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Não há consenso sobre o que seja Juventude. Uma forma simples de caracterizá- la, adotada por várias entidades, é o recorte de uma faixa etária, mas mesmo neste aspecto que se espera mais objetivo, o consenso não está presente. De acordo com Abramovay & Castro (2006), é comum o recorte etário de 15 a 24 anos para a classificação de jovens, no entanto, nem sempre esta é a faixa usada em pesquisas nacionais e internacionais19, sendo frequente os que defendem a ampliação da idade para 29 anos, vez que a construção da autonomia tem se dado cada vez mais tardiamente.

No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) considera adolescentes os jovens entre 12 e 18 anos incompletos. Já para o Conselho Nacional de Juventude (CONJUVE), jovens são sujeitos que se situam entre 15 e 29 anos. Neste conselho a juventude está divida em três faixas: adolescentes – jovens (15 a 17 anos); jovens (entre 18 e 24 anos) e jovens – adultos (entre 25 e 29 anos). A Secretaria Nacional de Juventude focaliza suas ações para sujeitos entre 18 e 29 anos, sendo este o recorte considerado no presente estudo.

Para Novaes (2006) a definição de juventude a partir do recorte etário é a maneira mais simples de tentar agregar indivíduos com experiências que se caracterizam por serem diversas e desiguais. Por isso para fins de pesquisa, legislação e definição de políticas públicas seja possível estabelecer como sendo jovens aqueles(as) que se encontram em torno de determinado corte etário, no entanto ressalta a importância de reconhecer a inadequação conceitual de se articular um só campo de representações que seja unificador dos sentidos do que venha a ser a “juventude”.

É preciso compreender a juventude como “categoria em permanente construção social e histórica, incorporando a complexidade da vida – em suas dimensões biológicas, sociais, psíquicas, culturais, políticas, econômicas etc. – que organizam as múltiplas maneiras de viver a condição juvenil” (IBASE, 2006:6). Nesse sentido, a juventude deve ser entendida a partir de experiências geracionais em comum (NOVAES, 1998), ou seja, jovens marcados por um tempo histórico determinado. Pode-se dizer que se está diante de uma mesma geração quando os sujeitos, de certa maneira, vivenciam espaços e tempos

19

As autoras citam como exemplos: Informe Juventud en España (15 a 29 anos), Pesquisa Nacional de Juventud 2000 realizada pelo Instituto Mexicano de La Juventude (12 a 29 anos).

comuns em relação às sensibilidades, percepções, conhecimentos, memórias, experiências históricas e culturais.

Dayrell (2003) também reconhece a dificuldade de elaborar uma definição de juventude a partir de suas características históricas e culturais. Para este autor, corroborando com Peralva (2007), a juventude é uma condição social e um tipo de representação, pois, apesar de reconhecer que há certo caráter universal dado pelas transformações do indivíduo numa determinada faixa etária, onde complementa o seu desenvolvimento físico e sofre mudanças psicológicas, ressalta que cada sociedade, em seu período histórico, cada grupo social lida diferentemente com tais representações. Essa diversidade se concretiza com base nas condições sociais (classes sociais), culturais (etnias, identidades religiosas, valores), de gênero, e também das regiões geográficas, dentre outros aspectos, assim:

Construir uma noção de juventude na perspectiva da diversidade implica, em primeiro lugar, considerá-la não mais presa a critérios rígidos, mas sim como parte de um processo de crescimento mais totalizante, que ganha contornos específicos no conjunto das experiências vivenciadas pelos indivíduos no seu contexto social, significa não entender a juventude como uma etapa com um fim predeterminado, muito menos como um momento de preparação que será superado com o chegar da vida adulta (DAYRELL, 2003: 42). Nascimento (2002), no entanto, retoma a ideia de transição, caracterizando a juventude como um momento de transformações pessoais e sociais, que se inicia com a puberdade e se conclui com a entrada no mundo adulto, traduzido pela autora como o momento de “assumir atividades produtivas”.

Observa-se que, apesar das tentativas teóricas dos estudiosos da área para definir ou delinear o conceito de juventude e, ao fazê-lo, fugir da ideia de faixa etária como base para delimitação conceitual, esta última ainda é muito presente, não só para o senso comum, como também para as definições de políticas públicas voltadas para os jovens, o que pode levar um distanciamento dessas em relação a seus objetivos. Mas o que define a condição juvenil afinal?

