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Capítulo 3 Filosofia na escola: Experiência de uma pratica pedagógica

3.2 Liberdade sem medo

Não se trata, então de que – como pedagogos, como pessoas, como pessoas que conhecemos as crianças e a educação – reduzamos a infância a algo que, de antemão, já sabemos o que é, o que quer ou o que necessita. (LARROSSA, Jorge, Pedagogia Profana Danças, piruetas e mascaradas, 1998. P. 234 235).

Um dos princípios que o projeto de filosofia tem em comum com a Vivendo é que a criança não é vista como uma coisa acabada e pronta que com uma receita podemos entender e explicar tudo que acontece e como funciona e assim ter o

“produto final esperado”. Na vivendo a criança é vista e respeitada na sua individualidade, o trabalho com elas é feito a partir dos interesses imediato das crianças. Nunca entendendo a criança como uma coisa pronta e acabada.

Nós sabemos o que são as crianças, ou tentamos saber, e procuramos falar uma língua que as crianças possam entender quando tratamos com ela, nos lugares que organizamos para abriga-las.

Não obstante, e ao mesmo tempo, a infância é um outro: aquilo que, sempre além de qualquer tentativa de captura, inquieta a segurança de nossos saberes, questiona o poder de nossas praticas e abre um vazio em que se abisma o edifício bem construído de nossas instituições de acolhimento.

Pensar a infância como um outro é, justamente, pensar essa inquietação, esse questionamento e esse vazio. (LARROSSA, Jorge, Pedagogia Profana Danças, piruetas e mascaradas, 1998. P. 230).

Diferente das escolas tradicionais, como no caso do aluno que foi tirado da escola, observei que depois de colocar a criança de castigo na escola por algum

“problema” surgia o comentário entre professores que a criança não tinha “mais jeito” porque nada resolvia. Foram poucas as vezes que observei alguém tentando entender as crianças para ajudar a entender o mundo. A tentativa foi sempre de tentar conseguir que a criança obedecesse por medo de ser castigada, quanto mais obediente, “melhor é a criança”.

começamos a trabalhar ficamos com medo de apresentar nossas ideias e não serem consideradas boas.

A nossa liberdade de escolha foi tirada, sempre temos que fazer o que é o

“certo”, a nossa liberdade de escolha é tirada. Não estou dizendo que podemos fazer tudo que queremos, mas que não temos que fazer tudo o que mandam também. Fazer ou não fazer não é questão de escolha é uma questão de medo, medo de ser punido.

No ensino filosófico a preocupação está em fazer uma construção moral com as crianças, trabalhando as questões de forma que as crianças participem do processo de construção e entendam que significa cada coisa e suas implicações.

Construindo com as crianças o que é o certo ou errado desejável dentro da sociedade em que elas vivem e entendendo o porque dessas regras.

Descobri que não só era importante que as crianças aprendessem a pensar de maneira correta num sentido lógico, mas também que era importante que pudessem pensar acerca de estética, ética, política e fazer bons julgamentos em torno das diferentes questões que tradicionalmente tinham sido patrimônio da filosofia. Comecei a pensar que meninos e meninas precisavam da filosofia para esclarecer conceitos que são filosóficos ( como “verdade”, “tempo”,

”justiça”) e que, ao mesmo tempo, fazem parte da linguagem de todos os dias.

Os adultos dizem continuamente as crianças que devem se comportar bem, mas nunca discutem com elas o que é o bem; pedem-lhes que digam a verdade, mas nunca falam com elas acerca do que é a verdade. E não só não discutem com as crianças, como também não concebem espaços para que elas conversem a respeito entre si ou pesquisem por si mesmas. (Filosofia para crianças: A tentativa pioneira de Matthew Lipman/ Walter Omar Kohan, Ana Míriam Wuensch. – Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. P. 30-31)- (série filosofia e crianças).

E assim podemos ajudar as crianças a dar significado as coisas e não simplesmente “enfiando goela abaixo” delas e dizendo que tem que fazer assim e pronto. Depois como podemos dizer que estão fazendo uma coisa “certa ou errada”

se não entendem a diferença entre o que jugamos ser certo ou errado, simplesmente ensinamos que não podem fazer e pronto, acabou a conversa.

Figura 5

Quando criamos um espaço que as crianças podem exercer sua autonomia e deixamos as crianças participarem dos processos de construção elas se sentem cada vez mais valorizadas no grupo e na sua individualidade.

Por autonomia entende-se a liberdade de escolher o que, quando e de que forma fazer e não a “liberdade” somente de poder fazer as coisas que tem para ser feitas.

Essa liberdade é importante porque pessoas mais autônomas adquirem mais responsabilidades dentro do grupo que vivem e se tornam mais participativas, ajudando a criar a sensação de pertencimento ao grupo se tornando responsável com o grupo também. Como consequência investem mais energia no grupo e conseguem perceber melhor as pessoas a sua volta.

Nesse aspecto o jeito de trabalho filosófico não funciona somente em escola, é uma dinâmica que pode ser usada em qualquer outro ambiente, e uma forma de viver.

Quando comecei a trabalhar na Vivendo, depois de trabalhar em outros lugares, esperava que as pessoas me mandassem fazer as coisas, tinha pouca autonomia e medo de fazer alguma coisa que fosse errado e que fosse punido por cometer algum erro, ou fizesse algo de forma diferente. Com o passar do tempo fui percebendo como era diferente aquele lugar e sentindo cada vez mais que aquele lugar era meu também.

“Apanhei” muito até entender como funcionava a dinâmica da Vivendo.

Quando eu cometia algum erro as pessoas vinham conversar abertamente,

mostrando onde foi a falha e apontando as possibilidades de melhora. A preocupação que se tinha era em ajudar a melhorar, para que sempre pudéssemos estar melhorando juntos.

Sempre senti um grande respeito nesses momentos, me passando segurança para dizer o que aconteceu, sem sentir necessidade de esconder nada. Assim resolvendo os problemas da melhor forma possível.

Foi quando comecei a perceber como funciona a dinâmica da filosofia, pude perceber como aquele lugar passava a ser meu também, me sentindo pertencente aquele grupo e em consequência querendo participar cada vez mais daquele espaço e contribuir com ele.

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