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Capítulo II: Percurso Metodológico

3. Métodos e Técnicas de Investigação

Todo o tipo de intervenção supõe o recurso a procedimentos de investigação que deem a conhecer o contexto e os seus atores. Assim, tendo em conta que “(…) as ciências sociais têm por objeto real um objeto que fala, que usa a mesma linguagem de base de que se socorre a ciência e que tem uma opinião e julga conhecer o que a ciência se propõe conhecer.” (Sousa Santos, 1989:33), a investigação e a procura de conhecimento sobre determinado “problema” deve ser executada junto de uma população que se enquadre ao que se quer investigar/saber. Portanto, a investigação é algo que se faz de forma a gerar conceções à cerca de determinados acontecimentos, realidades e objetos, logo, importa “(…) pensar que conhecimento se produz e como se produz e que decisões socio epistemológicas se tomam.” (Silva, 2011:119). Então, refletir epistemologicamente em relação à metodologia e à produção de conhecimento, torna-se importante, uma vez que a ida para o terreno, e as experiências que lá passamos, nos influenciam nas nossas tomadas de decisão.

Neste seguimento, baseei-me no método etnográfico para analisar as complexidades do quotidiano da escola básica com jardim de infância (EB1/JI), onde estagiei, através da coordenação da mesma; pois, este método estuda as interações humanas e tenta ver para além do que já se sabe de antemão sobre o contexto e as interações lá passadas. Dessa forma, reconhece-se que para ser possível realizar uma reflexão epistemológica acerca da produção de conhecimento, necessitamos de estar envolvidos nesse processo; pois, sem isso, perdemos a oportunidade de “(…) discutir a forma como a etnografia pode constituir-se enquanto método que qualifica conhecimentos profanos e locais, podendo estes adquirir o estatuto de conhecimentos transformadores” (Silva, 2011:119). A etnografia é, portanto, um método que permite o reconhecimento legitimado dos saberes adquiridos no contexto, que por sua vez, são transpostos para as notas de terreno.

A este método interliga-se a observação participante, visto que se pressupõe que quem investiga, fica por um extenso período de tempo no terreno. Segundo Peretz (1998:73), esta associa três comportamentos distintos, que fui identificando ao longo do meu percurso, nomeadamente, “uma forma de interação social com o meio estudado”, considerando que através do estágio estamos ativamente presentes e envolvidos com o contexto; “as atividades de observação”, que foram uma constante em todos os momentos

Página 39 passados no contexto; e “um registo dos dados observados”, contidos, neste caso, nas notas de terreno (ibidem).

Portanto, a observação participante é uma estratégia, metodologicamente falando, importante em todas as fases do estágio, desde a exploração inicial do terreno, ao seu conhecimento ligeiramente mais aprofundado, até à avaliação, mais diagnóstica do trabalho que foi realizado; especialmente, conforme me fui envolvendo ativamente nos momentos que observava. Através desse envolvimento tive a oportunidade de participar da vida quotidiana da escola, o que remete para uma posição subjetivista, “(…) tendo o observador que assumir uma posição interna de participação na investigação e na situação em estudo e que recorrer à introspeção e à redução fenomenológica para compreender essa situação, privilegiando-se necessariamente a metodologia etnográfica ou etnometodologia.” (Estrela e Rodrigues,1994:98).

Ultimamente, estes fatores contribuíram, indo de encontro a Becker (1958:652 in Silva, 2011), para que eu, como observadora participante, reunisse um conjunto de dados; o que me permitiu percecionar os acontecimentos do quotidiano, durante um determinado longo período de tempo, através do acompanhamento da coordenadora, da dinâmica da escola e das atividades realizadas; que mais tarde, contribuíram para identificar padrões que serviram de apoio para a análise de dados.

