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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.2 ESPACIALIZAÇÃO E IMPACTOS SÓCIOAMBIENTAIS DO PROCESSO DE SALINIZAÇÃO

4.2.2 Mapeamento da salinidade do solo

Por meio do mapeamento da área foi possível estabelecer aproximadamente os níveis altimétricos de todo o território do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba. As cotas mais elevadas estão nas áreas mais ao sul do perímetro irrigado. As áreas salinizadas estão concentradas na parte central do perímetro irrigado que apresentam cotas altimétricas altas, acima dos 50 metros (Figura 27). As variações da altitude conjuntamente com os tipos de relevos, que a área do perímetro está inserida, podem interferir diretamente na espacialização do processo de salinização. O relevo irregular tende a direcionar os saís para as áreas de depressão circunvizinhas e também podem servir como barreira natural para que os sais não migrem para os espaços de altitudes menores. A geomorfologia irregular com a presença de áreas depressivas entre outras de maior altitude, faz com que os saís sejam levados para a parte mais baixa.

A área 17 evidencia a irregularidade do relevo do território do perímetro irrigado e também uma das serras residuais da região semiárida sergipana. Essa propriedade agrícola está inserida dentro da variação de cor de maior altitude podendo chegar a 300 metros, como pode ser visualizado no mapa abaixo (Figura 26).

Vale salientar que a concentração das áreas salinizadas está dentro de uma altimetria baixa em relação às áreas limites do perímetro irrigado. Essa área de acordo com os agricultores é classificada como intermediária no processo de salinização, no entanto, as análises físico-químicas o solo desse local classificou-se como salino-sódico. Os solos classificados como salino-sódicos estão dentro de um nível do processo de salinização considerado pela literatura como problemático para agricultura.

Figura 26 - Área 17 com solos salino-sódicos; marcada por relevo irregular.(SANTOS, S. J. S, 2014).

Uma das medidas de remediação praticadas pelos agricultores é a aberturas de canais artificiais dentro da parcela do lote, para que a água proveniente da irrigação drene para dentro do canal os saís solúveis. Os agricultores acreditam que essa medida irá minimizar os efeitos da salinização dentro da parcela prejudicada pela salinidade. Contudo, essa remediação por meio da mudança da estrutura dos horizontes pedológicos dificilmente mitiga os efeitos da salinização, a exemplo dos solos salino-sódicos, que tendem a aumentar o percentual de sódio trocável ao longo do tempo, pela fixação do sódio nos horizontes mais superficiais do solo (RIBEIRO, 2010).

É notório destacar que as condições edafoclimáticas da região favorecem o processo de salinização, quando esse se intensifica dentro das parcelas. O Perímetro Irrigado Jacaré- Curituba está inserido na região semiárida nordestina, com o tipo climático semiárido, com baixas e irregulares precipitações anuais e elevada evapotranspiração. A escassez de chuva na maior parte do ano aumenta a evapotranspiração, o que resulta numa maior concentração dos sais. As áreas com sistema de irrigação ativo não demonstram com a mesma intensidade os efeitos da estação seca como as áreas que nunca foram irrigadas ou que a irrigação foi desativada.

Vale ressaltar que a desativação do sistema de irrigação deve-se a degradação dos solos, relatada pelos agricultores como sendo causa da salinização dentro do perímetro irrigado, o que ficou comprovado nas análises dessa pesquisa. As áreas salinizadas durante a estação chuvosa tendem a ficar encharcadas e com um aspecto espumoso no solo e na estação seca os sais cristalizam-se na superfície e são facilmente visíveis (Figura 28).

Figura 28 - solo salino identificado na área 01: encharcado e com aspecto espumoso.(SANTOS, S. J. S, 2014).

