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2 A LITERATURA DE CORDEL E O ENSINO

2.1 Leitura literária na escola

O papel primordial da escola é habilitar os indivíduos à escrita e à leitura e formá-los enquanto cidadãos conscientes de sua atuação em sociedade. Dentre os benefícios da leitura, Zilberman (2009, p.24), destaca “a emancipação intelectual do indivíduo, capacidade de formar suas próprias opiniões, decidir seu destino e elevar-se espiritualmente”. No entanto, esse sentido beneficiário da leitura nem sempre é esclarecido para o aluno. Por isso, mesmo quando aprende a ler, não necessariamente o aluno torna-se leitor.

Por muito tempo, o ensino de literatura se resumia ao ensino da história literária, centrado na memorização de nomes de autores clássicos, de trechos de seus textos e na demarcação precisa da literatura através dos séculos. Para se reverter essa concepção de ensino como transmissão de saber e recolocar a literatura como prática em sala de aula, precisa-se “substituir a história literária pelo trabalho com o texto, não como objeto sagrado a explicar, mas como espaço de linguagem, cruzamento de discursos e saberes” (CHIAPPINI, 2005, p 209), sendo a expressão livre dos alunos acerca da sua experiência literária, o ponto de partida e de chegada.

A mecanização da tarefa de ensinar a ler tem levado o aluno a afastar-se cada dia mais da leitura. Nessa concepção de leitura, conforme nos alerta Zilberman (2009) o livro tornou-se inevitavelmente um produto, funcionando como um “depósito” de informações na sala de aula, degradado a um utilitarismo exacerbado. Essa visão do livro apenas como produto quando passa pelo sistema comercial, se converte numa fonte de renda para autores, editores e livreiros. Esses fatores resumem o livro a uma condição imediatista, consequentemente, descartável.

Para que a leitura literária não se torne um tormento para nossos jovens estudantes, Zilberman (2009, p. 30) destaca que é preciso entender que o real objetivo da leitura é de apropriação da realidade, bem como “o sentido do objeto ao qual se concretiza: a obra literária”.

Isso implica, num estudo da literatura que ultrapasse informações sobre autores e obras e se volte para o papel do leitor, através do qual os textos adquirem múltiplos sentidos.

De acordo com Zilberman (2009), o texto ficcional se constitui um modelo essencial de leitura escolar, pois se trata de uma imagem simbólica do mundo que se deseja conhecer, devido a sua estrutura ser marcada por vazios que requerem a intervenção do leitor, o qual preenche essas lacunas.

Nesse sentido, Aguiar (2011) defende a leitura literária como um movimento ativo do leitor sobre o texto. Segundo a pesquisadora, esses pontos de indeterminação e vazios a serem preenchidos se cruzam ao horizonte de expectativas do leitor que, completa esses espaços e constrói tonalidade de sentido dando assim, vazão à imaginação. Nesse processo portanto, “ler é ampliar horizontes e a literatura será tanto melhor quanto mais provocar seu leitor”. (AGUIAR, 2011, p. 242).

O trabalho de mediação entre cada ser humano e o mundo que o rodeia se dá quando, ao ter contato com determinada obra, esta não transmite apenas um saber, mas também se entrelaça com seu destinatário exigindo que se integre ao texto com sua participação ativa. (ZILBERMAN, 2009, p. 33).

Por essa linha de pensamento, é necessário que a escola/professores abrigue em diferentes formas de aproximação entre sujeitos e os livros, conforme propõe Aguiar (2011, p. 254):

A leitura é um jogo em que o autor escolhe as peças, dá as regras, monta o texto e deixa ao leitor a possibilidade de fazer combinações. Quando ela faz sentido, está ganha a aposta. Mas isso só acontece porque o leitor aceita as regras e se transporta para o mundo imaginário criado. Se ele resiste, fica fora da partida... essa consciência do brinquedo que a arte é leva-nos a experimentar o prazer de entrar em seu jogo.

Por esta explicação, confirma-se que o caráter lúdico da literatura contribui para que o leitor alcance sentidos para além do texto. Ao propor atividades que explorem esse caráter lúdico do texto literário, estaremos provocando a participação do leitor de modo a descobrir seu papel ativo no “jogo da leitura” a que a autora se refere.

Nesse sentido, levamos em conta a interferência de diferentes mediadores de leitura se queremos uma proposta pedagógica que estenda a capacidade leitora. Dentre estes, repensamos o papel do professor de língua portuguesa que, por essa nova perspectiva, “o docente deixa de ser um mero transmissor de conhecimentos para atuar como mediador entre o conhecimento e o aluno”. (TINOCCO; STEPHANI, 2016, p. 97).

Os autores definem ainda que esse processo de mediação requer uma relação de interação entre professor e aluno, de modo a repensar os seu papeis, passando a vê-los como coparticipantes do processo de ensino e aprendizagem. A tarefa do professor é criar condições para o educando realizar sua própria aprendizagem. Por isso, os autores ainda falam que ser mediador implica ter uma relação aluno-professor, baseada na confiança, na colaboração de ambas as partes.

Esse conceito de mediação, defendido pelos autores, é baseado nas teorias de Vygostky, que defende uma abordagem interacionista, em que “no processo de ensino-aprendizagem, o professor mediador assessora/guia/auxilia o aluno no processor de compreensão leitora de um texto” (TINOCCO; STEPHANI, 2016, p. 105). Essa definição supõe que o professor, enquanto sujeito mais experiente, ofereça apoio ao aluno, menos experiente, sempre numa posição de interação.

Desse modo, o professor tem papel importante em propiciar ao aluno a convivência afetiva com o texto literário, no entanto, conforme Tinoco e Stephany (2016), o docente só pode auxiliar o aluno nesse processo se ele mesmo já tiver passado por ele. Isso implica na necessidade de o professor-mediador conhecer as teorias que fundamentam a experiência leitora e, principalmente, ser um leitor dedicado dessa literatura. É o texto literário que deflagra a experiência mais ampla da leitura (ZILBERMAN, 2009, p. 36). Dessa maneira, cabe recuperar seu papel, o que significa repensar essa visão apenas historicista da obra literária, proporcionando uma descoberta do mundo, por um processo que favoreça a imaginação e a experiência individual.

Nos próximos tópicos, veremos o que está sendo feito nesse sentido, através de pesquisas e intervenções do Pós-Graduação em Linguagem e Ensino pela Universidade Federal de Campina Grande, bem como quais temáticas da literatura de cordel são apropriadas para serem abordadas na sala de aula de modo a favorecer uma significativa experiência de leitura.