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Capítulo III Resultados e Discussão

3.1 Biofortificação em ambiente controlado

3.1.4 Composição do grão

3.1.4.1. Localização de elementos minerais

Os grãos de cereais são um bom exemplo de sistemas altamente heterogéneos, proporcionando um desafio analítico para a imagiologia (Lombi et al., 2011). A distribuição elementar nos grãos de cereais tem sido investigada com aplicação de diversas técnicas, particularmente em cevada (Lombi et al., 2011a), trigo biofortificado (Ajiboye et al., 2015) e arroz (Choi et al., 2014). A partir dos mapeamentos elementares e considerando os mecanismos de processamento de alimentos é possível quantificar as perdas de nutrientes a partir dos grãos de cereais para o produto final, facto importante para a indústria de processamento de alimentos. Esta é uma ferramenta bastante importante, particularmente quando se analisam alimentos base biofortificados (Ajiboye et al., 2015).

A biofortificação consiste numa técnica estabelecida não só para colmatar défices nutricionais de populações (Lidon et al., 2015), mas também para estudar a elasticidade metabólica e os processos homeostáticos das plantas (Kabir et al., 2014), assim como, as interações solo-planta e a fitorremediação (Wu et al., 2015).

Os mapeamentos espectrais foram obtidos para todos os grãos e os resultados qualitativos são totalmente consistentes. Para o Triticum durum, variedade Marialva foram selecionados grãos dos tratamentos controlo (15 mL) e 90 mL. Na Figura 3.46 encontram-se os mapeamentos obtidos para os grãos selecionados.

Devido ao corte longitudinal dos grãos efetuado pelo sulco ventral é possível observar que a aleurona e a cavidade do endosperma permanecem numa metade do grão, enquanto a outra metade não apresenta estas estruturas. Saliente-se que a acumulação dos diferentes elementos minerais é específica para algumas estruturas do grão. Por exemplo, o Fe, Mn, Zn e Ca estão essencialmente concentrados no endosperma e na zona basal do embrião, enquanto que o K se encontra distribuído na aleurona. O P predomina essencialmente na camada interior da aleurona, em torno do endosperma, e no embrião (Figuras 3.45 e 3.46).

Em todos os grãos, com e sem biofortificação, é possível observar que o Ca também se encontra distribuído por todo o pericarpo, particularmente na hipoderme, o que está de acordo com Heneen e Brismar (1987) e Stomph et al. (2011). O Mn ocorre na zona basal do embrião porém em quantidades reduzidas. Estes resultados são um pouco díspares dos resultados propostos por Ajiboye et al. (2015), onde os grãos biofortificados apresentaram a maior concentração de Zn no embrião, decrescendo abruptamente no endosperma. O Cu constitui um caso interessante, pois embora seja observado em valores próximos do limite inferior de deteção da técnica, encontra-se presente em concentrações elevadas no endosperma e em qualquer uma das estruturas do farelo e da aleurona. Ajiboye et al. (2015) verificaram que o Cu estava presente essencialmente no endosperma e aleurona de grãos de trigo mole,

independentemente do processo de biofortificação. Note-se, contudo, que neste estudo se recorreu a uma adubação de fundo, contrastando com a adubação foliar de Ajiboye et al. (2015), o que pode explicar a elevada concentração de Cu na aleurona de grãos biofortificados.

Em síntese, neste estudo verificou-se que as maiores variações na concentração ocorrem no embrião. Adicionalmente, as concentrações dos micronutrientes são mais elevadas no farelo relativamente ao endosperma, o que indica que o conjunto de grãos de trigo deve inevitavelmente ser utilizado para obtenção de sêmola integral, necessária no fabrico de massas alimentícias biofortificadas para consumo humano. O facto de o embrião ser removido durante o processo de moagem significa que a estrutura com maior variação de micronutrientes também é removida, no entanto, mesmo uma pequena variação da fração de massa no endosperma pode conduzir a um incremento significativo na quantidade desses micronutrientes.

Figura 3.45 – Caracterização do grão de trigo com representação dos seus componentes

principais: farelo (A), endosperma (B), embrião (C) e zona basal do embrião (D) (Brouns et al., 2013).

A

B

C D

98 2a 3a 4a 5a 6a 7a A 8a B 9a A 2b 3b 4b 5b 6b 7b 8b 9b 1 1a

Figura 3.46 – Imagens de uma semente de trigo duro selecionada longitudinalmente através de análise espectrométrica

por fluorescência de raios X de distintos elementos minerais: Microscopia eletrónica de varrimento (1 e 1a); Fe (2); Zn (3); Mn (4); Cu (5); K (6); P (7); Ca (8) e S (9), referente aos tratamentos 15 mL (a) e 90 mL (b).

