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3. JUVENTUDE E TRÁFICO DE DROGAS NO BRASIL

3.1 Juventude e “Questão Social”

Múltiplas são as expressões da “questão social” na juventude brasileira, fruto das determinações provocadas pelo modo de produção capitalista e sua forma de sociabilidade contemporânea, que tem como expressões atuais a desregulamentação e a financeirização dos mercados, a flexibilização da produção e a adoção de novos padrões produtivos e trabalhistas, bem como a coisificação das relações humanas, o aprofundamento da alienação, do individualismo e da competitividade. “Assim, vivemos uma era de incertezas, de agravamento das expressões da 'questão social', resultantes das transformações e inflexões o novo padrão de acumulação” (CFESS, 2014).

Para realizar uma abordagem sobre a juventude e sua relação com as expressões da “questão social” é preciso situar, antes de tudo, as condições socioeconômicas nas quais este público vivem atualmente. Segundo o Instituto Brasileiro de geografia e estatística – IBGE, em pesquisa mais recente, realizada no ano de 2007 (apud CFESS, 2014), a juventude brasileira representava 50,2 milhões

54 É preciso esclarecer que a criminalização da pobreza – como também da juventude pobre – não se resume à questão do tráfico de substâncias ilícitas e seu consumo, mas também se expressa na tentativa de repressão e controle de outras formas de expressão da classe trabalhadora, como na música produzida nas periferias (exemplo do funk e do rap), em determinadas alternativas de renda (exemplo dos “camlôs” e dos “flanelinhas”) - que nada mais são que expressões do desemprego estrutural do sistema capitalista –, e nas suas organizações sociais e políticas, ou seja, a criminalização dos movimentos sociais. Essas alternativas nada mais são do que

expressões da questão social”, bem como as respostas dadas pelo poder dominante representada pelo Estado, configurando-se na então luta de classes.

de pessoas entre 15 e 29 anos – 26,4% da população em 2007. “Desses/as 30,6% podem ser considerados/as pobres, pois vivem em famílias com renda domiciliar per capita de até meio salário mínimo” (Ibid). A juventude pobre, segundo a pesquisa, concentra-se na região Nordeste, com 51,7% do total do país e são em sua maioria negros, o que corresponde a 70,9%, evidenciando a formação social e histórica do Brasil (Ibid).

Quanto a educação, apesar da diminuição do analfabetismo entre jovens brasileiros de 15 a 24 anos – de 1996 com 6,5 para 2,3 em 2006, com uma variação de 64,6% –, o analfabetismo funcional chega a 30 milhões de pessoas acima de 15 anos, um número ainda muito preocupante (BRASIL, 2010, p. 19). Além disso, em 2004 cerca de 8,9% do grupo etário entre 5 a 17 anos de idade estavam fora da escola, já em 2008 aproximadamente 97,5% das crianças entre 6 e 14 anos e 72,8% de 4 e 5 anos estavam frequentando a escola (Ibid, p. 19-20).

Como vimos na seção 1.1 deste estudo, outras questões estão colocadas ao novo “mundo do trabalho”, fruto do contexto de crise estrutural do capital que se expressa fortemente no crescimento do desemprego, do trabalho informal e da precarização das condições trabalhistas, principalmente na juventude. Segundo relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2012 apud CFESS, 2014), 81 milhões dos jovens entre 15 e 24 anos de idade estavam desempregados/as no final de 2009 em comparação aos 621 milhões de jovens economicamente ativos. “A taxa de desemprego de jovens aumentou de 11,9%, em 2007, para 13% em 2009”, revelando-se maior do que nos adultos/as (Ibid).

Quanto ao consumo de álcool e outras “drogas” pode-se verificar que na adolescência, entre de 14 a 17 anos, o início do consumo dessa substância se dá em média aos 13,9 anos de idade, e na juventude, entre 18 a 25 anos, a média é aos 15,3 anos (BRASIL, 2010, p. 41). Em relação ao consumo regular, os adolescentes adquiriram este comportamento em média aos 14,6 anos, enquanto que os jovens começaram por volta de 17,3 anos (Ibid). Sobre esse consumo é relevante dizer que não há diferenças significativas entre os meninos e as meninas (Ibid).

