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De maneira resumida, a NGP caracteriza-se por ser uma abordagem normativa e prescritiva, formada a partir de um conjunto de abordagens teóricas que apresentam em comum a visão de que o setor público pode funcionar a partir de princípios mercadológicos. Busca-se,

com isso, a substituição de uma gestão burocrática e rígida, por um modelo gerencial, mais flexível, baseado na competitividade e nos resultados (ABREU, HELOU, FIALHO, 2013).

As mudanças realizadas com base nessa concepção de administração pública têm sido analisadas ao longo dos anos, e vem sofrendo diversas críticas, e alertas, sobre seus limites. Muitas dessas críticas voltam-se à ênfase que essa abordagem adota, de ressaltar componentes ideológicos mais que os práticos, privilegiando, muitas vezes, a legitimação das ações, apenas no âmbito do discurso. Questiona-se a contribuição efetiva das ações, como as privatizações, por exemplo, no ajuste das contas públicas (ANDREWS; KOUZMIN, 1998; POLLITT, 1995). Paula (2003) indica que, apesar de incluir, em seu arcabouço, o discurso da participação e fortificação dos princípios democráticos, ao adotar princípios gerencialistas, a NGP acaba por deixá-los, apenas, no âmbito do discurso. Na prática, seus princípios estão mais voltados para a eficiência técnica e para o desempenho, do que para a dimensão sociopolítica.

Outra questão prática levantada é a real efetividade das técnicas gerenciais do setor privado, amparada muitas vezes em mitos e modismos gerenciais. Com frequência, essas ferramentas ignoram a complexidade da gestão e os aspectos sociopolíticos envolvidos. Deixam, pois, de considerar o contexto de elaboração e as consequências de sua aplicação, no próprio contexto empresarial onde primeiro foram inseridas (PAULA 2003).

Um exemplo disso são as dificuldades metodológicas da aferição de resultados. Diefenbach (2009) destaca que as técnicas de avaliação de desempenho empresarial são limitadas em amplitude e profundidade. Mesmo os mais avançados sistemas de avaliação de desempenho incorporam poucos aspectos intangíveis. Assim, as ferramentas gerenciais para medição do desempenho preocupam-se em captar e medir apenas determinados aspectos, em geral, os mensuráveis. O enfoque sobre esses aspectos limita a avaliação de desempenho à enfocar eficiência e produtividade.

Esse estreitamento nos parâmetros de medição de resultados pode acarretar efeitos perversos, especialmente sobre aspectos não quantificáveis, os quais podem ser ignorados ou negligenciados, já que não são capturados no radar de desempenho. Assim, aspectos subjetivos passam a ser desvalorizados e desacreditados, retratados como sem importância, empregados de forma instrumental (DIEFENBACH, 2009).

A flexibilização ou diminuição do controle burocrático, almejada pelas organizações que aplicam as ferramentas da NGP, também vem sendo questionada nos estudos empíricos. Em alguns casos, as mudanças trouxeram, inclusive, aumento do controle. Em busca da descentralização, foram inseridas mais regras e níveis hierárquicos para controle (ABREU, HELOU, FIALHO, 2013). Secchi (2009), concluiu, a partir da continuidade do controle burocrático em organizações que passaram por reformas gerenciais, que a implantação da NGP não se configurou em ruptura com a burocracia.

Pollitt (1990) considera que os princípios da NGP são similares aos da Administração Científica, constituindo-se em uma espécie de neotaylorismo. Para esse autor, da mesma forma que o taylorismo, a NGP privilegia a busca pela produtividade e eficiência, a separação entre gestão e política, e a aplicação de ferramentas gerencialistas “cientificamente” testadas. Dessa forma, as consequências do taylorismo, como alienação do trabalho, também seriam transplantadas para a gestão pública.

