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Literatura Pop Management

A Ciência está caminhando para um modelo holístico, onde o rigor metodológico ainda valorizado será circunstanciado. Além disso, conforme já visto, novos modelos de apresentação de sua produção serão desenvolvidos e utilizados. Trata-se de uma aproximação da Ciência com a sociedade, fundamental para o desenvolvimento desta última. Para as Ciências Aplicadas e, no caso analisado, a Administração, este movimento não será diferente.

Portanto, cabe deter-se sobre a importância que a academia dá à seleção de seu referencial teórico. Para isso, trazemos como contribuição um diálogo do filme O

Despertar de Rita, no qual um professor de Literatura e sua aluna travam a seguinte

discussão:

Prof. Frank – Aliás, sobre este resumo crítico que você escreveu sobre Howard’s End...

Rita – Uma droga?

Prof. Frank – Não. O problema é que... Como, diabos, você escreve sobre E. M. Forster quase totalmente se referenciando a Harold Robbins?

Rita – Você disse para eu trazer outros autores. “Referência a outros autores impressiona os examinadores”, você disse!

Prof. Frank – A outras obras sim. Mas duvido, por Deus, que os examinadores tenham lido “Para onde foi o amor”.

Rita – Azar deles!

Prof. Frank – Azar seu, quando eles te reprovarem. É o que eles fariam se você escrevesse isso no exame.

Rita – Essa é boa! Isso é que eu chamo de injustiça! Sou reprovada porque leio mais do que os examinadores neuróticos?

Prof. Frank – Devorar ficção barata não é ler bem... Rita – Pensei que ler fosse bom!

Prof. Frank – E é, mas tem que aprender a selecionar. A coisa mais importante, Rita, é que se você quer aprender a criticar, tem que disciplinar sua mente.5

No filme, o professor procura retratar a importância dada pela Academia para a

5

Do roteiro do filme O Despertar de Rita – Educating Rita – em tradução livre do autor do trabalho

origem, para a fonte que é utilizada por aqueles que se propõem a estudar e pesquisar. A relevância de Harold Robbins, um romancista popular e que tem seus livros largamente comercializados em todo o mundo ocidental, não está em discussão. Mas sim, o rigor necessário a um texto para que este sirva de referência para estudos de Literatura.

A seleção da literatura que baseia os estudos científicos em Administração é feita ainda hoje segundo um modelo e metodologias importados. Portanto, atende a interesses não declarados de “domínio intelectual”, ao que Colado (2005) chamou de Capitalismo Acadêmico. Curado (2003) não se utiliza desse termo, mas alerta que os estudos científicos importados nos chegam como se neutros fossem (e como se essa neutralidade ideológica realmente fosse possível) e, portanto, aplicáveis diretamente em nossas organizações. Curado cita Oliveira, quando diz que esse exercício de “domínio literário” traduz-se em evolução social e, como os modelos organizacionais fazem parte dessa evolução, eles devem ser copiados e difundidos pelas sociedades mais atrasadas.

A literatura popular de gestão, mundialmente conhecida como Pop

Management, pode ser avaliada pelo menos por dois prismas: o de ser legítima

representante do sistema de disseminação e colonização intelectual do capitalismo acadêmico; ou como as primeiras manifestações, talvez ainda não tão rigorosas quanto o necessário, da tendência holística manifestada por Capra (2005).

As críticas da Academia a esta literatura têm sido bastante contundentes. Carvalho et ali declaram-se consternados pela constatação de que “cada vez mais dinheiro é investido para promover uma explosão de vendagem de títulos risíveis cujos conteúdos são mais patéticos a cada novo lançamento” (CARVALHO et ali, 2007, p. 1). Por sua vez, Paes de Paula et al constatam que, apesar de terem seus conteúdo e consistência constantemente questionados, “isso não parece constituir barreira para tornar alguns deles grandes best-sellers” (PAES DE PAULA et al, 2003, p. 3). Costa (2006) ressalta que a leitura desses livros se dá, entre os pós- graduados em Administração, por indicação dos professores dos cursos em sua maior parte, cabendo uma pequena parte da responsabilidade às pessoas relacionadas ao ambiente de trabalho.

enquanto alguns de seus integrantes criticam de forma incisiva esta literatura, outros a utilizam à larga em suas salas de aula. E o estudante de Administração, que se pretende gerente em futuro próximo, vive esse dilema.

As criticas feitas a esta literatura podem ser, na verdade, os motivos de seu sucesso. Curado lembra que a Administração “empresta, de outras áreas de conhecimento, seu ferramental teórico e metodológico” (CURADO, 2003, p. 7). Cita Psicologia, Sociologia, Antropologia, Biologia, Matemática e Economia como algumas das ciências que contribuem diretamente para o estudo da Administração. Capra (2005) defende que a visão limitada do mundo cartesiano está cada vez mais evidente em todas as áreas do conhecimento humano e que em todas as áreas os cientistas terão de ir muito além das abordagens mecanicista e reducionista e adotar enfoques holísticos e ecológicos, para transcender o modelo clássico. Portanto, torna-se importante identificar os pontos que suportam críticas como a feita por Carvalho et ali (2007) quando compara os livros Pop Management com livros exotéricos ou de auto-ajuda. Afinal, essas podem ser algumas das áreas que contribuem para a compreensão da Administração como ciência social aplicada.

Essa identificação deve ser feita de forma criteriosa pois corremos o risco de, em nome da pluralidade e do hibridismo, aceitarmos conteúdos frágeis e inconsistentes. Este é o atual desafio do cientista social: procurar maior abrangência de suas contribuições sem perder a consistência científica.

Capra (2005) ressalta que o comportamento competitivo ora em voga em detrimento do espírito de cooperação é uma das principais manifestações da tendência isolacionista e auto-afirmativa da sociedade moderna, que tem raízes ainda no darwinismo social do século dezenove. A visão de competição como “força impulsionadora da economia” gerou um padrão de consumo de recursos naturais, que hoje começa a ser discutido com mais intensidade. E foi graças a este ambiente competitivo que uma literatura de linguagem mais acessível e soluções mais óbvias se desenvolveu, satisfazendo uma necessidade crescente de capacitação como diferencial dos gestores.

Com relação à forma de apresentação dos textos acadêmicos, lembramos os modelos de Robey e Markus (1998) e Fallman (2002) quando propõem serem necessárias mudanças na forma de apresentar os resultados das pesquisas

acadêmicas, viabilizando assim seu entendimento e aproveitamento por uma maior parte da sociedade (conceito de público-alvo). Se a literatura popular de gestão a despeito das críticas da Academia, continua crescendo em volume de vendas e importância no processo de aprendizado de estudantes de Administração e gestores, é porque até aqui esta mesma Academia não conseguiu realizar essa proposta.

Neste capítulo, apresentou-se a discussão sobre o ambiente de crise da Ciência como um todo, as criticas aos modelos e métodos de pesquisa tradicionais, a discussão sobre rigor e relevância e sua aproximação com a discussão sobre teoria e prática e a literatura popular de gestão, como possível vertente literária desse ambiente científico em mutação.

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