Após análise da semente com recurso a microscopia eletrónica de varrimento acoplada a uma sonda de raios X foi possível constatar que (Figura 3.47) valores mínimos de Fe e Zn se localizaram no embrião tanto no tratamento 15 mL como no tratamento 90 mL. Verificou- se ainda que no tratamento 15 mL, o Fe e o Zn se localizaram preferencialmente na região equatorial do endosperma da semente (Fe 3,37 %; Zn 8,01 %). Paralelamente constatou-se no tratamento 90 mL, uma localização específica destes elementos minerais na região apical terminal da semente (Fe 2,73 %; Zn 12,69 %). Por oposição, Cakmak et al. (2010b) consideraram para o tratamento controlo (Fe 0,0089 %; Zn 0,0038 %) e para o tratamento de adubação foliar (Fe 0,0089 %; Zn 0,0047 %) que o Fe e o Zn predominaram no embrião.

Uma análise comparativa entre os tratamentos permitiu ainda constatar que a razão Fe / Zn sofreu um incremento de 0,32 para 0,85 do tratamento 15 mL para o tratamento 90 mL no embrião. Esta mesma razão aumentou na região apical terminal da semente de 0,19 para 0,22, decrescendo na região equatorial do endosperma de 0,42 para 0,26. Observou-se que no tratamento 15 mL a razão Fe / Zn aumentou na região equatorial do endosperma e posteriormente decresceu na região apical terminal da semente. Relativamente ao tratamento de maior carga nutricional (90 mL), verificou-se uma tendência decrescente ao longo do grão (do embrião para a extremidade apical).

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Figura 3.47- Microscopia eletrónica de varrimento acoplada a microanálise de raios X e localização de

elementos minerais na semente, particularmente no embrião (A), região equatorial do endosperma (B) e região apical terminal (C) para os tratamentos 15 mL (1) e 90 mL (2).

A fração mássica (W %) referente ao ferro e zinco corresponde à percentagem destes elementos face ao total de elementos considerados, nomeadamente Na, Mg, P, K, Ca, Mn, Fe, Cu e Zn, sendo o somatório de 100 %.

Cakmak et al. (2010b) sugeriram que entre as diferentes frações do grão, o endosperma obteve a menor concentração de Zn. Particularmente para o tratamento controlo (sem aplicação foliar de Zn) o embrião apresentava concentrações de Zn similares comparativamente com a região apical terminal. A aplicação de tratamentos foliares de Zn incrementou significativamente as concentrações deste elemento mineral nas três frações do grão. Cakmak et al. (2010b) constataram que o Zn se encontra preferencialmente na aleurona e embrião. Aplicações de Zn no solo resultaram num decréscimo da concentração de Fe em todas as frações do grão, principalmente na aleurona e embrião. De forma a obter um impacte biológico mensurável na saúde humana, a concentração de Zn no grão deve ser incrementada para 10 mg kg-1. Estes autores obtiveram incrementos de 17 mg kg-1. Resultados semelhantes foram relatados por Kutman et al. (2010) num estudo efetuado em estufa com trigo duro. Ozturk et al. (2006) também constataram que a adubação foliar incrementou significativamente as

1A Fe 0,60 % Zn 1,86 % Fe/Zn = 0,32 Fe 2,05 % Zn 2,42 % Fe/Zn = 0,85 2A Fe 3,37 % Zn 8,01 % Fe/Zn = 0,42 1B 2B Fe 2,39 % Zn 9,24 % Fe/Zn = 0,26 Fe 0,91 % Zn 4,68 % Fe/Zn = 0,19 1C 2C Fe 2,73 % Zn 12,69 % Fe/Zn = 0,22

concentrações de Zn no grão de trigo, apontando para uma elevada mobilidade deste elemento mineral nas plantas. Estes autores observaram ainda que o Zn se encontra localizado preferencialmente no embrião e na aleurona. Adicionalmente, Ehret (1985) demonstrou que o Zn está particularmente concentrado no embrião, sendo que na totalidade do grão de trigo a sua concentração foi de 27 mg kg-1. Neste enquadramento verificou-se que os resultados obtidos no nosso estudo divergem de forma substancial dos resultados propostos por estes autores. Observou-se uma localização preferencial de Fe e Zn na região equatorial do endosperma da semente (Figura 3.47) neste estudo. Contrariamente, de acordo com a literatura, estes elementos minerais encontraram-se preferencialmente na aleurona e embrião.

A análise espectrométrica por fluorescência de raios X (Figura 3.46) é uma técnica semi- quantitativa, com uma reduzida incidência do feixe. Analogamente, a microscopia eletrónica de varrimento acoplada a microanálise de raios X (Figura 3.48) consiste numa técnica quantitativa, com um índice de quantificação mais sensível e um maior poder de deteção. De facto, confirma-se que a proporção de elementos minerais existentes no interior do endosperma é substancialmente reduzida, não sendo comparável com a proporção existente na sêmea. As concentrações dos elementos Mn, Fe, Cu e Zn são uniformes e residuais, não sendo possível distinguir entre o tratamento controlo (15 mL) e o tratamento biofortificado (90 mL), devido à localização preferencial destes elementos minerais na sêmea do grão de trigo.

Figura 3.48 – Registo espectral da deposição de Mg (1), P (2), K (3), Ca (4), Mn (5), Fe (6), Cu (7) e Zn (8)

respetivamente, referente aos tratamentos 15 mL (a) e 90 mL (b), segundo o corte longitudinal da semente, conforme indicado pelo traçado azul.

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