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A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL E A EDUCAÇÃO FÍSICA

Conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9394/96, a Educação Física passou a ser um componente curricular integrado ao processo educacional e não mais uma “atividade” no currículo escolar, condição que vigorava no marco legal até então. O artigo 26º, parágrafo 3º, determina que: “A Educação Física, integrada à proposta

pedagógica da escola, é componente curricular da Educação Básica, ajustando-se às faixas etárias e às condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos”

(BRASIL/Lei 9.394, 2017).

A condição facultativa para o ensino noturno foi modificada em 2003, sendo que a lei vigente atualmente retoma a percepção da área relacionada à mera atividade. Também podemos ver que o entendimento da Educação Física é mais próximo de uma atividade física do que de uma práxis educativa, pois embora o art. 26º define a Educação Física como “componente

curricular da Educação Básica”, no ano de 2003, a partir da Lei nº 10.793 (BRASIL/Lei

10.793, 2003), acrescenta-se ao texto o termo “obrigatório” após “componente curricular”, dando-se ênfase à necessidade da Educação Física na escola. Como já vimos, a mesma lei torna essa disciplina facultativa para os estudantes que estudam no período noturno, que cumprem jornada de trabalho igual ou superior a seis horas, aos alunos maiores de 30 anos de idade, que estiverem prestando serviço militar inicial, ou que, em situação similar, estiverem obrigados à prática de Educação Física, e também àqueles que tenha prole.

Nesse sentido, o discurso presente na LDBEN demonstra contradições relacionadas às concepções da Educação Física Escolar. Intencionalidades presentes no texto oficial demonstram interesses e visões diferentes e até mesmo contraditórias. Ao mesmo tempo que ao longo da história se avançou na concepção pedagógica da área, quando esta se torna um “componente curricular”, ou seja, uma disciplina que tem um saber, possui ricas e variadas concepções pedagógicas e pauta-se em diversos objetivos, conceitos, conhecimentos e saberes a serem apropriados e explorados, a lei retrocede quando esse componente curricular é concebido como facultativo no período noturno na modalidade da EJA, pois reafirma a condição da Educação Física como atividade paralela e não obrigatória dentro da estrutura curricular da escola.

A Educação Física no contexto escolar como componente curricular facultativo ou não tem características pedagógicas próprias, porém no interior de suas peculiaridades possui a riqueza de ações, de movimentos, de metodologias de ensino, de experimentações, de

descobertas e de aprendizagens. Essa riqueza de possibilidades da Educação Física pensada no contexto da EJA, referente à cultura cotidiana da escola faz-se precisa quando nos referimos ao CIEJA da Prefeitura de São Paulo, visto que ele também possui suas características próprias de organização, de pensamento pedagógico e de ações. Sendo assim, nesse contexto, os educadores(as) bem como toda a equipe da gestão pedagógica possuem certa autonomia para pensar o projeto pedagógico, o currículo, selecionar as metodologias a serem adotadas e os procedimentos didáticos.

Toledo (2017), em sua dissertação, ao se referir ao CIEJA enquanto modalidade da EJA oferecida pela Prefeitura Municipal de São Paulo, defende que ele deve possuir uma metodologia voltada para práticas emancipatórias, voltadas para a libertação e para a autonomia. A autora acredita que as ações interdisciplinares propostas evitam a diluição e o fracionamento de saberes, mesmo que seus componentes curriculares sejam separados por áreas. As discussões provenientes dos conteúdos presentes, que via de regra são planejados isoladamente e são também circunstanciais, podem ocorrer de forma interdisciplinar e coletiva, com a intenção de troca de saberes para a construção de um novo saber coletivo, por meio de uma ação democrática e dialógica. Tal conclusão da autora direciona nosso entendimento a respeito do CIEJA, que possibilita certa liberdade de ação e criação do fazer pedagógico, podendo articular diversos saberes e possibilidades de ensino e de aprendizagem.

A falta de compreensão das secretarias de Educação e dos órgãos centrais que geram políticas públicas de implementação da EJA nos Estados e Munícipios sobre a importância educativa, social e pedagógica da Educação Física na EJA representa para nós, uma continuidade do vínculo histórico e do descompromisso em relação à área que continua sendo desvalorizada.

Para nós, tal posição caracteriza-se como uma injustiça curricular comparando-se a Educação Física com os demais componentes curriculares, pois reduz sua importância se relacionada aos componentes tidos como obrigatórios. De acordo com essa nossa forma de entender, essa posição foi cristalizada historicamente e desconsidera a riqueza de possibilidades da Educação Física na EJA. A Educação Física enquanto componente curricular da Educação Básica e também integrante na EJA é assegurada Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), porém na EJA ela não se concretiza, porque são várias as possibilidades de dispensa dessas aulas. Mesmo assim, ela é oferecida como componente curricular no Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos (CIEJA). A Educação Física enquanto componente curricular presente nessa modalidade de ensino deve possuir objetivos educacionais e

pedagógicos claros na vida dos estudantes da EJA e serem dadas condições estruturais para que ela aconteça de fato.

Partindo dessa premissa, enquanto componente curricular também presente nessa modalidade de ensino, ela traz em seu bojo indagações, objetivos, metodologias, didática e concepções curriculares específicas que devem considerar as particularidades dos estudantes e do projeto de educação ao qual se destina.

A necessidade de aprendizagem ao longo da vida amplia-se em virtude também das diferentes características que compõem as populações humanas. Nesse sentido, as ações desenvolvidas no âmbito da Educação de Jovens e Adultos devem possibilitar a aproximação das gerações e respeitar as diferenças existentes nesse contexto, visto que, nessa modalidade de Educação, há diferentes perfis e diferentes gerações de estudantes, assim como diferentes idades, diferentes formas de pensar e ver o mundo, diferentes saberes e formas de aprender. Assim, a Educação Física deve estar diretamente atrelada à Educação integral e voltar-se para a aprendizagem dos estudantes em diferentes dimensões, buscando seu desenvolvimento físico, mental e social.

Essa concepção inicial de que a Educação Física desenvolve outras áreas além da físico- corporal contribui para o pensamento da ação única da Educação Física na escola, porém nem sempre foi assim e como vimos discutindo até aqui é necessário repensar o trabalho desse componente na EJA.

Não há como se pensar na concepção da Educação Física Escolar sem considerar a Educação como um todo, caso contrário corremos o risco de pensar de forma equivocada. Se considerarmos a Educação Física uma atividade corporal distinta e separada da atividade intelectual e cognitiva incorremos em erro. Assim, ela é um componente curricular que possui objetivos pedagógicos para fins de ensino e aprendizagem, auxiliando a construção do conhecimento dentro e fora da escola. Seu ensino e aprendizagem não devem ser caracterizados por um fazer pelo fazer, ou seja, não deve ser um fazer apenas prático, mas sim um aprender de conhecimentos e saberes que auxiliem o desenvolvimento cognitivo, intelectual, físico e social do educando (a).

Segundo Beltrami (2006), a Educação Física é uma atividade que coopera para preservar o patrimônio corporal dos indivíduos de qualquer idade, sexo e condição social. Quando pensamos em estudantes jovens e adultos não deve haver restrições, pois acreditamos que a Educação Física deve contemplar todos os sujeitos inseridos no processo educacional inclusive na EJA, preservadas suas características, necessidades e expectativas.

6. “O CORPO NOSSO DE CADA DIA NOS DAI HOJE”: O CORPO COMO