Os tipos de solos identificados dentro do território do Perímetro Irrigado Jacaré- Curituba foram o Neossolo Litólico e o Luvissolo Crômico. O solo Luvissolo Crômico apresenta uma profundidade rasa (60-120 cm), tem drenagem variável (60-120 cm), tem drenagem variável, com nítida diferenciação entre os horizontes A e Bt, devido ao contraste de textura, cor e/ou estrutura entre eles. A mudança abrupta de textura é resultado do tipo de material intemperizado das rochas e pela decomposição da matéria orgânica. A ação do clima e agentes erosivos, como a água, o ar e a biota também atuam significativamente na formação desses solos (Agência Embrapa de Informação Tecnológica, 2015).

O solo Luvissolo Crômico são moderamente ácidos e ligeiramente alcalinos com teores de alumínio extraível baixos ou nulos e presença, em quantidade variável, mas expressiva, de argilominerais. As áreas de ocorrência desse tipo de solo apresenta clima seco com déficit hídrico e amplitude térmica alta, devido às irregularidades do relevo. Por conter alta saturação das bases se tornam férteis naturalmente (eutróficos) sendo, portanto favoráveis ao desenvolvimento de cultivos agrícolas (Agência Embrapa de Informação Tecnológica, 2015). No território do perímetro irrigado o solo apresentou em alguns locais afloramentos rochosos configurando uma feição pedregosa, bem como a identificação de áreas com caráter solódico ou sódico nas profundidades de 0,0-0,15 m e 0,15-0,30 m (Figura 29).

O Neossolo Litólico é um dos tipos de solos ocorrentes no alto sertão sergipano e foi identificado em menor proporção no território do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba. No território do perímetro o solo Neossolo Litólico está nos limites do território e não há desenvolvimento da agricultura nesses locais, mas, a presença de cobertura vegetacional do Bioma Caatinga. Cabe destacar que não foram coletadas amostras de solo nessa parte do perímetro irrigado, pois se priorizou as parcelas do Assentamento Jacaré-Curituba com o desenvolvimento da agricultura.

Figura 29 - Classificação das subclasses dos solos do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba(QUINTÃO, 2015).

A cobertura do solo durante a produção do espaço geográfico, dos territórios analisados, passou por mudanças resultantes da própria evolução da paisagem, e principalmente após a implantação do Assentamento de Reforma Agrária Jacaré-Curituba e Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba. Por meio de dados obtidos no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra constatou-se que uma parte significativa do Bioma Caatinga, vegetação natural da área, foi desmatada com a finalidade principal de comercialização da madeira. Essas interferências na vegetação natural refletem diretamente na qualidade ambiental do solo, pois o mesmo se torna mais suscetível à ação dos processos

intempéricos e erosivos. A inserção da agricultura na área se intensifica a partir da consolidação do Assentamento de Reforma Agrária Jacaré-Curitiba, que segundo informações do Incra , esse território era anteriormente ocupado por fazendas improdutivas.

Por meio de mapeamento constatou-se que há no território do Perímetro Irrigado a vegetação do Bioma Caatinga (Figura 30), inserida em de Área de Proteção Permanente, Reserva Legal e nos locais em que a vegetação está se regenerando naturalmente. Nos lotes de sequeiro há a presença de pastagens e o plantio da palma. As culturas irrigadas do perímetro estão dispostas nos lotes, que se dividem em parcelas, pertencente aos assentados. Ressalta-se que as áreas em processo de salinização estão concentradas no centro do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba, que também se constitui no espaço mais intensamente usado, ao longo das duas últimas décadas, por cultivos agrícolas.

Figura 30- Área de Proteção Permanente do Bioma Caattinga no Perímetro Irrigado Jacaré- Curituba (SANTOS, S. J. S, 2014).

Os efeitos da salinização modificam intensamente a paisagem, e a vegetação é um dos atributos ambientais que melhor reflete os impactos do aumento da salinidade. A ausência da vegetação em algumas áreas do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba é consequência do acúmulo de saís no solo. A redução intensa da vegetação nas áreas salinizadas implica uma diminuição substancial do material orgânico que fornece nutrientes necessários para a qualidade ambiental dos solos (Figura 31).

Figura 31 - Mapa da Cobertura do Solo do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba (QUINTÃO, 2015).

