistema de saúde americano.
Fonte de dados
Fraudes e abusos no sistema de saúde americano Tema
Efeitos da investigação televisiva de notícias sobre membros do público em
geral, grupos de interesse e formuladores de políticas governamentais. Produto
Tabela 7: Cook, Tyler, Goetz, Protess, Leff e Molotch, 1983
Brosius e Kepplinger 1990
The Agenda-setting Function of Television News: Static and Dynamic
Views. Artigo
Análises de seções cruzadas e análises longitudinais Método
Sondagens: 53 sondagens semanais, com amostra de mil pessoas por sondagem.
Análise de Conteúdo: análise contínua de todos os temas, nos quatro maiores programas de notícias na Alemanha no ano de 1986.
Fonte de dados
Problema político nacional mais importante. Tema
Comparação estática (seção cruzada) e dinâmica (longitudinal) para identificar mudanças de opinião. Relacionam os efeitos da Agenda-setting aos temas veiculados de forma intensa e variada.
Produto Efeitos descritos em modelos de curto prazo, considerando períodos de
tempo de até uma semana. “Os dados empíricos sugerem que há um considerável período de tempo entre a mudança da cobertura dos meios e a mudança da agenda do público, com períodos maiores para a imprensa escrita do que para a televisão”.
Cronologia dos efeitos
Tabela 8: Brosius e Kepplinger, 1990
Funkhouser 1973
The Issue of the Sixties: An Exploratory Study in Dynamics of Public
Opinion Artigo
Análise Longitudinal Método
Sondagem: Gallup
Análise do Conteúdo: artigos de três revistas semanais
Fonte de dados
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Comparação entre a cobertura de mídia dos grandes temas da década de
1960, a opinião pública e a realidade destes temas. Produto
Tabela 9: Funkhouser, 1973
Winter e Eyal 1981
Agenda-setting for the Civil Right Issue. Artigo
Análise Longitudinal Método
Análise de conteúdo: meios de comunicação Sondagens: opinião pública
Fonte de dados
Direitos civis Tema
Efeitos de Agenda-setting para o tema “direitos civis” Produto
Definiu como lapso do efeito ótimo: “tempo decorrido entre a associação máxima dos meios de comunicação e a ênfase do público por um tema.” Ocorre entre quatro a seis semanas.
Cronologia dos efeitos
Tabela 10: Winter e Eyal, 1981
Behr e Iyengar 1985
Television News, Real-World Cues, and Changes in the Public Agenda. Artigo
Análise longitudinal Método
Sondagem: relatórios periódicos de três institutos de pesquisa.
Análise de conteúdo: notícias veiculadas na emissora CBS durante o mesmo período.
Fonte de dados
Inflação, desemprego e energia. Tema
As principais histórias, ou seja, aquelas que recebem destaque dos mass
media como notícias principais, são significantemente mais influentes na
formação da agenda do público.
Produto
Tabela 11: Behr e Iyengar, 1985
Iyengar e Simon 1993
News Coverage of the Gulf Crisis and Public Opinion: A Study of
Agendasetting, Priming and Framing. Artigo
Análise longitudinal Método
Sondagens: Gallup e National Election Study (3 anos)
Análise de conteúdo: cobertura dos mass media sobre o Golfo Pérsico.
Fonte de dados
Problema mais importante da América Tema
Comparação entre as agendas do público e dos meios de comunicação com a finalidade de identificar correlações e avaliar as ocorrências de efeitos de
Agenda-setting.
Produto
Tabela 12: Iyengar e Simon, 1993
Ader 1995
A Longitudinal Study of Agenda-setting for the Issue of Environmental
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Análise longitudinal Método
Sondagens: Gallup
Realidade: Environmental Quality e do Characterization of Municipal
Solid Waste in the United States
Análise de conteúdo: New York Times
Fonte de dados
Poluição do meio ambiente Tema
Correlações entre a agenda dos meios, a opinião do público e as condições
do mundo real. Produto
Tabela 13: Ader, 1995
Benton e Frazier 1976
The Agenda-setting Function of the Mass Media at Three Levels of
Information Holding. Artigo
Análise longitudinal Método
Sondagens: público consumidor
Análise do conteúdo: jornais e televisão
Fonte de dados
Economia Tema
Busca entender a forma como as pessoas absorvem a informação que recebem dos meios, ao incluir vários níveis de recepção de informação por parte do público.
Produto
Tabela 14: Benton e Frazier, 1976
Iyengar e Kinder 1987
News that Matters: Television and American Opinion. Livro
Análise longitudinal Método
Sondagem: feitas com grupos fechados em ambiente controlado Análise de conteúdo: conteúdo televisivo
Fonte de dados
Geral Tema
As notícias posicionadas no topo dos telejornais interferem na agenda do público com mais eficiência. A cobertura extensiva de alguns temas nos noticiários nacionais, torna-os mais importantes para os espectadores, ao passo que aqueles que são pouco veiculados perdem credibilidade.
Produto
Tabela 15: Iyengar e Kinder, 1987
Com base nestas informações, conclui-se que a maioria dos estudos utilizam
basicamente dois tipos de ferramenta metodológica: seção cruzada38 e análise
38 Tipo de análise estática, na qual os temas importantes das agendas dos media e do público são identificados, organizados em ordem de hierarquia e correlacionados, com a finalidade de perceber a relação de causalidade entre elas. É uma técnica limitada, pois não considera as variáveis externas nem os efeitos cumulativos do processo de transmissão de prioridades temáticas. Brosius e Kepplinger (1990) corroboram ao afirmar que “seu desenho estático não se adapta à natureza dinâmica do processo de Agenda-setting e não considera o período de tempo dos possíveis efeitos”.
