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lembremo-nos dos comovedores esforços de Colomlxi para impressionar favoravel­ mente aos reis e ao |Xivo durante o percurso de Sevilba a Almazán, onde estava a

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outra parto, continuaram favorecendo o seu almirante,38 39 mas aprenderam que o caráter e a condição de estrangeiro de Colombo eram sementeiras de discórdia e que não era homem a quem se confiar questões de governo e de administração, boram aceitos com rara tolerância o desastre e a frustração, mas não sem que a Coroa adotasse uma mudança de atitude de muitas consequências. De fato, lançadas por terra as primeiras delirantes expectativas, com­ preendeu-se que o regime de monopólio oficial estabelecido nas origens da viagem de 1 492 para que a hspanha se beneficiasse tios supostos tesouros com que o céu lhe havia agraciado, era mais um ônus do que um beneficio, dadas as condições que a realidade das terras achadas impunha. A exploração e a colonização ficaram abertas, pois, àquele que melhor a postulasse e à cobiça de quem se sentisse tentado a fazer fortuna.30 lista mudança acarretou consequências de enorme alcance ao imprimir sua marca na estrutura política e administrativa do império, cujos fundamentos se lançavam nesse momento, e provocou de imediato uma inusi­ tada aceleração de desenvolvimento no processo que estamos examinando.

Quanto ao problema que nos interessa direlamente, não faltaram aqueles que, sem muita demonstração cie juízo critico, aceitaram como boa a "prova" trazida por C .olombo a favor de sua crença inicial. Andrés Bernaldez licou realmente convencido de que a Terra de Cuba fazia parte da Ásia, conforme queria o almirante,40 mas o certo é que, em termos gerais, esse exemplo não leve seguidores.

38. Vejam-se, |xh exemplo, os documentos oin Navarrete, Colcuion, II, eix, cxiii, txiv,

cxxii, cxxv c cxxvi.

39. JvVnl IW iiúm a respeito dos que queriam povoar as índias c dos que desejavam descobrir novas (erras. 10 de abril de 1495. Navarrete, Culru.ió?i, II, l.xxxvi. 40. bernaldez, / lisiorúi, eap. 123. Duianie a viagem de reiorno, ColomU* observou um

eclipse da lua e acreditou ijue os resultados conlirmavam a medida de longitiiuc necessária para poder alirmar que havia t.hegado ao QuersonesoÁureo. (1-as Casas,

I hstorUi, I, xivi e xcviii, e Morison, Aiiniirul oj lhe Ocemi Sea, 11, 1 38-9 e 162, nota 16). O doutor Chanca (Curtu, Navarrete, Colea um, 1, p. 198-22-1) não colocou em duvida que as novas terras fossem a Ásia, mas o seu testemunho se releie tao so a pane da viagem que corresponde até a chegada a ilha 1 xpanhola. Nada diz a respeito

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Miguel tie Cunco, amigo pessoal tie Colombo c seu compa­ nheiro na viagem, mostra-se incrédulo. Ao final da sua animada tlescricão da exploração, dá-nos a informação de que, já de volta a bspanhola, o almirante discutia frequentemente com um certo abade de Lucerna, homem sábio e rico, por não poder convencê-lo tie que a Terra de Cuba era parte tia Ásia. Cunco acrescenta que ele e muitos outros pensavam tia mesma maneira que aquele néscio abade.41 Desconhecem-se os prós e os contra tios argumentos, mas é óbvio que a base tia “ prova” apresentada por Colombo, isto é, a inusitada extensão tia costa tie Cuba, não loi aceita como indício suficienlemente contrário á sua insularidade.

Pedro Mártir também não se deixou seduzir. Com sua habitual cautela, o humanista limitou-se a informar seus pares a respeito tia viagem. Constata-se, porém, que ele se mostrou impressionado não tanto pela identificação com a Asia mas pela segurança com que Colombo sustentava que a costa explorada pertencia a uma terra firme e não a mais uma ilha, como as outras que haviam sitio encontradas.42 Pedro Mártir demonstra uma prolmula consciência tlt) verdadeiro problema em questão, pois verilica-se que ele distingue entre a possibilidade real e surpreendente tie que existisse semelhante massa de terra nessas parles tlt) Oceano e a conclusão tie que, necessariamente, haveria tie se tratar da Ilha tia Terra. O assunto, entretanto, parece-lhe ainda demasiado duvidoso e toma o partido tie se refugiar na hipótese que, evidentemente, era a mais segura: a tie supor que todas aquelas terras, Cuba inclusive, eram

