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1.4 Promoção da Saúde e da Alimentação Saudável

1.4.1.1 Legislações para as lanchonetes comerciais escolares

No Brasil foram criadas leis estaduais, municipais e Distrital (DISTRITO FEDERAL, 2005; DISTRITO FEDERAL, 2008c; FLORIANÓPOLIS, 2001; LONDRINA, 2005; PARANÁ, 2004; PARANÁ, 2005; RIBEIRÃO PRETO, 2002; RIO DE JANEIRO (Estado), 2005; RIO DE JANEIRO (Município), 2002; RIO GRANDE DO SUL, 2008; SANTA CATARINA, 2001;SÃO PAULO, 2005) que regulamentam a venda em lanchonetes comerciais escolares. Essas iniciativas visam normatizar a contribuição destes estabelecimentos para a prevenção e controle da obesidade infanto-juvenil.

Especificamente, no Distrito Federal, no ano de 2006, foi criada a lei distrital nº 3.695, dispondo sobre a promoção da alimentação saudável nas escolas da rede de ensino, pública e privada, do Distrito Federal (DISTRITO FEDERAL, 2005). Eram destaques nesse dispositivo legal: a proibição de alimentos ricos em açúcares e gorduras; a capacitação do proprietário da lanchonete; obrigatoriedade da escola em desenvolver programa de educação nutricional e alimentos cuja venda a lei proibia (DISTRITO FEDERAL, 2005).

2006, o governo do Distrito Federal impetrou uma ação direta de inconstitucionalidade contra ela, sob a alegação de que a legislação sobre tais questões é da competência exclusiva do Chefe do Executivo nacional e que a referida lei imputava obrigações e encargos aos órgãos públicos, não previstos na lei orçamentária do DF. Com esses argumentos, ela foi considerada inconstitucional pelo Superior Tribunal de Justiça (2006)6

Atualmente, no Distrito Federal, encontra-se em vigor o decreto nº 29.110, de 03 de junho de 2008, que dispõe sobre a utilização de espaços dentro das escolas da Secretaria de Estado de Educação - SEE do DF para funcionamento de estabelecimentos comerciais – cantinas escolares. O Decreto define 1) horários de funcionamento dessas cantinas, coincidentes com o do atendimento aos alunos pelo PNAE; 2) os equipamentos mais adequados ao bom atendimento da clientela; 3) os cuidados relativos à higiene do local e à qualidade dos alimentos; 4) as obrigações fiscais, sanitárias e os aspectos que dizem respeito ao desenvolvimento desse tipo de ramo comercial (DISTRITO FEDERAL, 2008a).

Além deste decreto, encontra-se em vigor no Distrito Federal a Portaria nº 202, de 08 de setembro de 2008 (DISTRITO FEDERAL, 2008c), que estabelece o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais, na condição de lanchonete, cantina ou similar e determina os alimentos permitidos e proibidos para a venda nesses locais. Muitos alimentos podem ser oferecidos desde que não concorram com os oferecidos pelo PNAE7.

A portaria nº 202 determina também a proibição da venda de frituras em geral, alimentos condimentados e outros, observadas as normas de alimentação saudável estabelecidas pelo PNAE (DISTRITO FEDERAL, 2008c).

De acordo com relatório do Ministério da Saúde – MS (BRASIL, 2007b), observa- se que a abrangência das legislações sobre este tópico, na sua maioria, focaliza tanto

6 Durante a realização da III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, considerando-se a importância da lei para

a promoção da alimentação saudável nas escolas públicas e privadas do DF, foi aprovada uma moção de apoio à retirada da ação direta de inconstitucionalidade impetrada pelo governo do Distrito Federal (CONSELHO NACIONAL DE SEGURANÇA..., 2007).

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São eles: I-sucos de frutas (natural ou concentrado);II – suco misto (abacaxi e hortelã, laranja e couve, laranja e mamão, laranja, mamão e cenoura, limão e couve, limão e hortelã, maracujá e beterraba, uva e beterraba, outros);III – salada de frutas; IV – leite achocolatado; V – coalhada e coalhada batida com frutas; VI – bolos (bolo de cenoura, bolo de fubá, bolo de trigo, bolo simples de chocolate); VII – preparações doce (nhoque doce, pamonha cozida, pudim, torta); VIII – salgados assados (empada, empadão recheado com vegetais, enroladinho de queijo, esfirra, pizza, quibe assado, torta de frango ou carne com vegetais); IX – quitandas (biscoito de queijo, broa, pãezinhos, pão de queijo, rosca, queijo quente [pão francês, mussarela, tomate]); X – sanduíches naturais (devem ficar refrigerados);XI – caldos (caldo de feijão, caldo de milho de frango, outros); XII – vitamina de frutas.

escolas públicas quanto particulares, tendo em vista que é dever do Estado, a garantia da segurança alimentar e nutricional e do DHAA de forma abrangente. O Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), corrobora essa disposição afirmando que é dever do poder público e de outros atores sociais, assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária para crianças e adolescentes.