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longitudinal39. Estes métodos foram aplicados para análise de dados provenientes de dois
tipos de fontes, as sondagens de opinião pública e o próprio conteúdo produzido pelos meios de comunicação de massa.
As sondagens de opinião pública: sejam elas obtidas por meio de questionários produzidos pelos próprios pesquisadores e aplicados em uma amostra significativa, dentro do contexto de seus trabalhos, ou pela utilização de sondagens de opinião pré-existentes, como àquelas encomendadas por órgãos governamentais ou entidades privadas. A segunda fonte de dados normalmente utilizada é o próprio conteúdo produzido pelos meios de comunicação de massa analisado em cada estudo. Neste caso, diferentes modalidades da análise de conteúdo foram largamente utilizadas como ferramenta por todos os pesquisadores citados.
Percebe-se que as temáticas variam de acordo com o interesse e contexto das pesquisas e isto, por si só, torna-as diferentes umas das outras, possibilitando resultados diferentes e, por vezes, discussões antagônicas. Outro aspecto importante e, talvez, um dos que geram maior discordância metodológica é o da questão temporal, ou seja, ainda não se conseguiu definir um padrão temporal preciso capaz de mensurar com precisão o tempo decorrido entre a divulgação de determinado tema pelos media e a assimilação do mesmo por parte do público. Neste sentido, ganha destaque o método longitudinal, pois permite inserir esta variável à complicada equação dos efeitos do Agenda-setting.
Alguns autores como McCombs e Shaw (1972) referem-se a “ênfase da mensagem” como um dos principais fatores condicionantes da ocorrência do Agenda-setting. E uma das formas encontradas por eles para imputar valoração à ênfase, diz respeito à codificação das mensagens em maiores e menores, conforme o espaço ocupado e a localização das notícias nos jornais e revistas. Nossa grelha de análise das unidades de registro contempla este tipo de recurso.
Como foi dito anteriormente, selecionamos o conteúdo do jornal impresso Folha de
São Paulo como base para análise. A escolha é apoiada nas premissas de que se trata do
mais significativo meio de comunicação impresso do país, em função de sua abordagem de
39 Nesta abordagem, a agenda do público é diagnosticada a partir de sondagens de opinião pública em uma série temporal de vários anos. A agenda dos meios também é investigada pelo mesmo período de tempo, ampliando o quadro temporal de análise. Com isso, as variações da agenda do público são examinadas de acordo com as variações na agenda dos meios, construindo os pilares para a comprovação de uma relação de causalidade. (Formiga, 2006:59)
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cariz nacional, de sua expressiva circulação, credibilidade e capacidade de influenciar os demais veículos de comunicação. Por estes motivos e, também, pela impossibilidade de analisar todo o conteúdo mediático brasileiro, optou-se por um único jornal impresso de circulação nacional para representar o universo da comunicação de massa no Brasil. Tal decisão baseou-se na premissa de que a hipótese de Agenda-setting sugere uma consonância temática dos meios de comunicação de massa, ou seja, trabalhamos com o pressuposto de que exista uma alta correlação entre os veículos, principalmente entre aqueles de grande porte, promovendo um consenso no que diz respeito aos principais
assuntos a serem abordados. Para McCombs e Shaw (1972), ainda que não exista um
acordo explícito sobre a seleção na divulgação das notícias, a crescente utilização dos serviços das agências de notícias e a constante comunicação entre os veículos, contribuem para a composição de conteúdo comum voltado aos principais temas divulgados. Por fim, a limitação da amostra a um único veículo, dá-se em função da falta de recursos que possibilitem a varredura de todos os meios de comunicação do país, condição que podemos definir como a ideal.
Ainda na esfera das justificativas metodológicas, cabe destacar, que Shaw (2004,
apud Formiga 2006:77), um dos fundadores da hipótese da Agenda-setting, defende os
resultados de sua pesquisa ao afirmar que a condição inicial necessária para demonstrar a causalidade é um “grau significativo de correlação entre a suposta causa e o efeito, perfeitamente atendido nos estudos relacionados ao modelo”. A segunda condição necessária é a ordem temporal, onde, segundo ele, “as provas dos efeitos da agenda dos meios, mais uma vez, atendem às exigências da relação causal”. Exemplos são dados para confirmar que “os modelos de investigação longitudinal em uma diversidade de cenários eleitorais permitiram comprovações detalhadas e sofisticadas de ordem temporal”. Dentre eles, Shaw (2004) destaca os trabalhos realizados por Funkhouser (1973), Kepplinger e Roth (1979), McCombs, Einsiedel e Weaver (1991), Ader (1995) e por Winter e Eyal (1981). Por fim, a pesquisa de Iyengar e Kinder (1987) fortalece a hipótese ao passo que evidencia a relação causal dos efeitos dos mass media. A pesquisa destes autores diferencia-se das demais por ter sido realizada em ambientes controlados de laboratório, onde os resultados puderam ser comparados de modo mais seguro, em função da possibilidade de manipulação sistemática das condições e da exposição controlada de variada gama de notícias ao grupo de telespectadores. As experiências realizadas nestas
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condições foram inovadoras e trouxeram provas contundentes da capacidade dos meios em influir na agenda do público.
Observa-se que as diversas pesquisas analisadas lograram certo grau de êxito ao empregarem metodologias semelhantes àquela que propomos para este trabalho, fato que justifica nossa pretensão de buscar resultados semelhantes. Para tal, utilizaremos, também, alguns dos recursos da “análise de conteúdo” por consideramos ser a ferramenta mais adequada para a tarefa de decompor o texto em dados representativos.