Dunn e Miller (2007) destacam que a inserção de determinadas práticas permitem, inclusive, a análise de que houve um deslocamento na NGP em direção à sua nêmese: o chamado Neo-Weberian State (NWS), ou Estado neoburocrático ou neoweberiano. O NWS emergiu da preocupação com as inadequações da NGP e de percepções sobre o fracasso de reformas promovidas por essa abordagem. Especialmente nos países em desenvolvimento, os críticos consideram que a NGP não tem conseguido alcançar seu objetivo: tornar as organizações públicas mais efetivas e eficientes.

A NWS diferencia-se da NGP por reconhecer a centralidade do Estado, defendendo que apenas um Estado forte tem capacidade gerencial de lidar com questões domésticas, e o contexto internacional de globalização, ameaças ambientais, desafios demográficos e inovação tecnológica. Defende, ainda, a preservação das carreiras do serviço público. No entanto, também apresenta pontos comuns a NGP, como orientação para os cidadãos, orientação para resultados e busca do profissionalismo na gestão pública - que, na verdade, foi um preceito preservado da própria burocracia na NGP (DUNN; MILLER, 2007).

Os autores destacam o predomínio da racionalidade instrumental em ambas as propostas. A NWS se caracteriza pela lógica racional-legal weberiana, enquanto a NGP adota, como foco, a adoção de ferramentas para obter ganhos financeiros, como downsizing, programas de redução de impostos, e privatizações. Ainda que democratização, participação e

compartilhamento de poder sejam tomados como valores em ambas as correntes, muitas vezes seu significado fica restrito à melhoria na eficiência dos serviços públicos (DUNN; MILLER, 2007).

Savoie (2006) afirma que a NGP é um conceito falho, e que é pouco provável que se obtenham, a longo prazo, bons resultados pela transferência das ferramentas do setor privado para o público, tendo em vista as diferenças existentes entre essas duas realidades. As mudanças propostas pela NGP são fortemente amparadas por modelos prescritivos e fracas em realizar diagnósticos. O autor comenta que muitos problemas da burocracia pública são causados não pelos servidores públicos, mas pelo ambiente político que cerca a própria administração pública, e dela é inseparável.

Além disso, também há diferenças entre a postura adotada por um cliente das atitudes adotadas por cidadãos. Um cliente é soberano no sentido de decidir individualmente por deixar de utilizar um serviço. O cliente insatisfeito utiliza o mercado, migrando para o competidor para preservar seu bem-estar e marcar posição. Suas atitudes são impessoais e individuais. As atitudes dos cidadãos, ao contrário, tem propósitos comuns. Suas vontades são manifestas e ouvidas por meio da opinião pública (SAVOIE, 2006).

Em termos conceituais, as limitações direcionadas à adoção da NAP são ainda mais profundas. A principal crítica apontada pela literatura (DENHARDT, 2012; BALL, 2005; PAULA, 2009) diz respeito à inadequação da transferência das técnicas, advindas da gestão privada para o setor público. Considerando que endossa valores como competição, produtividade, individualismo, adoção da lógica de mercado para a tomada de decisões nas organizações públicas, apoiando-se, teoricamente, em princípios que afirmam que “todo comportamento humano é dominado pelo autointeresse” (KAMENSKY, 1996, p.251) - e não ideais de equidade e justiça - questiona-se a validade de decisões amparadas por um modelo que rejeita princípios de coletivismo e espírito público.

Da mesma forma, a mudança discursiva no tratamento de cidadãos como consumidores faz com que os serviços públicos se voltem à lógica do autointeresse de curto prazo dos consumidores e não à busca dos interesses públicos definidos democraticamente pelos cidadãos. Além disso, a relação entre os prestadores de serviço público e seus “consumidores” é bem mais complexa que uma relação comercial (DENHARDT, 2012).

De fato, alguns serviços públicos, como educação, meio ambiente, segurança, estão mais voltados ao bem-estar coletivo que individual, e justamente pelo fato de integrarem decisões na esfera pública, resistem à simplificação de uma relação mercantilizada.

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