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A eficiência está prevista na Constituição Federal entre os princípios fundamentais da administração pública direta e indireta (BRASIL, 1988, art. 37). No entanto, o setor público é considerado uma “organização que possui processos lentos e burocráticos” (ANACLETO; ELY; FORCELLINE, 2010, p.2).

70 Entre as décadas de 1930 e 1940, a administração pública brasileira iniciou profundas modernizações inspiradas, principalmente, nos estudos de Taylor, Fayol e Weber, sendo que o órgão executor de tais mudanças foi o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) (WAHRLICH, 1974). O DASP foi criado em 1938, no Brasil, e teve a missão, dentre outras, de introduzir a noção de eficiência e de promover a racionalização9 de métodos, processos e procedimentos nos setores administrativos do serviço público (WAHRLICH, 1974; COSTA, 2008).

Em 1970, em diferentes países, os setores públicos iniciaram diversas tentativas para adaptar e transferir para seus ambientes os conhecimentos gerenciais advindos dos setores privados, que na época dominavam a produção de conhecimento administrativo. Tal movimento ficou conhecido como gerencialismo10 (PAULA, 2005). Surge, a partir disso, uma organização pós-burocrática, advinda de uma “burocracia flexível, fruto da flexibilização pós-fordista, que vem sendo emulada no setor público, originando um Estado gerencial” (PAULA, 2005, 81). No Brasil, o Estado gerencial surge no governo Fernando Henrique Cardoso com a reforma gerencial, em 1995. A reforma “é gerencial porque busca inspiração na administração das empresas privadas e porque visa a dar ao administrador público profissional condições efetivas de gerenciar com eficiência as agências públicas” (BRESSER- PEREIRA, 2000, p.25).

Percebe-se que, nos últimos anos, o setor público vem adotando diversas estratégias utilizadas pelos setores privados a fim de melhorar seu desempenho administrativo. Porém, é necessário atentar às especificidades do setor público ao aderir a qualquer metodologia decorrente do setor privado (BIAZZI, MUSCAT, BIAZZI, 2011).

Maarse e Janssen (2012) expõem essa busca dos governos pela racionalização de processos a fim de manter e melhorar o serviço público. Porém, os autores apontam não ser comum dar a devida atenção a esses processos no que diz respeito à melhoria. Assim, o conceito Lean surge como proposta de melhorar os processos no serviço público.

Pesquisas revelaram que há poucos estudos dos princípios Lean direcionados ao setor público no mundo (TURATI, 2007; MAARSE; JANSSEN, 2012; ALMEIDA et al.

9 O objetivo da racionalização é empregar os métodos científicos de trabalho, tendo em vista o planejamento das atividades para alcançar eficiência, produtividade e redução de custos (CHIAVENATO, 2004).

10 O gerencialismo desponta no Reino Unido, no governo de Margaret Thatcher, focado em uma cultura empreendedora para garantir controle, eficiência e competitividade nas organizações. Tal visão nasce da suposição de que as práticas e técnicas administrativas geradas pelos setores privados são eficientes (PAULA, 2005).

71 2017). Ademais, a cultura organizacional da administração pública no Brasil dificulta a aplicação Lean (ALMEIDA et al. 2017). Sobre isso, é possível observar dois aspectos que impedem uma mudança tranquila no setor público brasileiro e são decisivos ao se implementar estratégias que visam à eficiência nos setores públicos; trata-se do aspecto humano e do aspecto legal. Muitas vezes, os gestores públicos têm interesse e disposição em querer inovar ou possuem ideias para melhorar o ambiente; no entanto, é muito comum, esbarrarem nos aspectos legais e burocráticos inerentes da administração pública (ALMEIDA et al., 2017) uma vez que devem se pautar nos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (BRASIL, 1988). Além disso, Merton (1978) expõe diversas disfunções no setor público resultantes da burocracia, tais como: funcionários conformados com suas atividades, incapazes de enxergar problemas óbvios, que não questionam, com conhecimentos engessados, que seguem uma rotina obtendo preferências, com excesso de formalismo.

Apesar disso, os princípios Lean são totalmente aplicáveis a esse setor (TURATI, 2007; MAARSE; JANSSEN, 2012; ALMEIDA et al. 2017). Segundo Turati (2007, p. 96), o Lean Office oferece “ferramentas e técnicas gerenciais de melhoria no nível operacional, que aplicadas adequadamente, contribuem para a melhoria nos serviços públicos prestados à população”.

Estudos evidenciaram, também, que o conceito Lean pode identificar áreas e soluções para melhoria, especialmente do desperdício, em um processo de suporte a um setor público. O Lean pode contribuir para a redução de desperdício e para um fluxo de processo contínuo, sendo uma valiosa ferramenta de diagnóstico. Entretanto, foram identificadas algumas tensões com foco no cliente que, na abordagem Lean, são cruciais, pois ele é o ponto de partida para todos os outros princípios. Em ambientes públicos, os clientes, no verdadeiro sentido da palavra, dificilmente existem e são mais difíceis de identificar. O pensamento Lean, em sua essência, foca na criação de valor para o cliente. A sugestão é que o pensamento Lean voltado para o setor público se concentre na criação de valor público (MAARSE; JANSSEN, 2012). Para Moore (2007, p. 173), valor público representa os “valores que os indivíduos e grupos voluntários de indivíduos vinculam aos estados da sociedade para além de seu próprio bem-estar material e individual, os quais eles procuram implantar por meio da ação individual ou coletiva, cívica ou política”.

Ainda que a literatura afirme que os conceitos Lean podem ser aplicados a qualquer setor, Turati (2007) alerta que o sucesso de sua aplicação dependerá do desempenho

72 e interesse das pessoas envolvidas em melhorar os processos. Pearcea, Pons e Neitzert (2018) identificaram, através de seus estudos, que um problema para a implementação Lean de sucesso não era simplesmente o comprometimento da pessoa detentora de decisão, mas sim sua ignorância em relação ao que ela deveria se comprometer. Ou seja, um problema de conhecimento. Assim, Pearcea, Pons e Neitzert (2018) explicam que não basta apenas comprometimento, é necessário também envolvimento com a implementação Lean.

Além dos trabalhos supracitados sobre a viabilidade em aplicar o Lean Office em ambientes públicos, na literatura foram encontrados: um trabalho acadêmico sobre o Lean Office, aplicado à Gestão Documental (BASTOS, 2015) e um artigo sobre Lean Office, aplicado a arquivos (CAVAGLIERI; JULIANI, 2016). Ambas as pesquisas foram realizadas em setores privados e comprovaram a aplicabilidade do Lean Office em fluxos documentais.

Assim sendo, há estudos comprobatórios da aplicabilidade do Lean Office em ambientes públicos, assim como há estudos que comprovam a aplicabilidade do Lean Office a fluxo documental.

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