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MÚSICA 4 – DEAR THEODOSIA

No documento Hamilton : traduzindo as duas revoluções (páginas 45-48)

CAPÍTULO 2 – RELATÓRIO

2.2 O ATO TRADUTÓRIO

2.2.2 TRADUÇÃO DAS MÚSICAS

2.2.2.4 MÚSICA 4 – DEAR THEODOSIA

Dear Theodosia é a vigésima-segunda música, a última do primeiro ato. É cantada por Burr e Hamilton para seus respectivos filhos, Theodosia e Philip. Os dois homens, maravilhados e assombrados com a paternidade, veem seus filhos nascerem junto com a formação de uma nova nação e admitem que cometerão muitos erros nessa nova fase de suas vidas. É uma música que prenuncia as grandes crises – nas vidas desses dois personagens, e no novo governo americano – que serão abordadas no segundo ato. Porém, o tema principal é a paternidade e o amor que um pai sente pelo seu filho.

A cena é muito simples, com apenas Burr e Hamilton no palco, cantando juntos. A música está no compasso 4/4, mas em um ritmo sincopado, o que quer dizer que os tempos

fortes estão deslocados. Por esse motivo, foi a música que nos desafiou mais em questões rítmicas. Foi tão difícil identificar os tempos fortes, mesmo com o auxílio da partitura, quanto pensar em soluções que se encaixassem no esquema de tônicas.

Aqui fomos confrontados com a questão da domesticação ou não dos nomes dos personagens. Até então, isso não tinha sido uma necessidade nas traduções, considerando que apenas o nome de Eliza e Angelica tinham sido cantados nas músicas anteriores, e esses estão nomes presentes na cultura brasileira. Logo, a questão de alterar os nomes ou não, ainda não tinha sido considerada. Quando nos deparamos com o nome da filha de Burr é que a questão foi levantada.

Quadro 17: Exemplo da questão de nomes

Texto-Fonte Tradução: Versão 1 & 2 Dear Theodosia,

what to say to you?

Ah, Theodosia, nem sei descrever Dear /The–/o–/do–/sia,/

what/ to/ say/ to /you?

Ah,/ The/o/do/sia, nem/ sei / des/cre/ver

Algumas opções foram consideradas: poderíamos simplesmente não mencionar o nome da filha com “Minha filhinha”. Entretanto, isso seria fugir de um problema que teria de ser resolvido de qualquer forma, caso houvesse uma montagem brasileira do musical. Como nos propusemos a traduzir essas músicas pensando em versões possíveis de serem interpretadas em um palco, não poderíamos ignorar esta questão. “Minha filhinha” foi descartada, então.

Poderíamos domesticar o nome, o que resultaria em “Teodósia”. É uma opção válida, com o mesmo número de sílabas e com mesma sílaba tônica. Entretanto, acabamos por decidir que seria melhor manter os nomes com a grafia em inglês. Estamos lidando com uma obra que seria destinada a brasileiros adultos de classe média e alta, que estão em contato constante com a língua inglesa. Além disso, musicais no Brasil são altamente americanizados e, em geral, os nomes não são adaptados. No musical Wicked, por exemplo, as personagens principais possuem nomes peculiares: Elphaba e Glinda. Na versão brasileira, os nomes foram mantidos16.

                                                                                                               

16 Disponível em: http://ego.globo.com/famosos/noticia/2016/06/myra-ruiz-lembra-situacao-inusitada-por-conta-da-maquiagem-em-wicked.html. Acessado em: 4 de mai. de 2017.

Quadro 18: Exemplo de reorganização sintática em prol da Naturalidade Texto-Fonte Tradução: Versão 1 Tradução: Versão 2 Dear Theodosia,

what to say to you?

You have my eyes.

You have your mother’s name

When you came into the world, you cried and it broke my heart

Ah, Theodosia, nem sei descrever A vejo em mim Na sua mãe também

O seu choro ao nascer partiu o meu coração

Ah, Theodosia, nem sei descrever O que eu senti Ao ver você nascer

Você tem os meus olhos e o nome da sua mãe

Dear /The–/o–/do–/sia,/

what/ to/ say/ to /you?

You/ have /my/ eyes./

You /have /your /moth–/er’s/

name

When /you /came /in–/to /the /world/, /you /cried /and /it /broke /my /heart

Ah,/ The/o/do/sia, nem/ sei / des/cre/ver A/ ve/jo em /mim Na /su/a /mãe /tam/bém

O /seu /cho/ro ao/ nas/cer/

par/tiu o/ meu/ co/ra/ção

Ah,/ The/o/do/sia, nem/ sei / des/cre/ver O/ que eu/ sen/ti Ao/ ver/ vo/cê/ na/scer  

Vo/cê /tem/ meus/ o/lhos/, e o /no/me /da/ su/a /mãe

Para manter as adaptações próximas ao registro oral, recorremos ao uso das marcas de oralidade descritas por Paulo Henriques Britto. No Quadro 18, recorremos ao uso do pronome reto como objeto na segunda versão para conseguirmos, na versão final, um registro mais informal do que o contido na versão 1, em que há a presença do pronome oblíquo antes do verbo.

Chegamos à solução apresentada na primeira versão pelo número de sílabas que tínhamos disponíveis. “Vejo você em mim” contém seis sílabas, enquanto “A vejo em mim”, considerando a aglutinação das vogais, contém apenas quatro, dando o exato número de sílabas e notas do original.

A fim de manter o registro mais coloquial, invertemos as informações de posição. Na segunda versão, Burr primeiro fala de como se sentiu quando viu a filha nascer e depois fala das semelhanças que há entre a filha e os pais. Dessa forma, não utilizamos o pronome oblíquo átono e assim conseguimos um registro mais próximo à fala. Essa inversão de posição ainda nos possibilitou incluir sentidos que tinham sido perdidos na primeira versão, como Theodosia ter o mesmo nome que sua mãe e ter olhos semelhantes aos de seu pai.

Como colocamos mais acima, almejamos não incluir muitas inversões na tradução, preferindo uma ordem direta, pois isso estaria mais próximo do registro oral. Isso foi um grande desafio nessa música, muito provavelmente pela presença de muitas notas longas no final dos versos e pelo fato de os tempos fortes estarem deslocados. De fato, em muitos momentos não conseguimos manter a ordem direta na tradução.

Quadro 19: Exemplo de Sentido acima da Naturalidade

Texto-Fonte Tradução: Versão 1 Tradução: Versão 2 If we lay a strong enough

foundation

We’ll pass it on to you, we’ll give the world to you

Se cuidarmos bem da nossa terra

Bons frutos vou colher, passá-los pra você

Eu vou cuidar da nossa terra

Bons frutos vou colher, passá-los pra você If / we/ lay /a /strong /e–

/nough /foun–/da–/tion We’ll /pass /it /on /to /you,/

we’ll /give /the /world /to /you

Se /cui/dar/mos/ bem/ da/

nos/sa /ter/ra

Bons /fru/tos/ vou /co/lher, pas/sá-/los/ pra/ vo/cê

Eu/ vou/ cui/dar/ da/ nos/sa /ter/ra

Bons /fru/tos/ vou /co/lher, pas/sá-/los/ pra/ vo/cê

No quadro 19 “Vou colher bons frutos” não manteria a prosódia do português (Vou/

co/lher/ bons/ fru/tos), logo a solução foi inverter. Esse refrão como um todo impôs uma maior necessidade de inversões do que no total das outras músicas traduzidas.

No documento Hamilton : traduzindo as duas revoluções (páginas 45-48)

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