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Como é de conhecimento geral, a globalização alterou todas as formas de relações entre as sociedades – existe uma maior abertura e interconexão dos mercados e das economias mundiais – o que levou a um aumento da competição internacional e, nesse

19 sentido, a chave para o sucesso nos negócios internacionais está numa liderança organizacional efetiva. No entanto, Hofstede (1980, citado em Raskovic, 2010) aponta que a liderança não pode ser vista de forma universal pois as sociedades estão inseridas em diferentes contextos sociais e culturais. Early & Mosakowski (2004, citados em Raskovic, 2010), exemplificam: “enquanto que um gafanhoto comum é visto como uma peste no mundo ocidental, os chineses muitas vezes têm-nos como animais de estimação (em vez do hamster), e na Tailândia os gafanhotos fritos são uma iguaria reverenciada” (p. 18).

Tal como o exemplo dos gafanhotos, existem muitas outras diferenças culturais relacionadas com diversos fatores, incluindo a liderança organizacional. Diversos autores exploraram diferentes teorias sobre a relação entre a cultura e a liderança e encontraram variações culturais no que toca aos atributos específicos dos líderes (Hanges, Lord, & Dickson, 2000).

House, Hanges, Javidan, Dorfman, & Gupta (2004) referem que apesar de ter ocorrido uma evolução substancial na investigação sobre liderança transcultural nas últimas décadas, esta ainda é, por vezes, muito teórica, sem universalidade, lidando com problemas metodológicos e fragmentada em termos de publicação. No que toca a universalidade, Bass (1990) defende que as teorias da liderança ocidentais (maioritariamente norte americanas) muitas vezes não conseguem capturar a diversidade e a complexidade das relações dos países não ocidentais. Com isto, qualquer investigação transcultural aproxima-nos de um quadro teórico mais generalizado e universalmente aplicável, que é mais sensível ao contexto cultural.

2.3. A liderança no GLOBE

Um dos grandes objetivos do projeto GLOBE é determinar o que as pessoas de diferentes culturas acreditam ser a liderança. Nesse sentido, os investigadores do GLOBE relacionam as características culturais das sociedades (as nove dimensões referidas no capítulo sobre cultura) com os diferentes tipos de comportamentos de um líder.

20 Na primeira conferência de investigação do GLOBE, uma grande parte do tempo foi dedicada à criação de uma definição de liderança que refletisse os diversos pontos de vista dos investigadores. Surgiu então um consenso na definição de liderança organizacional: “a capacidade de um indivíduo influenciar, motivar e possibilitar os outros a contribuir em direção à eficácia e ao sucesso da organização em que são membros.” (House et al., 1999, p. 18).

Uma das fontes de inspiração para esta definição foi o estudo de Lord e Maher (1991, citados em Northouse, 2006) sobre a teoria da liderança implícita que diz: “os indivíduos possuem crenças e convicções implícitas sobre os atributos e crenças que distinguem os líderes dos não líderes e os líderes eficazes dos não eficazes” (p. 313).

É necessário perceber que esta é uma definição de liderança organizacional e não liderança em geral, visto que o projeto GLOBE estuda apenas o fenómeno de liderança organizacional.

Os autores do GLOBE identificaram seis comportamentos de liderança que são considerados comuns a todas as culturas estudadas. Estas características são (House & Javidan, 2004):

 Liderança Carismática/ baseada em valores – capacidade de inspirar, motivar e esperar um desempenho elevado com base na forte realização dos valores fundamentais. Este tipo de liderança abrange o ser visionário, inspirado, sacrificado, confiável, decisivo e orientado para o desempenho.

 Liderança orientada para a equipa – salienta o trabalho em equipa e a realização de propósitos comuns entre os membros. O líder é colaborativo, integrativo, diplomático, não malevolente e administrativamente competente.

 Liderança participativa – o líder abrange os outros membros na tomada e implementação de decisões. É participativo e não autocrático.

 Liderança orientada para as pessoas (humana) – o líder é solidário, atencioso, compassivo e generoso. É necessário ser modesto e sensível para com as pessoas.

21  Liderança autónoma – é uma liderança independente e individualista. O líder é

autónomo e único.

 Liderança auto protetora – reflete comportamentos que garantem a segurança do líder e do grupo. O líder é autocentrado (por exemplo, solitário e não participativo), consciente do status, indutor de conflito, ritualista e formal.

Em cada uma das sociedades estudadas pelo GLOBE, estas características são mais ou menos evidentes. Por exemplo, em países como Portugal, Espanha e Itália os líderes mais apreciados são do tipo carismático, orientado para o grupo e participativo (sendo este importante mas não tanto como os dois anteriores) (Northouse, 2006). Ou seja, a liderança deve ser inspiradora, colaborativa, participativa e orientada para o desempenho, mas ao mesmo tempo, pouco compassiva. Por outro lado, em países como a Rússia, a Polónia e a Hungria, os líderes devem ser, em primeiro lugar, pessoas independentes e que ao mesmo tempo mantenham um forte interesse em proteger a sua posição de liderança. Resumidamente, a liderança deve ser autónoma e independente, possuindo alguns traços de inspiração, orientação para o grupo e de atenção às necessidades das pessoas.

O histograma seguinte apresenta os seis atributos de liderança comuns a todas as sociedades, classificados de acordo com o grau de preferência de cada cluster (Hoppe, 2007).

22 Figura I 2 - Atributos dos líderes por clusters

(adaptado de Hoppe, 2007)

Um resultado muito interessante do projeto GLOBE foi a identificação de uma lista de atributos de liderança, tanto positivos como negativos, que são universalmente aceites por todas as sociedades estudadas. Estes atributos são listados na Tabela I 1.

Tabela I 1 - Atributos de Liderança (adaptado de Northouse, 2006)

Atributos Positivos de um Líder

Integrador de equipa Visionário Positivo Cauteloso

Orientado para a

excelência Encorajador Justo Inteligente

Negociador Decisivo Dinâmico Comunicativo

Inspirador de

confiança Honesto Motivador Inspirador

Administrativamente competente Informado Íntegro

Resolução de conflitos através de ganhar-

ganhar Coordenador Seguro

0 1 2 3

Orientação para Desempenho Orientação para Equipa Participativo

23

Atributos Negativos de um Líder

Pouco Explícito Irritável Anti-social Impiedoso

Não Cooperativo Ditador Egocêntrico Solitário

Muitos investigadores acreditam que apesar de existirem semelhanças económicas ou sociais entre os países, ainda mais atualmente devido à globalização, os desenvolvimentos históricos influenciam a evolução de importantes fenómenos de gestão (Javidan & Carl, 2004). Ou seja, os valores culturais de um país são uma determinante do seu perfil de liderança ideal.

Javidan (2004) refere o estudo de Triandis (1994) que mostra que os países individualistas dão mais importância à liberdade e aos empregos desafiantes, enquanto que nas culturas coletivistas as pessoas favorecem a segurança, a obediência, o dever e a harmonia do grupo. Portanto, mesmo com alguns atributos universais no sistema de gestão, cada cultura distinta deve ter o seu estilo de gestão e liderança, que é moderado e influenciado pela cultura.

Por outro lado, existem autores que argumentam que pelo menos alguns aspetos de liderança transcendem as barreiras culturais e são assim, universalmente aceites. Eles acreditam que devido à globalização, a tecnologia, os processos industriais, e as práticas e instituições globais são comuns e portanto, servem para harmonizar as práticas e os processos de gestão (Javidan & Carl, 2004).

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