A degradação biológica após a diminuição da matéria orgânica dos solos da região semiárida nordestina, associada às condições edafoclimáticas presentes nesse espaço prejudicam a recuperação natural desses solos. O fornecimento de matéria orgânica para o sistema é limitado pela baixa produção de biomassa vegetal e pelo déficit de umidade, o que favorece a redução da diversidade da fauna edáfica, pois cada espécie responde de maneira diferente aos efeitos da salinização. Pela diferença significativa entre as precipitações e as taxas de evapotranspiração, a baixa umidade, conjuntamente com altos teores de saís, há uma facilidade de ocorrer nas áreas salinizadas a mineralização do húmus (Figura 32), resultando em uma diferença negativa entre a incorporação e a perda de matéria orgânica. Esse tipo de

degradação do solo ocasionada pela salinização influencia a perda de nutrientes e micro- organismos benéficos, que são lixiviados pelas chuvas (RAYA, 1996 apud SÁ I. B. et al, 2010).

Figura 32 - Cristalização do húmus na área 05 com presença de solo salino na profundidade de 0,0-0,15 m. (SANTOS, S. J. S, 2014).

As observações de campo possibilitaram uma análise mais detalhada das características pertinentes às áreas de coleta que permitiram a identificação dos solos quanto a salinidade e sua classificação quanto a solos: normais, salino, salino-sódico e sódico. As áreas com solos normais estão sendo cultivadas por culturas agrícolas, como a do quiabo que é predominante no perímetro irrigado.

As áreas com presença de solos salinos, como a área 05 que apresentou essa condição na profundidade de 0,0-0,15 m, observou-se que o proprietário fez modificações no solo com a finalidade de conter o processo de salinização, por meio da abertura de um canal de drenagem, para que os saís não se espalhassem em toda a parcela. Foi possível constatar nesta área (Figura 33) o desenvolvimento, na maior parte da propriedade, da cultura do milho, irrigada por gotejamento. Ressalta-se que avanço da salinização nessa parcela agrícola está em direção à área mais rebaixada do terreno e do córrego artificial, que segundo os agricultores do assentamento serve também para conter a espacialização da salinidade.

Figura 33 - Área 05 solo salino (SANTOS, S. J. S, 2014).

A fertilidade do solo diminui severamente com o acúmulo de sais no solo e afeta a produtividade dos cultivos ocasionando sua diminuição até ao ponto de não se produzir mais. Algumas áreas degradadas pelo processo de salinização apresentam perda de aproximadamente 01 hectare da parcela que era cultivada.

De acordo com SILVEIRA et al (2010) os efeitos da salinidade são “silenciosos”, pois as plantas na fase de estresse frequentemente não exibem sintomas de toxidade, de desidratação nutricional ou desidratação visível. De acordo com os autores é difícil diagnosticar os efeitos e sintomas da salinidade em estágio inicial e intermediário ao processo de salinização. Vale salientar que foi utilizado nesse estudo o critério de visualização dos danos à vegetação e solo nas áreas que foram coletadas, como também naquelas com a agricultura em plena atividade, para fins de comparação e verificação da ocorrência do processo de salinização.

Em algumas áreas em que se diagnosticou a presença de solos salinos e salino-sódicos observou-se a existência de uma vegetação arbustiva e seca, árvores desfolhadas, solo desnudo e nenhum cultivo agrícola inserido (Figura 34). Ressalta-se que de acordo com a literatura a salinidade reflete-se diretamente na perda da fertilidade do solo, tornando-o mais suscetível aos processos erosivos.

Figura 34 - Vegetação degradada: área 13, presença de uma vegetação rasteira seca. (SANTOS, S. J. S, 2014).

Na área do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba e Assentamento de Reforma Agrária Jacaré-Curituba há diferentes espécies de plantas, pertencentes ao Bioma Caatinga e aquelas inseridas, que compõem os cultivos agrícolas do perímetro irrigado (Figura 35). Os efeitos da salinidade são refletidos de forma diferente nas plantas que estão sob o estresse salínico. O grau de salinidade interfere na absorção da água pelas plantas. Quando processo de salinização aumenta, a planta diminui absorção hídrica e poderá perder a água retida no seu interior, processo denominado de plasmólise.