As elevadas taxas de mortalidade por causas externas na juventude “atinge proporções mais significativas do que no restante da população”, ocupando o primeiro lugar nos índices de mortalidade juvenil, cerca de 70,7% entre adolescentes de 10 a 19 anos (BRASIL, 2010, p. 25). As agressões representam a principal causa

de morte de adolescentes na faixa etária entre 15 a 19 anos, o que corresponde a 58,7%, seguidas de lesões autoprovocadas, como afogamentos e submersões (Ibid). O índice de homicídios na população entre 15 a 24 anos subiram de 13.186 para 17.312 entre os anos de 1996 e 2006, representando um aumento de 31,3%, maior do que o índice na população total que foi 20% no mesmo período (Ibid, p. 26). A partir de 2003, com as campanhas pelo desarmamento no país, observou-se uma diminuição nesses números, onde se identifica uma queda significativa de 13% entre 2004 e 2006 (BRASIL, 2010, p. 27). Entre os adolescentes de 10 a 14 anos, a principal causa de mortes externas se refere aos acidentes de transporte, correspondendo a 35,9%, seguida de agressões com 22,4%, afogamentos e submersões com 21,8% e as lesões autoprovocadas com 4,8% (Ibid, p. 25). Os acidentes de trânsito que no Brasil, corresponde a segunda maior causa de mortalidade juvenil: entre as faixas etárias de 10 a 24 anos houve um total de 13.345 óbitos de ambos os sexos no ano de 2006 (BRASIL, 2010, p. 29). Esse índice aumenta de acordo com a idade, chegando ao seu auge na faixa de 20 a 24 anos, para ambos os sexos: 15,0%, jovens homens e 11,3% jovens mulheres (Ibid).

Quando se refere à juventude que reside nos centros urbanos, outros fatores evidenciam a realidade precária e os riscos sociais a que esta população está submetida. Exemplos disto é a crescente violência urbana, a segregação socioespacial e o genocídio da população jovem negra.

De acordo com o Índice de Homicídios da Adolescência (IHA, 2009), a probabilidade de ser vítima de homicídio é quase doze vezes superior para o sexo masculino, em comparação com o feminino, e mais que o dobro para os/as negros/as em comparação com os/as brancos/as. O risco de homicídio cresce até a faixa de 19 a 24 anos e vai declinando posteriormente com a idade. A maior parte dos homicídios é cometida com arma de fogo, o que frisa a importância do controle de armamento dentro das políticas de redução da violência letal (CFESS, 2014).

A condição de pobreza na qual se encontra a juventude gera uma série de outras consequências individuais e coletivas: o abandono; a evasão escolar; o trabalho infanto-juvenil, na grande maioria das vezes informal e precarizado; a prostituição; a mendicância; o adoecimento dessa população, como a desnutrição, as doenças sexualmente transmissíveis e a falta de acesso aos serviços de saúde; os riscos externos provocados pela exposição a situações de violência, e dentre outros fatores o crescimento de jovens envolvidos em atos infracionais,

principalmente relacionados ao tráfico de “drogas” no varejo. Portanto, pode-se afirmar que a juventude pobre é o segmento que mais se encontra exposto a situações de vulnerabilidade social.

Os dados acima demonstram que a realidade da juventude brasileira tem sido marcada por profundas expressões de desigualdades sociais e violação de direitos, aprofundadas ainda mais pelas expressões da sociabilidade contemporânea. As políticas sociais e os direitos historicamente conquistados para o atendimento das necessidades sociais desta população, apesar de sua importância, não foram suficientes para proporcionar a juventude uma realidade mais igualitária.

Ademais, as expressões da “questão social” que atingem a juventude contemporânea, principalmente urbana, tem se manifestado para além das precárias condições de vida desta população, fruto das desigualdades provocadas pelo capitalismo. Expressam-se também nas pressões provocadas pela ideologia consumista, nas precárias políticas sociais voltadas para esta população, como a falta de acesso à profissionalização e também ao mercado de trabalho formal; na crescente informalidade e precarização das relações trabalhistas, no desemprego estrutural, na banalização e na naturalização da violência urbana e na integração de jovens, cada vez mais cedo, ao tráfico varejista de “drogas” e demais grupos criminosos.

3.2 ANÁLISE SOBRE A ADESÃO DE JOVENS AO TRÁFICO VAREJISTA DE