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Capítulo IV – Discussão

5. Limitações e Futuras Investigações

Importa sublinhar que este estudo apresenta diversas limitações, que tiveram potencial impacto na qualidade dos resultados e na capacidade de resposta às hipóteses de investigação. Entre as principais limitações, destacam-se o design transversal, o tamanho da amostra, diferenças entre os grupos clínico e de controlo, a fidedignidade dos autorrelatos, a multifatoriedade das PUA e o uso de uma bateria extensa de provas neuropsicológicas como fator potenciador de fadiga. Em seguida, as limitações são discutidas em maior detalhe.

Tendo em conta que a presente investigação empregou um design transversal, em parte pelo facto de ter sido realizada num espaço de tempo limitado, não é possível determinar se, ao longo do tempo e relativamente à primeira hipótese, os sujeitos que se encontravam abstinentes há menos de um ano apresentarão melhorias no funcionamento neuropsicológico. Um estudo longitudinal seria útil para compreender esta questão. Este tipo de estudo é, obviamente, mais válido, uma vez que permitiria compreender mais detalhadamente as alterações cognitivas presentes em diferentes períodos de abstinência individual.

O tamanho da amostra no estudo é relativamente pequeno, o que teve um potencial impacto na potência dos testes utilizados na análise estatística dos dados e na magnitude do efeito, limitando a generalização das conclusões. Importa salientar que esta foi uma amostra recolhida num espaço de tempo limitado, o que impediu que o seu tamanho fosse superior. Adicionalmente, os critérios de exclusão abrangeram um número relativamente grande de potenciais participantes, o que também contribuiu para esta limitação.

Dentro da investigação neuropsicológica, vários subgrupos de alcoólicos foram excluídos, direta ou indiretamente. Os critérios de exclusão direta incluíram a presença de algumas perturbações comórbidas e outras condições que provoquem alterações neurológicas

82 (como TCE, AVC, entre outros), assim como síndromes clínicas específicas associadas ao álcool (como síndrome de Korsakoff e encefalopatia de Wernicke) e PNM induzida pelo álcool. As amostras altamente seletivas são vantajosas para investigar os efeitos diretos do abuso de álcool, mas não são representativas de todos os alcoólicos que entram no tratamento para desintoxicação. Isto implica que existe a possibilidade de presença de outras dificuldades ao tratamento associadas a estas condições, que também necessitam de atenção neuropsicológica. Apesar do grupo de controlo ter sido emparelhado ao nível da idade e escolaridade, o mesmo não se sucedeu com o sexo, havendo diferenças significativas dos grupos clínicos para o grupo de controlo neste aspeto metodológico, o que é um potencial fator de influência nos resultados da investigação. Ainda relativamente às caraterísticas dos grupos, é relevante frisar que a inclusão de indivíduos consumidores de polisubstâncias leva a que os efeitos individuais das substâncias, neste caso, do álcool, sejam difíceis de isolar.

Interessa ainda salientar que neste estudo foram incluídos participantes com idades e pontuações variadas nas SPM. Deste modo, considera-se relevante sublinhar a influência de diversas variáveis na compreensão, desempenho e resultados dos testes, tais como funcionamento intelectual global inferior, baixa escolaridade, desenvolvimento incompleto de funções executivas, ou declínio cognitivo relacionado à idade (Salgado et al., 2009). Visto que os grupos não foram emparelhados de acordo com o QI, nem houve um valor mínimo de QI estabelecido como critério de inclusão, alguns resultados observados podem estar associados a défices no funcionamento cognitivo global.

Ao analisar a investigação que envolve a dependência de álcool, é importante perceber que a determinação fidedigna e precisa do consumo de álcool é muito pouco frequente. A (pouca) fidedignidade dos autorrelatos do consumo de álcool é algo que está bem documentado na literatura, pois há uma tendência para subestimar e subnotificar o nível de consumo de álcool, assim como o nível de erro pode aumentar com a quantidade consumida (Rehm et al., 2008, citados por Lezak et al., 2012). Esta imprecisão é igualmente aplicável à estimativa de início do padrão de consumo problemático, duração da dependência e do número de desintoxicações. A idade, a escolaridade, o sexo, o uso de outras substâncias, comorbilidades psicopatológicas, perturbações do comportamento da infância e história familiar de alcoolismo, por exemplo, constituem fatores de risco para défices cognitivos induzidos pelo álcool (Bates, Labouvie, et al., 2002; Oscar-Berman et al., 1997). Esta heterogeneidade de fatores psicológicos, sociais, culturais, genéticos e biológicos, e a sua interação afeta o funcionamento cognitivo dos alcoólicos de forma distinta, assim como a sua recuperação com a abstinência.

83 Esta multifatoriedade inerente às PUA e aos défices cognitivos decorrentes da mesma constitui, assim, uma limitação ao estudo pois não é possível isolar e controlar todos estes fatores.

Tal como em todos os estudos sobre os efeitos do uso de substâncias no cérebro, este tipo de investigação é desafiante de conduzir e interpretar, devido à frequente presença de perturbações comórbidas que podem contribuir para os aparentes efeitos do consumo de álcool, assim como a influência da própria medicação para tratar as PUA e as comorbilidades psicopatológicas. Apesar de ter sido analisado estatisticamente, é possível que alguns fatores que possam causar comprometimento cognitivo (por exemplo, uso de ansiolíticos, antidepressivos, doença hepática, entre outros) possam ter influenciado os resultados.

A dimensão da bateria de testes utilizada constituiu um potencial fator de fadiga aos participantes, o que pode ter tido impacto nos testes aplicados em último lugar. Sugere-se, por isso, o recurso a provas menos extensas, evitando a fadiga dos participantes. Por outro lado, a dimensão da bateria de testes permitiu uma avaliação relativamente abrangente da amostra.

Estudos futuros podem basear-se nestes resultados, com amostras maiores e medição de fatores moderadores e mediadores para ampliar a nossa compreensão de como o comprometimento cognitivo influencia os resultados.

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