ii:i explorarão tie Cuba. O relato ile Syllaeio ineroecria uni comentário detalhado pela fantástica visão i]ite tem ilas regiões achadas por C'olonibo. Aqui basta vcriltrar que, como o doutor Chanca, seu testemunho relere-se tão só a primeira parte da viagem e que o autor está convencido de que Colombo circunavegou a Alrica convertendo-o num Vasco da Cam a «trmt In Icttre. Parece-lhe que o almirante havia re|x-tido a su|xista tacanha do cartaginês I lannon, que chegou a umas ilhas próximas do G ollo Arábico, e que os carilvs podiam ser os lusiuic, iritx> marítima dos etio|H's africanos, denominação que signiiica homens com (rês olhos, não porque os tivessem, mas como alusão á pontaria inlalivel das suas llechas. Certamente o pobre Syllaeio andava muito perdido.

4 1. Cunco, “ Relato da Segunda viagem” . Rncailui, III, ii, 107.

42. Pedro Mártir, l.pistolario, 142, 152, 1 Só, 1 58 e 164. ISuas cartas são de fins de 1 4l24 c as restantes, de 14l75.

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insulares, se bem que já não insistisse na anterior sugestão de identificá-las com o arquipélago das Antilhas.41 * *

Pode-se concluir que essa segunda viagem de Colombo tem o sentido de ser uma primeira tentativa de trazer a prova que se requeria para demonstrar que se linha conseguido estabelecer a conexão entre làtropa e Ásia pela rota do ocidente, mas uma tentativa fracassada. Tem, além do mais, o interesse particular de mostrar que Colombo aceitava como certa a tese que temos chamado da península Étnica como a verdadeira visão dos litorais atlânticos tia Ásia. Tenhamos presente esta determinação decisiva para entender a sua terceira viagem e o problema que os seus resultados desencadearam.

XI

Quando, em 1496, Colombo regressou à hspanha, nada se sabia ainda de certo a respeito da existência de uma terra de massa comparável ao orbis lemtntm em regiões vizinhas ao primeiro ■ achado de 1492. No ano seguinte, aproveitando a nova atitude da Coroa, empreenderam-se várias explorações que resolveram a questão num sentido afirmativo.44 Soulv-se que ao poente das ilhas

4V IV ,Iro M ártir, P.Vruím, Dec. I, liv. III. (Redigido cm 1 500). O autor não so comprometo com declarações explicitas, mas já se |x*rcelx- que ailm ile para si mesmo a |xv>sihilidade de <]iie, na hipótese de C.nl’a ser parte cie um continente, não era absolutamenle necessário cpic- este losse o asiático. Isso parece indicar, cie lato, a maneira |vla qual se relere a Cutha, seja como illta, seja como a imaginada terra lirm e” (na tradução de Torres Asonsio ó empregada a expressão cl existimrtcío

commente"), ambiguidade quo, indicando prolerència pela tese insular, nau deixa de adm itir a |xrssibilidade contrária, mas sem identificações comprometedoras. I aroco claro cjite a ausência de indícios indiscutíveis de caracleristicas asiáticas |X'sa no ânimo de IVdro M á rtir de modo que ele tiluhoie a respeito da suposta enorme dimensão da Ásia, única premissa da c|ttal depende, para ele, a possiwl verdade da crença colombiana.

44. A este res|H Íto devemos ter presentes as duas ex|xdições de Ceilxrto patrocinadas

pelo rei da Inglaterra, c|ite se eleluaram cm maicvjulho de 1 497 e ju nh o de 1 498-99,

rospoctivamontc. M u ito mais importante c a exjxxliçào espanhola de maio de

1497-otuuhro de I 498, que se sitpcV tenha sido comandada por Solis c que I evil lier

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HGURA 4- Desenhos cio litoral sul do Cuba. Ilustram as idéias geográlioas do Cristóvão Colom bo depois do haver percorrido tais litorais otn sua segunda viagem. (1: linha conliinia, litorais explorados por Colombo; linlia interrompida, litorais não suspei­ tados |n>r Colombo. II: linha eontinua, litorais explorados por Colom lx'; linha inurrompula, lilorais imaginários suspoitiulos por Colomlx>).