Todos estes acontecimentos são materializados para as notas de terreno (NT), tiradas por quem investiga ao longo da sua observação no terreno, que neste caso resultaram em setenta e duas páginas densas e detalhadas2, permitindo-me ter uma visão mais minuciosa e real possível do contexto Também aqui se pode considerar que a avaliação qualitativa está presente, pois a observação para além de ser participante é, também, sempre acompanhada por notas de terreno. Posteriormente, através deste registo descritivo dos acontecimentos observados e vividos durante o estágio, foi possível problematizar e inferir sobre os mesmos, estabelecendo pontes, que contribuíram para relembrar informação pertinente a ser mobilizada na argumentação e justificação dos resultados. Considero que a partir desse é ainda possível identificar traços “(…) [d]a avaliação ex-ante (Aguiliar e Ander-Egg, 1992:27-28), igualmente designada por avaliação diagnóstico (Beaudoin et al., 1986:193-198) (…)” (Monteiro, 2000:142), tendo

2 As setenta e duas páginas de notas de terreno resultaram dos sessenta e dois dias e trezentas e oitenta e

quatro horas de estágio, acompanhando o quotidiano do contexto. Seguem em apêndice dez exemplos de NT.

Página 40 em conta que esta “(…) desenha o inventário das necessidades, dos beneficiários e dos recursos disponíveis.” (ibidem), o que acabou, mais ou menos evidentemente, por estar presente, e daí surgir a problemática e um conjunto de propostas de intervenções no estágio.

Por sua vez Burgess (1997), reconhece, a este método, a facilidade com a qual os/as “investigadores” podem cair na “tentação” de alterar as suas notas, assim como “modificarem e influenciarem o contexto de investigação tanto quanto podem eles próprios ser influenciados por ele” (ibidem). Porém, admite-se haver “(…) sempre o exercício de objetificar os discursos das pessoas e concretizar uma forma de as representar” (Silva, 2011:116). Neste seguimento, reconhecendo que nunca é possível ser-se totalmente neutro, as experiências e vivências que vamos tendo ao longo desse período de tempo, contribuem, também, para o que se passa no contexto. Dessa forma, assume-se “(…) a dificuldade em separar as compreensões que se fazem em blocos estanques (partes e capítulos) para morfologicamente serem apresentáveis, pois «deitam por fora», transbordam, tentaculando ligações evidentes entre si.” (ibidem).

Este método “(…) é, sobretudo, uma postura que é visível não apenas no modo particular de se estar no terreno e de recolher dados, mas igualmente no modo de produzir os textos finais, onde se procura fazer justiça aos sentidos e à compreensão dos sujeitos sobre as suas vidas no mundo.” (ibidem). No entanto, admite-se haver “(…) sempre o exercício de objetificar os discursos das pessoas e concretizar uma forma de as representar.” (ibidem). Assim, atentando a este caso em particular, tentei manter-me o mais fiel possível nas minhas transcrições, e, posteriormente, optei pela análise de conteúdo, técnica que me auxiliou a encontrar uma maneira de percecionar o mundo dos intervenientes do contexto, o mais neutralmente possível, uma vez que contactei com um contexto diferente do meu e do qual estou envolvida.

Segundo Bogdan e Biklen (1994:220 in Amado, 2013:305) a análise de conteúdo constitui-se como um instrumento básico da investigação qualitativa, numa busca de conferir sentido ao material empírico recolhido, em especial quando existe a procura de desenvolver e sustentar algo através dos dados recolhidos. Para tal, está implícita a decomposição da informação recolhida de modo a categorizá-la numa “espécie de gavetas ou rúbricas” (Bardin, 1977: 37), conforme vão emergindo através da análise e confronto do material em questão. Tendo isso em conta, esta técnica, permitiu a classificação da

Página 41 informação que foi recolhida, em três categorias3, abordadas no próximo capítulo, fundamentais para a organização e confronto de ideias entre a prática e a teoria.

Por fim, reconhece-se a utilidade que a observação participante e as NT assumiram no contributo da captura e preservação dos procedimentos, condutas e rotinas do local de estágio.