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LINEARIDADE, NÃO LINEARIDADE E INTERACTIVIDADE

1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1.6. A NARRATIVA

1.6.3. LINEARIDADE, NÃO LINEARIDADE E INTERACTIVIDADE

Linearidade

Muitos documentários interativos recentes reagem e asseguram que o conteúdo é sempre sobre determinado, que cada clip, cada pedaço de conteúdo remonta à unificação da narrativa. Podemos navegar à vontade mas o tema nunca está para além de um clique de distância. As possibilidades para outros temas, outras interpretações, outras realidades, estão encerradas. Isto leva-nos a ter em conta o modo convencional, em que o público espera que o conteúdo lhes seja oferecido. Tendo sido condicionados a aceitar participação mínima na construção e desconstrução da narrativa, o espectador arquetípico pode rejeitar o esforço adicionado e tomar uma iniciativa pessoal de forma a “criar” a sua própria narrativa.

Parece mais evidente que existam temas mais abrangentes que são inevitáveis de forma a determinar e a sustentar uma narrativa bem- sucedida, independentemente da fragmentação que possa apresentar superficialmente. Claramente, é igualmente importante compreender que o condicionamento dos espectadores a um documentário não- interativo pressupõe que novos ou desconhecidos utilizadores interativos migrem para algo que não lhes é típico ou nativo.

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Enquanto formato documental emergente, não se pode assumir que o future do documentário interativo esteja limitado aos parâmetros ou limites da sua fórmula inicial. À medida que a sua popularidade vai aumentando, podemos ver o desenvolvimento do género numa nova e mais eficaz narrativa não-linear. O filme documental convencional tem a longevidade do seu próprio sucesso como um media eficaz e bem estabelecido, que confirma que, presentemente, uma comparação equilibrada dos sucessos de ambos os formatos não pode ser apresentada devido à história significativamente mais curta do documentário interativo.

Não-linearidade

A narrativa não-linear, semelhante à perda de controlo sobre o discurso do autor, é vista como um problema pelo mundo do documentário tradicional, mas como um novo género é considerado como uma grande oportunidade. Este tipo de narrativa permite que os projetos audiovisuais incorporem e implementem elementos que sejam um complemente enriquecedor, permitindo um conjunto de novos valores à experiência global dos utilizadores, tornando-a mais variada, completa e imersiva. O papel do documentarista é encontrar o meio-termo onde o significado pode ser maximizado e a audiência é mais empenhado. É neste meio-termo onde o documentário tradicional e o media interativo coexiste. Combinando o poder do filme como forma de apresentar uma perspectiva, e a possibilidade de interação para melhorar a participação do utilizador com o material, o documentário interativo poderá produzir projetos com maior significado. A ideia de que o media interativo pode preencher a lacuna entre produtor e utilizador é bastante promissor para qualquer documentarista que procura intensificar a participação na narrativa. Mas se a distância entre produtor e utilizador for demasiado curta o

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projeto poderá perder interesse precisamente devido à falta de uma forte voz narrativa e uma organização precisa da narrativa, que é exatamente o que os documentaristas tradicionais temem.

O formato interativo permite experiências que misturam o entretenimento com o didático (conhecimento), da forma mais eficiente e atrativamente possível. Isto torna-se possível através da combinação de modos de navegação e interação diferentes que permitem uma troca múltipla entre o projeto e o utilizador. Numa primeira fase, navegando e visitando diferentes estruturas de conteúdo (informação/conhecimento) implica a utilização de estratégias e recursos que são normalmente aplicadas à criação e conceção de jogos. Desta forma, a estrutura interativa com modos de navegação permitem ao utilizador, de certo modo, “jogar” com as possibilidades que o projeto permite, satisfazendo uma necessidade principal, que é a de divertimento e entretenimento. Numa segunda fase, esta estratégia muito próxima com a experiência de jogo normalmente implica que o utilizador retenha uma sensação de imersão profunda, o que impede que a aprendizagem se torna fastidiosa. Esta forma de interatividade é muito mais apelativa e dinâmica que a interatividade permitida pelo hipertexto. Nesta fase, o utilizador vai “aprendendo enquanto joga ou explora”, e depois de “aprenderem” podem partilhar o conhecimento com outros utilizadores (em tempo real ou quando acharem conveniente). Desta forma, podemos compreender como o documentário interativo satisfaz três necessidades específicas: recreativa (a de jogar), forma tive (para quem tiver interesses culturais) e comunicacional (nível de interação com outros participantes). Através da conjugação correta destes três aspetos, as aplicações de multimédia não-ficcional podem ser, em semelhança com a ficção tradicional, igualmente apelativas. O formato interativo permite que o utilizador seja um

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explorador, em vez de ser um consumidor, permitindo-lhe entender uma história ou local complexos.

Interatividade

O conceito de interatividade é diversamente discutido por teóricos contemporâneos. Para uns, o conceito é descrito de forma simplista, mas para outros a interatividade é algo complexo demais para ter uma definição linear, em poucas palavras, como argumenta Manovich (2005).

A interatividade está presente em qualquer processo comunicacional, mesmo que unidirecional. A interatividade ocorre, por exemplo, na recepção da mensagem e na sua consequente interpretação. O ato de interpretar é interativo. Porém, é um processo interativo que pode ser limitado à consciência do receptor. Ele não reage, não interage a essa recepção de outra forma a não ser a de se consciencializar a seu respeito. De acordo com Vilches (2003, p.229), “a interatividade não é um meio de comunicação, mas uma função dentro de um processo de intercâmbio entre duas entidades humanas ou máquinas”.

O efeito cativante dos botões interativos juntamente com histórias cativantes sem uma clara indicação da longevidade e da extensão da storyline coincide com a crença de Barthes de que “o nascimento do leitor deve ser um efeito da morte do Autor”, estando o autor presente para “impor um limite ao texto” (Barthes, 1978). Não há dúvida de que há um autor existente por detrás de um texto de novo media, existe, sim, uma contradição na definição de “autor”, estando removido do seu papel original de controlador da narrativa,

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assumindo um papel de mediador, criando conteúdo, mas não a orientar uma ordem do seu consumo.

A interatividade é pertinente aos meios de comunicação da Internet, mas não é um termo que, de acordo com Manovich, foi bem entendido nas tentativas gerais de explicar as experiências dos media digitais. (Manovich 2008).

O termo tem sido debatido, há algum tempo, quanto seu nível adequado de definição no que diz respeito aos relacionamentos da Internet

Em aplicação aos media de ecrã, e especificamente ao documentário de base de dados, existem novas possibilidades narrativas permitidas pelas formas de interatividade não-lineares, em software de autoria relativamente recente, como, por exemplo, o Korsakow29.

Quando as audiências podem contribuir para o conteúdo dos documentários de base de dados, o trabalho torna-se aberto a novas ideias e formas de articulação. Existem formas através das quais o conteúdo deixa de ser uma narrativa absoluta e transforma-se num recurso com um alcance de possíveis configurações da narrativa. No que diz respeito à autoria, o ponto central do trabalho desenvolvido deixa de existir nesta forma mais distribuída de prática mediática.

1.6.4. MODOS DE ESTRUTURAÇÃO DA NARRATIVA DO DOCUMENTÁRIO