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encontradas polo almirante jazia uma grande massa tio torra, hstc importantíssimo fato lavorooia a crença tio Colombo, pois preen- chia o primoiro rot]tiisilo oxi^itlo pola prova, tio manoira cjuo a hipóloso tio tino so tratava tio oxtromo orionto tia Ilha tia Torra não só parooia possivol, como so ponsava ato ontao, mas ora provávol. Kssas regiões hahitatlas por homons, t)uo outra coisa podiam sor so não litorais desconhecidos, mas tio existência sabida tio orbis lermrwn? Colombo continuava convencido tio que a Torra tio Caiba não ora uma ilha adjacente a ossos litorais, mas parlo deles.4Í Deniro do quadro gorai tio problema, no entanto, esta opinião tatla voz mais solitária deixou tio tor verdadeira importância, porque so tratava da modalidade tio um mesmo o fundamental lato. Consta­ ta-se, então, que todo o poso tia duvida passa a gravitar, a seguir, em torno tio segundo requisito tia prova: a localizaçao daquela passagem marítima quedaria acosso ao Oceano Indii o o as riqut zas tias rogiõos que já estavam na iminência d«* oairem nas mãos tios portugueses.* 46 Assim indopendonlemonto do so sabor so Cuba ora ou não o que Colombo supunha, decisivo ora eiuontrar aquela passagem, a qual, tio acordo com a imagem que olee muitos outros tinham tios litorais tia Ásia, deveria estar nas imediações tia linha equatorial, pois, por essas latitudes terminava a península do Quersonoso Áureo.47 listo ora, consequentemente, o próximo

inv.xada |x4o historiador argentino parece contundente, e.nlxira não tenha conven­

cido a uxlos. Vcja-sc Mostro Ves/mcirmo. Catálogo. C:omil<ilo o.ioro..;.' adAmer.go

Ves/mcc. ,u-l ,,ióntoce..iennrio(l.4!a »oscilo. Horença, 1955. Hm Itxlt. caso, de acordo

a n u essa prova, e in.lcpcndcntcmonle .los problemas concretos que suscita, e

incgãvel em princípios .lo século XVI, .lis,n11i l tain-s.- cio .lados sobre a ex.sténc.a

cto uma grande massa . lf terra ao |xacnlc .las ilhas e vizinha ilelas.

*15. Isso e t. que se infere da alirmação em sua Cana sohre a terceira viagem, em que diz que os reis eram agora senhores do monte Sophora, que esta na .lha hspanhola.

Navarreie, Colccriórt, I, p. 244. Pierre d ’A illy , Imago M un.li, cap. 49, menciona esse

monte to m o ... prom ontório na índia oriental, para onde Saltm .ao enviata. sua

frota. C olom bo numa anotação rc|vle a inlormação. Anolaetx-s, 304, 3/4 e 5t\ .

46. Não parece casual que tenha sido exatamente ate 1495, quando os portugueses decidiram realizar a viagem á índia apesar de o Calxt da boa I sperança ter s.do descolx-rto anos antes. A viagem só foi empreendida |x>r Vasco da ( .ama em 14 /. 47. Colomlxs, anotação 36 ã Historio rcriim »bique gcstori.m de Pio II (Aeneas Sylvn.s

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passo exibido pela lógica da prova; islo foi, realmente, cr que Colombo pretendeu fazer na sua viagem seguinte. Mas tudo se complicou enormemente, como veremos, pelo inesperado apare­ cimento de uma massa cie terra austral que semeou o desconcerto.

X ll

Para a sua terceira viagem (a frota zarpou de Sanlúcar de Barrameda, no dia 30 de maio de 1498), Colombo elaborou o projeto de navegar para o sul até alcançar regiões equatoriais e daí prosseguir em direção ao poente.48 49 Pretendia primeiro verificar se encontrava uma terra que o rei de Portugal alirmava existir nesse caminho4'' e, segundo, estabelecer contato com os litorais da Asia, buscando a passagem pelo Oceano Indico que, segundo a imagem que fazia dele, estaria por essas latitudes. Mas a realidade lhe reservava uma surpresa desconcertante.

Depois di' alcançar, aproximadamente, o paralelo 9° de latitude norte e de percorrê-lo em direção oeste, sem ler encontrado a terra preconizada pelo monarca lusitano, aportou em uma ilha densa­ mente povoada por gente de melhor compleição o mais branca do que aquela que havia encontrado até então. Chamou a essa ilha LiTrinidad - nome que conserva até nossos dias - e correiamente calculou que se achava ao sul do colar das ilhas dos canibais que havia reconhecido em sua viagem anterior.

Colombo pensou que estivesse num arquipélago adjacente ao extremo meridional do orhis icrrannn, ou concretamente falando, vizinho às costas do Quersoneso Áureo (Península de Malaca) que,

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