A sociologia da juventude busca esta resposta a partir de dois eixos: o primeiro da convergência, procurando entender e definir características semelhantes e traços comuns, enquanto o segundo focaliza as divergências apostando em uma definição plural, configurando uma diversidade de juventudes, realçando os traços que provocam rupturas

internas nesse “universo geracional” (PAIS; CAIRNS; PAPPÁMIKAIL, 2005:111). Os autores acrescentam aos dois eixos de análise um terceiro: reflexões sobre o modo como se sai da condição juvenil, ou a transição para a vida adulta, entendida como um conjunto de acontecimentos que demarcam o fim da juventude: empregabilidade em tempo integral, conjugabilidade, parentalidade e residências autônomas de sua família original. No entanto, o que se observa é que essas passagens não ocorrem de modo homogêneo, mas sim com uma acentuada singularização das trajetórias e atitudes juvenis com processos de idas e vindas entre a escola e o mundo do trabalho, entre a casa própria e a casa dos pais, dentre outras idas e vindas.

Segundo o texto base para a 2ª Conferência Nacional de Políticas Públicas de Juventude (2011:2), as mudanças ocorridas nas últimas décadas apontam para a juventude como uma etapa do ciclo de vida que se ampliou e comporta “múltiplas dimensões de vivência e experimentação, para além da formação para a vida adulta, adquirindo sentido em si mesma”. Neste sentido, o texto considera a juventude como um caminho para “inserção e emancipação social” e como um tempo próprio para “viver a vida juvenil”.

As mudanças sociais e econômicas, apesar de afetarem todos os recortes sociais, confrontam as novas gerações de modo particular. A diluição de marcos de referências estáveis (flexibilização e precarização das relações laborais e pluralização das formas de organização familiar, por exemplo) impacta diretamente nos mecanismos de socialização e transição para a vida adulta, enfraquecendo as referências culturais que conduziam às trajetórias individuais. Diante das incertezas e indefinições, características da contemporaneidade, um dos traços marcantes da condição juvenil atual se traduz como uma “situação de impasse” em relação ao futuro de muitos jovens, já que a precariedade de suas trajetórias não lhes permite agrupar todas as condições de independência econômica de forma estável e continua (PAIS, 2009).

Aos jovens cabe inventar novos caminhos, criar novos estilos de vida, compor novas identidades, mesclando influências oriundas de setores muito distintos da sociedade. Assim, estudos demonstram que os temas que despertam maior interesse nos jovens brasileiros são: educação, trabalho e oportunidades de cultura e lazer (AQUINO, 2009), violência e pobreza/desigualdade social (IBASE, 2006).

Neste sentido, as novas exigências do mundo do trabalho impactam diretamente na formação do trabalhador e afetam esta camada da população em sua busca pela sobrevivência e inserção no mundo.

Bastos (2004) refere que “apesar de sua inegável heterogeneidade, as transformações têm tornado o trabalho, de forma geral, mais complexo, mais cognitivo, mas fluido, mas invisível, com maior incerteza e interligado.20” (op.cit.:27). As novas características do trabalho demandam trabalhadores com competências e habilidades até então menos importantes. Ainda com Bastos (2004), pensar os desafios da qualificação profissional, inter-relaciona os complexos processos de transformação do mundo do trabalho e as políticas públicas que lidam com os “seus subprodutos, especialmente o desemprego, as ações das diversas instituições educacionais e de formação do trabalhador,...” (op.cit.: 27).

Pesquisas realizadas indicam forte interesse dos jovens brasileiros, em especial os oriundos de classe populares, por programas que lhes ofereçam maior capacitação e formação para o mundo do trabalho (CAMPOS, 2003; IBASE, 2006; PROJOVEM, 2007b; PROJOVEM, 2008; MILETO, 2009).

Tais exigências dão à qualificação do profissional o poder ilusório de determinar o sucesso ou o fracasso das pessoas, atribuindo aspectos determinantes para a inclusão ou exclusão do sujeito no mundo do trabalho.

Num país de grande desigualdade social e diferentes oportunidades, as discrepâncias são explicitas. Enquanto jovens com formação de alto nível encontram as portas do mercado de trabalho abertas, um enorme contingente de pessoas, com pouca ou nenhuma formação, luta diariamente para conseguir o primeiro emprego criando um contingente de jovens com pouca escolarização e escassa qualificação para o trabalho.