As legislações existentes até agora abarcam três aspectos importantes: a proibição da venda de determinados alimentos (essa é uma disposição comum a todos os textos consultados); o desenvolvimento de ações educativas, e as ações de fiscalização e sanções.

Observa-se uma intenção do poder público de, por meio de legislações, assegurar os direitos dos cidadãos à saúde e à alimentação e estabelecer um diálogo com as lanchonetes escolares. Estas leis são um instrumento legítimo que busca conciliar os interesses e obrigações da lanchonete escolar e da escola, e simultaneamente garantir uma alimentação saudável para o estudante, no ambiente escolar. No entanto, apesar dos seus aspectos positivos, os textos legais são omissos ou lacônicos em relação aos processos necessários para a implantação de uma lanchonete saudável, como, por exemplo, a realização de cursos de capacitação para os proprietários.

No geral essas pessoas são comerciantes, e não possuem uma formação técnica que lhes possibilite atuar junto as ações educativas de uma escola. Nesse mesmo sentido, os dispositivos legais não têm oferecido, por exemplo, alternativas à retirada dos alimentos proibidos pela lei, quando se sabe que eles constituem para os proprietários, a maior quantidade de venda, tendo em vista as preferências alimentares dos escolares (PERRY et al., 2004).

Em que pese alguma lacuna ainda existente nestas resoluções, observa-se que, de fato, a prática social, ainda estabelecida dentro das lanchonetes escolares, é a venda dos alimentos proibidos pelas referidas legislações, com excessos de açúcares, gorduras e sal (CULLEN e ZAKERI, 2004; O’TOOLE et al, 2007; TEMPLETON, MARLETTE, PANEMANGALORE, 2005; WIECHA et al., 2006). A dificuldade de

obedecer à legislação é reflexo do padrão vivenciado fora da escola, no qual predomina um alto consumo de alimentos com grande densidade energética e pouco consumo de frutas e legumes (INSTITUTO BRASILEIRO..., 2006b), conseqüência, por sua vez, de orientações econômicas, políticas, culturais e ideológicas mais amplas, segundo Chouliariaki e Fairclough (1999). Gabriel et al (2009) verificaram em Santa Catarina, que os itens que apresentaram maior dificuldade de adequação à lei nº 12.061, de dezembro de 2001 (SANTA CATARINA, 2001) foram os sucos artificiais, sendo estes comercializados por 66,7% das lanchonetes, além do não cumprimento da comercialização diária de duas frutas, uma vez que 83,1% não comercializam frutas.

As legislações, além disso, apresentam um texto que prejudica o entendimento do proprietário de lanchonete, ou porque parece divergir de outras legislações, quando tem poucos pontos em comum com elas, ou porque contem linguagem ou informações acadêmicas8, de difícil apropriação pelos proprietários das lanchonetes, reforçando a necessidade de um processo educativo que ilustre e coloque na prática os preceitos da lei.

Foucault (1969) apud Oliveira (2001) diz que o discurso constrói os objetos, as identidades, os conceitos, os quais se manifestam nos textos por meio de várias vozes. Dentro dessa perspectiva, as legislações estão propiciando a formação de novos conceitos e, principalmente, uma nova identidade para a lanchonete e para o seu proprietário, entretanto, ainda não encontrando um respaldo e um estabelecimento seguro para se expressar, de acordo com os textos das normativas.

As legislações recomendam, também, a promoção de práticas alimentares saudáveis no ambiente escolar. Essas práticas são estratégicas para a educação nutricional, produzindo impactos positivos sobre a alimentação e nutrição dos escolares (SANTOS, 2005). A recomendação focaliza o trabalho com a comunidade como um todo, indo além de uma proposta de capacitação dos atores escolares, para que, efetivamente, seja um estímulo adequado à promoção da alimentação saudável nas escolas (SCHMITZ et al., 2008).

As legislações mostram-se limitadas quanto à promoção de práticas alimentares

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Como exemplo pode ser citado: “alimentos com mais de 3g (três gramas) de gordura em 100kcal (cem kilocalorias) do produto”, que aparece no texto da lei nº 3695, de 15 de dezembro de 2005 (BRASIL, 2005).

saudáveis. Um dos recursos, que visa cumprir essa função é o mural educativo, cujo potencial, ainda que explorado, é pequeno e restrito para uma promoção da educação alimentar no ambiente escolar. Ainda sim, Gabriel et al (2009) mostraram que apenas 7,1% das cantinas possuíam mural sobre alimentação, apesar do mesmo ser exigido pela lei nº 12.061, de dezembro de 2001 (SANTA CATARINA, 2001).

Observa-se, portanto, que as legislações apresentam-se como um instrumento importante para apoio a promoção da alimentação saudável na escola. Entretanto, necessita de aprimoramento com relação ao envolvimento da comunidade escolar como um todo, além do desenvolvimento de cursos de capacitação para os donos de lanchonetes escolares, dentre outras ações. Gabriel et al (2009) afirmam que a capacitação de donos de lanchonetes escolares é inclusive uma das estratégias para que se possa proporcionar a sustentabilidade econômica das mesmas.