O solo na área 10 foi classificado como salino-sódico e foi possível constatar a presença de árvores de pequeno porte e arbustos desfolhados e secos. As coletas nessa parte da parcela foram feitas na estação chuvosa, o que favorece o crescimento das folhas e o desenvolvimento da planta, contudo, o processo de salinização que atingiu esse espaço impede que as plantas se desenvolvam e muitas morrem por não conseguir se adaptar ao solo salinizado. Vale salientar que a área 10 não tem o sistema de irrigação implantado, portanto, a salinização ocorrente está sendo ocasionada pelo escoamento superficial e infiltração dos saís da área adjacentes (Figura 36).

Figura 36 - Área 10- degradação intensa da vegetação. (SANTOS, S. J. S, 2014).

O território do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba apresenta cursos fluviais que formam a rede de drenagem da sub-bacia hidrográfica do rio Jacaré e da sub-bacia hidrográfica do rio Curituba. Ressalta-se que tanto o perímetro irrigado quanto o assentamento tem o nome Jacaré-Curituba em virtude desses dois rios acima mencionados. As áreas salinizadas estão concentradas na parte centro sul do perímetro irrigado, e nelas há a presença de cursos fluviais e alagadiços.

A hidrografia e a geomorfologia do território do perímetro irrigado interferem diretamente no processo de salinização (Figura 37). O relevo das áreas com solos salinizados comumente são irregulares e rebaixados em relação às áreas circunvizinhas e em algumas

delas há a presença de canais fluviais ou áreas alagadiças na estação chuvosa. Foi possível constatar que se trata de uma linha de drenagem com rios estreitos com pouca turbulência e vazão.

Figura 37- Hidrografia e Topografia do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba.(QUINTÃO, 2015).

Na área 06 o processo de salinização se apresenta intenso e há a presença de um curso fluvial circundando uma parte da área. Nessa área o solo na estação chuvosa estava muito encharcado e semissólido e na estação seca foi possível verificar um solo mais compacto, com rachadura em alguns locais com os sais aflorando. A presença da água proveniente do curso

fluvial na área intensifica ainda mais o intemperismo químico das rochas e consequentemente haverá uma maior diluição dos saís solúveis, agravando ainda mais a problemática da salinização (

Figura 38).

Figura 38 - Área 06 solo salino-sódico drenado por curso fluvial: mata ciliar do canal. (SANTOS, S. J. S, 2014).

A altitude do território se eleva em direção ao sul do perímetro irrigado, sendo o relevo marcado por topografias irregulares, recortadas por canais fluviais. Com as análises constatou-se que há uma contenção natural da salinidade para as áreas mais rebaixadas ao norte. O rio São Francisco está localizado ao norte do perímetro irrigado, parte rebaixada do território, marcada pela transição do pediplano sertanejo para um relevo mais erodido. Essa análise se torna relevante para entender a espacialização da salinização dentro do Perímetro Irrigado Jacaré-Curituba. Os rios que drenam a maior parcela das áreas salinizadas não estão em contato direto com o rio São Francisco, mas compõem a rede de drenagem da sub-bacia do rio Jacaré.

Por se tratar de um território utilizado intensamente pela prática agrícola, os impactos ocasionados pela lixiviação dos saís poderão desencadear a perda da qualidade das águas e

danos à biota desses cursos fluviais. Na área 01 foi possível verificar a degradação que o processo de salinização causou numa parte do curso fluvial que drena a propriedade. Por meio da análise da paisagem constatou-se a vegetação ciliar seca, pela toxidade dos saís, e em alguns trechos inexistentes, o que favorece a intensidade dos processos do intemperismo e da erosão (Figura 39).

Figura 39: Área 01 com solo salino: curso fluvial degradado pela ação do aumento da salinidade (SANTOS, S. J. S, 2014).