... a defesa de um trabalho decente também significa a defesa de uma educação de qualidade. Ainda que o aumento dos níveis de escolaridade e de qualificação não seja suficiente para garantir acesso ao trabalho decente, eles são muito importantes. Os jovens brasileiros têm se esforçado cada vez mais para conciliar os estudos e o trabalho, mas parcela considerável ainda não completou a escolaridade básica, sendo sua qualidade uma questão prioritária a ser enfrentada, de modo simultâneo à ampliação do acesso ao ensino superior e à qualificação profissional (CORROCHAMO, 2010:3).

O jovem descrito na citação de Corrochamo é o exemplo típico do sujeito deste estudo. Sujeito que, apesar do recorte etário de juventude, possui uma trajetória laboral que vem de “longas datas” e tenta, a custo de grande sacrifico físico, em boa parte dos casos, conciliar trabalho e formação escolar, ainda em nível básico. Além das responsabilidades com filhos e moradia.

O início precoce e a consequente falta de capacitação adequada, frágil vínculo empregatício e trabalhos de baixa remuneração e valorização social geram uma relação bastante precária com o mundo do trabalho. Pochmann (2004) considera que o aumento da expectativa de média de vida da população e a consequente alteração da situação de juventude colaboram para o aumento dos níveis de desemprego, precariedade, subtrabalho e deteriorização dos níveis de renda, especialmente entre os jovens de classes populares no Brasil.

Para o autor a persistência do desempenho desfavorável no mundo do trabalho induziu ainda mais as segmentações ocupacionais, excluindo os mais pobres dos empregos nos segmentos educacionais mais elevados. De certa forma ampliou-se consideravelmente o processo discriminatório no interior do mundo de trabalho, sobretudo entre distintas faixas etárias (jovens e adultos), raças e gênero.

Os jovens brasileiros, além de constituírem o grupo etário mais desfavorecido pelas condições de trabalho, enfrentando altas taxas de desemprego e de informalidade, baixos rendimentos e ausência de proteção social, também enfrentam elevadas taxas de rotatividade, principalmente por estarem em trabalhos precários, muitas vezes de caráter temporário.

O trabalho tem, para a sociedade ocidental atual, um lugar de destaque entre os papéis sociais. No ocidente, o trabalho é mais que uma necessidade básica de sustentação econômica, aqui ele assume o papel de definidor de identidade dos indivíduos. Assim um Estado com altos índices de desemprego e mão de obra desqualificada sofrerá com sérios problemas sociais, como os vivenciados no Brasil (MOURÃO; PUENTE-PALACIOS, 2006).

Neste sentido não é estranha a forte relação que os próprios jovens estabelecem entre a elevação do grau de escolaridade e a expectativa de maiores e melhores chances

no mundo do trabalho, reforçando a importância atribuída ao trabalho na sociedade atual e o poder inclusivo delegado à educação formal, como aponta Saviani:

Considerando o reconhecimento consensual de que vivemos na sociedade do conhecimento; de que nesse tipo de sociedade a educação formal é a chave sem a qual todas as portas tendem a ser fechadas. Sem essa chave os indivíduos ficam excluídos e as organizações, inclusive as empresas, perdendo em produtividade, acabam tragadas na voragem da competitividade. Esse é o discurso que está na boca da maioria das pessoas, com destaque para os empresários e os políticos (SAVIANI, 2010:245).

Apesar de não haver consenso sobre o conceito de juventude, “existe um componente geracional que permite definir a juventude pelo que há de específico à sua condição” (AQUINO, 2009:31), no entanto, as diferenças entre pessoas com o mesmo recorte etário são muitas, assim como as desigualdades que a perpassam, sendo imprescindível considerar tal diversidade na forma de vivenciar tal condição. Por isso, a expressão juventudes passou a ser empregada como forma de enfatizar a pluralidade de situações e as distintas demandas e necessidades desses sujeitos, apesar de constituírem um grupo etário que vivencia várias experiências comuns.

É preciso pensar a juventude como parte de um processo de constituição de sujeitos que têm especificidades que marcam a trajetória de cada um, sendo necessário combinar políticas estruturais de efeito duradouro com programas e ações emergenciais de efeitos imediatos, que busquem a estruturação de mecanismos de suporte adequados para que os jovens possam desenvolver sua formação, processar suas buscas, construir seus projetos e percursos de inserção na vida social.

Compreender as exigências do mundo contemporâneo para este grupo diverso de pessoas é fundamental no entendimento de suas escolhas, pois estas estão interligadas, afetando cada sujeito de forma única, mas não dissociada de sua inserção no espaço e no tempo ao qual pertencem.

PERMANÊNCIA NA EDUCAÇÃO FORMAL - UMA ESCOLHA POSSÍVEL

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