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A literatura revela que existem lesões específicas que estão associadas com a marcha, sobretudo a corrida. Estas são aparentemente causadas pelas ondas de impactos transmitidos ao corpo pelos pés, especialmente no momento de contato inicial com o solo.

Contudo, muitos outros fatores podem intervir para o surgimento de uma lesão, sendo sua origem, conseqüentemente, multi-fatorial.

Hrealjac (2004) observou que em um período de um ano, quase 70 % dos corredores apresentaram alguma forma de lesão por excesso de uso, apesar de não haver uma definição clara de sua etiologia. Muitas lesões têm sido relacionadas à locomoção, como:

tendinopatias, avulsão de tendões, lesões musculares, fraturas de fadiga etc. (Viel et al., 2001). Por essa razão, este tópico abordará quase que unicamente a associação entre lesões e a corrida, em função da maior magnitude de impactos relacionados a ela, quando comparado com a caminhada, e às marcantes diferenças cinéticas e cinemáticas entre essas duas.

O processo de transmissão e absorção de impactos se inicia no pé, absorvendo as vibrações decorrentes a cada passada que realizamos. Este toca o solo cerca de 766 a 786 vezes a cada 1 km percorrido, sendo a magnitude do impacto, no momento do contato entre o calcanhar com o solo, diretamente proporcional à velocidade da locomoção (Viel et al., 2001). Entretanto, há corredores que não usam o calcanhar como primeiro local de contato contra o solo, mas o antepé. Quando comparados com os corredores que usam o calcanhar, estes estão mais sujeitos a desenvolverem fasciite plantar, ou até mesmo ruptura da aponeurose plantar (Viel et al., 2001).

Medidas de aceleração na cabeça mostraram que o impacto do calcanhar é atenuado em até 70%, sendo esta atenuação reduzida em cerca de 30% pela doença articular degenerativa (Kim, et al., 1993). Isto indica que uma vez lesionado, maiores são as chances de ocorrer uma nova lesão.

A técnica também parece influenciar no surgimento de lesões. Os corredores demonstram uma marcha mais “suave” que os que não correm, tanto em velocidade de caminhada rápida de 6,3 km/h, como para a corrida em 12 km/h (Hreljac, 2000).

O efeito dos impactos no corpo pode variar de acordo com a magnitude destes, a quantidade recebida em cada sessão de treinamento e a freqüência semanal de treino (Derrick e Mercer, 2004). Não é bem compreendida qual é a intensidade, duração e magnitude ótimas destes impactos, para uma ótima saúde tecidual (Hardin et al., 2004). A sobrecarga tecidual está relacionada com a osteoartrite em modelos animais e, apesar de não haver experimentos em humanos, existe certa concordância de que os impactos também podem desencadear lesões. Um bom exemplo é a existência de altas taxas de lesões associadas com uma grande quilometragem semanal de corrida (Hardin et al, 2004).

Contudo, apesar de ser comum a pesquisadores e médicos associarem os impactos a lesões em corredores, existe pouca evidência epidemiológica de relação causa e efeito (Derrick, 2004). Segundo Derrick (2004), os impactos podem contribuir para lesões quando associados com anatomia anormal, cinemática anormal, duração excessiva do esforço ou repouso inadequado entre as sessões. O organograma na Figura 11 apresenta um resumo das possíveis causas de lesões durante a corrida descritas na literatura. Das variáveis descritas na figura, o treinamento contribuiu com 60% de todas as lesões (Hreljac et al., 2000). Hreljac et al. (2000) verificaram que corredores que desenvolviam padrões de passada, que incorporavam baixas taxas de impacto e uma rápida taxa de pronação, possuíam um risco reduzido de desenvolver lesões. Uma recomendação final, feita por estes autores, sugere a redução da velocidade de treinamento como meio de reduzir as forças de impacto.

Existe um limite inferior de impactos que são adequados para manter a saúde do tecido e um limite superior que, se for superado, pode levar a um estresse tecidual. É provável que variações anatômicas mudem estes limiares, tornando algumas pessoas predispostas a lesões (Derrick e Mercer, 2004). Em concordância, Knutzen e Hart (1996), em sua extensa revisão sobre as lesões na corrida, sugeriram que a interação de sobrecargas mecânicas com alterações nos padrões normais de corrida, superfície de corrida, mudanças no treinamento e tênis, parecem criar modificações funcionais que levariam às lesões. Estas seriam mais prevalentes nos joelhos, seguidas pelas pernas e pés. O local mais freqüente de fratura por estresse, apresentado por Knutzen e Hart (1996), é o colo femoral seguido por fraturas subtrocantéricas femorais, pubianas e sacrais.

Lesões na corrida

Figura 11 – Organograma contendo os fatores relacionados com lesões em corredores (adaptado de Hreljac et al., 2000).

Quando as forças de reação aos impactos são moderadas, aparentemente o sistema nervoso central modula a força muscular, antes do contato do pé com o solo, bem como o tempo em que esta será aplicada (Santello, 2005). O entendimento de como essas forças atuam sobre o corpo poderia ajudar na prevenção e tratamento das lesões associadas com a locomoção.

As principais mudanças cinemáticas que podem modificar as forças de impacto são a inversão do pé, a dorsiflexão do tornozelo e a flexão do joelho (Hardin et al., 2004).

Observações feitas pelo estudo de Hardin et al. (2004) mostram que as adaptações cinemáticas ocorridas durante a corrida, realizada com tênis de diferentes durezas da meia-sola, combinada com diferentes durezas do piso, levam a mudanças na postura do MI. Estas modificações cinemáticas sugerem uma forma ativa de adaptação dos efeitos mecânicos passivos e surgem para diminuir o custo energético, apesar de aumentar a magnitude do impacto. Isto poderia contribuir no aumento do risco de lesões por excesso de uso em corredores de longa distância, especialmente nestes que correm em superfícies duras.

Por outro lado, existem evidências que sugerem o oposto. Como verificado, os corredores normalmente mantêm o joelho quase que em extensão no momento do impacto do pé sobre o solo. Se as condições não são ideais (freqüência de passada, fadiga, luminosidade, dureza da superfície e comprimento da grama), então, aparentemente, o ângulo de flexão do joelho aumenta, reduzindo o potencial lesivo, em função da menor severidade que um erro ocasionaria. Entretanto, esta variação na técnica ideal reduz a performance máxima para maior absorção dos impactos (Derrick, 2004).

Com relação aos equipamentos usados na redução dos impactos, o tênis, especificamente sua meia-sola, tem sido desenvolvido para amortecer o impacto, apesar do freqüente debate em torno de sua eficácia (Hardin et al., 2004). Verificou-se que um tênis impróprio pode aumentar a velocidade de flexão do joelho e o custo energético da locomoção (Hardin et al., 2004).

De um modo geral, corredores que apresentam uma lesão deveriam ser aconselhados a reduzir a velocidade de treinamento, como forma de reduzir as forças de impacto e, somado a isso, maiores períodos de recuperação entre as sessões de treinamento (Hreljac, 2004).

CAPÍTULO III–MATERIAIS E MÉTODOS

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